Sazonalidade e atividade diurna de Tabanidae (Diptera: Insecta) de dossel na Reserva Florestal Adolpho Ducke, Manaus, AM

Seasonality and diurnal activity of Tabanidae (Diptera: Insecta) of canopy in the Adolpho Ducke Forested Reserve, Manaus, Amazonas State, Brazil

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Sazonalidade e atividade diurna de Tabanidae (Diptera: Insecta) de dossel na Reserva Florestal Adolpho Ducke, Manaus, AM

Seasonality and diurnal activity of Tabanidae (Diptera: Insecta) of canopy in the Adolpho Ducke Forested Reserve, Manaus, Amazonas State, Brazil

Aldenira F. Oliveira; Ruth L.M. Ferreira; José A. Rafael

Coordenação de Pesquisas em Entomologia, Instituto Nacional de Pesquisas da Amazônia - INPA, C. postal 478, 69011-970, Manaus, AM; [e-mail], [e-mail] [e-mail]

RESUMO

A sazonalidade e periodicidade diurna de vôo de tabanídeos de dossel na Reserva Ducke, Manaus, AM, foram analisadas utilizando-se uma armadilha suspensa instalada a 20 m de altura, conectada a um cilindro de gás carbônico. Realizaram-se coletas quinzenais, com duração de um dia, no período de abril de 2000 a junho de 2001. O material foi retirado da armadilha em intervalos de 2h e acondicionado em tubos plásticos. Coletaram-se 955 indivíduos, correspondendo a trinta espécies. Philipotabanus stigmaticalis (Kröber) (37,9%) ocorreu ao longo do ano, com maior atividade de vôo entre 12:00h e 16:00h. Acanthocera marginalis Walker (16,3%) ocorreu ao longo do ano, sendo mais abundante nos meses menos chuvosos (julho a novembro), com maior atividade no período entre 10:00h e 12:00h. Acanthocera gorayebi Henriques & Rafael (9,0%) foi mais abundante em julho, com maior atividade entre 10:00h e 12:00h. Dichelacera damicornis (Fabricius) (10,9%) ocorreu nos meses de maior precipitação (janeiro, fevereiro e abril), com maior atividade diurna entre 10:00h e 14:00h. Diachlorus podagricus (Fabricius) (6,6%) ocorreu ao longo de todo o ano exceto em fevereiro, mostrando maior atividade entre 10:00h e 14:00h. Os fatores climáticos, quando correlacionados com a riqueza de tabanídeos, somente mostraram correlação com a precipitação; enquanto a abundância dos espécimes foi correlacionada com a umidade e com a precipitação.

Palavras-chave: Amazônia Central, armadilha suspensa, atividade diária, dióxido de carbono

ABSTRACT

The seasonality and diurnal flight activity of tabanids from canopy was studied at Ducke Reserve, in the county of Manaus, Amazonas State, Brazil, using a suspended trap installed at 20 m above the soil, connected to the carbon dioxide gas cylinder. During one day, twice monthly collects of Tabanidae were taken from April 2000 to June 2001. The material was collected from the trap in intervals of 2h and placed in plastic tubes. A total of 955 individuals, corresponding to thirty species were collected. Philipotabanus stigmaticalis (Kröber) (37.9%) was caught all over the year and showed higher flight activity between 12:00 p.m. and 4:00 p.m. Acanthocera marginalis Walker (16.3%) was more abundant in the less rainy months (July to November) with a higher activity period between 10:00 a.m. and 12:00 p.m. Acanthocera gorayebi Henriques & Rafael (9.0%) was more abundant in July with more activity between 10:00 a.m. and 12:00 p.m. Dichelacera damicornis (Fabricius) (10.9%) was more abundant in the months of heavier rainfall (January, February and April) and showed higher diurnal activity between 10:00 a.m. and 2:00 p.m. Diachlorus podagricus (Fabricius) (6.6%) was caught throughout the year except in February and showed higher activity between 10:00 a.m. and 14:00 p.m. The climatic factors when correlated to the tabanids richness just showed significant correlation with precipitation, while the specimens abundance was correlated to humidity and precipitation.

Key words: Central Amazon, hang trap, daily activity, carbon dioxide

No Brasil, os estudos de sazonalidade e atividade diurna de tabanídeos foram desenvolvidos principalmente com espécies de ocorrência próxima ao solo utilizando diferentes modelos de armadilhas de interceptação de vôo, tipo Malaise, ou iscas animais (Gorayeb 2000, Ferreira et al. 2002, Ferreira & Rafael 2004). As espécies de dossel são conhecidas por coletas realizadas com armadilhas suspensas com septo preto (Rafael & Gorayeb 1982, Gorayeb 1999), no entanto os períodos de atividades ainda são desconhecidos para algumas espécies. O objetivo deste estudo foi o de conhecer a sazonalidade e a atividade de vôo diurna das espécies mais abundantes de Tabanidae no dossel de uma floresta primária na Amazônia e verificar sua relação com os fatores climáticos: temperatura, umidade relativa do ar e precipitação pluviométrica.

Material e Métodos

O estudo foi realizado de abril de 2000 a junho de 2001, quinzenalmente, entre 6:00h e 18:00h, na Reserva Florestal Adolpho Ducke no município de Manaus, AM, localizada na rodovia AM-010, km 26 (2º55’S/59º59’W). No local estudado, a vegetação é típica de floresta de platô, com árvores de grande porte, de aproximadamente 40 m de altura, com cobertura muito densa de trepadeiras e arbustos (Ribeiro et al. 1999).

A armadilha suspensa (Rafael & Gorayeb 1982) foi montada a 20 m de altura (Fig. 1A). Para isso uma corda foi arremessada no ponto desejado para o seu posicionamento. Como atrativo, foi liberado gás carbônico à vazão média de 2 L/min, de um cilindro de CO₂ (Fig. 1B) que ficou no solo conectado à armadilha por um tubo plástico flexível de 5 mm de diâmetro. As amostras foram retiradas da armadilha a cada 2h, acondicionadas em tubos plásticos e mantidas em freezer. Posteriormente, o material foi transportado em caixa de isopor para o Laboratório de Entomologia do Instituto Nacional de Pesquisas da Amazônia (INPA). Os tabanídeos foram contados por intervalos de coleta, separados, alfinetados e identificados. Espécimes testemunhas foram depositados na Coleção de Invertebrados do INPA, em Manaus.

Dados de precipitação pluviométrica, umidade relativa do ar e temperatura foram tomados junto ao serviço de meteorologia da Embrapa Amazônia Ocidental, situada próxima à Reserva Ducke, na rodovia AM 10, km 29. Os dados foram obtidos em nível normativo para estações meteorológicas, sendo desta forma, próximos ao solo. Foram feitas correlações entre os fatores climáticos (umidade, temperatura e precipitação) com a abundância e riqueza das espécies utilizando o teste de Spearman (r_s) P < 0,05 (Zar 1996), supondo que a tendência da variação dos dados utilizados seja compatível às oscilações no dossel a 20 m de altura.

Resultados e Discussão

O período de coleta, de abril/2000 a junho/2001, foi marcado por chuvas regulares para a região, com precipitação mínima mensal de 74 mm e máxima de 456 mm e médias de temperatura mínima de 25,8ºC e máxima de 28,6ºC; a média da umidade relativa do ar variou entre 87% e 93%.

Foram coletados 955 indivíduos, pertencentes a 30 espécies de Tabanidae (Tabela 1). As espécies mais abundantes foram: Philipotabanus stigmaticalis (Kröber), Acanthocera marginalis Walker, Dichelacera damicornis (Fabricius), Acanthocera gorayebi Henriques & Rafael e Diachlorus podagricus (Fabricius).

A riqueza de tabanídeos somente foi correlacionada com a precipitação (r = -0,65; P = 0,01). Enquanto a abundância foi correlacionada com umidade (r = -0,56; P = 0,01) e precipitação (r = -0,70; P = 0,02).

P. stigmaticalis ocorreu com maior freqüência populacional. Foram coletados 362 exemplares ao longo de todo o ano, com picos seguidos após o período chuvoso, sendo estes em junho e julho do primeiro ano amostral (Tabela 1; Fig. 2A). Era de se esperar que esse comportamento se repetisse em junho do ano subseqüente, fato este que não ocorreu. A análise de ocorrência de uma espécie em uma área pode envolver diversos parâmetros físicos e biológicos, no entanto, nenhuma das variações climáticas obtidas poderia ser usada para responder de forma segura o evento ocorrido. De acordo com Enger et al. (2006) um processo estocástico é um desses comportamentos não determinísticos de variabilidade nas taxas de crescimento de populações. Essa variabilidade possivelmente é oriunda de características intrínsecas da espécie, determinando aleatoriamente o tamanho populacional dentro de um período de tempo.

O período de menor atividade ocorreu na estação mais seca (Fig. 2A; 3) entre agosto e outubro, quando a temperatura oscilava entre 27ºC e 29ºC. Quando se analisou a flutuação populacional junto aos fatores climáticos, não houve correlação significativa.

A atividade de vôo diurno de P. stigmaticalis foi baixa na primeira metade do dia. Às 11:00h mostrou discreto aumento e entre 12:00h e 18:00h a freqüência alcançou padrões numéricos maiores e muito semelhantes (Fig. 4A). P. stigmaticalis é uma espécie amplamente distribuída na região amazônica, presente ao longo de todo o ano, e coletada preferencialmente no dossel de floresta primária (Henriques & Rafael 1999). Foi abundante em armadilha suspensa em área de mata e borda de clareira (Ferreira 2003), entretanto, em coletas realizadas em área de mata, no leste de Belém (Gorayeb 1999), somente um exemplar foi coletado em agosto, a 7 m de altura.

A. marginalis foi a segunda espécie mais abundante com 156 exemplares. Ocorreu com maior freqüência entre junho e novembro (Fig. 2B), meses de menor precipitação. Apresentou pico populacional em setembro, quando a temperatura estava em torno de 28,2ºC (Figs. 2B e 3). A espécie teve correlação (negativa) com a umidade (r = -0,53; P = 0,04) e com a precipitação (r = -0,77; P = 0,01). Foi citada por Henriques & Rafael (1999), sendo bem coletada de maio a fevereiro em floreta primária. Foi coletada por Gorayeb (1999) em armadilha suspensa 15 m.

Ao longo do dia, neste trabalho, a atividade de vôo foi maior entre 10:00h e 12:00h, desaparecendo a partir das 16:00h (Fig. 4B).

D. damicornis foi a terceira espécie mais abundante com 105 exemplares. Ocorreu com maior freqüência (Fig. 2C) nos meses da estação chuvosa (Fig. 3). E somente apresentou correlação (positiva) com a precipitação (r = 0,55; P = 0,04). A atividade de vôo diurno predominante foi entre 10:00h e 16:00h com pico entre 10:00h e 12:00h (Fig. 4C). A espécie está bem distribuída na Amazônia, com preferência pelo dossel da floresta primária e clareira antrópica (Ferreira 2003). Em estudos realizados por Gorayeb (1999) em área de floresta, utilizando armadilha suspensa, foi a espécie mais abundante com picos populacionais em setembro e novembro, ocorrendo em diferentes estratos 1,6, 7, 15 e 23 metros.

Tabela 02

A. gorayebi foi a quarta espécie mais abundante, com 86 indivíduos. Ocorreu principalmente nos meses mais secos, com pico em julho e menor atividade no período chuvoso (janeiro a março), recuperando a atividade em junho do segundo ano (Figs. 2D, 3). Apresentou correlação significante (negativa) com a precipitação (r = -0,72; P = 0,01). A. gorayebi possui ampla distribuição na região amazônica (Henriques 1999) ocorrendo em floresta de dossel de abril a dezembro (Henriques & Rafael 1999), e em dossel de mata e clareira antrópica a 25 m (Ferreira 2003). A atividade de vôo diurno iniciou cerca de 8:00h, com maior freqüência entre 10:00h e 14:00h e pico entre 10:00h e 12:00h, diminuindo a partir das 16:00h (Fig. 4D). Ataca principalmente em área aberta, nas horas mais quentes, secas e com mais luz (Gorayeb 2000).

D. podagricus foi a quinta espécie mais abundante com 63 indivíduos. Foi registrada ao longo de todo o ano com discreto pico populacional em julho (Fig. 2E). A espécie teve correlação (negativa) com a umidade (r = -0,79; P = 0,01) e com a precipitação (r = -0,62; P = 0,01). Foi coletada por Gorayeb (1999) principalmente a 23 m de altura. Ferreira (2003) coletou em suspensa alta na mata a 25 m. Neste trabalho, sua atividade de vôo diurno se iniciou cerca de 8:00h, com maior freqüência populacional entre 10:00h e 16:00h (Fig. 4E), e pico entre 10:00h e 12:00h.

O presente estudo demonstrou que a utilização de armadilha suspensa no dossel, acompanhada da liberação de dióxido de carbono, é eficiente para a coleta de Tabanidae, o que facilita estudos de sazonalidade e de periodicidade diurna para as espécies mais abundantes. No entanto, para as espécies que ocorrem com baixa freqüência e por curtos períodos é necessário que se façam capturas em diferentes habitats e estratos que possibilitem a determinação segura da ocorrência diurna e sazonal no dossel. Ao longo do dia, P. stigmaticalis foi mais representativa na parte da tarde em relação às outras espécies, que mostraram padrão de atividade semelhante, sendo mais ativas da metade da manhã até o início da tarde. Esse comportamento possivelmente reflete um mecanismo evolutivo que diminui a competição inter-específica de P. stigmaticalis, espécie mais abundante, no período estudado. A sazonalidade das espécies mais abundantes pode ter sido influenciada pela quantidade de chuvas e pela umidade do ar. Entretanto, para minimizar erros na interpretação do conhecimento ecológico se fazem necessárias maiores amostragens e considerações micro-climáticas estratificadas.

Agradecimentos

Aos técnicos João Vidal, Jaílson Vidal e Jéferson Silva pela ajuda nos trabalhos de campo e a Sheyla Couceiro pela ajuda na análise estatística.

Received 20/IV/06. Accepted 27/II/07.

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Datas de Publicação

• Publicação nesta coleção
  29 Nov 2007
• Data do Fascículo
  Out 2007

Histórico

• Aceito
  27 Fev 2007
• Recebido
  20 Abr 2006