RESUMO
O jacurutu Bubo virginianus (Gmelin, 1788) tem ampla distribuição pela América, estendendo-se desde o Alasca e norte do Canadá, até o centro da Argentina e Uruguai. Apesar de relativamente comum, diferentes aspectos da história natural desta espécie ainda permanecem pouco conhecidos, sobretudo na Região Neotropical. Assim, o objetivo deste trabalho foi obter informações referentes à área de vida utilizada por B. virginianus, sua biologia reprodutiva e dieta no Pampa brasileiro. O estudo foi realizado entre abril de 2015 e abril de 2018, no município de Santa Margarida do Sul, região central do Pampa brasileiro, Rio Grande do Sul, Brasil. A área de estudo conta com capões de Eucaliptus spp., sob os quais a vegetação é predominantemente formada por gramíneas, com manchas de arbustos espinhosos em pontos específicos. Os arredores do capão principal são utilizados para criação extensiva de gado em campo nativo além de cultivos de soja e arroz. A coleta de dados foi baseada no acompanhamento visual dos indivíduos com ao menos uma observação quinzenal durante o período não reprodutivo, e ao menos uma observação semanal durante o período de utilização do ninho. Além do ninho, foram verificados os poleiros de descanso dos indivíduos monitorados e coletadas as egagrópilas regurgitadas, para posterior estudo de seus hábitos alimentares. A área de vida utilizada pelo casal foi estimada em 0,35 km² pelo método do MCP, ou 0,41 km² baseado em estimativas pelo método de Kernel. Os indivíduos parecem demonstrar interesse por locais limítrofes da área de vida durante a noite e preferindo a parte central da mesma para abrigo/descanso durante o dia. O tempo de utilização do ninho foi de três meses em todos os períodos reprodutivos. A estação reprodutiva da espécie está relacionada ao pico do inverno, com um a dois filhotes nascendo próximo ao final da estação. Os filhotes permaneceram na área de vida dos pais por um período de sete até dez de meses, dispersando durante os meses do outono do ano seguinte. Por fim, a dieta foi baseada em roedores, sobretudo Holochilus vulpinus (Brants, 1827) e aves, seguindo um padrão já conhecido para espécie.
PALAVRAS-CHAVE
Campos; hábitos alimentares; corujas; reprodução; ecologia espacial
ABSTRACT
The Great Horned Owl Bubo virginianus (Gmelin, 1788) has a wide distribution through Americas, from Canada and Alaska to Argentina and Uruguay. Beside common, several aspects of its natural history are still poorly known, especially at Neotropical Region. The aim of this study was to obtain data regarding to the home range, nesting and feeding habits of Bubo virginianus in the Brazilian Pampas. This study was conducted from April 2015 to April 2018, in Santa Margarida do Sul, central region of Rio Grande do Sul State, southern Brazil. The study area presents patches of Eucaliptus spp. tree, under which the vegetation is composed by grass with some spine bushes. The surrounding area of the main patch of Eucaliptus is used for extensive cattle ranch and rice and soy crops. Data was collected by direct observation, with unless one visit each 15 days during the non-reproductive period, and unless one visit per week during the breeding season. In these observations we checked the use of the nest and the use of diurnal resting perches, where we collected pellets for diet analyses. Considering 95% of locations, the home range of the pair of great horned owl was estimated as 0.35 km² considering MCP method or 0.41 km² considering Kernel estimates. Individuals seem interested in bordering locations of the home range during night and the center of the area for resting during the daylight. The nest was used for a period of three months, in three consecutive breeding seasons. Breeding season is related to the austral winter, with one or two chicks hatching near late winter. The juveniles stayed with the parents for up to 10 months (7 to 10 months) and dispersed from the parents’ home range in the autumn of the next year. Furthermore, diet was based in rodents, especially Holochilus vulpinus (Brants, 1827), and birds, following a common pattern for this species.
KEYWORDS
Grasslands; feeding habits; owls; reproduction; spatial ecology
O Pampa é uma formação predominantemente campestre, ocorrente na metade sul do Rio Grande do Sul que, conjuntamente com o Uruguai e região centro leste da Argentina, formam os “Pastizales del Rio de la Plata” (Overbeck et al., 2015Overbeck, G. E.; Boldrini, I. I.; Do Carmo, M. R. B.; Garcia, E. N.; Moro, R. S.; Pinto, C. E.; Trevisan, R. & Zannin, A. 2015. Fisionomia dos campos. In: Pillar, V. D. & Lange, O. eds. Os Campos do Sul. Porto Alegre, Rede Campos Sulinos, p.31-42.), uma das maiores áreas de pastagem em clima temperado do mundo (Bilenca & Miñarro, 2004Bilenca, D. & Miñarro, F. 2004. Identificación de áreas valiosas de pastizal, APVs, en las Pampas y Campos de Argentina, Uruguay y sur de Brasil. Buenos Aires, Fundación Vida Silvestre Argentina. 353p. ). Essa formação apresenta altos índices de biodiversidade de fauna e flora (Bilenca & Miñarro, 2004Bilenca, D. & Miñarro, F. 2004. Identificación de áreas valiosas de pastizal, APVs, en las Pampas y Campos de Argentina, Uruguay y sur de Brasil. Buenos Aires, Fundación Vida Silvestre Argentina. 353p. ) com diversas espécies endêmicas (Behling et al., 2009Behling, H.; Jeske-Pieruschka, V.; Schüler, L. & Pillar, V. D. P. 2009. Dinâmica dos campos no sul do Brasil durante o Quaternário Tardio.In: Pillar, V. P.; Müller, S. C.; Souza, Z. M. & Jaques, A. V. A. Campos Sulinos - conservação e uso sustentável da biodiversidade. Brasília, Ministério do Meio Ambiente. 408p.; Bencke, 2009Bencke, G. A. 2009. Diversidade e conservação da fauna dos campos do sul do Brasil. In: Pillar, V. P.; Müller, S. C.; Castilhos, Z. M. S. & Jacques, A. V. A. eds. Campos Sulinos conservação e uso sustentável da biodiversidade. Brasília, Ministério do Meio Ambiente. p. 101-121.).
Entre os elementos da fauna mais marcantes desse bioma estão as aves, com uma rica diversidade, que inclui não somente espécies campestres, mas diversas espécies florestais. Destacam-se por sua importância ecológica, funcional e estética os rapinantes predominantemente noturnos, pertencentes à ordem Strigiformes. São animais predadores de alto nível que desempenham papéis importantes na manutenção da diversidade biológica em paisagens alteradas por humanos, mantendo o número de mesopredadores sob controle (Soulé et al., 1988Soulé, M. E.; Bolger, D. T.; Alberts, A. C.; Wright, J.; Soric, M. & Hints, S. 1988. Reconstructed dynamics of rapid extinctions of chaparral-requiring birds in urban habitat islands. Conservation Biology 2:75-92.; Litvaitis & Villafuerte, 1995Litvaits, J. A. & Villafuerte, R. 1995. Intraguild predation, mesopredator release, and prey stability. Ecological Modelling 220:1098-1104.; Crooks & Soulé, 1999Crooks, K. R. & Soulé, M. E. 1999. Mesopredator release and avifaunal extinctions in a fragmented system. Nature 400:563-566.).
O jacurutu [Bubo virginianus (Gmelin, 1788)] é uma das corujas mais comuns e de maior distribuição nas Américas, com ocorrência do norte do Canadá ao extremo sul da América do Sul (Sick, 1997Sick, H. 1997. Ornitologia brasileira. Rio de Janeiro, Nova Fronteira. 912p.; Houston et al., 1998Houston, C. S.; Smith, D. G. & Rohner, C. 1998. Great Horned Owl (Bubo virginianus). In: Poole, A. & Gill, F. eds. The birds of North America: The Birds of North America. Washington, D.C., Academy of Natural Sciences, Philadelphia and American Ornithologists’ Union. 372p.; Konig & Weick, 2010Konig, C. & Weick, F. 2010. Owls of the world. London, A & C Black. 528p.). Apesar de relativamente comum, diferentes aspectos da história natural desta espécie ainda permanecem pouco conhecidos (Marks et al., 1999Marks, J. S.; Cannings, R. J. & Mikkola, H. 1999. Family Strigidae (Typical Owls) In: Del Hoyo, J.A.; Elliot, A. & Sargatal, J. eds. Handbook of the birds of the world. Barn owls to humming bird. Barcelona, Lynx Edicions, p. 76-151.), sobretudo no Brasil ou na Região Neotropical como um todo (Motta-Junior et al., 2017Motta-Junior, J. C.; Braga, A. C. R. & Granzinolli, M. A. M. 2017. The owls of Brazil. In: Enriquez, P., ed. Neotropical owls. Cham, Springer, p. 97-158. .). Em relação a sua ecologia a maioria dos trabalhos faz referência aos hábitos alimentares da espécie. As informações disponíveis apontam uma dieta generalista, onde aves e mamíferos são as presas mais frequentes, variando conforme a disponibilidade e abundância no ambiente (Jacsik & Marti, 1984Jaksic, F. M. & Marti, C. D. 1984. Comparative food habits of Bubo owls in Mediterranean-type ecosystems. The Condor 86:88-296.; Marti & Kochert, 1996Marti, C. D. & Kochert, M. N. 1996. Diet and trophic characteristics of Great Horned Owls in Southwester Idaho. Journal Field Ornithology 67:499-506.; Aragon et al., 2002Aragon, E. E.; Castillo, B. & Garza, A. 2002. Roedores em la dieta de los aves rapaces nocturnas (Bubo virginianus y Tyto alba) em el noroeste de Durango, México. Acta Zoológica Mexicana 86:29-50.; Tomazzoni et al., 2004Tomazzoni, A. C.; Pedó, E. & Hartz, S. M. 2004. Food habitats of Great Horned Owls (Bubo virginanus) in the breeding season in Lami Biological Reserve Southern Brazil. Ornitologia Neotropical 15:279-282.).
Quando nos referimos a aves de rapina, uma das características ecológicas mais importantes é a definição de suas áreas de vida. A definição do espaço necessário para sua sobrevivência muitas vezes está relacionada à disponibilidade de presas (Zabel et al., 1995Zabel, C. J.; Mckelvey, K. & Ward, J. R. 1995. Influence of primary prey on home range size and habitat-use patterns of Northern Spotted Owls (Strix occidentalis caurina). Canadian Journal of Zoology 73:433-439.; Ward et al., 1998Ward, Jr.; James, P.; Gutiérrez, R. J. & Barry, R. N. 1998. Habitat selection by northern spotted owls: the consequences of prey selection and distribution. The Condor 100:79-92.; Preston, 1999Preston, C. R. 1990. Distribution of raptor foraging in relation to prey biomass and habitat structure. The Condor 92:107-112.) e ao comportamento de caça, que definem não só a área a ser explorada mais o tamanho e intensidade de uso (Wakeley, 1978Wakeley, J. P. 1978. Hunting methods and factors affecting their use by ferruginious hawks. The Condor 80:327-333.; Kenward, 1982Kenward, R. E. 1982. Goshawk hunting behavior and range size as function of food and habitat availability. Journal of Animal Ecology 51:69-80.). Outros fatores ligados ao uso e seleção de habitat são a presença de sítios adequados para a construção e/ou ocupação de ninhos e, no caso das corujas, a presença de locais para a utilização como abrigo durante o dia (Preston, 1990; Belthoff & Ritchson, 1990Belthoff, J. R. & Ritchison, G. 1990. Roosting behavior of postfledging Eastern Screech-Owls. Nest-site selection by Eastern Screech-Owls in Central Kenucky. The Condor 92:982-990.; Blakesley et al., 1992Blakesley, J. A.; Franklin, A. B. & Gutiérrez, R. J. 1992. Spotted Owl roost and nest site selection in northwestern California. Journal of Wildlife Management 56:388-392.; Peery et al., 1999Peery, M. Z.; Gutíerrez, R. J. & Seamans, M. E. 1999. Habitat composition and configuration around Mexican Spotted Owl nest and roost sites in the tularosa moutains, New Mexico. Journal of Wildlife Management 63:36-43.). Tais características são pouco conhecidas para a maioria dos organismos e corujas em especial, até mesmo para espécies relativamente comuns como B. virginianus.
Diante deste panorama, esse estudo visa apresentar informações relacionadas à área de vida, reprodução e dieta de B. virginianus em uma área do Pampa brasileiro.
MATERIAL E MÉTODOS
Área de estudo. O estudo foi realizado no município de Santa Margarida do Sul, região central do Pampa brasileiro, Rio Grande do Sul, Brasil (30°12’S, 54°06’O) (Fig. 1). O clima da região é temperado subtropical mesotérmico úmido, classificado como “Cfa” pelo sistema Köppen-Geiger (Alvares et al., 2013 Alvares, C. A.; Stape, J. L.; Sentelhas, P.C.; Gonçalves, J. L. M. & Sparovek, G. 2013. Köppen’s climate classification map for Brazil. Meteorologische Zeitschrift 22:711-728. ) com uma altitude média de 90 m. A paisagem dominante é de campos limpos, com predominância de ervas e gramíneas como Vernonia nudiflora Less. (Asteraceae) e Eryngium pandanifolium Cham. & Schltdl. (Apiaceae). A área apresenta um extenso capão de Eucaliptus spp. (com cerca de 20 hectares) e outros aglomerados dessa mesma árvore, com menos de 0,5 hectares. A área de Eucaliptus - assim como seus arredores -, é utilizada para criação extensiva de gado em campo nativo. Além disso, as áreas de entorno contam ainda com cultivos de soja e arroz durante o período quente (outubro a março), que são deixadas sem cultivo no período de clima frio. Finalmente, imediatamente ao lado do capão principal de Eucaliptus, há um lago formado por uma barragem de irrigação com aproximadamente 10 ha, rodeado com vegetação aquática.
Área de estudo de um casal de Bubo virginianus (Gmelin, 1788) acompanhado no Pampa brasileiro (município de Santa Margarida do Sul, Rio Grande do Sul), e a fisionomia da paisagem estudada, com fragmentos de Eucaliptus cercados por campos limpos.
Observações de uso do espaço e estimativas do território. O estudo se baseou no monitoramento de um casal de B. virginianus para avaliar sua área de vida, padrão reprodutivo e dieta ao longo de 37 meses (entre abril de 2015 e abril de 2018). Durante o período foram realizadas observações quinzenais durante o período não reprodutivo e semanais durante o período de utilização do ninho. Em cada visita à área foram verificados os poleiros de descanso dos indivíduos monitorados (durante o período não reprodutivo) e o uso do ninho (durante o período reprodutivo).
Os registros dos indivíduos foram feitos em dois momentos: 1) busca pelos poleiros de descanso durante o dia, e 2) busca pelos indivíduos em atividade no período crepuscular/noturno. No período diurno era feita uma busca ativa a pé pelas aves no fragmento de Eucaliptus regularmente utilizado pelo casal para descanso e nidificação. No turno da noite, a busca ativa era realizada a pé ou com veículo motorizado, com auxílio de lanternas e holofote de longo alcance nas redondezas do fragmento. A busca dos indivíduos ocorreu em um raio de até 2,5 km do fragmento principal. Vocalizações foram utilizadas para o auxílio à detecção das corujas, facilitando seu encontro para o registro visual. Todas as visualizações do casal tiveram suas coordenadas geográficas registradas; tais coordenadas foram utilizadas para estimativa da área de vida mínima ocupada pelo casal. No que se refere à identificação dos indivíduos monitorados, a primeira fêmea do casal (única da qual foram utilizados dados para a estimativa da área de vida) tinha como marca distintiva a ausência do tufo de penas esquerdo. Via de regra, as localizações em atividade eram precedidas ou seguidas de deslocamentos em direção ao fragmento de Eucaliptus central. Além disso, a possível presença de outros indivíduos (além do casal) foi considerada, avaliando eventuais mudanças de comportamento ou a ocorrência de padrões diferenciados de deslocamento. Embora não seja possível afirmar com 100% de certeza que todos os registros se refiram aos mesmos dois indivíduos, já que os animais não foram marcados, o comportamento territorialista e monogâmico (guardadas as devidas restrições ao uso do termo) característico dos rapinantes, levam a crer que o conjunto de dados se refere a um único casal. Importante destacar ainda que a área de estudo era uma área de campo com poucas manchas de Eucaliptus que pudessem ser propícios para ninhos ou locais de descanso de outros indivíduos. Dessa forma, dificilmente outro casal, ou mesmo outro indivíduo, teria passado despercebido, caso utilizasse a área de vida das corujas monitoradas.
Para as estimativas da área de vida foi utilizado software Biotas através da análise do Polígono Convexo Mínimo (MCP), formado pelos pontos mais extremos onde os indivíduos forma observados, e pelo estimador Kernel. Ambos os estimadores utilizaram 95% dos pontos, de forma a excluir pontos extremos que poderiam representar incursões exploratórias para fora da área de vida realmente necessária ao casal. A exclusão destes pontos extremos (“outliers”) evita uma inflação artificial da estimativa da área de vida (Jacob & Rudran, 2003Jacob, A. A. & Rudram, R. 2003. Radio telemetria em estudos populacionais. In: Cullen Jr., L.; Rudran, R. & Valladares-Padua, C. eds. Métodos de Estudos em Biologia da Conservação e Manejo da Vida Silvestre. Curitiba, Editora da UFPR e Fundação O Boticário de Proteção a Natureza, p. 285-343.). Uma projeção da área de vida estimada pelo MCP, com a indicação da intensidade de uso dos diferentes poleiros, foi realizada sobre uma imagem de satélite da área, com o uso do software QGIS 3.16.11.
Acompanhamento do período reprodutivo. O acompanhamento dos indivíduos permitiu a observação e o acompanhamento dos períodos reprodutivos. Inicialmente, o ninho foi descrito quanto sua localização na área de vida, estrutura e posição em relação à árvore. Posteriormente, a atividade de reprodução passou a ser monitorada quanto à postura e incubação dos ovos, o nascimento dos ninhegos e a sobrevivência dos filhotes até a dispersão. Além da observação visual, com auxílio de binóculos e câmera fotográfica com teleobjetiva de 18-55 mm, foi utilizada uma câmera fotográfica com recurso de gravação de vídeo, presa a uma haste longa, que permitiu a inspeção do ninho. As gravações nunca excederam mais de um minuto, procedimento esse adotado visando reduzir as perturbações às aves.
Análise da dieta. Junto aos poleiros de descanso diurno, assim como nos arredores do ninho, foram realizadas coletas de egagrópilas para análise dos hábitos alimentares da espécie. Em campo, as egagrópilas coletadas foram armazenadas em sacos plásticos individuais para posterior análise. Em laboratório, cada egagrópila foi umidificada com álcool 70% e desmanchada em placas de Petri para melhor separação do conteúdo. A identificação dos itens em cada amostra foi realizada a partir de fragmentos duros não digeridos que possibilitassem o reconhecimento da presa consumida, tais como pelos, penas, garras, crânios, dentes, escamas e ossos. As identificações foram baseadas em comparações com os materiais da coleção de referência do Museu de Zoologia do Pampa (MZPAMPA) alocado no Laboratório de Biologia de Mamíferos e Aves (LABIMAVE) da Universidade Federal do Pampa (UNIPAMPA), campus de São Gabriel, RS. Todo material triado e utilizado para identificação das presas foi armazenado no setor das aves do acervo. Os itens foram quantificados quanto à Frequência de Ocorrência (FO), que representa a porcentagem de egagrópilas em que o item esteve presente na dieta, e quanto à Porcentagem do número de presas individuais (PNPI) (Marti et al., 2007Marti, C. D.; Bechard, M. & Jaksic, F. M. 2007. Food Habits. In: Bird, D. M. & Bildstein, K. L. eds. Raptor: Research and Management Techniques. Surrey and Blaine, Hancock House Publishers Ltd, p. 129-149.), que representa a porcentagem que cada item representa em relação ao total de itens encontrados. Além disso, foram realizadas observações diretas do consumo de algumas presas de grande porte. Essas, porém, não foram incluídas na quantificação apresentada na tabela geral dos resultados de dieta, sendo apenas relatadas e discutidas.
RESULTADOS
Área de vida. No total foram registrados 123 encontros com os indivíduos monitorados em 34 pontos, ao longo de 37 meses. Sete indivíduos foram observados, sendo estes um casal e sua prole entre 2015 e 2017. Ao final deste período de monitoramento, a fêmea do casal desapareceu e foi substituída imediatamente por outra. Porém, todos os dados aqui apresentados referem-se ao casal original e seus filhotes. A área de vida estimada pelo método do polígono convexo mínimo (MCP) foi de 0,35 km² (35 ha) (Fig. 2). As estimativas da área de vida utilizando o método Kernel sugerem tamanho semelhante, com 0,41 km² (41 ha).
Área de vida estimada pelo método do Polígono Convexo Mínimo (MCP), para um casal de Bubo virginianus (Gmelin, 1788) no Pampa brasileiro. Os círculos representam a intensidade de uso dos diferentes poleiros nos períodos diurno e noturno.
Durante o dia os indivíduos de B. virginianus foram encontrados sempre no centro da área de vida, em poleiros de descanso sombreados do capão principal de Eucaliptus. À noite os indivíduos foram frequentemente registrados fora do capão, forrageando em áreas abertas mais próximas aos limites do território. Na figura 2 os diâmetros dos círculos representam a intensidade de uso dos diferentes poleiros, nos períodos noturno e diurno, e sua localização na área de vida. As corujas monitoradas mostraram-se mais fiéis a alguns poucos poleiros diurnos (reutilizados frequentemente) do que a maioria dos poleiros noturnos utilizada em sua maioria apenas uma ou duas vezes.
No que se referem aos deslocamentos, os indivíduos foram observados a uma distância média de 0,7 km do capão principal de Eucaliptus nos períodos noturnos em busca de suas presas.
Aspectos reprodutivos. O ninho utilizado para criação dos filhotes localizava-se no centro fragmento principal de Eucalyptus, em uma árvore desta mesma espécie. O ninho era composto por gravetos e possuía cerca de 1,5 metro de diâmetro, disposto na primeira forquilha da árvore, a uma altura de cerca de sete metros. A estrutura principal do ninho foi originalmente construída por um grupo familiar de caturritas [Myiopsitta monachus (Boddaert, 1783)], que deixavam de utilizar o ninho sempre que as corujas passavam a ocupá-lo. Para seu uso, o casal de B. virginianus realizou pequenas adequações da estrutura tornando-o apto para a utilização como ninho, com o achatamento da parte superior e formação uma concavidade para abrigar os ovos e filhotes (Figs 3-5).
Bubo virginianus (Gmelin, 1788): 3, fêmea de no ninho com seu ninhego recém-nascido; 4, ninhego juntamente ao ovo não eclodido na segunda temporada reprodutiva; 5, jovens com cerca de dois meses de vida; Todos os registros referentes a um mesmo casal reprodutivo, acompanhado em Santa Margarida do Sul, Rio Grande do Sul, Brasil.
O início do período reprodutivo - aqui considerado como sendo o momento em que o casal monitorado passava a utilizar a área ao redor do ninho - ocorreu sempre entre as últimas três semanas do outono e as primeiras três semanas do início do inverno. Entre uma e duas semanas após o casal começar a trabalhar na adequação do ninho, a fêmea passou a ocupar o ninho para realização da postura de seus ovos. Foram registrados três eventos reprodutivos, sendo um por ano. Durante as três temporadas reprodutivas observadas (2015-2017), houve um total de cinco ovos postados pela fêmea, dois na primeira temporada, dois na segunda e apenas um na última temporada. Dos cinco ovos registrados nos três anos de monitoramento, apenas um, na segunda temporada, não eclodiu, resultando em 80% de sucesso na incubação dos ovos.
O primeiro voo dos filhotes, se aventurando para outra árvore, aconteceu com cerca de um mês após a mãe deixar de frequentar o ninho, aproximadamente dois meses após nascimento. Assim, o tempo de utilização do ninho foi de três meses. Os pais acompanharam os juvenis até o quarto mês de vida, onde cada indivíduo adulto do casal forrageava junto com cada indivíduo da sua prole. A partir deste período, os pais deixaram de acompanhar os juvenis e consequentemente passaram a forragear sozinhos. Os filhotes permaneceram na área de vida dos pais, entre sete a dez meses após o nascimento. Todos obtiveram sucesso em sua criação e dispersaram próximo ao início do novo ciclo reprodutivo dos pais, no ano seguinte.
Dieta. Do total de 110 egagrópilas encontradas sob os poleiros de descanso diurno e sob o ninho do casal monitorado, foram identificadas 142 presas individuais pertencentes a 24 táxons. Os grupos mais importantes na dieta foram mamíferos, com 61,7% dos itens identificados na dieta, e as aves representando 31,6% dos itens consumidos (Tab. I). Além da análise da dieta calculada com base na amostragem de egagrópilas, foi possível testemunhar o consumo de duas presas de médio porte: um indivíduo de Lepus europaeus (Fig. 6) e um de Conepatus chinga (Fig. 7).
Itens alimentares (nº=142) encontrados em 110 egagrópilas de Bubo virginianus no Pampa brasileiro, Rio Grande do Sul, Brasil. Para cada presa são apresentados o número total de indivíduos encontrados, além da Frequência de Ocorrência (FO) e Porcentagem do número de presas individuais (PNPI), ambos expressos em porcentagem; A Proporção de Ocorrência dos grandes grupos de presas está sombreado na tabela.
Registros de predação por Bubo virginianus (Gmelin, 1788) no Pampa brasileiro: 6, lebre (Lepus europaeus Pallas, 1778); 7, zorrilho [Conepatus chinga (Molina, 1782)].
DISCUSSÃO
Há poucos estudos disponíveis na literatura no que se refere ao tamanho da área de vida de Strigiformes. Os dados disponíveis citam áreas de vida variando de 1 ha para Micrathene whitneyi (Cooper, 1861) (Gamel & Brush, 2001Gamel, C. M. & Brush, T. 2001. Habitat use, population density and home range of elf owls (Micrathene whitneyi) at Santa Ana National Wildlife Refuge, Texas. Journal of Raptor Research 35:214-220.) até 2.046 ha para Strix occidentalis (Xántus, 1860) (Forsman et al., 2005Forsman, E. D.; Kaminski, T. J.; Lewis, J. C.; Maurice, K. J.; Sovern, S. G.; Ferland, C. & Glenn, E. M. 2005. Home range and habitat use of Nouthern Spotted Owls on the Olympic Peninsula. Journal of Raptor Research 39:365-377.). Geralmente a diferença de tamanho na área de vida dos vertebrados está associada a fatores como a massa corpórea (Harestad & Bunnell, 1979Harested, A. S. & Bunnell, F. L. 1979. Home range and body weight - a reevaluation. Ecology 60:389-402. ; Peery, 2000Peery, M. Z. 2000. Factors affecting interspecies variation in home range size of raptors. The Auk 117:511-517.), densidade populacional (Peery, 2000Peery, M. Z. 2000. Factors affecting interspecies variation in home range size of raptors. The Auk 117:511-517.; Makarieva et al., 2005Makarieva, A. M.; Gorshkov, V. G. & Bai-Lian, L. I. 2005. Why do population density an inverse home range scale differently with body size? Implications for ecosystem stability. Ecological Complexity 2:259-271.) e taxas metabólicas (Mace & Harvey, 1983Mace, G. M. & Harvey, P. H. 1983. Energetic constraints on home range size. The American Naturalist 121:120-132.; Peery, 2000Peery, M. Z. 2000. Factors affecting interspecies variation in home range size of raptors. The Auk 117:511-517.). Em ambientes florestados, a produtividade por unidade de área parece ser maior do que em ambientes mais abertos, que podem resultar na necessidade de áreas de vida de tamanhos diferentes para uma mesma espécie (Gerhardt et al., 1994Gerhardt, R. P.; González, N. B.; Gerhardt, D. M. & Flatten, C. J. 1994. Breeding biology and home range of two Ciccaba owls. Wilson Bulletin 106:629-639.).
Embora a massa corpórea e, por conseguinte, a necessidade de alimento, possa ser um fator importante no tamanho das áreas utilizadas entre as diferentes espécies (Peery, 2000Peery, M. Z. 2000. Factors affecting interspecies variation in home range size of raptors. The Auk 117:511-517.), ela não pode ser encarada como única explicação. Nossos dados sugerem uma área de uso semelhante à observada para Megascops asio (Gerhard et al., 1994Gerhardt, R. P.; González, N. B.; Gerhardt, D. M. & Flatten, C. J. 1994. Breeding biology and home range of two Ciccaba owls. Wilson Bulletin 106:629-639.), que é uma coruja muito menor do que B. virginianus. Uma conjunção de fatores como adequabilidade do habitat e estrutura da vegetação levam os animais selecionarem habitats que maximizem sua aptidão e sobrevivência (Pyke, 1984Pyke, G. H. 1984. Optimal foraging theory: a critical review. Annual Review of Ecology and Systematics 15:523-575.). Porém, é provável que a disponibilidade e abundância de presas sejam um dos fatores principais associado ao tamanho da área de vida adotado pelas corujas (Newton, 2002Newton, I. 2002. Population limitation in Holarctic owls. In: Newton, I.; Kavanagh, R.; Olsen, J. & Taylor, I. eds. Ecology and conservation of owls. Melbourne, CSIRO Publishing, p. 3-29.). Os dados obtidos sugerem que a área principal de forrageio estende-se num raio de menos de 1 km do capão principal de Eucaliptus. Essa distância representa cerca da metade da distância encontrada em estudo com Asio otus (Linnaeus, 1758) (D. Emin et al., 2018D. Emin, A. G.; Toxopeus, A. G.; Groen, T. A.; Kontogeorgos, I.; Georgopoulou, E. & Xirouchakis, S. 2018. Home range and habitat selection of Long-eared Owls (Asio otus) in Mediterranean agricultural land scapes (Crete, Greece). Avian Biology Research 11(3):204-218.).
No que se refere à reprodução, houve observação de características interessantes. A utilização de ninhos de M. monachus para nidificação desta coruja já havia sido registrada nas províncias de Santa Fé e Entre Ríos na Argentina, também localizados em capões de mata de árvores exóticas (Pagano & Chiale, 2016Pagano, L. & Chiale, M. 2016. Ñacurutú (Bubo virginianus) nidificando en la ciudad autónoma de Buenos Aires, Argentina. Nuestras Aves 61:36-37.). Além do uso de ninhos de M. monachus, o jacurutu já foi registrado utilizando o ninho de indivíduos de garças (Ardeidae) para nidificar (König & Weick, 2010Konig, C. & Weick, F. 2010. Owls of the world. London, A & C Black. 528p.).
Para a Argentina é observada a postura de apenas um ovo por evento reprodutivo (Pagano & Chiale, 2016Pagano, L. & Chiale, M. 2016. Ñacurutú (Bubo virginianus) nidificando en la ciudad autónoma de Buenos Aires, Argentina. Nuestras Aves 61:36-37.). Em nosso estudo foram postados dois ovos na maioria dos eventos reprodutivos acompanhados, de forma semelhante ao registrado por Lisboa et al. (2005Lisboa, J. S.; Pallinger, F. & Leão, C. 2005. Observações de Nidificação de Bubo virginianus em Minas Gerais. Boletim Associação Brasileira de Falcoeiros e Preservação das aves de Rapina 8(2):83-85. ) que observou dois filhotes em um ninho região central do Brasil. Só é possível especular sobre a diferença no número de ovos e filhotes observada entre as áreas no Brasil e na Argentina. Esta diferença pode estar associada a diversos fatores como a latitude e variáveis ambientais, como a disponibilidade de alimento. Todavia, não há informação suficiente tanto nas referências citadas, como no estudo ora apresentado, para corroborar tal hipótese.
A dispersão dos filhotes parece estar relacionada com o início do período reprodutivo dos adultos, visto que quanto mais tarde os indivíduos juvenis dispersaram, mais tarde começou a utilização da área do ninho para a próxima temporada reprodutiva. Os dados aqui apresentados, referentes ao período juvenil dos filhotes (após terem deixado o ninho) são inéditos e não contam com registros na literatura, com os quais seja possível uma comparação.
A dieta ora apresentada ressalta a importância de mamíferos (que representaram mais 60% dos itens consumidos) e aves (representando mais de 30%). Estes resultados corroboram com Tomazzoni et al. (2004Tomazzoni, A. C.; Pedó, E. & Hartz, S. M. 2004. Food habitats of Great Horned Owls (Bubo virginanus) in the breeding season in Lami Biological Reserve Southern Brazil. Ornitologia Neotropical 15:279-282.) que também encontraram estes dois grupos como os mais importantes para a dieta da espécie. Porém, no estudo supracitado, as aves foram os itens mais importantes, ainda que em proporções apenas um pouco maiores que os mamíferos (38% e 34% respectivamente). Os mamíferos também são importantes na dieta de B. virginianus na América do Norte, representando de 33% a 97% das presas consumidas, enquanto as aves variam de 5% a 65% (McInvaille & Keith, 1974McInvaille, J. W. B. & Keith, L. B. 1974. Predation-prey relations and breeding biology of the Great Horned Owl and Red-tailed Hawk in Central Alberta. Canadian Field Naturalist 88:1-20.; Rudolph, 1978Rudolph, S. E. 1978. Predation ecology of coexisting Great Horned and Barn owls. Wilson Bulletin 90:134-137.; Weir & Hanson, 1989Weir, D. & Hanson, A. 1989. Food habits of Great Horned Owls, Bubo virginianus, in the northern taiga of the Yukon Territory and Alaska. Canadian Field Naturalist 103:12-17.; Gutierrez et al., 1991Gutiérrez, J.; Arnaud, G. & Azevedo, M. 1991. Food habits of the Great Horned Owl (Bubo virginianus) in the Cape region of lower California. Mexico. Journal of Raptor Research 25:140-141.; Bosakowski & Smith, 1992Bosakowski, T. & Smith, D. G. 1992. Comparative diets of sympatric nesting raptors in the eastern deciduous forest biome. Canadian Journal Zoology 70:984-992.; Zimmerman et al., 1996Zimmerman, G.; Stapp, P. & Van Horne, B. 1996. Seasonal variation in the diet of Great Horned Owls (Bubo virginianus) on short grass prairie. American Midland Naturalist 136:149-156.; Murphy, 1997Murphy, R. K. 1997. Importance of prairie wetlands and avian prey to breeding Great Horned Owls (Bubo virginianus) in northwestern North Dakota. In: Duncan, J. R.; Johnson, D. H. & Nicholls, T. H. eds. Biology and conservation of owls of northern hemisphere. Washington, DC, USA General Technical Report NC-190. Department of Agriculture/Forest Service, p. 286-298.). Segundo Del Hoyo et al. (1999Del Hoyo, J.; Elliott, A. & Sargatal, J. 1999. Handbook of the birds of the world: barn-owls to humming birds. Barcelona, Lynx Edicions. 759p.) o jacurutu é considerado um predador de pequenos mamíferos que se alimenta principalmente de roedores nativos. Em estudos realizados na Colômbia, Argentina e Chile, os roedores aparecem como o item principal na dieta desta coruja, o que pode mostrar uma tendência de maior consumo deste tipo de grupo alimentar na dieta da espécie para a América do Sul (Jaksic et al., 1978Jaksic, F.; Rau, J. & Yañez, J. 1978. Oferta de presas y predación por Bubo virginianus (Strigidae) en el Parque Nacional Torres del Paine. Anales del Instituto de La Patagonia 9:199-202.; Teta et al., 2006Teta, P.; Maizof, S.; Quintana, R. & Pereira, J. 2006. Presas del ñacurutu (Bubo virginianus) en el bajo delta del rio Paraná, Buenos Aires, Argentina. Neotropical Ornithological Society 17:441-444.). Nossos dados mostram que a presa principal da espécie na área de estudo foi Holochilus vulpinus, um roedor de 200 - 275g (Paglia et al., 2012Paglia, A. avares, V. C.; Mittermeier, R. A. & Patton, J. L. 2012. Lista Anotada dos Mamíferos do Brasil / Annotated Checklist of Brazilian Mammals. 2ª Edição / 2nd Edition. Occasional Papers in Conservation Biology, No. 6. Arlington, Conservation International. 76p.). Uma vez que predadores tendem a se concentrar nas presas mais lucrativas em termos de custo/benefício (Houston et al., 1998Houston, C. S.; Smith, D. G. & Rohner, C. 1998. Great Horned Owl (Bubo virginianus). In: Poole, A. & Gill, F. eds. The birds of North America: The Birds of North America. Washington, D.C., Academy of Natural Sciences, Philadelphia and American Ornithologists’ Union. 372p.), é plausível supor que essa espécie apresente abundâncias relativamente altas e/ou seja mais facilmente capturada que outros roedores menores ou mais esquivos.
Digno de nota ainda é o consumo de presas de médio porte. A presença de L. europaeus foi registrada em três egagrópilas além do registro visual citado. Importante informar que as egagrópilas com L. europaeus não foram coletadas no mesmo período do registro visual e, portanto, referem-se a outras predações. Ainda que o consumo dessa espécie não seja frequente, ocorrendo em apenas 2,7% das amostras analisadas, é provavelmente uma presa importante dada a maior biomassa desses animais em relação aos roedores (item mais frequente). O consumo da Lepus por B. virginianus é relativamente comum no México (Gutiérrez et al., 1991Gutiérrez, J.; Arnaud, G. & Azevedo, M. 1991. Food habits of the Great Horned Owl (Bubo virginianus) in the Cape region of lower California. Mexico. Journal of Raptor Research 25:140-141.) e já havia sido citado por Peters et al. (2009Peters, F. B.; Roth, P. R. O.; Jeronimo, A. A.; Pereira, M. S.; Poerschke, F.; Machado, L. F. & Christoff, A. U. 2009. Predação de Lepus europaeus (Lagomorpha: Leporidae) por Bubo virginianus (Strigiformes: Strigidae) no sul do Brasil. Biodiversidade Pampeana 7:31-34. ) para o município de Santana do Livramento, também no Pampa brasileiro. Além da lebre, outras duas presas de médio porte foram observadas na dieta: um Didelphis, registrado nas egagrópilas, e a visualização do consumo de um Conepatus chinga. Mais uma vez, o registro corrobora informações anteriores, que já haviam registrado a predação de C. chinga no município de Eldorado do Sul, também no Pampa (Anza & Zilio, 2015Anza, J. & Zilio, F. 2015. Molina’s Hog-nosed Skunk as prey of the Great Horned Owl: predation or opportunist scavenging? Revista Brasileira de Ornitologia 23:377-379. ).
Os resultados deste estudo ampliam o conhecimento ecológico de B. virginianus e das corujas como um todo, sendo fundamental para iniciativas em prol da conservação desses fantásticos rapinantes noturnos.
Agradecimentos
Os autores agradecem ao Dr. Felipe Zilio e ao Dr. Dante Meller, pelas opiniões e sugestões na escrita da primeira versão deste manuscrito; os autores agradecem também à “Estância Capão Comprido”, onde o estudo foi realizado, ao proprietário e admirador das aves Paulo de Andrade Souto (in memoriam) e a Universidade Federal do Pampa. O trabalho foi realizado com apoio da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior - Brasil (CAPES), Código de Financiamento 001.
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Datas de Publicação
-
Publicação nesta coleção
23 Out 2023 -
Data do Fascículo
2023
Histórico
-
Recebido
23 Jan 2023 -
Aceito
11 Abr 2023