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Consumo alimentar e sua associação com estado nutricional, atividade física e fatores sociodemográficos de candidatos à cirurgia bariátrica.

RESUMO

Objetivo:

avaliar a associação do consumo alimentar com estado nutricional, atividade física e fatores sociodemográficos no pré-operatório de cirurgia bariátrica.

Métodos:

estudo transversal, realizado no período de 2018 a 2019, com pacientes internados para a cirurgia bariátrica no Hospital Universitário Oswaldo Cruz da Universidade Federal de Pernambuco. Foram obtidos dados sociodemográficos, estado nutricional pelo índice de massa corporal (IMC), circunferência da cintura, maior peso e peso pré-cirúrgico, consumo alimentar obtido pelo questionário de frequência alimentar baseado na pirâmide alimentar adaptada para o paciente bariátrico e atividade física.

Resultados:

participaram do estudo 60 pacientes, sendo 78,3% do sexo feminino, com idades de 38,8±9,6 anos, 53,3% casados e 70% dos indivíduos com mais de 12 anos de estudo. Na prática de atividade física, 31,7% eram sedentários. Sobre o estado nutricional, a média de IMC observada foi de 47,3±6,96kg/m2. O peso pré-operatório, maior peso atingido antes da cirurgia e circunferência da cintura foi maior no sexo masculino (p<0,05). Houve associação entre atividade física e consumo alimentar, sendo que indivíduos sedentários consumiam mais carboidratos (p=0,041). Por outro lado, dados sociodemográficos e estado nutricional não apresentaram associações com o consumo.

Conclusão:

o nível de atividade física evidenciou associação significativa apenas com o consumo de carboidratos.

Descritores:
Cirurgia Bariátrica; Obesidade; Consumo de Alimentos; Estado Nutricional; Período Pré-Operatório.

ABSTRACT

Objective:

to evaluate the association of food consumption with nutritional status, physical activity and sociodemographic factors in the bariatric surgery period preoperative.

Methods:

we conducted a cross-sectional study from 2018 to 2019, with patients admitted for bariatric surgery at the Oswaldo Cruz University Hospital, Federal University of Pernambuco. We collected data sociodemographic and nutritional data such as body mass index (BMI), waist circumference, highest weight and pre-surgical weight. We evaluated food consumption with the food frequency questionnaire based on the food pyramid adapted for bariatric patients and physical activity.

Results:

the study involved 60 patients, 78.3% were female, mean age was 38.8±9.6 years, 53.3% were married, and 70% had more than 12 years of education. As for physical activity, 31.7% were sedentary. Regarding nutritional status, the mean BMI was 47.3±6.96kg/m2. Preoperative weight, highest weight reached before surgery and waist circumference were higher in males (p<0.05). There was an association between physical activity and food intake, and sedentary individuals consumed more carbohydrates (p=0.041). On the other hand, sociodemographic data and nutritional status were not associated with food consumption.

Conclusion:

the level of physical activity showed significant association only with carbohydrate consumption.

Keywords:
Bariatric Surgery; Obesity; Food Consumption; Nutritional Status; Preoperative Period.

INTRODUÇÃO

A obesidade é uma doença complexa e multifatorial, em crescimento exponencial no Brasil e no mundo. É considerada fator de risco para doenças cardiovasculares, diabetes mellitus tipo 2, hipertensão, dislipidemia e múltiplos cânceres, sendo causada pela interação de fatores genéticos, ambientais, metabólicos, psicológicos e comportamentais11 Upadhyay J, Farr O, Perakakis N, Ghaly W, Mantzoros C. Obesity as a disease. Med Clin N Am. 2018;102(1):13-33.. Seu tratamento é complexo e envolve mudança de estilo de vida e tratamento farmacológico. Entretanto, estes têm sido pouco efetivos em obesos mórbidos e não se mostram sustentáveis em longo prazo22 Mechanick JI, Kushner RF, Sugerman HJ, Gonzalez-Campoy JM, Collazo-Clavell ML, Guven S, et al. American Association of Clinical Endocrinologist, The Obesity Society, and American Society for Metabolic & Bariatric Surgery Medical Guidelines for Clinical Practice for the perioperative nutritional, metabolic and nonsurgical support of the bariatric surgery patient. Surg Obes Relat Dis. 2008;4(5 Suppl):S109-84. Erratum in: Surg Obes Relat Dis. 2010;6(1):112.. É consenso que a cirurgia bariátrica é o método mais efetivo para o tratamento e profilaxia das complicações causadas pela obesidade mórbida, sendo indicado quando o tratamento conservador é ineficaz33 Acquafresca PA, Palermo M, Duza GE, Blanco LA, Serra EE. [Gastric Bypass versus Sleeve gastrectomy: comparison between type 2 Diabetes weight loss and complications. Review of randomized control trails]. Acta Gastroenterol Latinoam. 2015;45(2):143-54. Spanish.

4 Puzziferri N, Roshek TB 3rd, Mayo HG, Gallagher R, Belle SH, Livingston EH. Long-term follow-up after bariatric surgery: a systematic review. JAMA. 2014;312(9):934-42.
-55 Sjöström L. Bariatric surgery and reduction in morbidity and mortality: experiences from the SOS study. Inter J Obes (Lond). 2008;32 Suppl 7: S93-7..

Dentre os efeitos da cirurgia, se destaca a redução do peso, com melhora do quadro metabólico, que resulta na diminuição do risco cardiovascular, da resistência à insulina, do diabetes, entre outros66 Maïmoun L, Lefebvre P, Aouinti S, Picot MC, Mariano-Goulart D, Nocca D; Montpellier Study Group of Bariatric Surgery. Acute and longer-term body composition changes after bariatric surgery. Surg Obes Relat Dis. Epub 2019 Jul 29.. No entanto, carências podem ocorrer e estão relacionadas à ingestão alimentar reduzida, baixa adesão aos suplementos, má absorção de nutrientes no pós-operatório, e também às deficiências existentes antes da cirurgia77 Lupoli R, Lembo E, Saldalamacchia G, Avola CK, Angrisani L, Capaldo B. Bariatric surgery and long-term nutritional issues. World J Diabetes. 2017;8(11):464-74.,88 Bordalo LA, Teixeira TFS, Bressan J, Mourão DM. Cirurgia bariátrica: como e por que suplementar. Rev Assoc Med Bras. 2011;57(1):113-20.. Esse quadro de deficiência pode acarretar anemia, osteoporose, distúrbios neurológicos e desnutrição77 Lupoli R, Lembo E, Saldalamacchia G, Avola CK, Angrisani L, Capaldo B. Bariatric surgery and long-term nutritional issues. World J Diabetes. 2017;8(11):464-74..

Sobre as características do consumo alimentar de macronutrientes de pacientes obesos, observa-se elevada ingesta calórica oriunda de carboidratos, gorduras trans e saturadas, associada à diminuição do consumo de frutas, verduras e proteínas, o que resulta no ganho de peso corporal99 Hall KD. The Potential Role of Protein Leverage in the US Obesity Epidemic. Obesity (Silver Spring). 2019;27(8):1222-4..

Com o intuito de intervir em tempo hábil e evitar complicações clínicas e nutricionais mais graves após a cirurgia, se faz necessário promover práticas alimentares e de hábitos de vida saudáveis1010 Ahmad D, Esmadi S, Hammad MH. Malnutrition secondary to non-compliance with vitamin and mineral supplements after gastric bypass surgery: what can we do about it? Am J Case Rep. 2012;13:209-13.. Portanto, o objetivo deste estudo foi verificar a associação do consumo alimentar com estado nutricional, atividade física e fatores sociodemográficos de candidatos à cirurgia bariátrica.

MÉTODOS

Estudo transversal realizado com pacientes no pré-operatório de cirurgia bariátrica do Hospital Universitário Oswaldo Cruz da Universidade Federal de Pernambuco (HUOC-UPE), Recife/PE, no período de 2018 a 2019. Utilizou-se como critérios de elegibilidade pacientes de ambos os sexos, com idades entre 18 e 59 anos. Aqueles que apresentaram histórico de doença psíquica, uso de drogas ilícitas, risco cirúrgico elevado, deficientes físicos por impossibilidade de realizar antropometria, que apresentavam intervenção cirúrgica pregressa do trato digestório, internados para reabordagem cirúrgica por reganho de peso e aqueles que não sabiam ler e escrever, foram excluídos do estudo.

Dados sociodemográficos, como idade, sexo, escolaridade em anos de estudo1111 ABEP Associação Brasileira de Pesquisas. Critério de classificação econômica Brasil [Internet]. 2012 [Acesso 2019 mar 5]. Disponível em http://www.abep.org/criterio-brasil
http://www.abep.org/criterio-brasil...
, estado civil e procedência, foram obtidos, assim como, medidas antropométricas de peso pré-operatório (Kg), maior peso atingido (Kg), altura (m) e circunferência da cintura (CC) pré-operatória (cm)1212 Jellife DB. Evolución del estado de nutrición de la comunidad. 1 ed. Ginebra, Suiza: Organización Mundial de la Salud; 1968.. A CC foi aferida utilizando-se uma fita métrica flexível e inelástica, dividida em centímetros e subdivida em milímetros (com precisão de 1mm). Para a aferição, a fita métrica foi localizada a cerca de 2cm acima da cicatriz umbilical devido à dificuldade de obter o ponto médio entre a última costela e a crista ilíaca nesses pacientes1313 (WHO). Obesity: preventing and managing the global epidemic. Report of WHO Consultation on obesity. World Health Organization: Geneva; 1998.. Após obtenção do peso e altura, foi calculado o índice de massa corporal (IMC), sendo utilizado os pontos de corte recomendados pela American Society for Metabolic & Bariatric Surgery22 Mechanick JI, Kushner RF, Sugerman HJ, Gonzalez-Campoy JM, Collazo-Clavell ML, Guven S, et al. American Association of Clinical Endocrinologist, The Obesity Society, and American Society for Metabolic & Bariatric Surgery Medical Guidelines for Clinical Practice for the perioperative nutritional, metabolic and nonsurgical support of the bariatric surgery patient. Surg Obes Relat Dis. 2008;4(5 Suppl):S109-84. Erratum in: Surg Obes Relat Dis. 2010;6(1):112..

Para avaliar o nível de atividade física, utilizou-se o Questionário Internacional de Atividade Física - IPAQ, em sua versão curta, que classifica os indivíduos em muito ativos, ativos, irregularmente ativos e sedentários1414 Craig CL, Marshall AI, Sjöström M, Bauman AE, Booth ML, Ainsworth BE, et al. International physical activity questionnaire: 12-country reliability and validity. Med Sci Sports Exerc. 2003;35(8):1381-95.. O consumo alimentar foi estimado pelo questionário de frequência alimentar direcionado (QFAD) e adaptado, desenvolvido por Soares et al.1515 Soares FL, Bissoni de Sousa L, Corradi-Perini C, Ramos da Cruz MR, Nunes MG, Branco-Filho AJ. Food Quality in the late postoperative period of bariatric surgery: an evaluation using the bariatric food pyramid. Obes Surg. 2014;24(9):1481-6., baseado nos parâmetros da pirâmide alimentar para pacientes bariátricos proposto por Moizé et al.1616 Moizé VL, Pi-Sunyer X, Mochari H, Vidal J. Nutritional pyramid for post- gastric by-pass patients. Obes Surg. 2010;20(8):1133-41.. Esta pirâmide divide-se em cinco níveis, sendo sua base relacionada à ingestão hídrica e de suplementos, além da prática de atividade física. Os outros quatro níveis abordam sobre o consumo de grupos alimentares, sendo grupo 1: proteínas (leguminosas, carnes, ovos, leite e derivados); grupo 2: hortaliças, frutas e azeite de oliva; grupo 3: arroz, massas, raízes e tubérculos; grupo 4: bebidas alcoólicas, industrializados, alimentos ricos em açúcar, gorduras saturadas, trans e colesterol.

A avaliação pelo QFAD divide os alimentos distribuídos nos quatro grupos alimentares presentes nesta pirâmide, segundo frequências categorizadas de consumo em: raro ou nunca, uma a três vezes no mês, uma vez na semana, duas a quatro vezes na semana, cinco ou mais vezes na semana, uma vez ao dia, duas ou mais vezes por dia. O questionário aborda dados referentes ao mês anterior à entrevista a fim de evitar relatos superestimados e auxiliar na recordação do consumo.

A avaliação do consumo foi realizada com base na metodologia proposta por Fornés et al.1717 Fornés NS, Martins IS, Velásquez Melendez G, Latorre MRDO. Escores de consumo alimentar e níveis lipêmicos em população de São Paulo, Brasil. Rev. Saúde Pública. 2002;36(1):12-8., na qual o cálculo geral da frequência de consumo é convertido em escores. Para transformar as frequências relatadas no QFAD de cada alimento em frequência diária, foi atribuído um peso a cada categoria de frequência de consumo, considerando como referência o consumo relatado "uma vez por dia" igual a 1. Dessa forma, para frequência "raro ou nunca" o correspondente em frequência diária foi 0; para "1 a 3 vezes no mês" foi atribuído 0,067 (2x/30 dias); para "1 vez na semana" foi 0,143 (1x/7 dias); para "2 a 4 vezes na semana" 0,429 (3x/7 dias); para "5 a 6 vezes na semana" 0,786 (5,5x/7 dias); para "2 ou mais vezes por dia" foi igual a 2. Além disso, foi avaliado também a utilização de suplementos polivitamínicos e minerais prévios à cirurgia bariátrica e ingestão hídrica.

Para as análises estatísticas foi empregado o pacote estatístico SPSS versão 12.0 (SPSS Inc., Chicago, IL, USA). Inicialmente, as variáveis contínuas foram testadas segundo a normalidade pelo teste de Kolmogorov-Smirnov. As variáveis com distribuição normal foram descritas pela média e desvio padrão e aquelas com distribuição não paramétricas, foram descritas pela mediana e o respectivo intervalo interquartílico (IQ) (Percentis 25 e 75). A comparação entre as médias foi obtida pelo teste t de Student (duas médias). Os escores de frequência de consumo alimentar, por se tratarem de variáveis em escala ordinal, foram descritos na forma de mediana e IQ. A associação entre o consumo alimentar e as variáveis independentes foi avaliada pelos testes u de Mann-Whitney (duas medianas) e Kruskal-Wallis (mais de duas medianas) e empregou-se o teste u de Mann-Whitney a posteriori. Na validação das associações investigadas foi adotado o valor de p<0,05.

Todos os participantes foram informados sobre o trabalho, receberam por escrito uma descrição do estudo e de todos os procedimentos a que foram submetidos e assinaram o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido (TCLE). Esta pesquisa foi aprovada pelo Comitê de Ética em Pesquisa em Seres Humanos do Centro de Ciências da Saúde (CCS) da Universidade Federal de Pernambuco, de acordo com a Resolução nº 466/12, do Conselho Nacional de Saúde, sob o parecer CAAE: 67051817.9.0000.5192.

RESULTADOS

Foram avaliados 60 pacientes submetidos à cirurgia bariátrica, com uma média de idade de 38,8±9,6 anos, sendo 78,3% do sexo feminino. Dados sobre o perfil sociodemográfico dos pacientes estão apresentados na tabela 1.

Tabela 1
Perfil sociodemográfico dos pacientes antes da cirurgia bariátrica (HUOC-UPE).

Com relação ao estado nutricional, foi encontrada diferença estatisticamente significante entre média do peso pré-operatório, maior peso atingido antes da cirurgia e circunferência da cintura entre os sexos, sendo superior no sexo masculino (p<0,05). A média de IMC observada foi de 47,3±6,96kg/m22 Mechanick JI, Kushner RF, Sugerman HJ, Gonzalez-Campoy JM, Collazo-Clavell ML, Guven S, et al. American Association of Clinical Endocrinologist, The Obesity Society, and American Society for Metabolic & Bariatric Surgery Medical Guidelines for Clinical Practice for the perioperative nutritional, metabolic and nonsurgical support of the bariatric surgery patient. Surg Obes Relat Dis. 2008;4(5 Suppl):S109-84. Erratum in: Surg Obes Relat Dis. 2010;6(1):112. (Tabela 2).

Tabela 2
Variáveis antropométricas dos pacientes antes da cirurgia bariátrica (HUOC-UPE).

Quanto à atividade física, foi observado que 24 pacientes (40%) eram ativos, 17 (28,3%) insuficientemente ativos, e 19 (31,7%) sedentários. Além disso, no que se refere ao uso de suplementação de vitaminas e/ou minerais antes da cirurgia, 20 (33,3%) usaram em algum momento, especialmente polivitamínicos e minerais, citrato de cálcio e vitamina D. Quanto à ingestão hídrica, a maioria ingeria mais de dois litros de água/dia (71,7%) (dados não apresentados em tabelas). Não foram encontradas diferenças significativas entre os escores de consumo alimentar dos pacientes candidatos à cirurgia bariátrica com dados sociodemográficos (Tabela 3). Porém, observou-se que indivíduos sedentários apresentaram maior consumo de alimentos pertencentes ao grupo alimentar dos carboidratos (p=0,041) (Tabela 4).

Tabela 3
Medianas e intervalos interquartílicos dos escores de consumo alimentar segundo variáveis sociodemográficas dos pacientes antes da cirurgia bariátrica (HUOC-UPE).
Tabela 4
Medianas e intervalos interquartílicos dos escores de consumo alimentar segundo variáveis antropométricas e atividade física dos pacientes antes da cirurgia bariátrica (HUOC-UPE).

DISCUSSÃO

A velocidade de crescimento da obesidade mórbida consegue ser mais expressiva do que obesidade em geral, e isso reflete no aumento do número de cirurgias bariátricas realizadas no Brasil1818 Sociedade Brasileira de Cirurgia Bariátrica e Metabólica (SBCBM). Consenso Bariátrico. [Internet]. 2006 [Acesso em 2019 Aug 15]. Disponível em: http://www.sbcb.org.br/ membros_consenso_bariatrico.php
http://www.sbcb.org.br/ membros_consenso...
. No entanto, o paciente obeso necessita de acompanhamento em todas as etapas do processo, antes e depois da cirurgia, a fim de identificar e corrigir o consumo alimentar e/ou necessidade de suplementação, para minimizar as complicações nutricionais comuns nesse público. As complicações nutricionais mais prevalentes e relatadas na literatura são alopécia, astenia, alteração na textura das unhas, todas consideradas preditivos de carências nutricionais1919 Ribeiro de Moraes M, Lúcia de Mendonça Soares B, Maio R, Pessoa de Araújo Burgos MG. Clinical-nutritional evolution of older women submitted to Roux-en-Y gastric by-pass. Nutr Hosp. 2015;31(3):1330-5.,2020 Santos TD, Burgos MGPA, Lemos MCC, Cabral PC. Aspectos clínicos e nutricionais em mulheres obesas durante o primeiro ano após bypass gástrico em Y-de-Roux. ABCD Arq Bras Cir Dig. 2015;28(Suppl 1):56-60..

O acompanhamento clínico-nutricional antes da cirurgia permite a correção destas carências e pode reduzir complicações nutricionais maiores. No presente estudo, foi observado que 33,3% dos pacientes usaram suplementos no pré-operatório, como polivitamínicos e minerais, citrato de cálcio e vitamina D. Pacientes submetidos a procedimentos cirúrgicos disabsortivos devem utilizar estes suplementos de forma preventiva, pois, além das alterações anatômicas e fisiológicas que prejudicam a absorção e/ou ingestão alimentar, seu uso no pós-operatório costuma ser escasso e esporádico, implicando em queda no estado nutricional do paciente88 Bordalo LA, Teixeira TFS, Bressan J, Mourão DM. Cirurgia bariátrica: como e por que suplementar. Rev Assoc Med Bras. 2011;57(1):113-20.,2121 Trindade EM, Gebara TSS, Cambi MPC, Baretta GAP. Aspectos nutricionais e o uso de suplementos alimentares em mulheres submetidas ao bypass gástrico. ABCD Arq Bras Cir Dig. 2017;30(1):11-3..

A maioria dos pacientes avaliados era do sexo feminino. Isso corrobora com vários outros trabalhos2020 Santos TD, Burgos MGPA, Lemos MCC, Cabral PC. Aspectos clínicos e nutricionais em mulheres obesas durante o primeiro ano após bypass gástrico em Y-de-Roux. ABCD Arq Bras Cir Dig. 2015;28(Suppl 1):56-60.,2222 Tedesco AK, Biazotto R, Gebara TSS, Cambi MPC, Baretta GAP. Pré e pós-operatório de cirurgia bariátrica: algumas alterações bioquímicas. ABCD Arq Bras Cir Dig. 2016;29(Supl. 1):67-71.

23 Rolim FFA, Santa-Cruz F, Campos JM, Ferraz AAB. Repercussões em longo prazo da derivação gástrica em Y de Roux em população de baixa renda: avaliação após dez anos de cirurgia. Rev Col Bras Cir. 2018; 45(4):e1916.
-2424 Zyger LT, Zanardo VPS, Tomicki C. Perfil nutricional e estilo de vida de pacientes pré e pós-cirurgia bariátrica. Sci Med (Porto Alegre). 2016;26(3):ID23707., pois sabe-se que, na mulher, o controle de peso tem forte motivação estética e há maior preocupação com a saúde2020 Santos TD, Burgos MGPA, Lemos MCC, Cabral PC. Aspectos clínicos e nutricionais em mulheres obesas durante o primeiro ano após bypass gástrico em Y-de-Roux. ABCD Arq Bras Cir Dig. 2015;28(Suppl 1):56-60.. Ao comparar o estado nutricional de homens e mulheres, mostrou-se que o peso pré-operatório, o maior peso antes da cirurgia e a CC foram significativamente maiores nos homens (p<0,005), confirmando que as mulheres se preocupam mais com a saúde e procuram mais o serviço de saúde do que os homens.

Os dados da Pesquisa de Vigilância de Fatores de Risco e Proteção para Doenças Crônicas por Inquérito Telefônico2525 Brasil. Ministério da Saúde. Secretaria de Vigilância em Saúde. Departamento de Analise em Saúde e Vigilância de Doenças não Transmissíveis. Vigitel Brasil 2018 - Vigilância de fatores de risco e proteção para doenças crônicas por inquérito telefônico: estimativas sobre frequência e distribuição sociodemográfica de fatores de risco e proteção para doenças crônicas nas capitais dos 26 estados brasileiros e no Distrito Federal em 2018. Brasília (DF): Ministério da Saúde; 2019. também apontaram para um crescimento maior da obesidade entre os adultos de 35 e 44 anos, confirmando o encontrado no presente estudo e diferente da média de idade encontrada em um trabalho realizado também em Recife, em que prevalecia a população com idades entre 41 e 50 anos (45,2%)2323 Rolim FFA, Santa-Cruz F, Campos JM, Ferraz AAB. Repercussões em longo prazo da derivação gástrica em Y de Roux em população de baixa renda: avaliação após dez anos de cirurgia. Rev Col Bras Cir. 2018; 45(4):e1916..

Em relação aos anos de estudo, predominaram os pacientes com 12 anos ou mais, dados semelhantes aos obtidos por Zyger et al.2424 Zyger LT, Zanardo VPS, Tomicki C. Perfil nutricional e estilo de vida de pacientes pré e pós-cirurgia bariátrica. Sci Med (Porto Alegre). 2016;26(3):ID23707. e que permite inferir que pessoas de maior escolaridade procuram mais o serviço de saúde, em comparação com pessoas de menor escolaridade2626 Viacava F, Oliveira RAD, Carvalho CC, Laguardia J, Bellido JG. SUS: oferta, acesso e utilização de serviços de saúde nos últimos 30 anos. Ciên Saúde Coletiva. 2018;23(6):1751-62.. Achados opostos foram encontrados por Rosa et al.2727 Rosa SC, Macedo JLS, Casulari LA, Canedo LR, Marques JVA. Perfil antropométrico e clínico de pacientes pós-bariátricos submetidos a procedimentos em cirurgia plástica. Rev Col Bras Cir. 2018;45(2):e1613. e Rolim et al.2323 Rolim FFA, Santa-Cruz F, Campos JM, Ferraz AAB. Repercussões em longo prazo da derivação gástrica em Y de Roux em população de baixa renda: avaliação após dez anos de cirurgia. Rev Col Bras Cir. 2018; 45(4):e1916..

Em relação à prática de atividade física, 40% dos pacientes eram ativos, como também observado por Boscatto et al.2828 Boscatto EC, Duarte MFS, Gomes MA. Estágios de mudança de comportamento e barreiras para atividade física em obesos mórbidos. Rev Bras Cineantropom Desempenho Hum. 2011;13(5):329-34.. Essa predominância de indivíduos ativos pode ter ocorrido devido ao programa de acompanhamento do nosso Serviço, realizado com esses pacientes previamente à cirurgia bariátrica. No entanto, observa-se ainda valores elevados de sedentários (31,7%). O sedentarismo é um dos aspectos de estilo de vida que mais acometem a qualidade de vida dos obesos, sendo considerado fator de risco primário e independente para o desenvolvimento da obesidade. Ademais, também está relacionado com a qualidade dos alimentos ingeridos2424 Zyger LT, Zanardo VPS, Tomicki C. Perfil nutricional e estilo de vida de pacientes pré e pós-cirurgia bariátrica. Sci Med (Porto Alegre). 2016;26(3):ID23707.. O sedentarismo, associado com o elevado consumo de açúcares simples e alimentos gordurosos, apresenta efeito de risco para a obesidade e para outras doenças crônicas. Tal associação foi observada no estudo ao relacionar a atividade física com o consumo alimentar, em que indivíduos sedentários apresentam o maior consumo de carboidratos (p=0,041). Os carboidratos, por se tratarem de um grupo alimentar de aceitação e digestão mais fáceis, são frequentemente observados na dieta de indivíduos obesos2929 Zaparolli M, Cruz MRR. Silova G, Radominsi R, Reichmann MTF, Schieferdecker ME, et al. Ingestão alimentar após cirurgia bariátrica: uma análise dos macronutrientes e adequação dos grupos alimentares à pirâmide específica. Nutr Clin Diet Hosp. 2018;38(1):36-9.,3030 Castanho GKF, Marsola FC, Mclellan KCP, Nicola M, Moreto F, Burini RC. Consumo de frutas, verduras e legumes associado à Síndrome Metabólica e seus componentes em amostra populacional adulta. Ciênc Saúde Coletiva. 2013;18(2):385-92..

Dessa forma, o nível de atividade física possui relação significativa com o consumo de carboidratos, o que permite refletir sobre a importância da avaliação do consumo alimentar de indivíduos obesos candidatos à cirurgia, com o propósito de identificar e corrigir os erros alimentares. Outros estudos são necessários para verificar a possível associação do consumo alimentar com a composição corporal desses indivíduos.

  • Fonte de financiamento: nenhuma.

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    31 Jan 2020
  • Data do Fascículo
    2019

Histórico

  • Recebido
    09 Out 2019
  • Aceito
    29 Out 2019
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