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Cartografia como Método de Pesquisa para Estudos de Trabalho e Subjetividade

RESUMO

Objetivo:

apresentar a cartografia como método relevante aos estudos relativos a trabalho e subjetividade na área de Administração.

Proposta:

fundamenta-se a cartografia com base no conceito de rizoma, de Deleuze e Guattari, seu alinhamento ao pós-estruturalismo, alguns estudos na Administração, bem como propõe-se o flâneur-cartógrafo como prática transversal à pesquisa. Para ilustrar o uso da cartografia, descreve-se o percurso cartográfico de uma pesquisa sobre processos de subjetivação que compõem o trabalho imaterial de migrantes e refugiados no Brasil.

Conclusões:

o rastreio, o toque, o pouso, o reconhecimento atento e, sobretudo, o percurso como flâneur-cartógrafo guiam a aproximação do território. Observação-participante de eventos-atividades e entrevista-encontro entre os diversos participantes são estratégias simultâneas para acompanhar a processualidade do território evidenciando a pesquisa-participação ou investigação-interação, o papel político do cartógrafo e o ethos de confiança necessário na cartografia. A análise dos dados produzidos em conjunto ocorre ao longo da pesquisa. Mantendo a vigilância às normas científicas, a cartografia se configura como método afetivo e político para acompanhar a relação entre trabalho e subjetividade em territórios existenciais de difícil acesso. Logo, também apresenta uma contribuição social com um quê de acolhimento da multiplicidade, alteridade e mobilidade.

Palavras-chave:
cartografia; método de pesquisa; subjetividade; trabalho; migração

ABSTRACT

Objective:

the study aims to present cartography as a suitable method to research work and subjectivity in administration.

Proposal:

in this article, cartography is supported by Deleuze and Guattari’s concept of ‘rhizome,’ aligned to post-structuralism and grounded on administration studies. Finally, this study proposes the flâneur-cartographer as a cross-cutting practice in research. The use of cartography is illustrated by describing the cartographic path of a study on subjectivation processes that make up the immaterial labor of migrants and refugees in Brazil.

Conclusions:

tracking, touching, landing, attentive recognition, and, above all, the journey as a flâneur-cartographer guide the approach to the territory. Participant-observation of events-activities and interview-meeting with the various participants are simultaneous strategies to follow the processes of the territory, evidencing the research-participation or investigation-interaction, the cartographer’s political role, and the ethos of trust necessary in cartography. The analysis of the jointly produced data occurs throughout the research. Keeping vigilance to scientific norms, cartography configures itself as an affective and political method to assess the relationship between work and subjectivity in existential territories of difficult access. Therefore, the method offers a social contribution, welcoming multiplicity, alterity, and mobility.

Keywords:
cartography; research method; subjectivity; labor; migration

INTRODUÇÃO

Originalmente, a cartografia vem de estudos da Geografia e tem como objetivo orientar a elaboração de representações gráficas do espaço através de mapas, cartas, plantas de paisagens físicas. Mais recentemente a área também tem produzido o que denomina-se cartografia social, ao acrescentar um olhar interdisciplinar para a produção de mapas coletivos construídos por profissionais junto com a comunidade em estudo. Segundo Rolnik (2006Rolnik, S. (2006). Cartografia sentimental: Transformações contemporâneas do desejo. Porto Alegre: Sulina.), a cartografia ainda pode se apresentar como “um desenho que acompanha e se faz ao mesmo tempo que as transformações da paisagem” (Rolnik, 2006, p. 23), de modo que as paisagens psicossociais também são possíveis de cartografar, o que a autora nomeia como cartografia sentimental ou cartografia psicossocial.

Essa perspectiva da cartografia é fundamentada na obra filosófica de Deleuze e Guattari, sobretudo a partir do texto “Rizoma”, introdução do volume 1 do livro Mil platôs, originalmente publicado em 1980. Rolnik (2006Rolnik, S. (2006). Cartografia sentimental: Transformações contemporâneas do desejo. Porto Alegre: Sulina.), assim como Fonseca e Kirst (2003Fonseca, T., & Kirst, P. (2003). Cartografias e devires: A construção do presente. Porto Alegre: Editora da UFRGS.) e Passos, Kastrup e Escóssia (2015Passos, E., Kastrup, V., & Escóssia, L. (2015). Pistas do método da cartografia: Pesquisa-intervenção e produção de subjetividade. Porto Alegre: Sulina.), são referências no Brasil que apresentam uma construção coletiva que remete à cartografia como um modo de pesquisar para acompanhar processos de produção de subjetividades “que ocorrem a partir de uma configuração de elementos, forças ou linhas que atuam simultaneamente” (Kastrup & Barros, 2015Barros, R. B., & Passos, E. (2015). Diário de bordo de uma viagem-intervenção. In E. Passos, V. Kastrup, & L. Escóssia (Orgs.), Pistas do método da cartografia: Pesquisa-intervenção e produção de subjetividade (pp. 172-200). Porto Alegre: Sulina., p. 77), e que é como compreende-se a cartografia neste artigo. Esta cartografia lida com matérias relativas à vida, à subjetividade, algo que é simultaneamente singular e coletivo. Por isso não é nada estanque, está sempre em movimento, e se caracteriza por ser relacional, por estabelecer relações entre o sujeito-participante e o seu meio. Por estar sempre “entre”, não visa a um resultado, uma conclusão, mas sim o processo (Costa, 2014Costa, L. B. (2014). Cartografia: Uma outra forma de pesquisar. Revista Digital do LAV, 7(2), 66-77. https://doi.org/10.5902/1983734815111
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).

Uma revisão integrativa de publicações brasileiras realizada por Cintra, Mesquita, Matumoto e Fortuna (2017Cintra, A. M. S., Mesquita, L. P., Matumoto, S., & Fortuna, C. M. (2017). Cartografia nas pesquisas científicas: Uma revisão integrativa. Fractal: Revista de Psicologia, 29(1), 45-53. https://doi.org/10.22409/1984-0292/v29i1/1453
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) revela que a cartografia tem sido praticada especialmente nas áreas de Saúde, Educação e Serviço Social. A maioria dos estudos cartográficos contempla espaços formais, com relações disciplinares e normatizadas, como instituições governamentais, prisões, escolas, hospitais e, ainda, redes sociais e outros espaços digitais típicos da sociedade de controle. Há também os que abarcam conexões da composição do sujeito com o mundo do trabalho, aproximando-se da área da Administração, referindo-se a coletivos específicos, como profissionais da saúde, docentes, comissários de voo, para citar alguns. O posicionamento crítico, a horizontalidade entre pesquisador e objeto, já que ambos são participantes da pesquisa, o compromisso ético-político em defesa da vida, a afetação pela diferença e o questionamento dos modos de vivenciar os espaços pesquisados são características comuns a estes estudos possibilitadas pelo uso da cartografia.

Na Administração, Weber, Grisci e Paulon (2012Weber, L., Grisci, C. L. I., & Paulon, S. M. (2012). Cartografia: Aproximação metodológica para produção do conhecimento em gestão de pessoas. Cadernos EBAPE.BR, 10(4), 841-857. https://doi.org/10.1590/S1679-39512012000400005
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) salientam que exíguas pesquisas expressam a potencialidade da cartografia como método, especialmente em relação ao campo de gestão de pessoas e relações de trabalho, que tem a subjetividade como um importante escopo de estudo. Nesta linha, as autoras encorajam seu uso como “alternativa aos métodos tradicionais de pesquisa, contribuindo, dessa forma, para a produção do conhecimento sobre o trabalho no cenário contemporâneo” (Weber, Grisci, & Paulon, 2012, p. 841). Ressalta-se que, embora a Administração venha apresentando certa abertura a diferentes epistemologias, a perspectiva funcionalista que caracteriza a organização moderna (Zioli, Ichikawa, & Mendes, 2021Zioli, E. G. O., Ichikawa, E. Y., & Mendes, L. (2021). Contribuições de Deleuze e Guattari para uma perspectiva rizomática das organizações. Cadernos EBAPE.BR, 19(3), 552-563. https://doi.org/10.1590/1679-395120200113
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), conhecida como management, ainda se configura como mainstream que conduz a decalques metodológicos. E pesquisar modos de trabalhar e organizar condizentes a movimentos de subjetivação demanda novas práticas metodológicas que possibilitem um mapeamento das transformações de um território e que priorizem a mobilidade da vida (e por isso também a mobilidade do pesquisador), o que encontra-se nesta perspectiva da cartografia.

Nesse sentido, o objetivo deste artigo é apresentar a cartografia como método relevante aos estudos relativos a trabalho e subjetividade na área de Administração. Para isso, além de fundamentar sua gênese e seus preceitos teóricos, ilustra o uso da cartografia ao descrever o percurso cartográfico de um estudo empírico sobre processos de subjetivação que compõem o trabalho imaterial de migrantes e refugiados.

Para o desenvolvimento da pesquisa, a cartografia esteve em constante rearranjo teórico-metodológico-empírico para a aproximação e acesso a um território de pesquisa que privilegiasse migrantes e refugiados do sul global que fazem uso de referências de seus países de origem para trabalhar - características que ilustram facetas do trabalho imaterial, aquele que demanda a vida do indivíduo, isto é, a sua subjetividade no cerne do processo de (auto)produção enquanto trabalhador (Gorz, 2005Gorz, A. (2005). O imaterial: Conhecimento, valor e capital. São Paulo: Annablume.). Desse modo, realizou-se um percurso como flâneur-cartógrafa - o qual revelou-se como contribuição transversal e significativa para a pesquisa - no cenário de migração da cidade de Porto Alegre, capital do estado do Rio Grande do Sul, Brasil. Esta prática possibilitou acompanhar um território existencial em que sujeito e objeto de pesquisa participam conjuntamente, se relacionam e se (co)determinam (Alvarez & Passos, 2015Passos, E., Kastrup, V., & Escóssia, L. (2015). Pistas do método da cartografia: Pesquisa-intervenção e produção de subjetividade. Porto Alegre: Sulina.), ou seja, expressam processos de subjetivação do trabalho imaterial desses migrantes e refugiados. Tal ilustração busca mostrar o potencial da cartografia e encorajar estudos cartográficos com outros sujeitos de pesquisa e sua relação com o trabalho.

A seguir, apresenta-se o alinhamento da cartografia ao pensamento pós-estruturalista e os estudos na Administração, e as pistas teóricas da prática do método cartográfico. Na sequência, com base nesse aporte epistemo-teórico-metodológico, expõe-se empiricamente como ocorreu a aproximação do território e como foram delineadas as estratégias e os procedimentos de produção da cartografia. Por fim, apresentam-se os procedimentos de análise dos dados produzidos e as reflexões finais que apontam diferenciais e contribuições da cartografia em pesquisas de Administração.

PÓS-ESTRUTURALISMO, CARTOGRAFIA E OS ESTUDOS NA ADMINISTRAÇÃO

O sentido da cartografia está no acompanhamento de percursos, nas implicações em processos de produção e na conexão de redes ou rizomas (Passos, Kastrup, & Escóssia, 2015Passos, E., Kastrup, V., & Escóssia, L. (2015). Pistas do método da cartografia: Pesquisa-intervenção e produção de subjetividade. Porto Alegre: Sulina.). A cartografia surge como princípio do rizoma, conceito filosófico de Deleuze e Guattari (2011Deleuze, G., & Guattari, F. (2011). Mil platôs: Capitalismo e esquizofrenia. (Vol. 1, 2 ed.). São Paulo: Editora 34.), em razão das linhas, conexões, heterogeneidades e multiplicidades experimentadas na realidade que se apresenta. O rizoma, diferente da raiz, não se desenvolve seguindo uma linha arborescente de evolução, mas uma lógica dos múltiplos singulares. Possui diversos centros que são móveis, funciona por proximidade e não por decalques.

Da cartografia, tem-se o mapa que faz parte do rizoma; o mapa tem múltiplas entradas, “é aberto, é conectável, em todas as suas dimensões, desmontável, reversível, suscetível de receber modificações constantemente” (Deleuze & Guattari, 2011Deleuze, G., & Guattari, F. (2011). Mil platôs: Capitalismo e esquizofrenia. (Vol. 1, 2 ed.). São Paulo: Editora 34., p. 30). Assim a cartografia se diferencia de um decalque, pois este “volta sempre ao mesmo”, é uma reprodução, um modelo, uma cópia (Deleuze & Guattari, 2011, p. 30). Tais características ajudam a compreender como o território da pesquisa empírica foi acessado - não seguiu um modelo, mas o processo do campo, isto é, a cartografia consiste em uma produção de mapas das linhas que se apresentam e compõem relações no território, que é sempre movente.

O rizoma não é apenas um conceito, mas um abrir portas à investigação de elementos marginalizados pelas formas de conhecimento dominantes, ou que lhes escapavam de alguma maneira (Cavalcanti, 2016Cavalcanti, M. F. R. (2016). Estudos organizacionais e filosofia: A contribuição de Deleuze. Revista de Administração de Empresas, 56(2), 182-191. https://doi.org/10.1590/S0034-759020160205
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). Como princípio rizomático, a cartografia tem em sua forma de operar “um movimento no mundo diferente do clássico-cartesiano” (Pozzana, 2013Pozzana, L. (2013). A formação do cartógrafo é o mundo: Corporificação e afetabilidade. Fractal: Revista de Psicologia, 25(2), 323-338. https://doi.org/10.1590/S1984-02922013000200007
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, p. 335). É como se fosse um modo de vida que leva à experimentação, e por isso também condiz ao pensamento pós-estruturalista.

Movimento criativo, constantemente aberto ao novo e indisposto a certezas finais e absolutas, para Williams (2017Williams, J. (2017). Pós-estruturalismo (2 ed.) Petrópolis, RJ: Vozes.) “o pós-estruturalismo é uma prática” (Williams, 2017, p. 20). Trata-se de uma prática crítica ao corporificar uma rede de pensamento interdisciplinar, que questiona os status privilegiados de dicotomias ou binarismos (Peters, 2000Peters, M. (2000). Pós-estruturalismo e filosofia da diferença [uma introdução]. Belo Horizonte: Autêntica.). O pensamento pós-estruturalista se revela como uma ruptura, em que se encontram resistências ou poder de resistir e trabalhar contra oposições estabelecidas (Williams, 2017).

A cartografia a partir desse olhar epistemo-teórico-metodológico tem despertado interesse, ainda pontual e incipiente, nos estudos com foco em trabalho e subjetividade que remetem ao campo da Administração. Há, por exemplo, o estudo de Balestrin e Strey (2009Balestrin, V. G., & Strey, M. N. (2009). Corpos-trabalhadores: Cartografias do consumo e da subjetividade contemporânea. Gestão e Desenvolvimento, 6(1), 107-115. Retrieved from https://www.redalyc.org/articulo.oa?id=514252214009
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), que reflete sobre os modos de trabalhar e de consumir na contemporaneidade, a partir de histórias de trabalhadores/as do comércio. Os mapeamentos refletem em pequenas práticas do cotidiano que produzem determinadas verdades sociais e matizes de gênero em um território aberto a conexões e devires, que fazem dos modos de trabalhar no comércio um potente dispositivo de subjetivação. Há, também, o estudo de Weber et al. (2012Weber, L., Grisci, C. L. I., & Paulon, S. M. (2012). Cartografia: Aproximação metodológica para produção do conhecimento em gestão de pessoas. Cadernos EBAPE.BR, 10(4), 841-857. https://doi.org/10.1590/S1679-39512012000400005
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), que apresenta um percurso metodológico de uma pesquisa em andamento que apreende conexões efetuadas em um blog coletivo ligado a uma política pública e analisa possibilidades de cooperação na produção do trabalho e de si. Ao apresentar a cartografia, as autoras argumentam sobre sua inovação na construção do conhecimento em Administração.

Cabe ainda destacar que há estudos que propõem a análise das organizações a partir do princípio do rizoma e da obra de Deleuze e Guattari (Barreto, Carrieri, & Romagnoli, 2020Barreto, R. O., Carrieri, A. P., & Romagnoli, R. C. (2020). O rizoma deleuze-guattariano nas pesquisas em estudos organizacionais. Cadernos EBAPE.BR, 18(1), 47-60. https://doi.org/10.1590/1679-395174655x
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; Cavalcanti, 2016Cavalcanti, M. F. R. (2016). Estudos organizacionais e filosofia: A contribuição de Deleuze. Revista de Administração de Empresas, 56(2), 182-191. https://doi.org/10.1590/S0034-759020160205
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; Grisci, 2008Grisci, C. L. I. (2008). Trabalho imaterial, controle rizomático e subjetividade no novo paradigma tecnológico. RAE-Eletrônica, 7(1). https://doi.org/10.1590/S1676-56482008000100005
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; Paes & Borges, 2016Paes, K. D., & Borges, F. A. (2016). O sujeito lacaniano e a organização rizomática: Devires-máquinas-de-guerra. Farol - Revista de Estudos Organizacionais e Sociedade, 3(7), 670-720. https://doi.org/10.25113/farol.v3i7.2753
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; Zioli et al., 2021Zioli, E. G. O., Ichikawa, E. Y., & Mendes, L. (2021). Contribuições de Deleuze e Guattari para uma perspectiva rizomática das organizações. Cadernos EBAPE.BR, 19(3), 552-563. https://doi.org/10.1590/1679-395120200113
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), o que reforça a potencialidade do uso da cartografia como modo de pesquisar a partir deste olhar na Administração.

Os fundamentos apresentados, intrinsecamente relacionados ao objetivo da pesquisa empírica que ilustra este artigo, são alicerces para a formulação de ações e cuidados à prática da cartografia, conforme se faz notar por meio das pistas apresentadas a seguir.

PISTAS DO MÉTODO CARTOGRÁFICO

O método cartográfico não se vê como algo pronto e acabado, com regras gerais para serem aplicadas (Kastrup & Barros, 2015Kastrup, V., & Barros, R. B. (2015). Pista 4 - movimentos-funções do dispositivo na prática da cartografia. In E. Passos, V. Kastrup, & L. Escóssia (Orgs.), Pistas do método da cartografia: Pesquisa-intervenção e produção de subjetividade (pp. 76-91). Porto Alegre: Sulina.), por isso se utiliza de pistas como “referências que concorrem para a manutenção de uma atitude de abertura ao que vai se produzindo e de calibragem do caminhar no percurso da pesquisa” (Passos et al., 2015Passos, E., Kastrup, V., & Escóssia, L. (2015). Pistas do método da cartografia: Pesquisa-intervenção e produção de subjetividade. Porto Alegre: Sulina., p. 13). Oito pistas são encontradas na obra de Passos et al. (2015) e antes de elencá-las, apresenta-se uma proposição sobre uma prática transversal às pistas na cartografia: o(a) flâneur-cartógrafo(a). Defende-se haver a necessidade de avançar na construção cartográfica, evidenciando as contribuições do flâneur-cartógrafo, pois este opera na lógica da multiplicidade, alteridade e mobilidade necessárias no caminhar pelo território durante toda a pesquisa.

Flâneur-cartógrafo como prática transversal às pistas cartográficas - Romero e Zamora (2016Romero, M. L., & Zamora, M. H. (2016). Pesquisando cidade e subjetividade: Corpos e errâncias de um flâneur-cartógrafo. Psicologia em Estudo, 21(3), 451-461. https://doi.org/10.4025/psicolestud.v21i3.29787
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) relacionam a prática do flâneur com a do cartógrafo ao argumentar que o corpo do cartógrafo emerge como central para a metodologia da cartografia nos estudos de subjetividade. Jacques (2012Jacques, P. B. (2012). Elogio aos errantes. Salvador: EDUFBA.) explica que a figura do flâneur, presente nas obras de Charles Baudelaire e na releitura de Walter Benjamim, se refere a uma prática de errâncias urbanas. O flâneur se move conforme o ritmo da cidade, não se protege de experiências de choque com o outro, vive a alteridade, deixa-se fascinar, mas também reage, tem potência crítica. A autora ressalta que o flâneur tem algo de uma sensibilidade etnográfica, que aqui neste artigo também entende-se por cartográfica. Seu objetivo é mostrar aqueles que habitam a cidade e relatar essas experiências em narrativas, sob a forma de criações de interlocuções críticas. No movimento cartográfico, o pesquisador se move em linhas rizomáticas, produzindo agenciamentos de multiplicidades que, ao passo que o afetam, vão mudando a natureza e criando novas conexões. Dessa forma, o percurso de flâneur-cartógrafo é transversal a todo o fazer cartográfico e por isso, sua prática torna-se potencializadora das pistas da cartografia.

Pista 1 - A cartografia como método de pesquisa-participação ou investigação-interação - Para Passos e Barros (2015Passos, E., Kastrup, V., & Escóssia, L. (2015). Pistas do método da cartografia: Pesquisa-intervenção e produção de subjetividade. Porto Alegre: Sulina.a), o cartógrafo não segue um trabalho prescritivo, com regras e objetivos previamente estabelecidos. Contudo, é necessária uma orientação do percurso da pesquisa em um processo em que pesquisador, objeto e sujeitos interagem e produzem efeitos na investigação. Há uma inseparabilidade entre pesquisar e intervir, ou seja, para os autores, a pesquisa é intervenção. Logo, tanto a realidade quanto o pesquisador se transformam. Embora Passos e Barros (2015a) utilizem o termo ‘pesquisa-intervenção’, opta-se pelo uso do termo ‘pesquisa-participação’ ou ‘investigação-interação’, pois estes traduzem de forma mais apropriada e justa tanto o enunciado da pista quanto a prática exercida no território. Salienta-se que participação e interação na pesquisa requerem o movimento do pesquisador-participante e do sujeito-participante, logo, entende-se que o movimento é possibilitado pelo andar do flâneur-cartógrafo em conjunto com os demais participantes da pesquisa.

Pista 2 - A atenção no trabalho da cartógrafa - Kastrup (2015Kastrup, V., & Barros, R. B. (2015). Pista 4 - movimentos-funções do dispositivo na prática da cartografia. In E. Passos, V. Kastrup, & L. Escóssia (Orgs.), Pistas do método da cartografia: Pesquisa-intervenção e produção de subjetividade (pp. 76-91). Porto Alegre: Sulina.) defende a ideia de que na cartografia não há coleta de dados, mas uma produção de dados que necessita da atenção flutuante do cartógrafo para cenas e discursos, signos e forças circulantes que compõem processos. A autora define quatro gestos da atenção cartográfica: o rastreio, o toque, o pouso e o reconhecimento atento. O rastreio é uma “varredura do campo” (Kastrup, 2015, p. 40), metas que variam continuamente, pois o território ainda é desconhecido. O toque é um pequeno vislumbre que seleciona, a atenção do cartógrafo é capturada. O pouso acontece quando se vê o campo em uma espécie de zoom, (re)configurando o território de pesquisa. O reconhecimento atento se dá com o caminhar, ao vislumbrar o que acontece no território. Acrescenta-se que, embora possa haver argumentos no sentido de que o cartógrafo mantenha a atenção o tempo todo, entende-se que a captura de sua atenção não se alinha a um nível de racionalidade, sendo decorrente do território que em algum momento desperta, afeta, toma o flâneur-cartógrafo em seu caminhar cambaleante e cambiante.

Pista 3 - Cartografar é acompanhar processos - rastros, passos e pegadas - Segundo Barros e Kastrup (2015Kastrup, V., & Barros, R. B. (2015). Pista 4 - movimentos-funções do dispositivo na prática da cartografia. In E. Passos, V. Kastrup, & L. Escóssia (Orgs.), Pistas do método da cartografia: Pesquisa-intervenção e produção de subjetividade (pp. 76-91). Porto Alegre: Sulina.), na ciência moderna, as etapas de pesquisa (coleta, análise e discussão de dados) são realizadas em momentos distintos. Na pesquisa cartográfica, tem-se uma produção de dados por meio de passos sucessivos e inseparáveis. Cada passo é prolongado, pois carrega consigo o anterior. O cartógrafo entra em território no meio do processo já constituído de uma história e objetiva “desenhar a rede de forças à qual o objeto ou fenômeno em questão se encontra conectado” (Barros & Kastrup, 2015, p. 57). Tendo em vista os próprios rastros, passos, pegadas no percurso do flâneur-cartógrafo, na investigação-interação é entre os participantes que se dá a coprodução de conhecimento.

Pista 4 - Movimentos-funções do dispositivo na prática da cartografia - Kastrup e Barros (2015Kastrup, V., & Barros, R. B. (2015). Pista 4 - movimentos-funções do dispositivo na prática da cartografia. In E. Passos, V. Kastrup, & L. Escóssia (Orgs.), Pistas do método da cartografia: Pesquisa-intervenção e produção de subjetividade (pp. 76-91). Porto Alegre: Sulina.) reiteram que a cartografia não se serve de um modelo de investigação, mas requer procedimentos concretizados em dispositivos, que desempenham movimentos-função. As autoras se baseiam na ideia de Foucault e Deleuze de dispositivo como um conjunto de linhas de visibilidade, enunciação, força e subjetivação, que podem contemplar discursos, instituições, leis e enunciados científicos. Os movimentos-função podem ser de natureza diversa: de referência (funciona com certa regularidade) e de explicitação (determina as linhas do processo em curso), levando a outro movimento-função, o de produção/transformação da realidade. Acrescenta-se que também o flâneur-cartógrafo sofre os movimentos-função de referência e de explicitação, alterando o olhar sobre o território e sobre si.

Pista 5 - O coletivo de forças como plano de experiência cartográfica - Conforme Escóssia e Tedesco (2015Escóssia, L., & Tedesco, S. (2015). Pista 5 - o coletivo de forças como plano de experiência cartográfica. In E. Passos, V. Kastrup, & L. Escóssia (Orgs.), Pistas do método da cartografia: Pesquisa-intervenção e produção de subjetividade (pp. 92-108). Porto Alegre: Sulina.), a cartografia olha para “o plano movente da realidade das coisas” (Escóssia & Tedesco, 2015, p. 92). A fim de não limitar o olhar da pesquisa ao plano de formas, também compreendido como plano de organização da realidade (Deleuze & Parnet, 1998Deleuze, G., & Parnet, C. (1998). Diálogos. São Paulo: Escuta.), que consiste em contornos estáveis e definidos como formas, objetos ou sujeitos simples de serem identificados, o cartógrafo mobiliza esforços para outra face da mesma realidade: o plano coletivo de forças, também compreendido como plano de consistências ou de imanência (Deleuze & Parnet, 1998) que produzem esses elementos. A este último cabe compreender tudo aquilo que faz do pensamento uma potência, que não se reduz, que expande a partir de saltos, (i)mobilizações “para dar aos elementos novas relações de velocidade e de lentidão que os fazem … saltar de um agenciamento para o outro” (Deleuze & Parnet, 1998, p. 76). O coletivo aqui compreendido não é o mesmo que coletivo social (grupo de indivíduos), nem está em oposição ao individual. O coletivo remete às relações estabelecidas entre o plano das formas e o plano das forças, que produzem a realidade. Tais planos constroem entre si relações de reciprocidade e de cruzamentos múltiplos. Argumenta-se que o caminhar do flâneur-cartógrafo abre caminhos para acessar tais planos.

Pista 6 - Cartografia como dissolução do ponto de vista do observador - Passos e Eirado (2015Passos, E., Kastrup, V., & Escóssia, L. (2015). Pistas do método da cartografia: Pesquisa-intervenção e produção de subjetividade. Porto Alegre: Sulina.) defendem a ideia de dissolução do ponto de vista do observador. Isso significa que, ao cartógrafo, é requerida uma abertura aos diversos pontos de vista que habitam uma mesma experiência, sem deixar-se dominar pelas aparências. É preciso ir abrindo caminhos para as multiplicidades, abrindo

“as formas da realidade, aumentando seu quantum de transversalidade …, colocando lado a lado … a forma do fenômeno e as linhas de sua composição, fazendo ver que as linhas penetram as formas e que as formas são apenas arranjos de linhas de forças” (Passos & Eirado, 2015Passos, E., Kastrup, V., & Escóssia, L. (2015). Pistas do método da cartografia: Pesquisa-intervenção e produção de subjetividade. Porto Alegre: Sulina., p. 110).

Permitir-se e entregar-se ao caminhar cambaleante e cambiante é condição para que o flâneur-cartógrafo seja afetado na produção da cartografia.

Pista 7 - Cartografar é habitar um território existencial - Alvarez e Passos (2015Passos, E., Kastrup, V., & Escóssia, L. (2015). Pistas do método da cartografia: Pesquisa-intervenção e produção de subjetividade. Porto Alegre: Sulina.) dizem que é na imersão e no compartilhamento de um território existencial que “sujeito e objeto da pesquisa se relacionam e se codeterminam” (Alvarez & Passos, 2015, p. 31). Os autores se apoiam no conceito de território de Deleuze e Guattari - que preza por expressividade, personagens rítmicos e paisagens melódicas. “As paisagens vão sendo povoadas por personagens e estes vão pertencendo à paisagem … somos levados a afirmar que o ethos ou o território existencial está em constante processo de produção” (Alvarez & Passos, 2015, p. 134). Habitar o território requer um processo construtivo do pesquisador como um aprendiz-cartógrafo, o que argumenta-se poder estar relacionado à prática do flâneur.

Pista 8 - Por uma política da narratividade - Passos e Barros (2015Passos, E., Kastrup, V., & Escóssia, L. (2015). Pistas do método da cartografia: Pesquisa-intervenção e produção de subjetividade. Porto Alegre: Sulina.b, p. 151) defendem que a produção de conhecimento na cartografia ocorre por uma tomada de posição que compromete politicamente o pesquisador. A política é tomada em seu sentido amplo, uma “forma de atividade humana que, ligada ao poder, coloca em relação sujeitos, articula-os segundo regras ou normas não necessariamente jurídicas e legais”. A política da narratividade é a expressão do conhecimento sobre o mundo e sobre si, não se constituindo somente como problema teórico, mas também político.

Apresentados os fundamentos epistemo-teóricos, a seguir é ilustrado o percurso cartográfico do estudo empírico que tinha como propósito abordar os processos de subjetivação e o trabalho imaterial de migrantes e refugiados.

APROXIMAÇÃO DO TERRITÓRIO

O rastreio. Durante o primeiro ano de meu1 1 . Inspiradas em Alvarez e Passos (2015), optamos por não seguir a regra acadêmica de uniformização da pessoa da narrativa ao longo da pesquisa. Desse modo, utilizamos a linguagem impessoal no processo de construção e argumentação teórica, e a primeira pessoa nos momentos em que são narradas as intervenções como cartógrafa ativa no movimento da pesquisa. doutorado, em 2016, buscava, em disciplinas, leituras, espaços de circulação, modos de trabalhar que pudessem indicar pistas de temas para a tese. Era uma época de vasta cobertura midiática internacional da “crise” dos refugiados. Imagens de barcos lotados de pessoas atravessando o mar para chegar à Europa e de indivíduos tentando atravessar a pé as fronteiras secas do Brasil ficaram capturadas na minha mente. Sensível ao que se repetia nos noticiários, lembro-me da sensação de indignação e de impotência que senti diante de vidas que eram empurradas a deixar suas terras, o que eu já associava às forças capitalísticas da globalização.

O toque. Ao andar pelas ruas em Porto Alegre minha atenção era direcionada a indivíduos que conversavam em idiomas que eu não identificava e que trajavam vestimentas ou possuíam características corporificadas como estrangeiras. Eram os ‘novos rostos’ da migração, como escutei uma vez em uma palestra, o que hoje associo às migrações sul-sul. Perguntava-me, então, sobre como essas pessoas refaziam suas vidas no Brasil. Tais indagações, ainda de forma nebulosa e muito ampla, eram vislumbradas como possibilidades de pesquisa. Como pesquisadora, sempre estive atenta a olhar para indivíduos em contextos interculturais, de modo que vi nesse tema um assunto do qual a academia, especialmente na minha área de atuação, não se aproximava. Busquei em bases de dados as produções sobre o tema. O vácuo na área de Administração alertou sobre a necessidade de dar luz a essa situação, especialmente porque eu partia do pressuposto de que a inserção dos refugiados no mercado de trabalho é fundamental para que esses indivíduos possam viver em outro país. Dessa forma, entendi que esse tema deveria ter a atenção da Administração. Mas qual seria o foco? Fui percebendo a predominância de discussões sobre trabalho precário, xenofobia e racismo. Tudo isso ainda possibilitava uma visão panorâmica, não ajustada, mas que revelava pistas importantes a serem juntadas para dar continuidade ao processo.

O pouso. Inesperadamente, aconteceu o ajuste do olhar. Era 2017, quando fui a um salão de beleza fazer design de sobrancelha e o proprietário me apresentou um profissional sírio que fazia depilação egípcia - procedimento realizado com o manusear de uma linha. “Ele é sírio, mas aprendeu a depilação egípcia no Egito mesmo. Ele já esteve lá e em vários outros países fugindo da guerra”, disse o dono do salão. A forma como me foi apresentado o serviço ressaltava a rentabilização dos saberes específicos de um refugiado, condizentes à noção teórica de trabalho imaterial. Decidi por trabalhar esse tema de pesquisa atenta aos desafios vindouros. No episódio que descrevi, o sírio não falava português, só árabe e inglês básico. Naquele momento, trocamos apenas poucas palavras em inglês junto a gestos e olhares de quem queria se expressar mais, que despertaram minha curiosidade. Quem me contou sua história foi o dono do salão, que o acolheu por fazer parte de uma grande comunidade de descendentes árabes da cidade. Naquele cenário, vi formas de relações de vida-trabalho vivenciadas pela mobilidade internacional muito diferentes das predominantes nos estudos da Administração, focadas na mobilidade de expatriados e gestores globais em empresas multinacionais.

O reconhecimento atento. Porto Alegre consta na 8ª colocação dentre os municípios do Brasil com mais alto registro de migrantes (14.107), e na 17ª colocação entre aqueles com mais alto registro de solicitações de refúgio (237), conforme o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (2019). Apesar desses números expressivos, não estava claro para mim por onde começar a pesquisa de campo. Eu buscava refugiados que trabalhassem com referências de seu país de origem, mas, em meus primeiros passos, guiados por uma visão ótica, não os encontrava. Era preciso dar passos mais largos, mais intensos, guiados por uma percepção háptica, como sugerem Deleuze e Guattari (2011Deleuze, G., & Guattari, F. (2011). Mil platôs: Capitalismo e esquizofrenia. (Vol. 1, 2 ed.). São Paulo: Editora 34.). O encontro com os participantes da pesquisa ocorreu após longo percurso, o que me levou ao grato encontro com a cartografia e à sua escolha como método de pesquisa. A cartografia desenhou movimentos seguidos por uma atenção flutuante (Costa, Angeli, & Fonseca, 2015Costa, L. A., Angeli, A. A. C, & Fonseca, T. M. G. (2015). Cartografar. In T. M. G. Fonseca, M. L. Nascimento, & C. Maraschin (Orgs.), Pesquisar na diferença: Um abedecedário (pp. 43-46). Porto Alegre: Editora Sulina.), por uma experimentação de uma flâneur-cartógrafa.

A flâneur-cartógrafa. A ciência de que eu havia iniciado a minha prática como flâneur-cartógrafa iniciou em 2017, quando comecei a participar de seminários, reuniões e exposições organizadas por universidades, governo, organizações internacionais, religiosas e da sociedade civil, predominantemente em Porto Alegre. Mas é importante salientar que hoje percebo que a minha prática como flâneur iniciou mesmo no período de rastreio. Nos lugares em que circulei, contava para as pessoas sobre a minha pesquisa, o que rendeu muitas indicações de eventos-atividades (detalhados adiante) nos quais participei ativamente, tanto em momentos de discussão e sugestão quanto em organização de atividades. Para minha surpresa, cheguei a ser convidada a assumir a coordenação do comitê estadual sobre migração promovida pelo governo do estado. Ao recusar o convite, foi um dos vários momentos em que eu tinha que explicar que meu papel como pesquisadora-participante se mesclava com o de representante-participante da sociedade civil. Também cursei disciplina sobre imigração em Programa de Pós-Graduação em Antropologia Social, onde contatei pesquisadores especialistas no tema. Acompanhava notícias na mídia e páginas de instituições e de grupos de migrantes nas redes sociais.

Nesse período, ainda conheci projetos que fornecem assistência a migrantes e refugiados. Destaco o Cibai (Centro Ítalo-Brasileiro de Assistência e Instrução às Migrações), responsável por liderar ações humanitárias em uma paróquia da Igreja Católica em Porto Alegre. Iniciei um trabalho voluntário no Cibai como professora de português para migrantes e refugiados, de novembro/2017 a agosto/2018. Também participei, até 2019, de outras atividades, como passeios culturais e confraternizações e ministrei palestras sobre o mercado de trabalho brasileiro em parceria com outra voluntária.

Neste espaço, conheci muitos migrantes e refugiados de diferentes nacionalidades, escutei suas histórias. Muitas me provocaram sentimentos de angústia e impotência, que ao mesmo tempo me mobilizavam a ajudá-los de alguma forma. Por mais que se leiam em noticiários as situações de extrema vulnerabilidade desses indivíduos, escutá-las de alguém que fazia parte das relações do seu cotidiano tomava uma dimensão diferente que me fazia refletir sobre minha responsabilidade como pesquisadora-participante. Muitos me viam como alguém que trabalhava na instituição, então, em vários momentos, fui uma espécie de mediadora e porta-voz, no intuito de ajudá-los na compreensão de aspectos culturais e burocráticos locais, e também compartilhei tais experiências nos espaços de tomada de decisão política e comunitária.

Tornar-me flâneur-cartógrafa permitiu-me observar-interagir em eventos-atividades, detectar forças-circulantes, dispositivos, e aproximar-me de migrantes e refugiados. Esse período iniciado em 2016 perdurou até o término da pesquisa em 2020, embora certas conexões ainda permaneçam, pois o olhar atento e flutuante de cartógrafa me inseriu em uma rede que me mantém ativa no cenário de migração.

ESTRATÉGIAS E PROCEDIMENTOS DE PRODUÇÃO DA CARTOGRAFIA

O percurso como flâneur-cartógrafa permitiu a iniciação de um ‘cenário de migração de Porto Alegre’, cujas linhas foram se delineando quando a presença de pessoas e instituições nos eventos-atividades foi se repetindo. Para acompanhar processos desse território, utilizei a observação-participante e a entrevista como estratégias de produção de dados. Diante das múltiplas possibilidades que a cartografia instiga, estas duas técnicas para produção de dados foram eleitas por possibilitarem o registro e a manutenção de contato com os sujeitos-participantes em seu território existencial e por já serem familiares às autoras. Mas é preciso ficar claro que a cartografia não tem como pré-requisito qualquer técnica ou ferramenta metodológica e que diferentes metodologias inventivas são incentivadas. É preciso estar atento ao território e no território para mobilizar o que ele demanda em termos de operação da pesquisa.

Observação-participante - Para Barros e Kastrup (2015Kastrup, V., & Barros, R. B. (2015). Pista 4 - movimentos-funções do dispositivo na prática da cartografia. In E. Passos, V. Kastrup, & L. Escóssia (Orgs.), Pistas do método da cartografia: Pesquisa-intervenção e produção de subjetividade (pp. 76-91). Porto Alegre: Sulina.), a cartografia pode se aproximar da etnografia ao servir-se da observação participante e, a partir dela, poder habitar um território existencial. Dentre múltiplos elementos, é pela percepção visual, auditiva ou outra que o cartógrafo pousa sua atenção e ajusta as lentes, reconfigurando o campo de observação (Kastrup, 2015). O diário é o que torna visível a observação participante. Mais do que isso, esse procedimento dá “visibilidade ao processo de construção coletiva do conhecimento” (Barros & Kastrup, 2015, p. 71). Conforme Barros e Passos (2015Passos, E., Kastrup, V., & Escóssia, L. (2015). Pistas do método da cartografia: Pesquisa-intervenção e produção de subjetividade. Porto Alegre: Sulina.), o diário de bordo de uma viagem-intervenção, entendida aqui como viagem-interação, ao ser apresentado na pesquisa, restitui um texto analítico ampliado, pois imprime ideias tanto dos pesquisadores-participantes quanto dos pesquisados-participantes.

Entrevista - Para Tedesco, Sade e Caliman (2013Tedesco, S. H., Sade, C., & Caliman, L. V. (2013). A entrevista na pesquisa cartográfica: A experiência do dizer. Fractal: Revista de Psicologia, 25(2), 299-322. https://doi.org/10.1590/S1984-02922013000200006
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), a entrevista em uma cartografia deve considerar, concomitantemente, as experiências de vida ou o vivido da experiência, “que advém da reflexão do sujeito sobre as suas vivências e inclui seus relatos sobre histórias de vida, ou seja, o narrado de suas emoções, motivações” e a experiência pré-refletida, referente “à processualidade, ao plano da coemergência, plano comum, coletivo de forças, do qual advêm todos os conteúdos representacionais” (Tedesco, Sade, & Caliman, 2013, p. 302). Os autores ressaltam que a linguagem ajuda a compreender não apenas o conteúdo dito, mas a experiência do entrevistado, o que, no âmbito da pesquisa empírica com os migrantes-participantes e refugiados-participantes, foi considerado com atenção redobrada, em razão da maioria das entrevistas não ter sido realizada na língua-mãe dos participantes. Tais recomendações guiaram a produção de dados durante a participação nos eventos-atividades e nos encontros e entrevistas, como se vê a seguir.

Eventos-atividades e participantes da pesquisa - Os procedimentos de produção de dados são apresentados em três partes: (a) observação-participante de eventos-atividades; (b) entrevistas com informantes-chave; e (c) observação-participante e entrevistas com migrantes e refugiados. Tais partes não são subsequentes, ocorreram de forma simultânea de modo a acompanhar a processualidade do território (Barros & Kastrup, 2015Kastrup, V., & Barros, R. B. (2015). Pista 4 - movimentos-funções do dispositivo na prática da cartografia. In E. Passos, V. Kastrup, & L. Escóssia (Orgs.), Pistas do método da cartografia: Pesquisa-intervenção e produção de subjetividade (pp. 76-91). Porto Alegre: Sulina.).

A primeira parte se refere à observação-participante dos 36 eventos-atividades que vivenciei como flâneur-cartógrafa. A título de exemplificação, a Tabela 1 detalha três deles, classificando-os como evento-atividade acadêmico (Acad), político (Pol), social (Soc) e cultural (Cult) - esta classificação é representada por cores, mais adiante, na Figura 1.

Tabela 1
Percurso como flâneur-cartógrafa em Porto Alegre 2017-2019.

Figura 1
Ilustração do território-rizoma de pesquisa cartografado.

Sobre os eventos-atividades vivenciados e praticados, além de trazer amadurecimento e sensibilização do olhar, imbuída pela ideia da dissolução do meu ponto de vista enquanto pesquisadora (Passos & Eirado, 2015Passos, E., Kastrup, V., & Escóssia, L. (2015). Pistas do método da cartografia: Pesquisa-intervenção e produção de subjetividade. Porto Alegre: Sulina.) e assumindo a postura de uma participante-observadora praticando observação-participante (Barros & Kastrup, 2015Kastrup, V., & Barros, R. B. (2015). Pista 4 - movimentos-funções do dispositivo na prática da cartografia. In E. Passos, V. Kastrup, & L. Escóssia (Orgs.), Pistas do método da cartografia: Pesquisa-intervenção e produção de subjetividade (pp. 76-91). Porto Alegre: Sulina.), foi possível: (a) acessar dispositivos pelos movimentos-função de referência, explicitação e produção da realidade (Kastrup & Barros, 2015), como leis, portarias, acordos internacionais e instituições (públicas, internacionais, religiosas, da sociedade civil); (b) acompanhar processos relativos à funcionalidade dessas instituições, interagindo com seus agentes ao circular repetidamente nos eventos-atividades, conversar nos intervalos, dar sugestões, ministrar aulas e ajudar na organização de eventos com trabalho voluntário - delineando concretude ao caráter do que Passos e Barros (2015a) chamam de pesquisa-intervenção, e aqui enfatiza-se ser entendido como pesquisa-interação; (c) construir um plano coletivo de forças moventes (Escóssia & Tedesco, 2015Escóssia, L., & Tedesco, S. (2015). Pista 5 - o coletivo de forças como plano de experiência cartográfica. In E. Passos, V. Kastrup, & L. Escóssia (Orgs.), Pistas do método da cartografia: Pesquisa-intervenção e produção de subjetividade (pp. 92-108). Porto Alegre: Sulina.) ao (re)conhecer agentes (como os informantes-chave) e interatuar com eles, e ao me aproximar, conviver e interagir com migrantes e refugiados e seus trabalhos; (d) produzir diários de bordo com anotações das principais percepções relativas às vivências e aos relatos de conversas informais.

A segunda parte dos procedimentos de produção de dados se refere aos encontros com cinco informantes-chave, membros de organizações religiosas, sociedade civil, universidade e poder público, os quais foram escolhidos pela representatividade do cargo ou pela participação ativa nos eventos-atividades que evidenciavam as conexões estabelecidas com os migrantes e refugiados que chamaram a atenção da pesquisadora. Foram realizadas conversas com enfoque nas suas experiências de trabalho com migração. Também foram solicitadas informações sobre migrantes e refugiados que utilizam referências de seus países para trabalhar, o que resultou em mais participantes da pesquisa. A título de exemplificação, a Tabela 2 detalha as informações de três informantes-chave.

Tabela 2
Informantes-chave.

Saliento que a Organização Internacional para Migrações (OIM) e o Alto Comissariado das Nações Unidas para Refugiados (Acnur) também foram considerados informantes-chave, visto que realizei conversas informais com seus representantes durante os eventos-atividades e troquei e-mails que resultaram em indicações de documentos oficiais públicos.

A terceira parte dos procedimentos de produção de dados se refere a entrevistas abertas com migrantes e refugiados e à observação-participante de suas atividades laborais de forma presencial (locais de trabalho/residência e/ou eventos-atividades) e virtual (redes sociais, como Facebook, Instagram, YouTube e WhatsApp). Importante salientar que não havia um roteiro prévio e que, devido à aproximação já existente entre pesquisadora-participante e os demais participantes, muitas das experiências já tinham sido compartilhadas por eles em outros encontros e também evidenciadas pela observação-participante. Assim, esse momento da entrevista formal auxiliou na seleção de experiências importantes na visão dos migrantes e refugiados. A título de exemplificação, a Tabela 3 apresenta três dos 16 participantes designados por nomes de rios de seu país, remetendo a fluxos, movimentos, deslocamentos.

Tabela 3
Apresentação dos migrantes-participantes e refugiados-participantes.

A Tabela 3 possibilitou apresentar as primeiras análises relativas aos dados demográficos, situação legal no Brasil e elementos marcantes de suas histórias de vida. Cabe salientar os seis países do sul global de onde provêm os participantes da pesquisa, a saber, Venezuela, Haiti, Síria, Senegal, Costa do Marfim e Nigéria, e as referências dos países de origem utilizadas nos trabalhos desses migrantes e refugiados no Brasil relativas a alimentação, dança, idioma, moda, música e representação político-cultural, o que de antemão expressa a pluralidade de elementos que compõem a caracterização do trabalho imaterial ao combinar vendabilidade de si com elementos afetivos - que remetem ao seu país de origem - e políticos - que remetem à luta por seus direitos no país de destino.

Foi esta identificação das características vernáculas relativas aos seus modos de se alimentar, se vestir, dançar, cantar, falar, lutar por seus direitos e da própria situação de refúgio/migração como rentabilizadoras de seu trabalho, caracterizado no estudo como trabalho imaterial (Gorz, 2005Gorz, A. (2005). O imaterial: Conhecimento, valor e capital. São Paulo: Annablume.), que me sensibilizou como pesquisadora durante os encontros nos eventos-atividades. Por estarem exercendo seu trabalho, perguntar sobre seus produtos e serviços foi um ponto de partida para aproximação. Nessas primeiras conversas informais, senti necessidade que eles me conhecessem também. Eu falava sobre mim, minha história de vida, meus princípios e posições que me fizeram chegar a meus estudos e à cartografia que realizava. Sentia que isso os deixava mais à vontade para se expressar.

Ainda, eles também puderam me conhecer pela minha atuação nos eventos-atividades que se configuravam como espaços de poder e tomada de decisão, sempre em defesa pelo direito à migração e necessidade de organização coletiva, o que deixava evidente meu papel político enquanto cartógrafa. Era importante que isso ficasse claro para eles, pois a pesquisa cartográfica não pressupõe neutralidade. Compreendo que no ethos de confiança foram nascendo agenciamentos que permitiram o acompanhamento dos seus modos de viver e trabalhar, que são móveis e, por isso, exigiram mobilidade também da pesquisadora como flâneur-cartógrafa.

As entrevistas ocorreram nos locais de trabalho, de estudo ou nas residências dos participantes, ou ainda em cafés/restaurantes, conforme disponibilidade de agenda. A duração média das entrevistas foi de uma hora, e a língua utilizada para comunicação foi escolhida pelo entrevistado. As entrevistas em idioma estrangeiro foram traduzidas para o português e alguns trechos sofreram correção gramatical para melhor inteligibilidade. Ressalta-se que apenas determinadas palavras ou expressões foram mantidas nas línguas-mãe, com o intuito de dar valor à função performativa dos modos de dizer, conforme sugerem Passos e Barros (2015Passos, E., Kastrup, V., & Escóssia, L. (2015). Pistas do método da cartografia: Pesquisa-intervenção e produção de subjetividade. Porto Alegre: Sulina.b).

Ademais, encontrei, ocasionalmente, os migrantes e refugiados nos eventos-atividades e/ou em visitas aos seus locais de trabalho ou a suas residências. Observei seus perfis de Facebook, Instagram e WhatsApp a fim de acompanhar publicações referentes ao desenrolar da vida-trabalho. Esses encontros presenciais e virtuais fizeram parte do exercício de observação-participante do cotidiano de cada participante, o que possibilitou conversas informais registradas em diários de bordo.

A título de exemplificação, a Tabela 4 apresenta três entrevistas e encontros com os migrantes e refugiados, ilustrando como foi o processo de construção da cartografia.

Tabela 4
Entrevistas e encontros com os migrantes-participantes e refugiados-participantes.

A partir dos participantes identificados no meu percurso como flâneur-cartógrafa, elaborei a Figura 1, do território de pesquisa cartografado, apenas com os dados apresentados neste artigo para fins de exemplificação. É possível notar as relações existentes entre os três eventos-atividades (pontos coloridos), os três informantes-chave (pontos em laranja) e os sete migrantes-participantes e refugiados-participantes (pontos em azul) a partir das linhas que configuram um território-rizoma e, de antemão, indicam a formação de redes de cooperação, característica consubstanciada ao trabalho imaterial, nos percursos dos migrantes e refugiados. Cabe salientar que a trama das linhas está mais fechada no entorno dos informantes-chave e do migrante Falémé, devido à sua participação ativa nos eventos-atividades e à sua relação de agenciamento com a maioria dos migrantes e refugiados. E para trazer a ideia de que as interações não se limitam às linhas apresentadas, pois são abertas e conectáveis na lógica rizomática, é apresentada a imagem de um rizoma ao fundo da figura, salientando outras possíveis conexões, heterogeneidades e multiplicidades. No estudo empírico foi possível notar que as redes de cooperação formam fluxos e abrem caminhos para um movimento de singularização pelo exercício do trabalho imaterial, que se multiplica em oportunidades laborais em eventos, festivais, feiras, parcerias presenciais e virtuais.

Aspectos éticos - Ressalto que encontrar migrantes ou refugiados que permitissem uma aproximação e aceitassem contar sua história não foi tarefa fácil. Muitos não desejam se expor por medo de envolver a si ou a família em situações de risco. Um exemplo que serviu de termômetro foi o episódio ocorrido na festa junina do Cibai Migrações (E14). Segue trecho do diário de bordo narrando essa ocasião: “Eu estava conversando com o Fulano, meu aluno que é refugiado e em meio à conversa surgiu a oportunidade de contar sobre a minha pesquisa e convidá-lo a participar. Ele, que é um aluno alegre, extrovertido e participativo nas aulas, mudou completamente sua expressão facial e corporal quando fiz o convite. Sua face empalideceu e o corpo ficou agitado. Ele contou, com voz estremecida, que uma vez uma jornalista havia colocado seus dados na internet, mas que ele não poderia aparecer, então teve que insistir para que ela apagasse o que havia publicado. Eu expliquei que, diferente da situação anterior vivenciada, esta se trataria de uma pesquisa acadêmica que prezaria pelo sigilo da identidade dos entrevistados. Mas ele demonstrava medo. Mesmo assim, ele tocou em meu ombro e disse que, se fosse em sigilo, ele faria a entrevista, que poderíamos combinar outro dia pelo WhatsApp e foi saindo do local onde estávamos. Passados uns dias eu entrei em contato e ele respondeu que estava doente. Eu entendi que não poderia ultrapassar seus limites” (Diário de bordo, E14).

Nesse sentido, busquei prezar pelo bem-estar dos entrevistados, agindo de modo a deixá-los à vontade e confortáveis para que contassem e compartilhassem aquilo que julgassem conveniente. Para tanto, observei aspectos éticos, como o consentimento do participante mediante assinatura de documento que explica os objetivos do estudo, a dinâmica de realização, bem como a possibilidade de interrupção a qualquer momento, se assim ele desejasse.

É importante ressaltar a inseparabilidade entre os aspectos éticos e metodológicos e o ethos da confiança necessário na cartografia. É preciso manejar os vínculos no processo de pesquisa em um regime de contratação que permite a participação engajada e efetiva, de modo que o participante sinta a singularidade de sua participação (Sade, Ferraz, & Rocha, 2013Sade, C., Ferraz, G. C., & Rocha, J. M. (2013). O ethos da confiança na pesquisa cartográfica: Experiência compartilhada e aumento da potência de agir. Fractal: Revista de Psicologia, 25(2), 281-298. https://doi.org/10.1590/S1984-02922013000200005
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). Posso dizer que esse regime de contratação foi facilitado pela minha presença nos eventos-atividades, como ressaltou o haitiano Artibonite na ocasião da audiência pública sobre migrações (E24). “Eu estava na porta de entrada quando o Artibonite chegou e me avistou. Com feições de surpresa, exclamou: ‘Tu de novo aqui?! Tu estás, realmente, em todos os lugares (risos)’” (Diário de Bordo, E24). O que inicialmente poderia gerar desconfiança posteriormente foi revertido em laço mais estreito: “Estás gostando do evento? Eu tenho mais umas pessoas para te indicar para a tua pesquisa” (Artibonite, Diário de Bordo, E35). Isso mostra a percepção de importância de suas participações na pesquisa e a confiança que depositaram em mim enquanto cartógrafa. Dessa forma, pude verificar que, acompanhando Sade, Ferraz e Rocha (2013), “a pesquisa cartográfica opera confiando na potência dos encontros estabelecidos no processo de pesquisar” (Sade et al., 2013, p. 294) e que a confiança entre pesquisador-participante e os demais participantes contribui para o engajamento na pesquisa e ressalta o aspecto ético-político da prática da cartografia.

ANÁLISE DOS DADOS PRODUZIDOS

A análise na pesquisa cartográfica, segundo Barros e Barros (2013Barros, L. M. R., & Barros, M. E. B. (2013). O problema da análise em pesquisa cartográfica. Fractal: Revista de Psicologia, 25(2), 373-390. https://doi.org/10.1590/S1984-02922013000200010
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), é a análise de processos que se coloca ao lado das experiências, nem sempre óbvias ou instantaneamente acessíveis. É necessário um grau crescente de contato com a experiência para tomar as evidências. Assim, a análise na cartografia ocorre em todos os momentos da pesquisa e não somente após se ter o material em mãos, pois “a abertura à multiplicidade de sentidos não pode ser temporalmente localizada. Daí o paradoxo da análise, o de constituir-se ao mesmo tempo como um acesso à objetividade e como um procedimento de proliferação de sentidos e de singularização” (Barros & Barros, 2013, p. 388).

Nesse sentido, com os dados produzidos em mãos, passei ao manejo e à preparação dessas informações para fins de apresentação e análise. As entrevistas dos migrantes-participantes, refugiados-participantes e informantes-chave foram transcritas e, juntamente com as anotações em diários de bordo, totalizaram 434 páginas. Após as transcrições, áudio e texto foram revisados e, concomitantemente, em um movimento de varredura, já foram extraídos trechos de falas que caracterizassem os percursos dos migrantes e refugiados.

Apresentado o percurso cartográfico da pesquisa empírica, cabe ressaltar que em sequência foi apresentada a tessitura dos processos de subjetivação no percurso de migrantes e refugiados em dimensões analíticas. Para cada dimensão, realizei o trabalho de ir e voltar aos dados e ao referencial teórico, até pousar, de forma conjunta, em trechos que engendraram determinado tema. Priorizei a “experimentação no plano coletivo das forças, que não se restringe ao domínio das pessoalidades” (Barros & Barros, 2013Barros, L. M. R., & Barros, M. E. B. (2013). O problema da análise em pesquisa cartográfica. Fractal: Revista de Psicologia, 25(2), 373-390. https://doi.org/10.1590/S1984-02922013000200010
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, p. 377). Busquei ver, sentir e analisar os percursos de migração por outros ângulos, proliferar sentidos que não são unívocos (Barros & Barros, 2013), vestir lentes que possibilitem dar outra visibilidade aos deslocamentos de indivíduos oriundos de países do sul global. Entreguei-me à experiência, sabedora de que “é preciso construir um modo de operar o processo de invenção” (DeLuca, Grisci, & Lazzarotto, 2018DeLuca, G., Grisci, C. L. I., & Lazzarotto, G. D. R. (2018). Trabalhar e tatuar-se: Estratégia de inventar a vida. Psicologia & Sociedade, 30, e170175. https://doi.org/10.1590/1807-0310/2018v30170175
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, p. 5).

MAIS ALGUMAS CONSIDERAÇÕES

O presente artigo possibilitou ver como a cartografia segue pistas que apontam para múltiplas entradas e conexões teórico-empíricas, de modo a manter correspondência com os estudos associados a trabalho e subjetividade, também no campo da Administração.

Destacam-se como diferenciais deste estudo o caráter de pesquisa-participação ou investigação-interação, de produção de dados (e não de coleta de dados), o papel político da pesquisadora-cartógrafa e, sobretudo, como contribuição, a realização de um percurso como flâneur-cartógrafa, que emerge como prática transversal combinada com as pistas já evidenciadas na literatura de cartografia. Esse modo de pesquisar permitiu a aproximação em um território existencial de difícil acesso, que por meio de seus fluxos cooperativos compôs um território-rizoma considerando a dinamicidade, intensidade e multiplicidade dos processos em constante transformação, como o acompanhamento do trabalho dos migrantes-participantes e refugiados-participantes tanto presencialmente quanto pelas redes sociais virtuais, o estabelecimento de laços de confiança com os participantes e seu consequente engajamento na produção da pesquisa, e a participação ativa, junto com informantes-chave, em eventos-atividades atuantes em prol das questões migratórias.

Quanto aos procedimentos de produção de dados, priorizaram-se estratégias qualitativas, como participação em eventos-atividades, entrevista e observação-participante presencial e virtual, mas é importante ficar claro que estas não são pré-requisitos para a prática cartográfica. Elas foram eleitas para o estudo empírico porque sua base teórica (Barros & Kastrup, 2015Kastrup, V., & Barros, R. B. (2015). Pista 4 - movimentos-funções do dispositivo na prática da cartografia. In E. Passos, V. Kastrup, & L. Escóssia (Orgs.), Pistas do método da cartografia: Pesquisa-intervenção e produção de subjetividade (pp. 76-91). Porto Alegre: Sulina.; Barros & Passos, 2015Passos, E., Kastrup, V., & Escóssia, L. (2015). Pistas do método da cartografia: Pesquisa-intervenção e produção de subjetividade. Porto Alegre: Sulina.; Kastrup, 2015; Tedesco et al., 2013Tedesco, S. H., Sade, C., & Caliman, L. V. (2013). A entrevista na pesquisa cartográfica: A experiência do dizer. Fractal: Revista de Psicologia, 25(2), 299-322. https://doi.org/10.1590/S1984-02922013000200006
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) está alinhada à visão pós-estruturalista e focada na prática cartográfica. Importa que estas técnicas permitiram a construção conjunta com os migrantes e refugiados - por isso a ênfase em migrantes-participantes e refugiados-participantes, além da pesquisadora-participante - vivenciando e acompanhando seus processos de produção de subjetividade, especialmente aqueles relativos ao trabalho. Reforça-se que a cartografia não possui regras, é aberta, assim como os territórios são moventes, por isso as técnicas para produção de dados devem ser eleitas a partir do momento que o pesquisador vivencia o território. “O pesquisador-cartógrafo terá que inventar os seus na medida em que estabelece relações e passa a fazer parte do seu próprio território de pesquisa” (Costa, 2014Costa, L. B. (2014). Cartografia: Uma outra forma de pesquisar. Revista Digital do LAV, 7(2), 66-77. https://doi.org/10.5902/1983734815111
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, p. 71).

Se Kastrup (2015Kastrup, V., & Barros, R. B. (2015). Pista 4 - movimentos-funções do dispositivo na prática da cartografia. In E. Passos, V. Kastrup, & L. Escóssia (Orgs.), Pistas do método da cartografia: Pesquisa-intervenção e produção de subjetividade (pp. 76-91). Porto Alegre: Sulina.) argumenta sobre a importância do pouso no território, para o estudo empírico ilustrativo é mais assertivo dizer que ocorreu um mergulho. O percurso de flâneur que possibilitou a pesquisa-participação abriu caminhos a esta escrita, mas também aos fluxos de vida-trabalho dos migrantes e refugiados. Pesquisadoras-participantes e demais participantes produziram encontros e foram afetados por eles. Assim como os movimentos dos migrantes e refugiados se mostraram afetivos e políticos, também a cartografia funcionou nesse sentido, mantendo-se a vigilância às normas científicas. Devido ao mergulho no território, há um envolvimento e uma força nos encontros que diferenciam a pesquisa cartográfica de outras possibilidades metodológicas. Dessa forma, a cartografia também apresenta uma contribuição social com um quê de acolhimento da multiplicidade, alteridade e mobilidade, ao passo que o cartógrafo estabelece relações com os participantes, que no caso desta pesquisa auxiliavam a compreensão da vida no país de destino.

A partir da apresentação da cartografia como método - mostrando sua gênese, suas pistas teóricas e o percurso cartográfico de um estudo empírico, evidenciou-se seu potencial epistemo-teórico-metodológico, que espera-se inspirar novas pesquisas. Dessa forma, considerando que, na contemporaneidade, trabalhadores e organizações são demandados pela sua flexibilidade, dinamicidade, mobilidade, polivalência, autonomia, com fronteiras cada vez mais diluídas entre eles que implicam novos modos de viver e trabalhar, a cartografia também se mostra fecunda para acessar territórios em suas multiplicidades em outros contextos e por outros olhares.

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    » https://doi.org/10.1590/1679-395120200113
  • Classificação JEL:

    B4, B49, J6, J69, M1, M19, Y2, Y20.
  • 1
    . Inspiradas em Alvarez e Passos (2015), optamos por não seguir a regra acadêmica de uniformização da pessoa da narrativa ao longo da pesquisa. Desse modo, utilizamos a linguagem impessoal no processo de construção e argumentação teórica, e a primeira pessoa nos momentos em que são narradas as intervenções como cartógrafa ativa no movimento da pesquisa.
  • Fast-track

    Uma versão anterior deste artigo recebeu o prêmio de melhor trabalho do VII Encontro de Ensino e Pesquisa em Administração e Contabilidade - EnEPQ realizado pela Associação Nacional de Pós-graduação e Pesquisa em Administração (ANPAD) em maio de 2021, bem como foi indicada pelo evento para submissão em regime de fast-track na RAC.
  • Direitos Autorais

    A RAC detém os direitos autorais deste conteúdo.
  • Verificação de Plágio

    A RAC mantém a prática de submeter todos os documentos aprovados para publicação à verificação de plágio, mediante o emprego de ferramentas específicas, e.g.: iThenticate.
  • Financiamento

    As autoras relataram que não houve suporte financeiro para a pesquisa deste artigo.
  • Método de Revisão por Pares

    Este conteúdo foi avaliado utilizando o processo de revisão por pares duplo-cego (double-blind peer-review). A divulgação das informações dos pareceristas constantes na primeira página e do Relatório de Revisão por Pares (Peer Review Report) é feita somente após a conclusão do processo avaliativo, e com o consentimento voluntário dos respectivos pareceristas e autores.
  • Disponibilidade dos Dados

    As autoras afirmam que todos os dados utilizados na pesquisa foram disponibilizados publicamente, e podem ser acessados por meio da plataforma Harvard Dataverse:
    Scherer, Laura Alves; Grisci, Carmem Ligia Iochins, 2022, "Replication Data for: "Cartography as a Research Method for Work and Subjectivity Studies” published by RAC-Revista de Administração Contemporânea", Harvard Dataverse, V1.
    https://doi.org/10.7910/DVN/T7FEMI
    A RAC incentiva o compartilhamento de dados mas, por observância a ditames éticos, não demanda a divulgação de qualquer meio de identificação de sujeitos de pesquisa, preservando a privacidade dos sujeitos de pesquisa. A prática de open data é viabilizar a reproducibilidade de resultados, e assegurar a irrestrita transparência dos resultados da pesquisa publicada, sem que seja demandada a identidade de sujeitos de pesquisa.

Editado por

Editor-chefe:

Marcelo de Souza Bispo (Universidade Federal da Paraíba, PPGA, Brasil)

Editora Associada:

Elisa Yoshie Ichikawa (Universidade Estadual de Maringá, Brasil)

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    02 Set 2022
  • Data do Fascículo
    2022

Histórico

  • Recebido
    26 Jul 2021
  • Revisado
    24 Fev 2022
  • Aceito
    07 Mar 2022
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