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Florística e estrutura de comunidades arbóreas em cerrados de Rondônia,Brasil

Flora and structure of tree communities in dry savannas in Rodônia, Brazil

Resumos

O cerrado constitui o segundo maior e mais diverso bioma brasileiro, configurando um heterogêneo mosaico fisionômico e florístico. Mais de seis mil espécies de fanerógamas são reportadas para o cerrado do Brasil Central. Este trabalho teve o objetivo de descrever e analisar a flora e a estrutura de quatro comunidades de árvores dos cerrados sensu latu do município de Vilhena, Rondônia, Brasil. As áreas estudadas foram: cerradão (Área 1), campo sujo (Área 2) e duas comunidades do cerrado sensu stricto (Áreas 3 e 4). Em cada área foi posicionado aleatoriamente um transecto de 10 x 1000 m (1 ha), dividido em 100 parcelas de 10 X 10 m. Todas as plantas vivas e mortas com circunferência do tronco e" 10 cm ao nível do solo foram registradas. O cerradão apresentou a maior riqueza específica, estrutura de tamanho e área basal. As percentagens de árvores mortas foram mais altas nas áreas de cerradão e campo sujo, com ocorrência de fogo recente. As famílias mais importantes foram Vochysiaceae, Ochnaceae, Clusiaceae, Malpighiaceae e Melastomataceae. As espécies mais importantes foram Qualea multiflora, Byrsonima crassifolia (área 1), Eugenia sp., Miconia sp.1 (área 2), Ouratea hexasperma, Caraipa savannarum (área 3), Ouratea hexasperma, Pouteria sp.3 (área 4). A maioria das espécies ocorre somente em uma área, sugerindo que a priorização de áreas para conservação deve envolver todo o mosaico de cerrados existentes. A mortalidade associada ao fogo é diferenciada entre as áreas, talvez induzida pelo grau de flamabilidade, recorrência do fogo e de fatores históricos do uso da terra.

Amazônia; Árvore; Fitossociologia; Flora


The Neotropical savannas, locally called "cerrado", are Brazil's second largest and diverse biome, constituting a heterogeneous physiognomic and floristic mosaic from which more than 6,000 species have been reported to date. This study describes and analyzes the floras and structures of four tree communities from dry savannas in the municipality of Vilhena, Rondônia, Brazil. The study areas were: savanna with trees "cerradão" (Area 1), savannas wich bushes or "campo sujo" (Area 2), and two savanna woodlands or "cerrado" sensu stricto (Areas 3 and 4). In each area an transect measuring 10 x 1,000 m (1 ha) was placed at random and divided into 100 quadrats of 10 x 10 m. All living and dead woody plants with circumference ³ 10 cm at ground level were included in the survey. "cerradão" was the richest in species, had the greatest plant diversity, and showed the largest basal area. The percentages of dead trees were highest in areas that had been recently burned. The most species-rich and abundant plant families were Vochysiaceae, Ochnaceae, Guttiferae, Malpighiaceae and Melastomataceae. The most important species were Qualea multiflora and Byrsonima crassifolia (area 1), Eugenia sp. and Miconia sp.1. (area 2), Ouratea hexasperma and Caraipa savannarum (area 3) Ouratea hexasperma and Pouteria sp3. (area 4). Most species (53%; N=92 spp.) were found in only one of the four areas, indicating that the selection of priority areas for biological conservation should take into account the whole of the savanna mosaic. Tree mortality caused by fire was different among the four study areas, probably as a function of burning recurrency, the degree of flammability, and historical factors involving land use.

Amazonian; Flora; Phytosociology; Tree


BOTÂNICA

Florística e estrutura de comunidades arbóreas em cerrados de Rondônia,Brasil

Flora and structure of tree communities in dry savannas in Rodônia, Brazil

Izildinha Souza MirandaI; Samuel Soares AlmeidaII; Paulo Jorge Dantas† † In memorian

IUniversidade Federal Rural da Amazônia, Departamento de Ciências Florestais, Av. Pres.Tancredo Neves n.º 2501, Caixa Postal 917, CEP 66.077-530, Belém, PA, Brasil. izildinhamiranda@uol.com.br

IIMuseu Paraense Emílio Goeldi, Departamento de Botânica, Av. Magalhães Barata, 376, C.P. 399, CEP 66040-170, Belém, PA, Brazil. salmeida@museu-goeldi.br

RESUMO

O cerrado constitui o segundo maior e mais diverso bioma brasileiro, configurando um heterogêneo mosaico fisionômico e florístico. Mais de seis mil espécies de fanerógamas são reportadas para o cerrado do Brasil Central. Este trabalho teve o objetivo de descrever e analisar a flora e a estrutura de quatro comunidades de árvores dos cerrados sensu latu do município de Vilhena, Rondônia, Brasil. As áreas estudadas foram: cerradão (Área 1), campo sujo (Área 2) e duas comunidades do cerrado sensu stricto (Áreas 3 e 4). Em cada área foi posicionado aleatoriamente um transecto de 10 x 1000 m (1 ha), dividido em 100 parcelas de 10 X 10 m. Todas as plantas vivas e mortas com circunferência do tronco e" 10 cm ao nível do solo foram registradas. O cerradão apresentou a maior riqueza específica, estrutura de tamanho e área basal. As percentagens de árvores mortas foram mais altas nas áreas de cerradão e campo sujo, com ocorrência de fogo recente. As famílias mais importantes foram Vochysiaceae, Ochnaceae, Clusiaceae, Malpighiaceae e Melastomataceae. As espécies mais importantes foram Qualea multiflora, Byrsonima crassifolia (área 1), Eugenia sp., Miconia sp.1 (área 2), Ouratea hexasperma, Caraipa savannarum (área 3), Ouratea hexasperma, Pouteria sp.3 (área 4). A maioria das espécies ocorre somente em uma área, sugerindo que a priorização de áreas para conservação deve envolver todo o mosaico de cerrados existentes. A mortalidade associada ao fogo é diferenciada entre as áreas, talvez induzida pelo grau de flamabilidade, recorrência do fogo e de fatores históricos do uso da terra.

PALAVRAS-CHAVE: Amazônia, Árvore, Fitossociologia, Flora.

ABSTRACT

The Neotropical savannas, locally called "cerrado", are Brazil's second largest and diverse biome, constituting a heterogeneous physiognomic and floristic mosaic from which more than 6,000 species have been reported to date. This study describes and analyzes the floras and structures of four tree communities from dry savannas in the municipality of Vilhena, Rondônia, Brazil. The study areas were: savanna with trees "cerradão" (Area 1), savannas wich bushes or "campo sujo" (Area 2), and two savanna woodlands or "cerrado" sensu stricto (Areas 3 and 4). In each area an transect measuring 10 x 1,000 m (1 ha) was placed at random and divided into 100 quadrats of 10 x 10 m. All living and dead woody plants with circumference ³ 10 cm at ground level were included in the survey. "cerradão" was the richest in species, had the greatest plant diversity, and showed the largest basal area. The percentages of dead trees were highest in areas that had been recently burned. The most species-rich and abundant plant families were Vochysiaceae, Ochnaceae, Guttiferae, Malpighiaceae and Melastomataceae. The most important species were Qualea multiflora and Byrsonima crassifolia (area 1), Eugenia sp. and Miconia sp.1. (area 2), Ouratea hexasperma and Caraipa savannarum (area 3) Ouratea hexasperma and Pouteria sp3. (area 4). Most species (53%; N=92 spp.) were found in only one of the four areas, indicating that the selection of priority areas for biological conservation should take into account the whole of the savanna mosaic. Tree mortality caused by fire was different among the four study areas, probably as a function of burning recurrency, the degree of flammability, and historical factors involving land use.

KEYWORDS: Amazonian, Flora, Phytosociology, Tree.

INTRODUÇÃO

A paisagem dos cerrados brasileiros é composta por um mosaico fito-fisionômico e florístico, caracterizada por vegetação savânica aberta, xeromórfica e rica em espécies (Huber, 1987), especialmente aquelas com distribuição restrita e endêmica. Esse bioma é o segundo em extensão, com cerca de dois milhões de km2, correspondendo a 23% do território brasileiro.

No passado, a dinâmica geo-climática foi determinante para a origem e diversificação dos cerrados. Atualmente, as variáveis edáficas e a sazonalidade climática são importantes para explicar a heterogeneidade ambiental verificada nesse bioma. Entre as propriedades dos solos apontadas como relevantes, pode-se citar o teor do alumínio, o teor das bases catiônicas trocáveis e dos microelementos, além de propriedades físicas como a textura, a capacidade de armazenamento de água, a profundidade, entre outras (Eiten, 1972; Goodland & Pollard, 1973; Montgomery & Askew, 1983; Ratter & Dargie, 1992). O regime pluviométrico também é fundamental, especialmente, o total e a distribuição anual das chuvas, assim como o período da estação seca (Huber, 1982; Oliveira Filho e Martins, 1986; Furley & Ratter, 1988; Oliveira Filho et. al., 1989). Outros fatores como fogo, herbivoria e perturbações antrópicas também desempenham papéis diferenciados e importantes em cada região, sendo considerados como determinantes secundários desses ecossistemas (Gibbs et al., 1983; Medina, 1987; Borhidi, 1988; Pagano et al., 1989; Durigan et al., 1994; Hoffmann, 1996).

Os cerrados do Brasil Central e mesmo aqueles da transição para a Amazônia, como os de Rondônia, estão situados em zonas de forte estacionalidade, onde o fogo é um evento freqüente que influencia, inclusive, a dinâmica da vegetação. A origem do fogo pode ser tanto natural ou fortuita devido ao grau de ignição, como acidental, de origem antrópica, quando utilizado na agricultura para limpeza de pastos, de áreas de culturas ou mesmo fogo induzido ou intencional (Raw & Hay, 1985).

O grau de ignição ou o potencial de flamabilidade, é dependente de diversos fatores locais, físicos e mesmo históricos, tais como: déficit hídrico, duração do período seco, estrutura da vegetação e grau de intermitência do evento. A combinação desses fatores faz com que cada área ou zona apresente susceptibilidade diferenciada ao fogo.

Os efeitos e os mecanismos ecofisiológicos e morfológicos das plantas de cerrado, e por extensão as de savanas, para resistirem ou conviverem com o fogo são bem documentados na literatura científica (Coutinho, 1978; Raw & Hay, 1985; Hoffman, 1996; Oliveira Filho et al., 1989).

A flora fanerogâmica nativa do bioma cerrado no Brasil Central, listada por Mendonça et al. (1998), inclui 6.060 espécies e 425 variedades distribuídas em 1.093 gêneros e 151 famílias botânicas, abrangendo todas as formas de vida vegetal e as várias feições de cerrado sensu lato, inclusive os ambientes associados como florestas de galeria, brejos e campos de altitude.

Em Rondônia, os cerrados localizam-se em grandes áreas contínuas, localizadas no sul do estado, na transição entre os domínios da floresta amazônica e dos cerrados do Brasil Central. Na transição com o bioma amazônico, os cerrados se entrelaçam com florestas abertas com palmeiras e florestas estacionais semideciduais. Compondo ainda esse cenário de "tensão ecológica", existem também, no norte do estado, áreas isoladas ou "ilhas" de cerrado, também conhecidas como savanas amazônicas. Esses fragmentos parecem que foram isolados pela expansão da floresta tropical neste último período úmido interglacial.

No município de Vilhena, ao sul de Rondônia, onde o presente estudo foi realizado, a vegetação de cerrado tem sido continuamente transformada em áreas agrícolas com alto potencial de produção de grãos em grande escala, especialmente soja. O avanço da soja se dá tanto sobre as áreas agrícolas e pastos abandonados, como sobre os remanescentes de cerrados. O processo de dizimação dos cerrados neste estado é semelhante ao ocorrido no Centro Oeste, onde grandes áreas foram convertidas em plantios homogêneos de soja, graças às novas tecnologias de correção do solo, seleção de sementes e mecanização agrícola. Apesar da existência de muitos estudos sobre a estrutura, dinâmica e composição dos vários grupos biológicos nos cerrados brasileiros, o conhecimento sobre a flora e a estrutura da vegetação de cerrados, nas regiões de transição entre os dois principais biomas brasileiros, é praticamente inexistente. Dessa forma, há uma grande necessidade de estudos sobre a flora e estrutura desse ambiente, não somente para aumentar o conhecimento científico sobre o mesmo, como também para subsidiar a escolha de áreas prioritárias para conservação de tratos representativos da variação ambiental e da biodiversidade do bioma cerrado, na junção com a floresta amazônica.

Este trabalho tem como objetivos descrever e analisar a flora e estrutura de quatro comunidades de árvores de cerrados do município de Vilhena, em Rondônia, visando aumentar o conhecimento sobre a composição florística e o porte desses ambientes na Amazônia, e, ainda, subsidiar a priorização de áreas para conservação.

MÉTODOS

ÁREAS DE ESTUDO

As áreas de cerrado estudadas estão localizadas no município de Vilhena, sul do estado de Rondônia, já na divisa com o Estado do Mato Grosso, entre as coordenadas 12º17'50" - 12º32'6,3" de latitude Sul e 60º12'32,8"- 60º25'10,7"de longitude Oeste, com altitudes que variam entre 347 a 565 m (Tabela 1). Essas áreas estão entre os rios Roosevelt e Comemoração, formadores da bacia do rio Madeira e drenam para o Norte. Tais áreas estão localizadas numa zona de importância biogeográfica da Chapada dos Parecis, uma vez que para Leste drenam os rios formadores da bacia do Tapajós, constituindo-se então num divisor de águas.

As áreas de estudo foram selecionadas levando em consideração a representatividade dos tipos de cerrado na região de Vilhena e a facilidade de acesso. A terminologia utilizada para os cerrados seguiu aquela apresentada e discutida por Ribeiro & Walter (1998).

O clima das áreas é o tropical úmido, quente, com sazonalidade marcante, caracterizado por estação seca muito bem definida. As temperaturas médias anuais estão entre 22 e 24ºC e as precipitações pluviométricas médias anuais entre 2000 e 2250 mm e umidade relativa média do ar em torno de 70 e 80% (Nimer, 1991).

Os solos predominantes são latossolos arenosos, bem drenados, ácidos, com altas concentrações de alumínio, baixa concentração de matéria orgânica e de bases trocáveis como cálcio, magnésio, potássio e fósforo (Tabela 2). Os níveis de micronutrientes como ferro, cobre e zinco são satisfatórios. Os valores estão dentro daqueles reconhecidos para os solos de cerrados no Brasil Central e de savanas neotropicais em geral (Montgomery & Askew, 1983).

MÉTODOS DE CAMPO E DE ANÁLISES

Em cada área selecionada foi aleatoriamente posicionado um transecto de 10 x 1.000 m, totalizando 10.000 m2 ou 1 hectare. O transecto foi dividido em 100 parcelas de 10 x 10 m. Dentro de cada parcela foram inventariadas todas as plantas, vivas e mortas, em pé com circunferência e" 10 cm ao nível do solo. Além da medida da circunferência, foi medida a altura total, coletado material botânico e realizada uma pré-identificação em campo.

O material botânico foi identificado com auxílio de literatura taxonômica e por comparação com material de herbário. Parte das espécies foi apenas morfotipada, porque o material botânico coletado estava estéril. As exsicatas contendo material fértil foram depositadas no herbário "João Murça Pires", do Museu Paraense Emílio Goeldi.

A análise florística incluiu a densidade de indivíduos, números de espécies, gêneros e famílias botânicas registradas por área, além da indicação dos gêneros e famílias mais ricos em espécies. A análise da estrutura incluiu a diversidade florística, calculada através do índice de Shannon-Wiener (H') baseado em logaritmos naturais; a equabilidade (E) foi calculada usando o índice de Pielou de acordo com Magurran (2004). Também foram incluídas a média das alturas e a totalização da área basal (AB), por área estudada.

Foram analisados parâmetros convencionais de fitossociologia, como abundâncias absoluta (N) e relativa (NR), freqüência relativa (FR), dominância relativa (DoR) e o índice de valor de importância específica (IVI). Todos os parâmetros relativos estão apresentados em percentagem e foram obtidos para cada espécie, por área estudada. Esses parâmetros foram calculados de acordo com Brower et al. (1997).

Para fins de análise, as espécies foram separadas entre aquelas com ocorrência restrita, quando registrada em somente uma área; ocorrência ocasional, quando detectada em duas áreas e com ocorrência irrestrita ou ampla, quando foi inventariada em três ou quatro áreas.

RESULTADOS

Os transectos inventariados nas quatro áreas incluíram 5.215 troncos, sendo 4.828 (92,58 %) pertencentes a árvores vivas e 387 (7,42 %) a árvores mortas. Esses indivíduos pertencem a 92 espécies ou morfoespécies, 61 gêneros e 38 famílias botânicas (Anexo I Anexo I ).

O transecto inventariado no cerradão (Área 1) apresentou total de 1.609 indivíduos, sendo que 211 estavam mortos (13,11 %). A flórula de árvores vivas incluiu 60 espécies pertencentes a 46 gêneros e 28 famílias botânicas. A área basal por hectare atingiu 12,44 m2 (Tabela 3). As famílias Vochysiaceae (4 espécies), Fabaceae (4 espécies), Malpighiaceae (4 espécies) e Rubiaceae (5 espécies) foram as mais ricas e abundantes nessa área. Os gêneros melhor representados foram Byrsonima com quatro espécies; Qualea e Eriotheca com três espécies; Davilla, Miconia, Erythroxylum, Pouteria, Kielmeyera e Eugenia com duas espécies cada (Anexo I Anexo I ).

O cerrado tipo campo sujo (Área 2) apresentou 442 indivíduos por hectare, com 72 troncos mortos (16,29 %). O restante dos indivíduos pertencia a 26 espécies, 24 gêneros e 20 famílias (Tabela 3). A área basal desse tipo de cerrado foi a menor, registrando-se somente 1,72 m2 por hectare (Tabela 3). As famílias mais abundantes no campo sujo foram Myrtaceae (1 espécie), Melastomataceae (3 espécies) e Sapotaceae (1 espécie). Os gêneros Miconia e Byrsonima apresentaram duas espécies cada (Anexo I Anexo I ).

No cerrado sensu stricto (Área 3) foram inventariados 1.353 indivíduos, com 60 troncos mortos (4,43 %). Os demais pertenciam a 39 espécies, 33 gêneros e 24 famílias. A área basal obtida foi de 8,71 m2 (Tabela 3). As famílias Ochnaceae (1 espécie), Clusiaceae (2 espécies), Myrtaceae (3 espécies), Vochysiaceae (3 espécies) e Melastomataceae (3 espécies) foram as mais abundantes e ricas nesse ambiente. O gênero Byrsonima foi o único que apresentou três espécies; os gêneros Eugenia, Vochysia, Miconia e Erythroxylum apresentaram duas espécies cada um (Anexo I Anexo I ).

O segundo cerrado sensu stricto (Área 4) incluiu 1.811 indivíduos, sendo que 44 (2,43 %) estavam mortos. Os demais indivíduos vivos estavam distribuídos em 45 espécies, 38 gêneros e 30 famílias. A área basal calculada ficou em 6,63 m2 por hectare (Tabela 3). As famílias mais importantes foram Ochnaceae, Vochysiaceae, Melastomataceae, Myrtaceae e Sapotaceae (Anexo I Anexo I ). Essa área apresentou florística mais rica e estrutura de menor porte quando comparada com a área anterior.

Em termos florísticos, a área de cerradão juntamente com as áreas de cerrado sensu stricto, apresentaram flórulas mais ricas em espécies, gêneros e famílias.

As distribuições de circunferências das quatro áreas revelaram padrão decrescente, com muitos indivíduos nas classes de tamanho menores (Figura 1). O mesmo padrão de distribuição foi apresentado pela maioria das principais populações arbóreas das quatro áreas estudadas. A área 4 apresentou a maioria dos indivíduos na classe de circunferência acima de 50 cm, denotando que esse ambiente apresenta estrutura de tamanho de maior porte, apesar de que, em média, sua altura foi inferior ao cerradão (Tabela 3).


A maioria das espécies apresentou ocorrência restrita a uma localidade (49 espécies, 53,26 %). Por sua vez, espécies registradas em três ou quatro áreas totalizam 26 (28,26 %), enquanto aquelas ocasionais, ou com dispersão intermediária que apareceram em 2 áreas, formaram o menor grupo, com 17 espécies (18,48 % do total) (Tabela 4).

A densidade média das espécies com ocorrência irrestrita (35,70 árvores.ha-1) foi mais elevada quando comparada com aquela verificada para as espécies com ocorrência restrita (24,78 árvores.ha-1) e ocasional (14,94 árvores.ha-1) (Tabela 4).

Entre os cerrados estudados, o número de indivíduos mortos na área de cerrado tipo "campo sujo" foi mais elevado, atingindo 16,29 % do total de troncos e 18,60 % da área basal por hectare (Tabela 5). As áreas de cerrado sensu stricto apresentaram os menores valores relativos para densidades (4,43% e 2,43 % para as áreas 3 e 4, respectivamente) e áreas basais (4,02 % e 2,87 % para as áreas 3 e 4, respectivamente) de troncos mortos (Tabela 5).

ANÁLISE FITOSSOCIOLÓGICA

As informações sobre os principais parâmetros fitossociológicos calculados para os cerrados estudados em Rondônia estão representadas na Tabela 5. A análise foi concentrada nas cinco espécies de maior IVI, sendo estas relacionadas com as comunidades arbóreas às quais pertenciam.

ÁREA 1: CERRADÃO (TRANSIÇÃO COM CERRADO SENSU STRICTO)

Nesse ambiente, as cinco espécies mais representativas incluíram 30,15 % da abundância relativa total, o que correspondeu a 485 indivíduos.ha-1; 36,34 % da dominância relativa da comunidade (Área Basal = 4,51 m2.ha-1) e 26,19 % da freqüência relativa registrada. O IVI expresso pela soma da abundância, dominância com as freqüências relativas, divididas por três, totalizou 30,89 % nesse grupo de espécies (Tabela 6).

Qualea multiflora (Vochysiaceae) se destacou nesse grupo, atingindo IVI de 10,39 %. As outras espécies proeminentes nessa comunidade foram Byrsonima crassifolia (Malpighiaceae), IVI = 6,61; Kielmeyera rubriflora (Clusiaceae), IVI = 5,37 %, Byrsonima tomentosa (Malpichiaceae), IVI = 4,29 % e Sclerolobium sp. (Caesalpiniaceae), IVI = 4,24 (Tabela 6).

ÁREA 2: CAMPO SUJO

Esse ambiente foi apresentou os maiores valores relativos para os parâmetros fitossociológicos das cinco espécies mais destacadas da comunidade arbórea, em comparação aos demais. Esse grupo de espécies atingiu 64,03 % da abundância relativa total, correspondente a 283 indivíduos/ha, 60,16 % da dominância obtida pela comunidade (Área Basal = 1,04 m2.ha-1) e 59,31 % da freqüência total. O grupo das cinco espécies mais destacadas na comunidade arbóreo atingiu 61,17 % do total do IVI.

As espécies mais abundantes também foram as mais freqüentes e dominantes, sendo conseqüentemente, as mais importantes na comunidade. Nesse grupo, destacou-se Eugenia sp. (Myrtaceae), IVI = 21,14 %; Miconia sp.1 (Melastomataceae), IVI = 15,01 %; Pouteria sp.1 (Sapotaceae), IVI = 10,80 %; Connarus suberosus (Connaraceae), IVI = 8,52 % e Eriotheca sp.1 (Bombacaceae), IVI = 5,70 % (Tabela 6).

ÁREA 3: CERRADO SENSU STRICTO

As cinco espécies mais representativas, nessa área, apresentaram valores relativos dos parâmetros fitossociológicos ligeiramente maiores quando comparada com outra área de cerrado sensu stricto (Área 4). A abundância relativa alcançou 60,98 %, correspondendo a 825 indivíduos.ha-1. A dominância relativa para esse grupo foi de 59,56 % (AB = 5,19 m2.ha-1), enquanto que a frequência relativa atingiu valor inferior aos demais, com 41,86 % do total. O IVI relativo ao grupo das cinco espécies mais representativas foi de 54,13% (Tabela 6).

Ouratea hexasperma (Ochnaceae) foi a espécie mais destacada na comunidade arbórea, alcançando IVI de 19,24 % do total. As demais espécies com elevado valor de importância fitossociológica foram: Caraipa savannarum (Clusiaceae), IVI = 12,76 %; Pouteria sp.1 (Sapotaceae), IVI = 8,16 %; Eugenia sp. (Myrtaceae), IVI = 7,42 % e Vochysia rufa (Vochysiaceae), IVI = 6,55 % (Tabela 6).

ÁREA 4: CERRADO SENSU STRICTO

Este cerrado apresentou maior riqueza e densidade de indivíduos do que as demais áreas, o que produziu menores valores relativos dos parâmetros fitossociológicos. No grupo das cinco espécies mais representativas, a abundância, a dominância e a freqüência relativa totalizaram 52,34% (correspondente a 948 indivíduos/ha), 41,31% (Área Basal = 2,74 m2.ha-1) e 39,88 %, respectivamente. O IVI calculado para essas espécies somou 44,51% do total do IVI (Tabela 6).

Novamente, Ouratea hexasperma foi a espécie com maior expressão fitossociológica, com IVI de 15,63 % do total, seguida por Pouteria sp.3 (Sapotaceae), IVI = 8,48 %; Myrtaceae sp.3, IVI = 7,72 %, Miconia sp.1 (Melastomataceae), IVI = 6,56 % e Vochysia rufa (Vochysiaceae), IVI = 6,12 % (Tabela 6).

DISCUSSÃO

Os cerrados estudados em Rondônia apresentaram riqueza de espécies, densidade e área basal comparáveis aos cerrados do Brasil Central (Goodland, 1971, 1979; Ribeiro et al., 1985; Silberbauer-Gottsberger & Eiten, 1987; Nascimento & Saddi , 1992; Felfili & Silva Junior, 1993).

O número de espécies encontrado nos cerrados amazônicos é geralmente baixo (Miranda et al., 2003; Sanaiotti et al., 1999). Os cerrados de Rondônia localizam-se na Amazônia, mas eles são unidos por corredores contínuos ao cerrado do Brasil Central. Portanto, devem ser considerados como o limite norte do domínio dos cerrados brasileiros e, embora eles localizem-se próximos das áreas isoladas dos cerrados amazônicos, são mais ricos que essas áreas isoladas.

Embora não tenham sido identificadas em nível específico, a maioria das espécies arbóreas encontradas nos cerrados estudados em Rondônia é comum às espécies que ocorrem nas principais áreas dos cerrados brasileiros, com exceção interessante de Caraipa savannarum, que não ocorre no Brasil Central (Mendonça et al., 1998). Sua distribuição vai das savanas do norte de América do Sul até os cerrados do sul da Amazônia brasileira, ocorrendo em grande abundância nas savanas das Guianas (Kubitzki, 1978). No Brasil, este é o primeiro registro de C. savannarum como espécie importante em comunidade arbóreas dos cerrados (segunda espécie mais importante da área 3), sugerindo que os cerrados de Rondônia possuem fortes relações florísticas com o cerrados do Brasil Central, como também nas savanas do Norte de América do Sul, fato que demonstra sua característica de transição entre esses dois importantes domínios vegetacionais.

Quinze espécies apresentam ampla distribuição nos cerrados brasileiros: Qualea grandiflora, Qualea multiflora, Qualea parviflora, Kielmeyera coriacea, Lafoensia pacari, Roupala montana, Tabebuia ochracea, Tocoyena formosa, Xylopia aromatica, Bowdichia virgilioides, Byrsonima coccolobifolia, Caryocar brasiliensis, Connarus suberosus, Curatella americana e Hancornia speciosa (Ratter e Dargie, 1992; Ratter et al., 1996).

Todos os parâmetros florísticos e estruturais analisados foram maiores na área 1 (cerradão-cerrado sensu stricto) e menores na área 2 (campo sujo), com exceção da porcentagem de árvores mortas. As diferenças florísticas e estruturais entre as áreas, assim como as diferenças entre os IVI de uma mesma espécie encontrada nas quatro áreas, podem estar relacionados a fatores edáficos. Goodland & Pollard (1973) encontraram diferenças na flora, fisionomia e produtividade dos cerrados, associadas a variações edáficas.

Algumas espécies são importantes em algumas áreas e raras em outras, fato que pode indicar preferências pelas condições ecológicas de alguns ambientes. Por exemplo, Q. multiflora, a primeira em importância na área 1, não ocorre nas outras áreas. a primeira em importância nas áreas 3 e 4, O. Hexasperma, não ocorre na área 1. Eugenia sp., a primeira em importância na área 2, foi também importante na área 3, mas rara nas áreas 1 e 4.

O fato de mais da metade das espécies terem sido registradas somente em uma das quatro áreas inventariadas, pode ser resultado da subamostragem dos ambientes, mas também, a evidência as limitações físicas e do grau de intervenção humana nessas áreas, uma vez que algumas espécies podem tolerar mais, tanto as variações naturais dos ambientes, como as mudanças nos diversos fatores históricos e humanos como: freqüência de fogo, fragmentação e impactos resultantes dos diversos usos da terra. No entanto, esse resultado sugere que a estratégia para priorização de áreas para conservação deve levar em consideração a inclusão de partes representativas do mosaico florístico e fito-fisionômico dos cerrados.

Entre as espécies presentes em todas as áreas, algumas aparecem em elevadas densidades ou abundância, como exemplo Vochysia rufa, Qualea multiflora, Caryocar brasiliense e Bowdichia virgilioides. Isso sugere que um grupo de espécies está mais apto a colonizar diferentes ambientes em densidades elevadas. Entretanto, existem outras espécies que aparecem em uma única área, em densidades também elevadas como Pouteria sp.2, Caraipa savannarum e Eugenia sp.

As alturas das árvores nas áreas estudadas em Rondônia foram menores do que outras áreas dos cerrados do Brasil Central, mas são comparáveis a outros cerrados amazônicos. Goodland (1971) verificou altura média de três metros nos campos sujos, seis metros nos cerrados sensu stricto e nove metros no cerradão. Silberbauer-Gottsberger & Eiten (1987) verificaram altura média de três metros em um cerrado de Botucatu, São Paulo. Nos cerrados amazônicos a altura encontrada por Miranda & Absy (2000) foi entre 2,4 e 3 m para as savanas de Roraima. Para as savanas do Marajó, Pará, Bastos (1984) verificou altura entre três e quatro metros. Para o cerrado de Alter-do-Chão, Pará, Miranda (1993) verificou uma altura média de 3,18 m.

De acordo com Ratter (1986), as espécies mais altas no cerrado sensu stricto estão entre cinco e seis metros de altura. No cerradão estão entre dez e doze metros, mas podem ocorrer indivíduos maiores. No presente estudo, as espécies que apresentaram as maiores alturas foram Sclerolobium sp., com indivíduos entre dez e quinze metros; Qualea multiflora, Byrsonima crassifolia, Ilex sp., Pouteria sp.1 e Oenocarpus distichus apresentaram indivíduos com mais de dez metros, na área 1.

As distribuições de circunferência das quatro áreas revelaram, na maioria distribuições decrescentes, muitos indivíduos nas classes de tamanhos menores, sendo o mesmo padrão de distribuição apresentado pela maioria das principais populações. De acordo com Richards (1996) esta distribuição é característica de vegetações naturais onde um grande número de indivíduos pequenos predomina.

O decréscimo acentuado apresentado na primeira classe de tamanho, especialmente na área 3 e 4, pode ser devido a não ocorrência de fogo nos últimos dois anos, segundo informação dos moradores e observações de campo. Esse fator pode ter proporcionado o estabelecimento de indivíduos da primeira classe de circunferência, entre dez e quinze centímetros, permitindo-os passar para as classes superiores. O fogo afeta classes de tamanho de um modo diferenciado (Raw & Hay,1985) e determina o estabelecimento de muitos arbustos e árvores (Hoffman, 1996). Mudanças na periodicidade dos eventos fenológicos também podem influenciar o número de indivíduos das primeiras classes de tamanho (Miranda, 1991).

A porcentagem de árvores mortas foi maior na área 2, no entanto, foi também alta na área 1. Segundo informação dos moradores e observações de campo, essas áreas foram queimadas na última estação seca e, a mortalidade alta pode ser devida à incidência de fogo recente.

A percentagem de árvores mortas nas áreas 1 e 2 são comparáveis àquelas encontradas no cerrado do Parque Nacional de Brasília (13,71% de troncos mortos), que também havia sido queimado antes da pesquisa (Felfili & Silva Junior, 1993). As porcentagens de árvores mortas nas áreas 3 e 4 foram muito menores doa que as encontradas nas áreas protegidas dos cerrados de Brasília, como por exemplo, na Estação Ecológica de Águas Emendadas (5,11% de troncos mortos) e na Área de Proteção Ambiental Cabeça de Veado (5,67% de troncos mortos) e dos cerrados de Minas Gerais estudados nos municípios de Patrocínio (5,20% de troncos mortos) e Paracatu (6,02% de troncos mortos) (Felfili & Silva Junior, 1993).

As manchas de cerrado apresentaram consideráveis níveis de mortalidade, provavelmente associados ao fogo, especialmente, elevados no cerradão e no campo sujo. Em geral, áreas com menor índice de lenhosidade, como campo sujo ou campo cerrado, podem apresentar maior vulnerabilidade ao fogo, embora a mortalidade associada possa variar de um estrato a outro (Raw & Hay, 1985). Assim, em campos sujos, a adaptação direcionada a tolerar o fogo pode atuar mais fortemente em ervas, enquanto que em cerrados sensu stricto, a seleção pode favorecer o estrato arbóreo que, por conseqüência, apresente menores taxas de mortalidade associadas a esse evento, conforme evidenciado neste estudo. No entanto, não se deve desconsiderar fatores históricos e antrópicos para explicar parte da mortalidade observada.

CONCLUSÕES

Os cerrados de Rondônia estudados apresentaram composição florística e estrutura de tamanho diferenciadas, evidenciando o mosaico florístico e fisionômico que caracteriza esse bioma.

Em relação ao componente arbóreo, o cerradão foi o ambiente com maior riqueza de espécies e maior porte, enquanto que o campo sujo evidenciou menor diversidade e porte.

O componente arbóreo é dominado por um grupo restrito de espécies, com exceção do cerradão onde a riqueza de espécies parece diluir a dominância entre um número maior de táxons.

Os cerrados de Rondônia têm afinidade florística e fisionômica com os existentes no Brasil Central, podendo ser considerados como uma extensão transicional desse bioma para o domínio da floresta Amazônia.

A mortalidade de árvores associada ao fogo varia entre as áreas estudadas, mas as espécies do cerrado sensu stricto parecem suportar melhores os efeitos deste fenômeno.

AGRADECIMENTOS

Este trabalho foi financiado com recursos do Programa PLANAFLORO, através da Empresa TECNOSOLO. Nós agradecemos a Edgar Menezes e Donadoni, pelo apoio logístico; aos fazendeiros Joaquim Romeu Fontes, José Paulo Gomes, Mário Alexandre Kerber, Romeu Kerber, que permitiram o trabalho em suas propriedades; ao Marcelo Cordeiro Thales pela produção do mapa de localização das áreas estudadas e aos botânicos que ajudaram na identificação das espécies: Kikyo Yamamoto, Volker Bittrich, Jorge Tamashiro (UNICAMP) e José Pirani (USP).

BIBLIOGRAFIA CITADA

Recebido em 04/05/2006

Aceito em 03/11/2006

ANEXO

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Anexo I

  • †
    In memorian
  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      23 Fev 2007
    • Data do Fascículo
      Dez 2006

    Histórico

    • Aceito
      03 Nov 2006
    • Recebido
      04 Maio 2006
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