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Sobre a morfologia dos dúctulos eferentes epididimários no cão (Canis familiaris, L.)

On the morphology of the ductuli efferentes in the dog (Canis familiaris, L.)

Resumos

A estrutura dos dúctulos eferentes no epidídimo do cão foi estudada através de microscopia óptica. Os dúctulos eferentes conectam a rede testicular com o segmento inicial do epidídimo. Os eferentes epididimários são revestidos por epitélio baixo do tipo cúbico ou cilíndrico simples, constituído por dois tipos celulares: células ciliadas e não-ciliadas. As características morfológicas dos eferentes são discutidas.

Morfologia; Cães; Condutos eferentes


The structure of the ductuli efferentes in the epididymis of the dog were studied by light microscopy. The efferent ductules connect the rete testis and the initial segment of the epididymis. Their epididymal segment is lined by a low simple cuboidal or columnar epithelium, which show basically nonciliated and ciliated cells. The morphological characteristics of ductuli efferentes are discussed in this report.

Morphology; Dogs; Efferents pathways


Sobre a morfologia dos dúctulos eferentes epididimários no cão (Canis familiaris, L.)

On the morphology of the ductuli efferentes in the dog (Canis familiaris, L.)

Bruno Cesar SCHIMMING1 1 Laboratório de Anatomia da Faculdade de Ciências da Saúde da Universidade de Marília, Marília ¾ SP 2 Departamento de Ciências Biológicas da Faculdade de Ciências da UNESP, Bauru ¾ SP ; Mara Alice Fernandes de ABREU2 1 Laboratório de Anatomia da Faculdade de Ciências da Saúde da Universidade de Marília, Marília ¾ SP 2 Departamento de Ciências Biológicas da Faculdade de Ciências da UNESP, Bauru ¾ SP

CORRESPONDÊNCIA PARA:

Bruno Cesar Schimming

Laboratório de Anatomia da

Faculdade de Ciências da Saúde da

Universidade de Marília ¾ UNIMAR

Av. Hygino Muzzy Filho, 1.001

Campus Universitário

17525-902 ¾ Marília ¾ SP

e-mail: brunoidish@uol.com.br schimmin-fcs@unimar.br

RESUMO

A estrutura dos dúctulos eferentes no epidídimo do cão foi estudada através de microscopia óptica. Os dúctulos eferentes conectam a rede testicular com o segmento inicial do epidídimo. Os eferentes epididimários são revestidos por epitélio baixo do tipo cúbico ou cilíndrico simples, constituído por dois tipos celulares: células ciliadas e não-ciliadas. As características morfológicas dos eferentes são discutidas.

UNITERMOS: Morfologia; Cães; Condutos eferentes.

INTRODUÇÃO

Vários trabalhos têm reconhecido que os dúctulos eferentes são estruturalmente diferenciados ao longo de toda a sua extensão6,11,18. Reid; Cleland18 referem-se a duas porções anatômicas distintas: a zona inicial e os cones vasculosos. No hamster dourado, os dúctulos eferentes também mostram dois segmentos distintos: o testicular e o epididimário21. Por outro lado, Hemeida et al.12 afirmam que os dúctulos eferentes podem ser divididos em três segmentos distintos: um segmento testicular, moderadamente ondulado; um segmento médio, altamente espiralado e um segmento epididimário, também moderadamente espiralado e delgado. O segmento médio também pode ser denominado de segmento cônico. Este segmento corresponde ao bulbo dos "cones vasculosos" descrito na literatura clássica, sobre os mamíferos domésticos3, tendo aspecto cônico, ou de um cone truncado, localizado sobre o pólo cranial do testículo, precedendo aos dúctulos eferentes epididimários.

Os dúctulos eferentes fazem a conexão entre a via espermática intratesticular, representada pelo complexo da rede testicular e suas divisões, e a via espermática extratesticular, representada, por sua vez, pelo segmento inicial do epidídimo16,23. Entretanto, no homem19 e em animais como o rato4,11 e cobaia1, eles são precedidos por uma delicada rede extratesticular. Quando isto acontece, os dúctulos eferentes se originam diretamente na chamada rede extratesticular.

Embora haja muitos relatos sobre a morfologia dos dúctulos eferentes em roedores2,14,21, no gato22,23 e no bovino20 , a literatura referente ao cão é escassa. Assim, objetivou-se descrever a estrutura dos dúctulos eferentes epididimários no cão, comparativamente com as de outras espécies.

MATERIAL E MÉTODO

No presente trabalho foram utilizados, em conjunto, testículos e epidídimos de cinco cães (Canis familiaris, L.), sexualmente maduros, sem raça definida, retirados de forma a permitirem inclusão histológica do pólo cranial dos testículos e da parte proximal da cabeça do epidídimo. Os animais eram provenientes do Biotério Central do campus de Botucatu, UNESP, e destinados a experimentações biomédicas ou a estudos anatômicos de cursos de graduação.

Após fixação em líquido de Bouin por 24 h, o material foi destinado à rotina histológica para inclusão em parafina, à microtomia com obtenção de cortes de 7 µm e a colorações para estudos morfológicos: H/E e Tricrômicos de Masson e de Mallory. A análise e a fotodocumentação do material foram realizadas em microscópio óptico Olympus BH-2.

RESULTADOS

Os dúctulos eferentes conectam a via espermática intratesticular (rede testicular) com a parte proximal da via espermática extratesticular (ducto epididimário), localizando-se junto à extremidade cranial do testículo, na altura da cabeça epididimária.

Os dúctulos eferentes epididimários, no cão, são contínuos aos eferentes procedentes do testículo, e precedem ao segmento inicial epididimário (Fig. 1). Eles se caracterizam por apresentar epitélio baixo entre cúbico e cilíndrico simples, e que repousa sobre membrana basal conspícua. Este epitélio delimita luz relativamente ampla e de contorno irregular e predominantemente ovalada. Na luz observa-se pouco ou nenhum conteúdo luminal, representado pelas esfoliações celulares, constituídas por células descamadas do epitélio seminífero e por alguns espermatozóides recém-liberados (Fig. 1 e 2).



Entre o epitélio de revestimento dos dúctulos eferentes observa-se uma túnica formada por tecido conjuntivo frouxo, onde são encontrados fibras colágenas, fibroblastos, delicadas fibras musculares lisas, vasos sangüíneos e células migratórias do tecido conjuntivo, que é denominado de estroma peritubular (Fig. 1 e 2). Infrajacente à membrana basal, que separa o epitélio de revestimento da túnica conjuntiva-muscular, evidencia-se a presença de inúmeras células mióides (Fig. 4).



O epitélio de revestimento é formado por dois tipos celulares distintos: células ciliadas e células não-ciliadas (Fig. 3 e 4). As células ciliadas são células predominantemente cilíndricas, com núcleos alongados, ovóides, de posição justabasal, com cromatina densa e nucléolos evidentes (Fig. 3 e 4). As células não-ciliadas são predominantemente cúbicas, com núcleos entre esféricos e quadrangulares com nucléolos evidentes e cromatina menos densa e grosseiramente granular ou em crostas. A posição nuclear tende a ser mais mediana (Fig. 3 e 4).

DISCUSSÃO

A estrutura morfológica geral dos dúctulos eferentes epididimários, no cão, é semelhante à descrita para outras espécies de mamíferos20,23.

Os dúctulos eferentes epididimários são revestidos por um epitélio do tipo cúbico a cilíndrico simples. Esta variação do padrão de revestimento epitelial também foi observada no zebuíno20. Orsi et al.17 afirmam que o epitélio destes dúctulos, no gambá sul-americano, é do tipo cilíndrico simples; já para Viotto et al.23, o epitélio encontrado no gato é do tipo cúbico simples. Contrariamente, no rato14, os dúctulos eferentes são revestidos por um epitélio colunar pseudo-estratificado.

Circundando o epitélio, foi observada uma túnica conjuntiva-muscular, o estroma peritubular, com constituintes similares ao encontrado no tecido conjuntivo frouxo do bovino zebu20 e do gato23. Além disso, a presença de grande número de células mióides dispostas ao redor da membrana basal também foi relatada no gato23.

Sobre a população celular constituinte do epitélio de revestimento, dois tipos básicos são encontrados na maioria dos animais estudados: células ciliadas e células não-ciliadas12,14,17,20, conforme relatado neste estudo.

Com base em estudos ultra-estruturais9, sugere-se que as células ciliadas são morfologicamente semelhantes em todas as espécies estudadas, ao passo que as células não-ciliadas variam entre as espécies. Em pequenos animais, há um tipo de célula não-ciliada caracterizada como célula absortiva11. Por outro lado, elas são classificadas em três tipos nos touros8 e caprinos10.

Há um outro tipo celular, os linfócitos intra-epiteliais, observados nos eferentes de outras espécies14,17,20 e não encontrado no cão. Possivelmente, os linfócitos intra-epiteliais ou células halo, como também são denominados, estejam associados com a segregação de antígenos antiespermáticos5.

As células ciliadas e as não-ciliadas parecem estar, citofisiologicamente, associadas com processos de absorção e/ou secreção celulares17. Martan et al.15 descreveram as propriedades citoquímicas das células não-ciliadas com o emprego de reações específicas, caracterizando a sua atividade secretora, o que para esses autores é difícil de ser evidenciada com as colorações morfológicas rotineiras, como as utilizadas neste trabalho.

A ultra-estrutura apresentada pelas células dos dúctulos eferentes, os quais possuem citoplasma com aparelho de Golgi com possíveis inter-relações com o retículo endoplasmático rugoso e polissomas, é sugestiva de processos citofisiológicos de concentração e deportação de macromoléculas, ou simplesmente, de secreção22.

Sabe-se que os dúctulos eferentes de mamíferos reabsorvem proteínas oriundas dos testículos. Há relatos que citam a absorção de substâncias introduzidas experimentalmente no lúmen tubular, como peroxidase, ferritina e albumina13. Estes achados possibilitam aventar que os eferentes também estejam envolvidos na reabsorção de fluidos luminais13.

Além disso, Goyal; Hrudka8 e Goyal7 afirmam que as células epiteliais, nos dúctulos eferentes, possuem também a habilidade para fagocitar e digerir espermatozóides, o que não pôde ser observado no cão, em nível de microscopia óptica. Esta função estaria, possivelmente, relacionada com o papel seletivo de espermatozóides, morfologicamente mais perfeitos, o que consolida a sua habilitação de fertilização no epidídimo20.

SUMMARY

The structure of the ductuli efferentes in the epididymis of the dog were studied by light microscopy. The efferent ductules connect the rete testis and the initial segment of the epididymis. Their epididymal segment is lined by a low simple cuboidal or columnar epithelium, which show basically nonciliated and ciliated cells. The morphological characteristics of ductuli efferentes are discussed in this report.

UNITERMS: Morphology; Dogs; Efferents pathways.

Recebido para publicação: 30/10/2000

Aprovado para publicação: 02/07/2001

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  • 1
    Laboratório de Anatomia da Faculdade de Ciências da Saúde da Universidade de Marília, Marília ¾ SP
    2
    Departamento de Ciências Biológicas da Faculdade de Ciências da UNESP, Bauru ¾ SP
  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      19 Jun 2002
    • Data do Fascículo
      2001

    Histórico

    • Aceito
      02 Jul 2001
    • Recebido
      30 Out 2000
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