Acessibilidade / Reportar erro

Análise comparativa da hiperplasia intimal após o implante de stents com e sem sirolimus em artérias coronárias de pequeno calibre

Resumos

OBJETIVO: Avaliar a redução do volume de hiperplasia intimal após angioplastia com stents com sirolimus (Cypher®) comparados com os stents não-recobertos de estrutura metálica fina (Pixel®) em pacientes com vasos pequenos. MÉTODOS: Oitenta pacientes com doença arterial coronariana foram prospectivamente incluídos em duas séries consecutivas de tratamento, sendo a primeira empregando stents com sirolimus (50) e a segunda stents não-recobertos de estrutura metálica fina (30). RESULTADOS: Os resultados foram: menor porcentual de obstrução da prótese através do ultra-som intracoronário [5,0% (EP = 0,77) x 39,0% (EP = 4,72), p < 0,001], menor perda tardia intra-stent [0,25 mm (EP = 0,03) x 1,11 mm (EP = 0,13), p < 0,001] e no segmento do vaso [0,30 mm (EP = 0,04) x 0,83 mm (EP = 0,11), p < 0,001], e também menor reestenose intra-stent (0% x 33,3%, p < 0,001) e no segmento do vaso (4% x 36,7%, p < 0,001) com os stents com sirolimus. A sobrevivência livre de eventos foi de 96% com os stents com sirolimus x 86,7% com os stents não-recobertos (p = 0,190). CONCLUSÃO: Os pacientes com vasos de pequeno calibre após o implante de stents com sirolimus evoluem com menor hiperplasia intimal (menor porcentual de obstrução intra-stent e menor perda tardia) do que quando são utilizados stents não-recobertos de estrutura metálica fina. Isto resultou em redução significativa da reestenose angiográfica aos oito meses de evolução.

Stent; reestenose; vaso pequeno


OBJECTIVE: This study aimed at evaluating reduction in intimal hyperplasia volume following angioplasty using sirolimus-eluting stents (Cypher™) compared with thin-strut bare-metal stents (Pixel™) in patients with small vessels. METHODS: Eighty patients with coronary artery disease were prospectively included in two consecutive series, the first using sirolimus-eluting stents (50) and the second using bare-metal stents (30). RESULTS: The use of sirolimus-eluting stents reduced: in-stent net volume obstruction [5.0% (SE = 0.77) x 39.0% (SE = 4.72), p < 0.001], in-stent late loss [0.25 mm (SE = 0.03) x 1,11 mm (SE = 0.13), p < 0,001], in-segment late loss [0.30 mm (SE = 0.04) x 0.83 mm (SE = 0.11), p < 0.001], in-stent restenosis (0% x 33.3%, p < 0.001) and in-segment restenosis (4% x 36.7%, p < 0.001). The event-free survival rate was 96% in the sirolimus-eluting stent group versus 86.7% in the bare-metal stent group (BMS) (p = 0.190). CONCLUSION: Sirolimus-eluting stents are superior to thin-strut bare-metal stents in reducing intimal hyperplasia (less in-stent obstruction and less late lumen loss) in patients with small vessels. The use of these stents significantly reduced angiographic restenosis at eight months.

Stent; restenosis; small vessels


ARTIGO ORIGINAL

Análise comparativa da hiperplasia intimal após o implante de stents com e sem sirolimus em artérias coronárias de pequeno calibre

Fernando Stuchi Devito; Amanda G. M. R. Sousa; Fausto Feres; Alexandre Antonio Cunha Abizaid; Rodolfo Staico; Luis Alberto Piva Mattos; Luis Fernando Leite Tanajura; Andréa C. L. S. Abizaid; Áurea Jacob Chaves; J. Eduardo M. R. Sousa

Instituto Dante Pazzanese de Cardiologia - São Paulo, SP

Correspondência Correspondência: Fernando Stuchi Devito Praça 9 de Julho, 176/111 15800-000 – Catanduva, SP E-mail: fdevito@cardiol.br

RESUMO

OBJETIVO: Avaliar a redução do volume de hiperplasia intimal após angioplastia com stents com sirolimus (Cypher®) comparados com os stents não-recobertos de estrutura metálica fina (Pixel®) em pacientes com vasos pequenos.

MÉTODOS: Oitenta pacientes com doença arterial coronariana foram prospectivamente incluídos em duas séries consecutivas de tratamento, sendo a primeira empregando stents com sirolimus (50) e a segunda stents não-recobertos de estrutura metálica fina (30).

RESULTADOS: Os resultados foram: menor porcentual de obstrução da prótese através do ultra-som intracoronário [5,0% (EP = 0,77) x 39,0% (EP = 4,72), p < 0,001], menor perda tardia intra-stent [0,25 mm (EP = 0,03) x 1,11 mm (EP = 0,13), p < 0,001] e no segmento do vaso [0,30 mm (EP = 0,04) x 0,83 mm (EP = 0,11), p < 0,001], e também menor reestenose intra-stent (0% x 33,3%, p < 0,001) e no segmento do vaso (4% x 36,7%, p < 0,001) com os stents com sirolimus. A sobrevivência livre de eventos foi de 96% com os stents com sirolimus x 86,7% com os stents não-recobertos (p = 0,190).

CONCLUSÃO: Os pacientes com vasos de pequeno calibre após o implante de stents com sirolimus evoluem com menor hiperplasia intimal (menor porcentual de obstrução intra-stent e menor perda tardia) do que quando são utilizados stents não-recobertos de estrutura metálica fina. Isto resultou em redução significativa da reestenose angiográfica aos oito meses de evolução.

Palavras-chave:Stent, reestenose, vaso pequeno.

O tratamento de pacientes com doença coronariana em vasos de pequeno calibre corresponde hoje a até 40% dos casos de revascularização percutânea1,2. A incidência de reestenose após stents não-recobertos em vasos de pequeno calibre pode ser de até 50% na dependência da extensão da lesão e da presença de diabete melito3-9. A hiperplasia intimal é o principal mecanismo responsável pela reestenose intra-stent, e terapêuticas que inibam o crescimento neointimal devem reduzir a reestenose10,11.

Nos estudos FIM e RAVEL o emprego dos stents liberadores de sirolimus em pacientes com vasos maiores que 3,0 mm, em comparação aos stents não-recobertos, resultou em importante redução da hiperplasia intimal12-14. No estudo SIRIUS, a reestenose angiográfica foi reduzida de 36,3% após stents não-recobertos para 8,9% após stents com sirolimus (p < 0,001). Entretanto, em uma subanálise desse mesmo estudo, a reestenose após stents com sirolimus nos vasos com média de diâmetro de referência de 2,29 mm foi mais elevada (18,4%) quando comparada aos vasos grandes (1,9%), questionando o desempenho dessas endopróteses nos pacientes com vasos pequenos15.

Paralelamente, desenvolveram-se modificações estruturais nos stents, com redução da espessura das hastes, e próteses com hastes finas foram avaliadas no estudo ISAR-STEREO-2, resultando em menor hiperplasia intimal16-18. Um estudo de Garcia e cols. avaliando esses stents em pacientes com vasos de pequeno calibre reportou incidência de reestenose de 19,3% e de revascularização da lesão-alvo de apenas 4,1%, e, desde então, esses stents com hastes finas têm sido considerados a melhor opção entre os stents não-recobertos para o tratamento de vasos pequenos19,20.

Neste estudo, analisamos a hiperplasia intimal em vasos de pequeno calibre (diâmetro de referência menor que 2,75 mm) após stents liberadores de sirolimus e stents não-recobertos com hastes finas, através da medida do volume de hiperplasia intimal obtido por meio do ultra-som intracoronariano.

MÉTODOS

De dezembro de 2002 a dezembro de 2003, pacientes com o diagnóstico estabelecido de doença arterial coronariana, candidatos a intervenção coronariana percutânea eletiva, foram prospectivamente incluídos neste estudo segundo os seguintes critérios: idade igual ou superior a dezoito anos; diagnóstico de angina estável (Classificação da Canadian Cardiovascular Society 1, 2, 3 ou 4), isquemia silenciosa, angina instável (classes IB, IC, IIB, IIC da classificação de Braunwald) ou infarto do miocárdio > sete dias de evolução; vaso-alvo com diâmetro de referência entre 2,20 mm a 2,75 mm (angiografia coronariana quantitativa); lesão coronariana primária, em vaso natural, com lesão-alvo com estenose da luz entre 50% e 99% e extensão < 30 mm. Os pacientes foram excluídos se: presença de choque cardiogênico; creatinina sérica > 2,0 mg/dL; doença vascular periférica; hipersensibilidade conhecida ou contra-indicação a heparina, ácido acetilsalicílico, ticlopidina ou clopidogrel; doenças terminais associadas a expectativa de vida limitada (menos de um ano); fração de ejeção do ventrículo esquerdo < 30%; vaso-alvo com tortuosidade excessiva, que dificulte a realização do ultra-som intracoronariano; lesão-alvo > 50% em tronco da coronária esquerda não protegido; lesões ostiais; lesão-alvo em bifurcações que envolvam ramos secundários com diâmetro > 2,0 mm e presença de trombo na lesão-alvo; o protocolo desta investigação foi aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa do Hospital.

Os pacientes eram alocados para o estudo de forma não-randomizada, divididos em dois grupos seqüenciais de tratamento, o primeiro utilizando o stent Cypher® (com sirolimus) e o segundo o stent Multilink Rx Pixel® (não-recoberto). De acordo com a técnica padrão, era administrado AAS na dose de 200 mg/dia, pelo menos 24 horas antes do procedimento e um tienopiridínico (ticlopidina ou clopidogrel) por dois meses. No caso da ticlopidina, (iniciada pelo menos 48 horas antes do procedimento) a dose era de 250 mg/duas vezes ao dia. Na opção pelo clopidogrel, era prescrita dose de ataque de 300 mg e manutenção de 75 mg/dia (pelo menos 24 horas antes do procedimento). A heparina não-fracionada era administrada por via endovenosa, em bolo, na dose de 100 UI/kg. O uso de inibidor de glicoproteína IIb/IIIa, assim como a realização ou não de pré-dilatação eram facultados ao operador. Na realização de pré-dilatação, os balões deveriam ser subdimensionados em relação ao diâmetro de referência do vaso em pelo menos 0,5 mm, além de ter extensão inferior à do stent escolhido. Na realização da pós-dilatação (pressão >12 atm), os balões também deveriam ter extensão inferior à do stent implantado. No emprego de múltiplos stents estes deveriam ser posicionados com superposição de 3 ou 4 mm, garantindo a continuidade entre as endopróteses. Era realizado estudo com ultra-som em todos os pacientes ao final do procedimento. As visitas ambulatoriais após a alta eram programadas para trinta dias, três, seis e oito meses após a ICP, quando era agendada nova angiografia coronariana com avaliação ultra-sonográfica.

Quanto às endopróteses utilizadas, o stent Cypher® (com sirolimus), que é fabricado pela Cordis® – Johnson & Johnson®, é de aço inoxidável 316L recoberto por dois polímeros não-degradáveis de polietilenevinilacetato (PEVA) e polibutilmetacrilato (PBMA) em uma mesma proporção de peso, aos quais é adsorvido o sirolimus e mais uma segunda camada de PBMA (top coat). Todos os stents contêm 148 µg de sirolimus por cm2 da área metálica e nessa formulação a liberação do fármaco é gradual e prolongada (95% liberado em até 28 dias após o implante). O stent Multilink Rx Pixel® é de aço inoxidável, não-recoberto, especificamente desenhado para vasos pequenos, com sistema de entrega do tipo balão-expansível e produzido pela Guidant®. É composto por apenas cinco anéis, tendo hastes com espessura fina (0,05 mm), permitindo completa cobertura circunferencial do vaso com menor quantidade de metal.

A análise angiográfica quantitativa off-line foi realizada utilizando-se o equipamento da CMS® (Medis, Holanda), com os quadros na fase final da diástole, sendo escolhido aquele no qual a lesão exibisse maior gravidade, antes e após o implante do stent. O diâmetro mínimo da luz (DML) e a perda tardia (PT) eram mensurados intra-stent e no segmento do vaso-alvo (intra-stent mais os 5 mm proximais e os 5 mm distais à endoprótese) nos momentos: pré-intervenção, pós-intervenção e na angiografia coronariana de seguimento.

Na avaliação ultra-sonográfica, o equipamento utilizado foi o Clear View® (CVIS, Boston Scientific Corporation) e o cateter de ultra-som utilizado foi o de 40 MHz. Utilizando-se um sistema de tração automática do cateter de ultra-som, a uma velocidade de 0,5 mm/s , a aquisição das imagens era ininterrupta, iniciada pelo menos 10 mm distais à lesão-alvo e progredindo até a junção aorto-ostial. As imagens eram analisadas por meio do programa de computação echoPlaque® 2 (Indec Systems Inc., Estados Unidos). As análises angio- e ultra-sonográficas foram realizadas no Laboratório de Angiografia e Ultra-som do Serviço de Cardiologia Invasiva do Instituto Dante Pazzanese de Cardiologia. Os volumes do stent, do lúmen arterial e da íntima eram calculados utilizando-se a fórmula de Simpson12. Como este estudo envolvia stents com diferentes extensões, os volumes eram calculados em números absolutos (mm3 por paciente) e relacionados à média das áreas em cada variável (mm2). O porcentual de obstrução do volume do stent (%OVS) era calculado como a razão entre o volume da íntima e o volume do stent multiplicado por 100. A aposição incompleta das hastes dos stents era avaliada e definida pela presença de uma ou mais hastes das endopróteses afastadas e separadas da parede do vaso com evidência de circulação de sangue entre as hastes e a parede do vaso (presença de pontilhados na imagem ultra-sonográfica). Quando mais de uma haste estivesse mal aposta, o ângulo circunferencial de mal aposição era reportado. A extensão da má aposição era também descrita e calculada pela somatória das distâncias entre as áreas com observação de má aposição14.

A reestenose foi definida pelo critério binário clássico (estenose maior que 50% na angiografia de seguimento), tanto intra-stent como no segmento do vaso-alvo. O sucesso foi definido pela presença de estenose residual após o procedimento inferior a 10%, na ausência de complicações maiores (óbito, infarto e cirurgia de emergência).

O objetivo primário foi a avaliação aos oito meses do porcentual de obstrução intra-stent ocupado pela hiperplasia intimal e os secundários: DML e perda tardia intra-stent e no segmento do vaso-alvo; reestenose binária; incidência de eventos cardíacos maiores (óbito, infarto e revascularização da lesão-alvo).

Para o cálculo do tamanho da amostra, assumiu-se para os stents não-recobertos um porcentual de obstrução intra-stent de 40% e para os stents com sirolimus de apenas 10% (DP = 30), ou seja, uma redução relativa de 75%21,22. Com teste de hipótese bicaudal, nível a de 0,05 e poder de 90%, seriam necessários 21 pacientes em cada grupo para demonstrar o objetivo primário. Considerando possíveis perdas e procurando incluir um número maior de pacientes que permitisse uma melhor distribuição das variáveis clínicas, angio- e ultra-sonográficas, planejamos a inclusão de trinta pacientes em cada grupo. Com a disponibilidade na instituição de cinqüenta tratamentos com stents com sirolimus, foram então tratados os primeiros cinqüenta pacientes seqüencialmente com essas endopróteses (stents com sirolimus), e a seguir, seqüencialmente, todos os pacientes com stents não-recobertos.

As variáveis categóricas foram expressas em freqüências absolutas e relativas (porcentagens) e as variáveis quantitativas em médias e erros padrão. Nas comparações entre os grupos, para análise das variáveis categóricas foi utilizado o teste qui-quadrado de Pearson ou o teste exato de Fisher, quando necessário. Para as variáveis quantitativas avaliadas em um único momento, utilizou-se o teste t de Student para amostras independentes. As variáveis quantitativas medidas em três momentos (pré-, pós-procedimento e aos oito meses) foram analisadas por Modelos Lineares Generalizados com medidas repetidas. Nesses modelos foram considerados dois fatores: grupo (stents com sirolimus e stents não-recobertos) e tempo (pré-, pós- e tardio) e foram feitas comparações entre os grupos (stents com sirolimus versus stents não-recobertos em cada um dos três momentos) e em cada grupo (pré x pós x tardio em cada um dos grupos). Os programas estatísticos utilizados foram o SPSS versão 11.0 e o SAS versão 8.01. O nível de significância adotado foi 0,05.

RESULTADOS

Oitenta pacientes foram incluídos neste estudo, sendo os primeiros cinqüenta pacientes tratados seqüencialmente com o stent com sirolimus (Cypher®), e os últimos trinta pacientes tratados sequencialmente com o stent Multilink Rx Pixel® (não-recoberto). As características clínicas desses pacientes nos dois grupos de tratamento encontram-se na tabela 1, as angiográficas na tabela 2, assim como as variáveis técnicas do procedimento na tabela 3. No seguimento, o estudo angiográfico foi realizado em 94% dos pacientes. Os resultados da angiografia coronariana quantitativa intra-stent encontram-se na tabela 4. As médias dos diâmetros de referência do vaso-alvo [2,44 mm (EP = 0,02) x 2,37 mm (EP = 0,03), p = 0,075] e das extensões das lesões tratadas [13,75 mm (EP = 0,92) x 12,87 mm (EP = 0,53), p = 0,498] foram similares nos dois grupos. As médias dos diâmetros mínimos da luz não diferiram entre os grupos, quer nos achados pré- (p = 0,926), como no pós-procedimento (p = 0,952), mas aos oito meses de evolução, os vasos tratados com os stents com sirolimus evoluíram com maior DML [2,14 mm (EP = 0,03) x 1,28 mm (EP = 0,13), p < 0,001]. Isso foi devido à perda tardia, que foi significantemente menor no grupo do sirolimus [0,25 mm (EP = 0,03) x 1,11 mm (EP = 0,13), p < 0,001].

Não se observou nenhum caso de reestenose intra-stent após os stents com sirolimus em oposição a 33,3% após os stents não-recobertos (p < 0,001). As variações individuais do DML, assim como as do porcentual de estenose ao longo do tempo, nos dois braços de tratamento, encontram-se na figura 1. Essas medidas angiográficas obtidas pré- e pós-procedimento são muito consistentes nos dois grupos de tratamento, mas na evolução tardia, há maior variabilidade com os stents não-recobertos. Na análise do segmento do vaso-alvo, o tratamento com os stents com sirolimus resultou em menor perda tardia que o com stents não-recobertos [0,30 mm (EP = 0,04) x 0,83 mm (EP = 0,11), p < 0,001, respectivamente], sendo a reestenose no segmento do vaso-alvo significativamente menor no braço dos stents com sirolimus [4% x 36,7%, (p < 0,001)].


Foi realizado estudo ultra-sonográfico completo em 80% dos pacientes. Na análise ultra-sonográfica, a média do volume de hiperplasia intimal foi de 5,0 mm3 (EP=0,77) no grupo dos stents com sirolimus x 27,5 mm3 (EP = 3,60) no dos stents não-recobertos (p < 0,001). A média da área de hiperplasia intimal foi menor com os stents com sirolimus em relação aos stents não-recobertos [0,24 mm2 (EP = 0,03) x 1,62 mm2 (EP = 0,19), p < 0,001], e da mesma forma foi a média do porcentual de obstrução intra-stent [5% (EP = 0,77) x 39% (EP = 4,72), p < 0,001]. Não foi observada má aposição das hastes dos stents em nenhum dos pacientes nos dois grupos de tratamento.

Os stents foram implantados com sucesso em 100% dos pacientes, não ocorrendo complicações maiores (óbito, infarto do miocárdio ou cirurgia de revascularização de emergência) durante a fase hospitalar. Não foi administrado inibidor da glicoproteína IIb/IIIa a nenhum dos casos neste estudo. Não foram observados casos de trombose da prótese, infarto do miocárdio não-fatal ou morte, nem aos trinta dias, nem aos oito meses de evolução. Todos os casos foram avaliados clinicamente durante esse período, e dois pacientes (4%) que receberam os stents com sirolimus necessitaram de nova revascularização da lesão-alvo. Nesses casos, foi realizada nova angioplastia com o implante de um outro stent, com sirolimus. No tratamento com stents não-recobertos, seis casos evoluíram com sintomas de isquemia miocárdica (20,0%), e quatro pacientes (13,3%) necessitaram de nova revascularização da lesão-alvo (RLA): duas angioplastias com balão e duas cirurgias de revascularização miocárdica. Assim, apesar da sobrevivência livre de eventos e a sobrevivência livre de RLA terem sido menores no grupo do sirolimus em comparação ao dos stents não-recobertos, não houve diferença estatisticamente significativa quanto a esses desfechos clínicos entre os grupos (96% x 86,7%; p = 0,190).

DISCUSSÃO

Os resultados deste estudo demonstraram que o implante de stents com sirolimus em pacientes com vasos de pequeno calibre se acompanha de menor grau de hiperplasia intimal em comparação à resposta reparativa pós-stents não-recobertos. Isso resultou em menor incidência de reestenose intra-stent e no segmento do vaso-alvo. As variáveis clínicas dos pacientes deste estudo caracterizaram grupos de pacientes de pelo menos moderada complexidade para a realização de ICP. Dentre todas as características, chama a atenção a elevada prevalência de diabete melito em 40% dos pacientes no grupo dos stents com sirolimus e em 30% no dos stents não-recobertos (p = 0,368). Nos estudos randomizados de balão x stents em pacientes com vasos de pequeno calibre, com exceção dos estudos CHIVAS23 e do RAP24, a prevalência de diabete foi inferior a 30%, situando-se na maioria dos estudos entre 12% e 20%. Mesmo na era dos stents com sirolimus, o estudo SVELT25 foi o que incluiu mais diabéticos (26,7%), e nos estudos RAVEL14, SIRIUS, C-SIRIUS26, E-SIRIUS27 e SES-SMART28, esse subgrupo representou 16%, 25%, 24%, 23% e 19,4%, respectivamente.

O mais importante achado ultra-sonográfico foi a detecção do mecanismo de benefício da prótese com liberação de sirolimus em relação ao stent não-recoberto, ou seja, a inibição (em 87%) da excessiva hiperplasia intimal, avaliada pelo porcentual de obstrução do volume da luz. Esse achado de intensa redução da hiperplasia intimal intra-stent tem sido constante em todos os estudos com stents com sirolimus que utilizaram a ferramenta do ultra-som como avaliação. A média das áreas de hiperplasia intimal obtida nessa investigação (0,24 mm2) foi semelhante às observadas no estudo SVELT25 (0,08 mm2) e também nos estudos com stents com sirolimus em vasos maiores, como o RAVEL14 e o SIRIUS15 (0,11 mm2 e 0,50 mm2, respectivamente), o que significa que a inibição da hiperplasia intimal com esses stents independe do tamanho do vaso. Já o encontro de média da hiperplasia intimal no tratamento com os stents não-recobertos e de hastes finas, que foram aqui empregados (Pixel®), foi de 1,62 mm2, menor que as observadas nos estudos DANTE29 (3,05 mm2) e nos respectivos braços dos estudos RAVEL14 e SIRIUS15 (2,05 mm2 e 2,70 mm2, respectivamente) que utilizaram os stents não-recobertos de hastes mais espessas.

Acrescente-se a isso que também não foram observados fenômenos de aposição incompleta das hastes das próteses, em ambos os tratamentos. Diferentemente do que foi observado em vasos grandes, o implante de stents em vasos pequenos é realizado com maior razão entre o tamanho do stent e o diâmetro do vaso, favorecendo a impactação das hastes na placa de ateroma. Assim, a observação de aposição incompleta dos stents é, geralmente, menos freqüente nos vasos pequenos. No estudo RAVEL14, por exemplo, a média dos diâmetros dos vasos dos dez pacientes que apresentaram aposição incompleta dos stents foi de 3,16 mm (DP = 0,57), enquanto a dos 38 pacientes com stents bem apostos foi de 2,79 mm (DP = 0,43), (p < 0,05).

As recomendações para o implante de stents não-recobertos na última década, enfatizaram a obtenção de maior luz arterial possível para mais bem acomodar a hiperplasia e assim, reduzir a reestenose. Porém, na investigação dos stents liberadores de medicamentos, que apresentaram redução importante da hiperplasia intimal intra-stent, como no estudo SIRIUS15, o achado dos efeitos das bordas chamou a atenção, pois foram os responsáveis pelas recorrências observadas neste estudo. Novas observações de ordem técnica foram então implementadas para orientar o implante da prótese, nessa nova perspectiva.

Um desses aspectos é o da cobertura da lesão pela prótese, pois a cobertura metálica incompleta no implante de stents com sirolimus pode influenciar os resultados tardios. Neste estudo, a razão entre a extensão do stent e a da lesão foi de 1,4, e nos estudos C-SIRIUS 26 e E-SIRIUS 27 foi ainda maior (1,7 e 1,8, respectivamente), da mesma forma que o estudo RAVEL14, que não exibiu reestenose no seguimento de seus pacientes, durante o primeiro ano. Apesar das lesões do C-SIRIUS26 terem sido mais complexas que as randomizadas no estudo RAVEL14, exigindo a utilização de mais de uma prótese por lesão em 48% dos casos (67% destes com sobreposição das hastes), as taxas de reestenose foram muito baixas (0% intra-stent e 2,3% no segmento do vaso-alvo), demonstrando que o emprego de próteses mais longas é melhor, mesmo que se tenha que utilizar mais de uma prótese, o que se deve fazer com sobreposição das hastes em 2 ou 3 mm. Isso evita que os extremos da lesão-alvo sejam expostos ao trauma do balão, e conseqüente, à proliferação intimal.

Entre as limitações deste estudo, a ausência de randomização seria um dos aspectos a ser mencionado. Questões logísticas da época, referentes à disponibilidade limitada das endopróteses com sirolimus, impediram o delineamento deste estudo com previsão de inclusão por um ano. No entanto, ressalta-se que os dois grupos de tratamentos foram bastante homogêneos em todas as variáveis relacionadas à recidiva da lesão, o que ameniza esse aspecto. Além disso, a forma seqüencial de inclusão dos casos e as diferenças estruturais das endopróteses impediram a análise cega dos resultados. Entretanto, a análise dos resultados por meio da angiografia quantitativa e do ultra-som intracoronariano, com medidas quantitativas precisas e objetivas, em um laboratório que exibe experiência reconhecida neste campo, amenizam esse aspecto.

Diante dos nossos achados, entendemos que, na fase atual, o tratamento de vasos com diâmetro de referência inferior a 2,75 mm sofreu profunda modificação com o surgimento dos stents liberadores de sirolimus. Além disso, é possível que em futuro próximo, com a redução dos custos das endopróteses, o emprego dos stents com sirolimus nos pacientes com vasos de pequeno calibre apresente ainda melhor relação de custo-benefício em comparação ao dos stents não-recobertos, por causa da menor revascularização da lesão-alvo, da menor necessidade de internações e da menor prescrição de medicamentos na evolução.

Assim, podemos concluir que o implante de stents com sirolimus em pacientes com vasos de pequeno calibre apresenta menor hiperplasia intimal, avaliada pelo ultra-som intracoronariano, em relação aos stents não-recobertos com estrutura metálica fina. As medidas angiográficas referentes ao resultado tardio (porcentual de estenose, perda tardia e reestenose) são significativamente menores após o implante dos stents com sirolimus. O diâmetro mínimo da luz tardio é maior após os stents com sirolimus em relação aos stents não-recobertos. A revascularização da lesão-alvo é cerca de dez pontos porcentuais menor nos pacientes que receberam stents com sirolimus, ainda que essa diferença não tenha apresentado significância estatística na presente investigação.

Declaro não haver conflitos de interesses pertinentes.

Recebido em 17/03/05

Aceito em 18/05/05

  • 1
    Sociedade Latino-Americana de Cardiologia Intervencionista [homepage]. Informe 1988-2002 sobre produtividade em Cardiologia na América Latina. [
  • 2
    Sociedade Brasileira de Hemodinâmica e Cardiologia Intervencionista [homepage]. Central Nacional de Intervenções Cardiovasculares (CENIC): Estatística - Balão vs. stent. [
  • 3. Akiyama T, Moussa I, Reimers B et al. Angiographic and clinical outcome following coronary stenting of small vessels: a comparison with coronary stenting of large vessels. J Am Coll Cardiol 1998; 32: 16108.
  • 4. Elezi S, Kastrati A, Neumann FJ et al. Vessel size and long-term outcome after coronary stent placement. Circulation 1998; 98: 1875-80.
  • 5. Al Suwaidi J, Yeh W, Williams DO et al. Comparison of immediate and one-year outcome after coronary angioplasty of narrowing <3 mm with those > or =3 mm (the National Heart, Lung, and Blood Institute Dynamic Registry). Am J Cardiol 2001; 87: 680-6.
  • 6. Briguori C, Nishida T, Adamian M et al. Coronary stenting versus balloon angioplasty in small coronary artery with complex lesions. Catheter Cardiovasc Interv 2000; 50: 390-7.
  • 7. Suselbeck T, Latsch A, Siri H et al. Role of vessel size as a predictor for the occurrence of in-stent restenosis in patients with diabetes mellitus. Am J Cardiol 2001; 88: 243-7.
  • 8. Moreno R, Fernandez C, Alfonso F et al. Coronary stenting versus ballon angioplasty in small vessels. J Am Coll Cardiol 2004; 43: 1964-72.
  • 9. Ho KKL, Sernechia C, Rodriguez O et al. Predictors of angiographic restenosis after stenting: pooled analysis of 1197 patient with protocol-mandated angiographic follow-up from 5 randomized trials. Circulation 1998; 98 (Suppl I): I-362.
  • 10. Mintz GS, Kent KM, Pichard AD et al. Intravascular ultrasound insights into mechanisms of stenosis formation and restenosis. Cardiol Clin 1997; 15: 17-29.
  • 11. Nikol S, Huehns TY, Hofling B. Molecular biology and post-angioplasty restenosis. Atherosclerosis 1996; 123: 17-31.
  • 12. Sousa JE, Costa MA, Abizaid AC et al. Sustained suppression of neointimal proliferation by sirolimus-eluting stents: one-year angiographic and intravascular ultrasound follow-up. Circulation 2001; 104: 2007-11.
  • 13. Sousa E. FIM 4 years. Presented to TCT 2004. [
  • 14. Morice MC, Serruys PW, Sousa JE et al. RAVEL Study Group. A randomized comparison of a sirolimus-eluting stent with a standard stent for coronary revascularization. N Engl J Med 2002; 346: 1773-80.
  • 15. Moses JW, Leon MB, Popma JJ et al, SIRIUS Investigators. Sirolimus-eluting stents versus standard stents in patients with stenosis in a native coronary artery. N Engl J Med 2003; 349: 1315-23.
  • 16. Hoffmann R, Mintz GS, Haager PK et al. Relation of stent design and stent surface material to subsequent in-stent intimal hyperplasia in coronary arteries determined by intravascular ultrasound. Am J Cardiol 2002; 89: 1360-4.
  • 17. Kastrati A, Mehilli J, Dirschinger J et al. Intracoronary stenting and angiographic results: strut thickness effect on restenosis outcome (ISAR-STEREO) trial. Circulation 2001; 103: 2816-21.
  • 18. Pache J, Kastrati A, Mehilli J et al. Intracoronary stenting and angiographic results: strut thickness effect on restenosis outcome (ISAR-STEREO-2) trial. J Am Coll Cardiol 2003; 41: 1283-8.
  • 19. Multi-Link Pixel TM Registry Six Months Results. 2005 [
  • 20. Garcia E. Randomized Trial of Direct Stenting With the Pixel Stent in Small Vessels. Transcatheter Cardiovascular Therapeutics (TCT) 2003. [
  • 21. Acute platelet inhibition with abciximab does not reduce in-stent restenosis (ERASER study). The ERASER Investigators. Circulation 1999; 100: 799-806.
  • 22. Dussaillant GR, Mintz GS, Pichard AD et al. Small stent size and intimal hiperplasia contribute to restenosis: a volumetric intravascular ultrasound analysis. J Am Coll Cardiol 1995; 26: 720-4.
  • 23. Muramatsu T, Iwasaki K, Inoue Nl. Coronary heart disease stenting in small vessels versus balloon angioplasty study (CHIVAS): a randomized prospective multicenter trial (abstr). J Am Coll Cardiol 2002; 39 (Suppl A): 50A.
  • 24. Garcia E, Gomez-Recio M, Moreno R. Stent reduces restenosis in small vessels: results of the RAP study (abstr). J Am Coll Cardiol 2001; 37 (Suppl. A): 17A.
  • 25. Souza E, for the SVELT investigators. Transcatheter Cardiovascular Therapeutics (TCT) 2004. [
  • 26. Schampaert E, Cohen EA, Schluter M et al. C-SIRIUS Investigators. The canadian study of the sirolimus-eluting stent in the treatment of patients with long de novo lesions in small native coronary arteries (C-SIRIUS). J Am Coll Cardiol 2004; 43: 1110 -5.
  • 27. Schofer J, Schluter M, Gershlick AH et al. E-SIRIUS Investigators. Sirolimus-eluting stents for treatment of patients with long atherosclerotic lesions in small coronary arteries: double-blind, randomised controlled trial (E-SIRIUS). Lancet 2003; 362: 1093-99.
  • 28. Ardissino D, Cavallini C, Bramucci E et al. SES-SMART Investigators. Sirolimus-Eluting vs uncoated Stents for Prevention of Restenosis in Small Coronary Arteries. JAMA 2004; 292: 2727-34.
  • 29. Chaves AJ. Análise volumétrica da hiperplasia intimal intra-stent em pacientes diabéticos tratados com e sem abciximab. São Paulo, 2004. 107p. Tese (Doutorado) Faculdade de Medicina, Universidade de São Paulo.
  • Correspondência:

    Fernando Stuchi Devito
    Praça 9 de Julho, 176/111
    15800-000 – Catanduva, SP
    E-mail:
  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      25 Abr 2006
    • Data do Fascículo
      Abr 2006

    Histórico

    • Aceito
      18 Maio 2005
    • Recebido
      17 Mar 2005
    Sociedade Brasileira de Cardiologia - SBC Avenida Marechal Câmara, 160, sala: 330, Centro, CEP: 20020-907, (21) 3478-2700 - Rio de Janeiro - RJ - Brazil, Fax: +55 21 3478-2770 - São Paulo - SP - Brazil
    E-mail: revista@cardiol.br