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Velocidade de hemossedimentação de segunda hora: qual a sua utilidade?

À BEIRA DO LEITO

CLÍNICA MÉDICA

Velocidade de hemossedimentação de segunda hora: qual a sua utilidade?

José Marques Filho

As provas de atividade inflamatória são exames freqüentemente utilizados na prática médica para auxiliar o diagnóstico e seguimento de afecções inflamatórias, infecciosas e neoplásicas.

Diversas provas laboratoriais podem ser utilizadas com essa finalidade: velocidade de hemossedimentação (VHS), proteína C reativa (PCR), alfa1 glicoproteina ácida, seromucóides, fibrinogênio, haptoglobina e inúmeras outras proteínas.

A utilização de termos com "Provas de atividade reumática", "reumatograma" são absolutamente inadequadas, porém infelizmente ainda utilizadas por alguns profissionais.

Inexiste até o momento uma definição das melhores ou mais adequadas provas de atividade inflamatória. A experiência do profissional com determinadas provas é muito importante, devendo conhecer bem as limitações e as possibilidades dos testes utilizados, devendo os mesmos serem interpretados à luz de um contexto clínico muito bem avaliado. Isoladamente, estas provas não têm nenhum valor.

A prática clínica tem demonstrado que a utilização de duas destas provas podem ser suficientes para uma adequada abordagem diagnóstica, assim como para seguimento de uma determinada enfermidade.

Observa-se também que o VHS e a PCR são os testes mais utilizados por clínicos experientes. Na última edição do livro Rheumatology, no capítulo de testes laboratoriais, na seção de "reagentes de fase aguda", somente são abordados no texto o VHS e a PCR.

Em relação ao VHS, alguns aspectos e características merecem destaque e discussão, devido à alta freqüência de utilização deste exame simples, de baixo custo, rápido, de fácil realização e com experiência acumulada de oito décadas.

Os primeiros estudos foram publicados separadamente, em 1921, por Fahraeus1 e Westergren2. Enquanto o primeiro o utilizava como teste para diagnóstico de gravidez, o segundo o aplicava nos pacientes portadores de tuberculose.

O VHS é a medida, sob condições padronizadas, da taxa de sedimentação dos eritrócitos em sangue não coagulado.

Em 1935, Wintrobe descreveu um método de avaliação do VHS usando sangue não coagulado em um tubo de hematócrito, que tinha a vantagem da leitura do hematócrito no mesmo material.

Entretanto, o método original de Westergren tem predominado e foi proposto como referência internacional (International Committe for Standartization in Haematology, 1973)3 e referendado no último consenso do conselho internacional de padronização, em Hematologia em 1993.

Wilhelm e Tillisch, em 1951, demonstraram que o VHS se modifica com a idade, sendo fisiologicamente mais acelerado em indivíduos idosos.

Segundo a recomendação do Conselho Internacional para Padronização em Hematologia, os valores de referência para VHS devem ser calculados nacional ou regionalmente, uma vez que o teste pode ser influenciado por condições locais. Não há tabelas de referências brasileiras, dispomos apenas de dados internacionais.

Os estados inflamatórios, infecciosos e neoplásicos são as condições mais freqüentes de VHS acelerada, enquanto classicamente diminuem o VHS a insuficiência cardíaca, a hipofibrinogenemia, a hipoproteinemia e a policitemia Vera, entre outras. Recentemente Lanzara et al.4 fizeram um levantamento da literatura internacional, abrangendo os estudos publicados nos últimos 50 anos, não encontrando nenhum artigo que desse validação científica sólida para a leitura do VHS de segunda hora. Praticamente todos os trabalhos utilizam o VHS lido em 60 minutos para a metodologia e conclusão. Outros autores têm chamado a atenção para a pouca utilidade da medida do VHS de segunda hora5,6.

O próprio Fahraeus, na primeira descrição do VHS, arbitrariamente estipulou 60 minutos como o tempo de leitura e o próprio Conselho Internacional de Padronização em Hematologia recomenda que a medida seja padronizada em 60 minutos.

A observação na prática diária demonstra que a realização da medida do VHS de segunda hora dificulta a sua interpretação, principalmente entre os profissionais menos experientes, gerando muitas vezes conduta inadequada ou novos exames desnecessários.

A divulgação da inadequação da medida do VHS de segunda hora, principalmente aos laboratórios de análises clínicas, é importante e deve ser feita no sentido de otimizarmos a interpretação deste teste simples, mas de inestimável importância na prática diária.

Referências

1. Fahraeus R: The suspension stability of the blood. Acta Med Scand 1921; 55:1-7.

2. Westergren A. Studies of the suspension stability of the blood in pulmonary tuberculosis, Acta Med Scand 1921; 54:247-51.

3. International Committee for Standartization in Hematology. Reference method for the Erythrocyte sedimentation Rate (ESR) Test in human blood. Br J Haematol 1973; 24:671-3.

4. Lanzara GL, Provenza JR, Bonfiglioli R. Velocidade de Hemossedimentação (VHS) de segunda hora: Qual o seu valor? Rev Bras Reumatol 2001; 41:237-41.

5. Marques Filho J. VHS-Revisão. Arq Bras Med 1992; 66:265-7.

6. Almeida AC, Cecin HÁ. Hemossedimentação: Depois de 80 anos, ainda útil (Editorial). Rev Bras Reumatol 1999; 39:59-61.

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    21 Jul 2004
  • Data do Fascículo
    Abr 2004
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