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DO PROFETISMO BÍBLICO AO PROFETISMO DE HOJE: ECOLOGIA INTEGRAL COMO JUSTIÇA-SHALOM

From Biblical Prophetism to Prophetism Today: Integral Ecology as Shalom Justice

RESUMO

A ecologia integral assumiu enorme relevância na reflexão teológica e pastoral, nos últimos tempos, de modo especial, após a Encíclica Laudato Si’ (2015) do Papa Francisco. Ela tem sido abordada sob variadas perspectivas, partindo da convicção de que “tudo está interligado”. Este artigo pensa a ecologia integral à luz do profetismo bíblico, pelo viés do tema da justiça, em sua conexão com a misericórdia, o direito e a fidelidade, bem como, o shalom, interação de todos os componentes da realidade humana. A ecologia integral revela-se, pois, como humanidade integral e sua face de fraternidade, de respeito pela dignidade humana e de cuidado com os irmãos e as irmãs.

PALAVRAS-CHAVE
Ecologia integral; Humanidade integral; Justiça; Direito; Shalom

ABSTRACT

The debate on Integral ecology has recently gained enormous relevance in theological and pastoral reflections, especially after Pope Francis’ Encyclical Laudato Si’ (2015). It has been approached from various perspectives, based on the conviction that “everything is interconnected”. This article discusses integral ecology in the light of biblical prophecy, through the lens of justice, in connection with mercy, right and fidelity, as well as with shalom; the interaction of all the components of human reality. Integral ecology is thus revealed as integral humanity and its aspects of fraternity, respect for human dignity, and care for our brothers and sisters.

KEYWORDS
Integral ecology; Integral humanity; Justice; Right; Shalom

Introdução

Pensar o tema da ecologia integral, tomando como ponto de partida o fenômeno profético bíblico, torna-se tarefa difícil, com o risco de se fazer uma leitura impertinente da tradição bíblica.1 1 “Ao longo das últimas décadas, sentiu-se a necessidade de acrescentar adjetivos ao substantivo ‘ecologia’ para, assim, explicitar dimensões outras que não fossem redutíveis apenas ao âmbito da biologia. E isto se deu, basicamente, pelo fato de o termo ecologia ter sido, impropriamente, identificado sempre mais com ‘ambiente’ apenas. E, consequentemente, discursos e práticas ecológicas foram sendo cada vez mais compreendidos como relativos única e exclusivamente à defesa do ambiente, concebido como mero cenário da presença e atividade humanas. Em última instância, reduzir a complexidade da ecologia à dimensão ambiental trairia a presença do inveterado antropocentrismo moderno. [...] A ecologia [deve ser] concebida a partir de uma visão sistêmica e, portanto, como singular complexidade composta por quatro dimensões: ambiental, social, mental e espiritual/integral” (TAVARES, 2020, p. 24-25). O progresso espetacular da ciência e da tecnologia descortinou um vasto horizonte de espírito ecológico, totalmente fora de cogitação a milênios de distância. Entretanto, um tópico da ecologia integral pode servir de elo entre o passado longínquo dos profetas bíblicos e a atual consciência a respeito do que se tem chamado de Casa Comum: a percepção de que tudo está interligado e que a superação dos desequilíbrios ecológicos passa pela restauração dos vínculos entre todos os elementos da criação, inclusive os seres humanos, como tarefa e responsabilidade de todos2 2 O cap. IV da Encíclica Laudato Si’ (LS), sob o título Uma ecologia integral, apresenta uma concepção ampla de ecologia que abarca, não apenas, o ambiental, mas, também, o econômico, o social, o cultural, a vida cotidiana e o intergeracional (2015, p. 85-97). .

O olhar dos profetas de Israel fixava-se no trato entre as pessoas e, com incrível clareza, davam-se conta de que a sociedade classista e excludente de seu tempo estava muito distante do querer de YHWH para seu povo3 3 Esse texto se deterá nos profetas bíblicos do século VIII a.C., quais sejam: Amós e Oseias (Reino do Norte) e Isaías e Miqueias (Reino do Sul). Textos desses profetas serão, prioritariamente, citados. Por outro lado, o tetragrama divino será referido como YHWH. . A existência de exploradores e explorados, senhores e servos, livres e escravos depunha contra o projeto divino que apontava para uma sociedade de irmãos e de irmãs, como se fora uma grande família, com atenção especial aos mais fragilizados e expostos à maldade alheia. Portanto, uma sociedade alicerçada na fraternidade e no cuidado, na estabilidade da convivência interpessoal e na busca contínua de equilíbrio social. Uma sociedade onde tudo estivesse interligado: as pessoas entre si e com a criação!

Com esse pano de fundo, pode-se falar em humanidade integral, em consonância com a ecologia integral, na qual todos os componentes do tecido social estão harmonizados; seria a “justiça social e ecológica, que alguns chamam de justiça socioambiental” (MOZOS, 2016MOZOS, P. A. Defender al pobre y proteger la naturaleza. Revista de Fomento Social, Córdoba-Espanha, v. 71, p. 81-98, jan. 2016., p. 90)4 4 A expressão humanidade integral pode evocar a obra de Jacques Maritain, Humanisme intégral (1936). Qualquer semelhança é mera coincidência! Humanidade integral pensa o ser humano concreto, de carne e osso, passando à margem de reflexões filosóficas, focando a criação da humanidade em sua pluralidade e diversidade, sim, porém, sem excluídos, explorados e marginalizados. .

Ecologia não é biocentrismo (LS, n. 118). De forma clara, o Papa [Francisco]FRANCISCO, Papa. Exortação Apostólica Evangelii Gaudium sobre o anúncio do Evangelho no mundo atual. São Paulo: Paulus; Loyola, 2013. rechaça uma abordagem onde todos os seres vivos ocupem o centro, sem considerar, de forma específica, o ser humano, com o que tem de dignidade especial, responsabilidade particular e capacidades específicas como conhecimento, vontade, liberdade e responsabilidade

(PRADO, 2016PRADO, M. L. C. Ecología y desarrollo humano integral. Revista de Fomento Social, Córdoba-Espanha, v. 71, n. 1, p. 161-165, mar. 2016., p. 163).

A teologia profética chama de justiça – sedaqah – a igualdade social, resultado da prática da misericórdia – hesed – e do direito – mispat –, correspondente ao propósito de Deus para seu povo. Outro elemento importante refere-se à fidelidade – ‘emet – na opção pelo querer divino, em contraste com a inconstância e a infidelidade.

O conjunto desses elementos tem o nome de shalom, que aponta para o bem-estar, a prosperidade e a atenção às carências de todos e de todas. O shalom só existe na condição de “tudo estar interligado”, no âmbito social, político, econômico e religioso5 5 A Encíclica Laudato Si’ (LS) repete, várias vezes, a declaração: “tudo está interligado” (n. 91, 117, 138 e 240), ou “tudo está estreitamente ligado no mundo” (n. 16). . A visão não dualista do modo de pensar bíblico permitia aos profetas detectar as consequências em cadeia dos desmandos cometidos em qualquer das esferas, por estarem todas em perfeita conexão. Eis por que se lançavam a denunciar as injustiças e a exigir a restauração dos laços de fraternidade, em sintonia com os propósitos de Deus.

Tal pensamento, que tem o humano como ponto de partida, serve de chave de compreensão profética da chamada ecologia integral, na medida em que alerta para a sustentabilidade do planeta, focando temas como o aquecimento global, a destruição do meio-ambiente, a poluição ambiental, as consequências das guerras e do consumo desenfreado, colocando em pauta problemas que tocam de cheio a humanidade, mormente, os pobres e os descartados. Dentre eles, até mesmo, países e continentes com suas populações. Na linha do profetismo, “a ecologia integral, entre outras coisas, revela a relação estrutural entre injustiças sociais e desastre ecológico” (ASURMENDI, 2015-2016ASURMENDI, J. Profetas, Escatologia, Ecologia. Revista Biblica, San Miguel, v. 77, p. 249-270, Dez. 2015-2016., p. 249).

Somente a partir do reconhecimento do que é humano e de seu valor acima das demais criaturas (LS, n. 119) é possível criar relações nas quais o outro seja reconhecido e cada pessoa seja valorizada. Isso é essencial para situar corretamente o conceito de ecologia integral. Para que as nossas relações com a natureza sejam adequadas, não é necessário enfraquecer a dimensão social do ser humano e nem a sua dimensão transcendente, a sua abertura ao “Tu” divino. Porque não se pode propor uma relação com o meio ambiente isolada da relação com as outras pessoas e com Deus. Seria um individualismo romântico disfarçado de beleza ecológica e um confinamento sufocante na imanência

(PRADO, 2016PRADO, M. L. C. Ecología y desarrollo humano integral. Revista de Fomento Social, Córdoba-Espanha, v. 71, n. 1, p. 161-165, mar. 2016., p. 163).

A fé cristã exige posturas proféticas em face da atual degradação do planeta e da crise de sustentabilidade. O mundo carece de profetas da ecologia integral, profetas da humanidade integral6 6 Uma leitura da tradição profética bíblica à luz do tema da ecologia, encontra-se em LEÓN, 2010, p. 149-172. . Os profetas bíblicos lhes podem ensinar a prestarem atenção especial aos sem voz e sem vez e a lutarem para que encontrem lugar num mundo sempre mais excludente, onde o supérfluo de poucos resulta da miséria de multidões. Em outras palavras, alertá-los a lutar pelo humanum, num contexto amplo de luta pela vida.

1 Justiça: uma sociedade ideal onde tudo está interligado

Seria anacrônico esperar que a Bíblia falasse de “ecologia integral” com a mesma lucidez que se possui com o avanço da ciência e da tecnologia. A ciência moderna, em suas múltiplas ramificações, tem dado passos de gigante no tocante à urgência de se defrontar com o tema da sustentabilidade do planeta Terra, mostrando a interconexão necessária e incontornável de seus muitíssimos elementos. Existe interconexões que, apesar do avanço científico vertiginoso, estão ainda por ser descobertas pelo engenho humano. Daí as surpresas positivas e negativas com as quais a humanidade se confronta, a cada passo7 7 A LS descreve a “crise do antropocentrismo moderno e suas consequências” (n. 115-136). .

A cosmovisão bíblica, em consonância com as culturas vizinhas, pensa a interligação entre os tantíssimos elementos da criação, conectados na mais perfeita ordem. A civilização egípcia conhecia a ideia de maat, vocábulo de difícil tradução, podendo ser entendido como ordem (FERGUSON, 2020FERGUSON, J., The Ancient Egyptian Concept of Maat: Reflections on Social Justice and Natural Order. Culture Mandala, Austrália, v. 13, special issue 3, p. 1-90, Mar. 2020., p. 1-90). Pensava-se todos os seres criados submetidos à maat – que chegou a ser transformada em divindade – que cuidava de forjar entre eles uma estreita inter-relação a ponto de o desequilíbrio de um gerar o desarranjo do conjunto. A ação do faraó com seus vizires estava em função de fazer a maat perpassar as estruturas sociais, de forma tão precisa, a ponto de não haver desigualdades8 8 “Maat era um atributo essencial do estado egípcio e uma das principais funções do faraó era garantir tratamentos corretos em relação a pessoas e situações” (FERGUSON, 2020, p. 20-21). . Por sua vez, a sabedoria de vida consistia em conhecer a ordem do cosmos, gerenciada por maat, e nela se integrar, com o correspondente comportamento, mesmo nas pequenas coisas. O sábio tinha a capacidade e a responsabilidade de reconhecer como se deve comportar, em cada caso ou circunstância, com um padrão de vida que permite aos humanos atuarem em total sintonia com a ordem do universo, que já começa no interior das pessoas. Isso corresponde a ordenar as paixões que, desordenadas, causam muito dano.

A visão de ordem cósmica que engloba o humanum está presente na Bíblia, desde as palavras iniciais, correspondentes aos relatos da criação, em Gn 1–2. O ser humano caracteriza-se como ser de relação com o Criador, com o outro, consigo e com as criaturas. Gn 3 narra a ruptura desses laços e suas consequências que desbordam para a segunda geração dos humanos. O fratricídio, descrito em Gn 4, constitui-se numa forma cruel e chocante de desastre da criação. A ordem original será recuperada quando a fraternidade e o reconhecimento do outro tornarem-se pauta cotidiana nas relações interpessoais. Essa, no âmbito do profetismo, seria o rosto da justiça, e se constitui no alicerce em que a “humanidade integral” se constrói.

Os profetas bíblicos, mais que ninguém, se deram conta do desequilíbrio social de seu tempo. E foram incansáveis em lutar para garantir a justiça, na contramão do “desastre humano”, provocado pelos agentes da injustiça, em detrimento de largas faixas da sociedade. Lidos com atenção, “os textos proféticos denunciam, com seu vigor habitual, a relação entre a injustiça social e os desastres ecológicos” (ASURMENDI, 2015-2016ASURMENDI, J. Profetas, Escatologia, Ecologia. Revista Biblica, San Miguel, v. 77, p. 249-270, Dez. 2015-2016., p. 249)9 9 O autor estuda o profetismo na perspectiva da ecologia integral, a partir de Os 2,18-25; Is 65,16b-25; Mq 4,1-5 (= Is 2,2-4) e Ez 47,1-12. . A capacidade de fazer o discernimento dos acontecimentos à luz da fé permitiu aos profetas verem o que as elites não viam. Enquanto muitos se contentavam com a “fotografia” do que se passava, os profetas tinham a capacidade de fazer uma verdadeira “tomografia” e detectar, em profundidade, o que muitos não viam: a injustiça com seu rastro de aviltamento dos mais fragilizados e indefesos.

Ao longo da literatura profética, a raiz sdq aparece um número incontável de vezes, seja na forma verbal (ser justo, declarar justo, fazer justiça), seja no adjetivo justo, seja no substantivo justiça. Interessa-nos aqui o substantivo sedaqah. Embora podendo ter diversas conotações, a depender do contexto literário em que ocorre, vamos nos deter na semântica do termo, que parece ser a mais significativa na literatura profética.

Justiça corresponde ao quadro em que toda a comunidade está articulada no reconhecimento de cada um, não excluindo ninguém, especialmente, aqueles por quem se deve, de preferência, preocupar: os órfãos, as viúvas, os pobres e os estrangeiros. Tal realidade resultaria da obediência à Torah de YHWH, como estabelece a Lei mosaica (Dt 14,28-29; 24,19-21; 26,13).

O conceito de justiça no Antigo Testamento, embora compreenda um comportamento correto, não se limita a ele. Tsedaka está ligada a uma postura de fidelidade ao grupo social, a um relacionamento benéfico no interior da comunidade. Essa fidelidade e lealdade ao povo alcançam expressão em diversas formas e não estão restritas a normas fixas ou preestabelecidas. Embora seja tarefa do rei criar o ambiente propício para o exercício da justiça (2Sm 8,15; 1Rs 10,9), ela não está restrita à esfera política. Em todas as esferas sociais e nas relações delas decorrentes deve-se promover a justiça”

(BAILÃO, 2011BAILÃO, M. P. C. O efeito da justiça será a paz (Is 32,15-20). Estudos Bíblicos, Petrópolis, v. 29, n. 112, p. 31-36. 2011., p. 35).

A sedaqah, nesse modo de pensar, supera o “dar a cada um o que é seu”. Numa sociedade classista, com fortes desequilíbrios, de modo que os ricos possuem muito e os pobres quase nada, a justiça consistirá na repartição e não na defesa exagerada da propriedade privada e na concentração de bens. Com efeito, a sedaqah corresponde a “uma qualidade que se inclinará frequentemente para a compaixão e a generosidade” (JENSEN, 2009JENSEN, J. Dimensões éticas dos profetas. São Paulo: Loyola, 2009., p. 103).

Vivendo numa sociedade de fortes contrastes, os profetas encontrarão no tema da justiça um argumento onde centrar suas denúncias. Defensores incansáveis do direito divino, não podiam estar tranquilos ao se defrontarem com a exploração, a opressão, a injustiça e a corrupção que campeavam diante dos olhos10 10 “O direito corresponde às normas e leis precisas e concretas, aos ‘códigos’ e corpus jurídicos, ao passo que a ‘justiça’ representa o horizonte em que tais códigos pretendem se encarnar, sem jamais consegui-lo. Os códigos não ‘esgotam’ a justiça, tampouco a justiça se reduz aos códigos” (ASURMENDI, 2015-2016, p. 253). . Em vista disso, se puseram a denunciar a injustiça e a anunciar a esperada sociedade fundada na justiça.

A denúncia da injustiça corresponde a um tema recorrente nos profetas do século VIII a.C. O profeta Amós denuncia, com linguajar forte, a perversão da justiça, quando proclama: “eles transformam o direito em veneno e lançam por terra a justiça” (Am 5,7); “vós transformais o direito em veneno e o fruto da justiça em absinto” (Am 6,12). O profeta Isaías constata desolado: “como se transformou em prostituta, a cidade fiel? Sião [Jerusalém], onde prevalecia o direito, onde habitava a justiça, agora está povoada de assassinos” (Is 1,21). A expectativa de YHWH foi frustrada, pois, “quando esperava o direito, produziram transgressões; quando esperava justiça, defrontou-se com gritos de desespero” (Is 5,7). Sim, “negavam a justiça ao justo” (Is 5,23)! Os juízes iníquos “desapossaram os fracos do seu direito e privaram da justiça os pobres do meu povo, para despojar as viúvas e saquear os órfãos” (Is 10,2). “Jerusalém traiu a Deus porque traiu os pobres”, com a participação ativa das autoridades, que tinham a responsabilidade de defendê-los (SICRE DÍAZ, 2012, p. 371).

Embora não recorrendo ao vocábulo sedaqah, o profeta Oseias descreve o descalabro social de seu tempo pelo descompasso entre o querer de YHWH e as ações dos “habitantes da terra”. “Não há fidelidade nem amor, nem conhecimento de Deus na terra, mas perjúrio e mentira, assassinato e roubo, adultério e violência; o sangue derramado soma-se ao sangue derramado” (Os 4,1-2). O ideal da justiça estava longe de se efetivar!

Nos oráculos de Oseias, a natureza tem um papel essencial. Não apenas pela profusão inigualável das imagens e metáforas que utiliza, mas, também, pela articulação entre injustiça social e desastre ecológico, como se constata, de forma meridiana, em Os 4,1-3. Não é de se estranhar que justiça e horizonte escatológico se entrelacem

(ASURMENDI, 2015-2016ASURMENDI, J. Profetas, Escatologia, Ecologia. Revista Biblica, San Miguel, v. 77, p. 249-270, Dez. 2015-2016., p. 255).

O profeta Miqueias segue na mesma direção, ao denunciar os latifundiários gananciosos que “planejam iniquidade e tramam o mal em seus leitos. Quando amanhece, eles o colocam em prática, por que isso está em suas mãos. Se cobiçam campos, eles os roubam, se casa, eles as tomam. Oprimem o indivíduo e sua casa, o homem e sua herança” (Mq 2,1-2). Resulta daí uma sociedade desequilibrada, por carecer de justiça, descrita pelo profeta com total realismo. “O fiel desapareceu da terra, não há um justo entre as pessoas! Todos estão à espreita para derramar o sangue; eles cercam os próprios irmãos com a rede” (Mq 7,1-4). Numa sociedade tão desintegrada, o profeta recomenda extrema prudência, até mesmo na convivência familiar. “Não confieis no próximo, não ponhais vossa confiança em um amigo; até mesmo diante daquela que dorme em teu seio, guarda-te de abrir a tua boca” (Mq 7,5). Triste constatação!

YHWH esperava de Israel a construção de uma sociedade justa, fruto da obediência, da submissão e da fidelidade ao seu querer. A alegoria da vinha (Is 5,1-7) serve de chave de leitura para compreender a expectativa divina quanto a seu povo e, ao mesmo tempo, sua frustração. Ele esperava uma coisa, contudo, se deparou com outra muito distinta!11 11 Sicre Díaz enumera os dez temas ligados à injustiça que mais chamam a atenção nas denúncias proféticas: “administração da justiça nos tribunais, comércio, escravidão, latifundismo, salário, tributos e impostos, roubo, assassinato, fianças e empréstimos, luxo” (SICRE DÍAZ, 2012, p. 375).

A recusa em praticar a justiça – “fazer a justiça” –, mergulhará o país numa tragédia iminente, pois, a injustiça clama pelo castigo de Deus (Am 2,13-16; 3,11; 5,3; Is 5,25; 10,3-4; Os 8,7; 9,7-9; Mq 2,4; 3,12). Na conjuntura dos profetas, a injustiça decorria da idolatria. Ao se bandear para outros deuses, o povo da Aliança deixava de lado a Lei de YHWH para optar por um agir – ethos – muito distinto, onde a prática da injustiça passava despercebida pelas divindades12 12 O culto a Baal, deus da natureza e da fertilidade, representou um enorme desafio para a fé de Israel, colocando em risco o culto a YHWH, por sua larga difusão no tempo e no espaço (NOCQUET, 2004, p. 289). .

Os profetas denunciaram o fracasso da liderança do povo, a quem cabia criar uma sociedade sem opressores nem oprimidos, tampouco, marginalizados nem explorados. A sociedade alicerçada na sedaqah! A sociedade querida por YHWH! No entanto, foram além das denúncias, ao se manterem fiéis ao Deus de sua fé e seu anseio de uma sociedade fundada na justiça, ponto de integração de todos os seus membros, de modo a não ficar ninguém de fora. Movidos pela esperança, acreditavam ser possível criar a sociedade “ideal”. Dois textos do profeta Isaías apontam nessa direção.

Is 8,23–9,6 menciona um “menino” que, cheio de poder, estabeleceria uma paz duradoura, porque seu trono estará assentado sobre “o direito e a justiça”. O status de “príncipe da paz” permiti-lo-á reverter a situação, de modo a adequar o cenário aos propósitos de YHWH e seu “amor ciumento” em favor de seu povo.

Is 11,1-9 vai na mesma direção, ao falar, metaforicamente, de um “rebento” que nascerá do tronco morto da dinastia davídica e será capaz de promover uma autêntica revolução numa sociedade onde a injustiça campeia (VITÓRIO, 2015VITÓRIO, J. “A justiça será o seu cinturão” (Is 11,5): esperança messiânico-política no profetismo bíblico. In: ALVES, C. F.; SOUZA, R. S. R.; PENZIM, A. M. B. (Orgs.), Igreja e Sociedade: análises em perspectiva. Belo Horizonte: NESP, 2015. p. 25-53., p. 25-53). Repleto do espírito de YHWH, ou seja, de sabedoria, inteligência, conselho, fortaleza, conhecimento e temor de YHWH, agirá como se espera de um autêntico líder em Israel. “Julgará os fracos com justiça; proferirá sentenças justas em favor dos pobres da terra; [...] o sopro de sua boca eliminará o ímpio”. Duas constatações fundamentais: “a justiça será o cinto dos seus lombos e a fidelidade, o cinto dos seus rins”. O fruto da justiça será uma sociedade bem integrada, onde os diferentes convivem, evitando-se pôr em risco a existência uns dos outros. Os exemplos tirados do reino animal dispõem em paralelos seres com características, à primeira vista, difíceis de serem conciliadas. Lobo e cordeiro, leopardo e cabrito, bezerro e leãozinho, vaca e urso, leão e boi, criança lactente e áspide, criancinha e víbora representam os opostos que se entenderão no reino de justiça a ser implementado. Apesar das disparidades entre eles, nenhum mal haverá de acontecer, pois “a terra ficará cheia do conhecimento de YHWH como as águas enchem o mar”. A isso se pode chamar de “o reino da justiça”, onde tudo está interligado.

Na realidade, o profeta Isaías (7.14; 9.6-7; 11.6-9) descreve a comunidade messiânica da perspectiva infantil, um mundo visto com olhos infantis. Isso é olhar o mundo de maneira subversiva que não se contenta em aceitar que a vida neste planeta seja definida, à maneira do adulto hegemônico, por meio de guerras, violência, extermínio do ecossistema, injustiça e opressão. É o mundo de harmonia, paz, igualdade, liberdade total. Seu líder é uma criança e a visão que governa é a infantil

(CETINA, 2017CETINA, E. S. Paz na Bíblia. Revista de Interpretação Bíblica Latino-Americana, São Bernardo do Campo, n. 74, p. 61-80. 2017., p. 70).

Essa esperança não é escatológica, no sentido da apocalíptica, que a projeta para um tempo longínquo, distante dos horizontes humanos. Os profetas insistem na necessidade de se criar já uma sociedade justa. Qualquer hora é hora de fazer a justiça acontecer, como advertia o profeta Amós, ao exigir que o mispat e a sedaqah jorrassem como um rio de águas abundantes (Am 5,24). E, também, o profeta Oseias: “semeai para vós segundo a justiça, colhei conforme o amor [...] é tempo de procurar o Senhor até que ele venha e faça chover sobre vós a justiça” (Os 10,12). O profeta Isaías exorta seus contemporâneos a “buscar o direito, corrigir o opressor, fazer justiça ao órfão, defender a causa da viúva” (Is 1,16), de maneira que Jerusalém “seja redimida pelo direito e seus habitantes, pela justiça” (Is 1,27). Então poderá ser chamada de “Cidade da Justiça e Cidade Fiel” (Is 1,26), pois um governante fiel “buscará o direito e zelará pela justiça” (Is 16,5). Essa será a maneira de mostrar o rosto de YHWH, o “Deus de Justiça”; “será bem-aventurado todo aquele que nele espera” (Is 30,18).

A profecia de Miqueias contém uma declaração lapidar, que pode servir de pauta para quem nutre a esperança de criar um mundo em que a justiça brilhe como sol. “Já lhe foi anunciado, ó ser humano, o que é bom e o que YHWH exige de ti: nada mais do que praticar a justiça, amar a bondade e aceitar caminhar com o seu Deus” (Mq 6,8). Portanto, os profetas, mesmo sendo críticos quanto à injustiça, mantêm-se firmes na esperança de que a história passará por uma transformação, e, assim, a justiça será o nome do mundo transformado.

Na tradição profética, a justiça aparece em estreita vinculação com a paz. Os vocábulos sedaqah e shalom são frequentemente associados. Shalom, em geral, traduzido por paz, não significa ausência de conflitos, e sim a conjuntura fundada no respeito ao valor de cada pessoa, com todos e cada um vendo seus direitos fundamentais serem assegurados. Uma sociedade onde convivem opulência e miséria, baseada em privilégios e marginalização social, mesmo não havendo conflitos nem tensões abertos, será sempre uma sociedade não pacificada, no sentido bíblico, por predominar a injustiça, na contramão do shalom. Só existe sedaqah onde existe shalom e, vice-versa, onde há shalom autêntico haverá sedaqah, como os dois lados de uma moeda. Por isso, o profeta Isaías estabelece o paralelo entre sedaqah e shalom, tranquilidade e segurança, garantidos para todos e todas e para sempre (Is 32,17).

2 A misericórdia nas origens da justiça

A justiça, sedaqah, decorre da prática da misericórdia, hesed, e do direito, mispat. Quando a misericórdia se constitui em alicerce da sociedade e o querer de YHWH corresponde à pauta ética de seus membros, então, sim, haverá justiça e, com ela, a paz, shalom. De fato, “se considerarmos a paz como projeto e estilo de vida alternativos, a paz representa uma nova relacionalidade” (Espinosa Arce, 2017Espinosa Arce, J. P. Una teología de la paz como proyecto alternativo de vida personal y comunitaria. Revista de la Universidad de La Salle, Bogotá, v. 72, n. 1, p. 103-114, jan. 2017., p. 112).

A misericórdia apela, de preferência, para o convívio com os mais fracos e desprotegidos. Em presença deles, devem ficar de lado toda arrogância e tentação de agir com superioridade, de modo a degradar o semelhante. A misericórdia cria solidariedade e cuidado que, por sua vez, levam a garantir a familiaridade respeitosa com o outro fragilizado e fazê-lo se levantar da inferioridade na qual se encontra. Portanto, misericórdia é ação em favor do necessitado; é engajamento em vista de resgatar o oprimido das garras do opressor; e empenho para fazer valer o direito de quem é desonrado pela violência ou pelo egoísmo dos malvados.

A palavra hebraica hesed tem sido traduzida de diferentes maneiras, de modo a ajustá-la ao contexto de sua ocorrência, com a tradução mais precisa. Destarte, pode ser traduzida como amor, misericórdia, piedade, benevolência, bondade, não existindo uma tradução padrão, pois o termo hesed tem larga abrangência (JENSEN, 2009JENSEN, J. Dimensões éticas dos profetas. São Paulo: Loyola, 2009., p. 129). A tradução mais comum é amor e misericórdia, havendo outros termos para se traduzir amor (‘ahabah) e misericórdia (rahamim = entranhas; donde a expressão “entranhas de misericórdia”, em Cl 3,12). Em Zc 7,9, encontramos a formulação: “praticai o amor (hesed) e a misericórdia (rahamim)”.

Alguns textos proféticos falam da misericórdia de Deus para com suas criaturas: “eu sou YHWH que pratico o amor (hesed), o direito e a justiça na terra. Porque, é disso que eu gosto” (Jr 9,23); “YHWH é bom; o seu amor (hesed) é para sempre” (Jr 33,11); “os montes podem mudar de lugar e as colinas podem abalar-se, porém meu amor (hesed) não mudará, minha aliança de paz não será abalada, diz YHWH” (Is 54,10).

Os profetas, ao mesmo tempo em que proclamam a misericórdia de Deus, denunciam a falta de misericórdia dos seres humanos entre si. Para o profeta Oseias, a falta de misericórdia (hesed) deu origem aos homicídios, aos roubos, à violência, ao derramamento de sangue (Os 4,1-2). Para ele, a prática da misericórdia deve prevalecer em se tratando do culto, ideia formulada de maneira inequívoca: “quero misericórdia (hesed) e não sacrifício (zabah), conhecimento de Deus mais do que holocaustos” (Os 6,6). O conhecimento de Deus desdobra-se na prática da misericórdia no relacionamento com o próximo. Daí a admoestação do profeta: “guarda a misericórdia (hesed) e o direito e espera sempre em teu Deus” (Os 12,7).

O profeta Miqueias segue a mesma direção, quando ensina a “amar a misericórdia” (Mq 6,8). Quem caminha com Deus aprende com ele a ser misericordioso. Será impossível alguém pretender caminhar com Deus, não se importando de exercitar a misericórdia. A misericórdia corresponde ao rosto da fé e do compromisso com Deus; torna-se encarnação da fé. Eis por que o profeta Miqueias será duro na denúncia das violências praticadas contra os fracos e indefesos. Não suporta os gananciosos que se apropriam dos bens alheios (Mq 2,1-2). Mas, também, os opressores (Mq 3,1-3), os profetas venais que, com suas profecias, acobertam a falta de misericórdia (Mq 3,5), todos quantos são promotores de um sistema de iniquidade (Mq 3,9-12) e toda sorte de defraudadores (Mq 6,9-12).

O profeta Oseias denuncia a misericórdia inconsistente de seus contemporâneos com uma metáfora: “o vosso hesed é como o nevoeiro da manhã, como o orvalho que cedo desaparece” (Os 6,4). Equivoca-se quem se contenta com a prática da misericórdia em alguns momentos ou em certas situações, esquecendo-se de transformá-la em verdadeiro estilo de vida. Misericórdia vacilante, em última análise, corresponde à sua ausência, pois os irmãos e as irmãs fragilizados dependem dela, a cada momento, para sobreviver. Quando lhes falta misericórdia, correm o risco de se tornarem vítimas da prepotência dos grandes, de modo a se verem privados de sua dignidade. Só a misericórdia dos irmãos e das irmãs pode lhes garantir uma vida digna, em contexto de perversidade. Como o hesed de YHWH é eterno (Sl 136 [135]), da mesma forma deve sê-lo o de seus adoradores.

3 O direito como ethos da justiça

A misericórdia (hesed), embora apele para a generosidade e a gratuidade, tem um balizamento jurídico, correspondente ao direito divino, que, na Bíblia, chama-se mispat. O termo tem variadas conotações. Pode significar o ato judicial (Is 3,14 – YHWH entra em mispat com a liderança de Jerusalém), o julgamento-sentença numa decisão (Is 1,17; 4,4; 5,16; Os 5,11), a regra-norma (Is 28,17) e a justiça (Is 34,5). Aqui nos interessa mispat no sentido de direito, aquilo que rege a conduta em sociedade e está codificado, de modo especial, no Livro do Deuteronômio (Dt 12–26)13 13 Na Bíblia, ao Código Deuteronômico (Dt 12–26), somam-se o Código da Aliança (Ex 20–23) e o Código Sacerdotal (Lv 17–26). . O mispat é propriamente a ética, o estilo de vida, o modo de proceder em sociedade, sob o qual se encontram todos os membros da comunidade; por outro lado, o conteúdo dessa ética corresponde àquele da torah. Pregando a submissão ao mispat, os profetas exortam o povo a obedecer a torah. Num tempo de grande desrespeito à mispat, serão compelidos a fazer desse ponto um tema central de sua pregação.

Os profetas são muito sensíveis quando se trata de perceber a desobediência ao mispat. Olhando ao redor, logo se dão conta dos resultados: assassinatos (Is 1,21), transgressões (Is 5,7), exploração dos fracos (Is 10,2), indigentes vitimados por trapaças (Is 32,7), perversão do mispat convertido em “planta venenosa” (Os 10,4) e “veneno” (Am 6,12). Os agentes da maldade não têm pudor de “execrar o mispat” (Mq 3,9). A missão dos profetas, então, consistirá em convencer o povo a se submeter ao mispat e a se pautar pelos mandamentos de YHWH, atuando como instância crítica, ao falar em nome de YHWH. Tornam-se a boca de YHWH a exigir atenção ao mispat, pois só a obediência ao mispat poderá redimir Sião (Is 1,27), ao se tornar a regra de vida em sociedade (Is 28,17).

O profeta Miqueias anuncia intrépido sua disposição interior: “estou cheio de força, do espírito do Senhor, de mispat e de coragem para anunciar a Jacó seu crime e a Israel seu pecado” (Mq 3,8). Expressa, dessa forma, o entendimento de sua missão de fazer valer o querer de YHWH, numa sociedade pervertida (Mq 7,2).

Se a liderança do povo se recusa a agir segundo o mispat, YHWH segue a direção oposta, por ser o “Deus do mispat” (Is 30,18). Mesmo quando castiga, mantém-se nos limites do mispat (Is 28,26), para não ser injusto, pois o castigo divino deve ser sempre pedagógico, ao visar o restabelecimento do mispat. O profeta Oseias, falando em nome de YHWH, declara: “eu os feri por meio dos profetas, matei-os pelas palavras de minha boca, para que o meu mispat surja como luz” (Os 6,5). Já o profeta Isaías, mirando o futuro, em tempos de infidelidade, intui o surgimento de um líder capaz de fazer o mispat ser respeitado, porque ele mesmo será um exemplo de vida calcada no querer divino. O mispat tornar-se-á a pauta ética da vida comunitária, pois nele o trono está firmado (Is 9,6) e por ele os príncipes se guiarão (Is 32,1). O “espírito de mispat” estará sobre quem “exerce o mispat” (Is 28,6), de modo que “o mispat habitará o deserto” (Is 32,16), pois YHWH é quem “assegura abundantemente a Sião o mispat e a sedaqah” (Is 33,5).

4 Fidelidade, uma exigência da justiça

Um elemento importante na construção da sedaqah corresponde à fidelidade, ou seja, a perseverança no compromisso com YHWH e seu desígnio para Israel. A inconstância torna-se atitude indesejada, quando se trata da Aliança com o seu Deus. Pelo contrário, recomenda-se a firmeza e a persistência, mesmo quando se deve enfrentar oposições, como foi o caso dos profetas. A palavra hebraica para expressar essa realidade é ‘emet, que, como nos vocábulos anteriores, supõe a Aliança como ponto de referência. Fidelidade e infidelidade são as duas posturas diante do pacto com Deus, tornando-se impossível uma terceira alternativa.

No trato com Israel, YHWH se mostra um Deus fiel que se atém, ciosamente, à palavra dada. Sua fidelidade foi demonstrada na longa trajetória de seu povo, de modo especial, nos momentos mais difíceis, quando a Aliança foi rompida. Nessas circunstâncias, a fidelidade de Deus desponta com toda força. Da parte de Israel, não havia contrapartida, uma vez que a fidelidade divina era respondida com infidelidade; a consideração ao pacto, por parte de YHWH, encontrava como resposta a flagrante insubordinação de Israel. Assim, a atitude de Israel estava em aberto contraste com a atitude de YHWH. Para o profeta Oseias, isso era evidente: “não há fidelidade (‘emet), nem amor, nem conhecimento de Deus no país” (Os 4,1), com suas terríveis consequências, em termos de insuportável perversão social (Os 4,2).

Se, na ótica de YHWH, assumida pelos profetas, era evidente a infidelidade de Israel, a caminhada do povo seguia noutra direção. Israel continuava tranquilamente a prestar culto a YHWH, parecendo submeter-se ao mispat divino. Mas, de fato, sua prática religiosa era vazia, pura exterioridade. Is 48,1 denunciava: “(vocês) confessam o Deus de Israel, mas sem firmeza (sedaqah) nem fidelidade (‘emet)”. Logo, Israel enganava-se a si mesmo!

Olhando para o futuro, os profetas entreveem a restauração da fidelidade e consideram a possibilidade de conversão. A experiência desastrosa pela qual passou Israel, obrigado a partir para o exílio, fá-lo-á reconsiderar sua infidelidade a YHWH. Aliás, a releitura do passado que desembocou na destruição da Samaria e na deportação de seus habitantes, em 721 a.C, pelos assírios (2Rs 17,7-23), de igual modo na destruição de Jerusalém e no exílio, consumados pelos babilônios, em 597 e 587 a.C. (2Rs 24–25), permitia reconhecer a infidelidade do povo e sua desconsideração do pacto estabelecido com seu Deus. A história trágica era consequência da infidelidade de Israel no compromisso com seu Deus.

Para o profeta Miqueias, a fidelidade não resultará do puro esforço humano, antes será um dom de YHWH, como afirma Mq 7,20: “tu darás a Jacó a fidelidade (‘emet) e o amor (hesed), a Abraão”. O profeta Isaías fala dos pais ensinando aos filhos a fidelidade a YHWH (Is 38,19), caminho de recuperação da comunhão com o Deus da fé e as esperadas consequências na construção de uma sociedade onde a afinação social entre as pessoas desponte como o resultado mais desejado.

5 Shalom, o rosto histórico da justiça

O vocábulo shalom, várias vezes referido nas reflexões anteriores, merece uma abordagem especial, em se tratando de relacionar a tradição profética bíblica e a ecologia integral. A tradução do termo hebraico shalom pelo grego eirene, não dá conta da riqueza semântica do original. A palavra paz, correspondente à tradução portuguesa, também, está longe de integrar a cosmovisão do shalom hebraico. Tende-se a pensar a paz como ausência de guerras e de conflitos, na linha da boa convivência, limitando-se ao trato entre os cidadãos e as cidadãs, mesmo com indiferentismo ou mútuo desconhecimento, “cada qual no seu canto”, bastando não cultivarem desavenças. A palavra adequada para se designar esse fenômeno é irenismo, de origem grega, onde os contrários convivem, numa aparente concórdia, fechando-se os olhos para as injustiças cometidas contra os mais fracos. Corresponde a esconder a verdade com uma aparente pacificação, virando-se as costas para o que tem de injustiça no cotidiano da sociedade.

O shalom bíblico segue numa direção muito mais rica e abrangente. Abarca a conjuntura na qual o direito e a dignidade de todos os cidadãos e cidadãs são assegurados; a prosperidade chega a todos, indistintamente; caso alguém se veja reduzido à pobreza e à indigência, receberá o cuidado dos irmãos e das irmãs, gratuita e solidariamente. No âmbito da Bíblia, “não podemos entender a paz sem uma ótima ordem de relações que promovam o bem-estar de todas as pessoas. A justiça corresponde àquela virtude que gera o fruto da paz” (Espinosa Arce, 2017Espinosa Arce, J. P. Una teología de la paz como proyecto alternativo de vida personal y comunitaria. Revista de la Universidad de La Salle, Bogotá, v. 72, n. 1, p. 103-114, jan. 2017., p. 110).

Trata-se do cosmos socioambiental ansiado por Deus, que integra também elementos do meio ambiente, como se vê na chamada Lei Deuteronomista (Dt 12–26) (REIMER, 2001REIMER, H. Sobre pássaros e ninhos: olhar ecológico em leis do Deuteronômio. Revista de Interpretação Bíblica Latino-Americana, São Bernardo do Campo, n. 39, p. 34-45, 2001., p. 34-45). Nessa direção, segue a proibição de abater árvores frutíferas com golpes de machado, por ocasião do sítio de uma cidade, permitindo-se cortar árvores não frutíferas. O argumento é interessante: “uma árvore do campo é, por acaso, um ser humano, para que a trates como um sitiado?” (Dt 20,19-20). Outra interdição visava os ninhos de pássaros, “com filhotes ou ovos e a mãe sobre os filhotes ou sobre os ovos”; deve-se deixar a mãe partir em liberdade, ao se capturar os filhotes, “para que tudo corra bem a ti e prolongues os teus dias” (Dt 22,6-7). A pureza do solo deveria ser garantida, por exemplo, não se fazendo as necessidades fisiológicas em qualquer lugar. Os soldados deveriam trazer consigo uma pá, para, quando fossem fazer as necessidades fisiológicas fora do acampamento, cavassem uma cova e enterrassem os excrementos, para não acontecer de YHWH pisar neles, quando “andasse pelo acampamento” (Dt 23,13-15).

O profeta Isaías, num hino de ação de graças (Is 26,1-6), chama a atenção dos habitantes de Jerusalém para a tarefa que YHWH lhes confiou. “Está decidido: tu manterás o shalom, pois o shalom foi confiado a ti” (Is 26,3). Com isso, será revertido o cenário de Is 1,21, que falava da corrupção da Cidade Santa, “onde prevalecia o mispat, onde habitava a sedaqah, mas, agora, povoada de assassinos”. O shalom desponta quando impera a fraternidade e o querer de YHWH se torna embasamento ético da sociedade. Aliás, YHWH “assegura o shalom”, pois, “todas as nossas obras tu as realiza para nós” (Is 26,12). Numa afirmação memorável, o profeta declara: “o fruto da sedaqah será o shalom, e a obra da sedaqah consistirá na tranquilidade e na segurança para sempre. Meu povo habitará em moradas de shalom, em lares seguros e em lugares tranquilos” (Is 32,17). Portanto, a tribulação desaparecerá da vida dos cidadãos e das cidadãs, que poderão gozar de uma existência serena, anseio de todos e todas, de modo especial, os mais pobres e carentes.

O profeta Amós, com duas admoestações contundentes, proclama os pré-requisitos para que haja shalom: “odeiem o mal e amem o bem, garantam o exercício do mispat à porta” (Am 5,15); “que o mispat corra como a água e a sedaqah como um rio caudaloso” (Am 5,24). O anseio do profeta, em conformidade com o querer de YHWH, mirava uma sociedade onde as injustiças fossem superadas, dando lugar a um tempo novo, de garantia dos direitos básicos de cada cidadão e cidadã, configurando o que hoje se chama ecologia integral, com foco no humano.

O qualificativo “integral” para a ecologia comporta uma série de significados distintos e complementares, tais como: inteireza, articulação sem reduzir as diferenças, união da estética com a ética, diálogo da fé com a ciência, abrangência de múltiplos fatores (ambiental, econômico, social, cultural), unificação da perspectiva ambiental com a social, superação do pragmatismo utilitarista, simultaneidade de ações pessoais e coletivas, e uma espiritualidade unificadora

(MURAD, 2022MURAD, A. Janelas abertas: fé cristã e ecologia integral. Paulinas: São Paulo, 2022., p. 116-117).

A profecia de Miqueias segue na mesma direção, quando anuncia o que “é bom para o ser humano” (Mq 6,8). O modo de viver, alicerçado na sedaqah, resultante do se deixar tocar pelo hesed, num caminhar contínuo em comunhão com Deus, com certeza, terá como resultado uma sociedade de irmãos e irmãs, sem opressores e oprimidos, indicativo do shalom acontecendo na vida do povo. Essa será a maneira de reverter o caos social, cruamente, descrito em Mq 7,1-6, onde “os inimigos do ser humano são as pessoas de sua própria casa” (Mq 7,6d). Quanto mais os infortúnios sociais se disseminam, tanto mais a sociedade se afasta do que se entende por ecologia integral humanista. Pelo contrário, na medida em que passa por um processo de reversão, a sociedade se coloca no bom caminho de reconstrução dos laços destruídos, com a consequência de ver despontar o shalom.

6 Ecologia integral como humanidade integral: obra divina com colaboração humana

A chave de leitura profética permite-nos entender a ecologia integral como humanidade integral. Os profetas bíblicos chocam-se, em primeiro lugar, com a injustiça disseminada na sociedade, vitimando as camadas mais pobres da sociedade, incapazes de fazer valer seus direitos, devido à ação desumanizadora dos ricos e das classes dirigentes. A preocupação com o meio ambiente, no sentido da atual percepção ecológica, não fazia parte de sua agenda. Mas a questão ecológica, sim!

Os profetas, em função de sua natureza própria de “denunciar o insuportável e anunciar o inimaginável”, não apenas denunciam, mas, também, incluem a dimensão ecológica em suas utopias escatológicas, ou seja, sua escatologia ecológica (ASURMENDI, 2015-2016ASURMENDI, J. Profetas, Escatologia, Ecologia. Revista Biblica, San Miguel, v. 77, p. 249-270, Dez. 2015-2016., p. 250).

A discrepância nas relações interpessoais, no discernimento profético, incidia sobre a vida dos indivíduos, numa sociedade classista e excludente, em que o querer de YHWH era continuamente atropelado. O desastre ecológico tornava-se perceptível na forma como os estratos mais baixos da sociedade eram tratados pelos estratos superiores, a começar pelo rei e sua corte.

O ideal de fraternidade, num mundo de irmãos e de irmãs, onde não existe excluídos e marginalizados, e tudo está bem interligado, estava sempre mais distante. Em termos simbólicos, era como se houvesse sido reeditada a situação de outrora, no Egito, quando Israel padecia sob o domínio do faraó, determinado a destruí-lo, e foi socorrido por YHWH, que o adotou como povo e tomou suas dores, decidindo libertá-lo da escravidão e conduzi-lo à terra da liberdade e da irmandade (Os 11,1-9). Essa experiência constituiu-se em ponto de partida da teologia de Israel, continuamente narrada, de forma a não cair no esquecimento. “Nossos pais nos contaram...” (Sl 44[43],2; 78[77],3) tornou-se a maneira de manter viva a memória do êxodo, que abriu para Israel expectativas de sobrevivência, num patamar inteiramente distinto, longe das garras do opressor.

Os profetas deram-se conta de como a experiência fundante de Israel tornara-se fato do passado, porquanto, os irmãos empobrecidos eram vilipendiados pelos irmãos detentores do poder econômico, social, político e religioso, desprovidos do sentido da misericórdia e da percepção das exigências de seu Deus. Esses se tornaram os faraós nas vidas daqueles e os profetas, conscientes de terem sido enviados por YHWH para tomar a defesa deles (Am 7,14; Is 6,8), tornaram-se quais novos Moisés a liderar a libertação, de modo a recolocar nos eixos uma sociedade inteiramente desviada de seus rumos.

A leitura profética não podia tolerar a falsa segurança religiosa perceptível na sociedade, onde a fumaça dos holocaustos impedia os adoradores de YHWH de perceber a situação indigna em que viviam os mais pobres. Um culto faustoso anestesiava a consciência da liderança de Israel, levando-a a esquecer que YHWH é um Deus de propósitos éticos, dos quais não abre mão, mormente, ao escutar os gritos lancinantes dos explorados e vitimados pela maldade alheia (Is 1,10-20) (VITÓRIO, 2016VITÓRIO, J. Culto desagradável a Deus – A denúncia profética da falsa religião em Is 1,10-20. Estudos Bíblicos, Petrópolis. v. 33, n. 129, p. 71-84, jan/mar. 2016., p. 71-84). A percepção da estreita correlação entre a desumanidade imperante e a ação dos adoradores de YHWH, como seus agentes, levava-os a denunciá-la, com valentia, e a pleitear a recuperação da harmonia social, como requisito incontornável para a restauração da Aliança e as bênçãos decorrentes da fidelidade a Deus.

A construção da humanidade integral, como shalom, da qual os empobrecidos e marginalizados seriam os principais beneficiados, na compreensão profética, não seria obra de um Deus ex machina, atuando à revelia da colaboração humana, para ordenar o que havia sido desintegrado por obra de seres humanos. Duas perícopes do profeta Isaías, já referidas, e uma do profeta Miqueias fazem alusão a um personagem histórico, cuja ação capitaneada por Deus poria nos eixos a sociedade transtornada pelas discrepâncias entre seus cidadãos. Vale a pena retomá-las!

Is 9,5 fala de um “menino” (yeled), nascido como dom divino, tendo sobre os ombros uma imensa missão. Seus inúmeros títulos descortinam as diversas vertentes de sua atuação: “Conselheiro maravilhoso, Deus forte, Pai eterno, Príncipe da paz”. Cabe-lhe estabelecer um “shalom eterno” (Is 9,6), com o banimento da injustiça, a volta do mispat e a consequente sedaqah com suas feições de shalom. Portanto, como sempre acontece com a ação divina, Deus se serve de mediadores de seu agir. O texto bíblico reflete a expectativa do profeta, seu anseio e convicção profundos, a ser incutida no coração dos concidadãos, tanto dos opressores quanto de suas vítimas. Quem haveria de ser, concretamente, tal “menino” escapa do conhecimento do profeta. Só o tempo para revelar sua identidade.

Is 11,1-9 expressa a esperança na ação de um futuro descendente do rei Davi, portanto, um messias, não saído da realeza instaurada em Jerusalém e, sim, das raízes originais, aludidas como “tronco de Jessé”. Embora seja descrito na posição de rei com a tarefa de implantar a sedaqah, o messias tem a identidade de um profeta, visto que sobre ele “repousará o espírito de YHWH” (Is 11,2). Em outras palavras, agirá sob a moção divina, de modo a não se desviar do caminho que lhe foi traçado. Antes, tudo quanto fizer será na mais estreita sintonia com o propósito de YHWH para seu povo, a ponto de ser restaurada a estabilidade pela superação de toda e qualquer dominação dos fortes sobre os fracos. Seus “atos próprios de justiça trazem como consequência o shalom” (CETINA, 2017CETINA, E. S. Paz na Bíblia. Revista de Interpretação Bíblica Latino-Americana, São Bernardo do Campo, n. 74, p. 61-80. 2017., p. 70). Tudo isso será possível porque a “a terra ficará cheia do conhecimento de YHWH, como as águas enchem o mar” (Is 11,9b). Em outras palavras, a ação do messias terá como foco fazer Israel compreender o querer de YHWH e torná-lo propósito de vida. Então, sim, haveria de irromper a humanidade integral, como shalom, nos moldes queridos por YHWH. Tudo isso pela ação destemida do rebento surgido no “tronco de Jessé” (Is 11,1).

O profeta Miqueias parece seguir na mesma direção do profeta Isaías. Mq 5,2 fala da “parturiente que dará à luz”, cujo filho tomará as rédeas da situação, fazendo as coisas voltarem aos devidos lugares. O profeta não se reporta a um rei (melek) e sim a um governante (moshel) de identidade davídica, já que será proveniente de Belém-Éfrata (Mq 5,1), conectado com o tronco ancestral. Quem será o recém-nascido, a quem cabe uma missão de grande porte? A história fica em aberto! O profeta pensa-o com a metáfora do pastor “que se ergue para apascentar o rebanho com a força de YHWH e pela glória de seu nome” (Mq 5,3). Por ser como um pastor, haverá de conduzir o povo pelos bons caminhos da sedaqah, em vista da concretização do shalom (Mq 5,4a).

Essas três perícopes proféticas alertam para a responsabilidade de cada pessoa na construção da humanidade integral almejada por Deus, como expressão do shalom. Ela não cairá do céu, como num passe de mágica! Tampouco, acontecerá por geração espontânea, à revelia da cooperação humana! Antes, o nascimento da humanidade integral querida por Deus resultará do compromisso de tantos homens e mulheres, movidos pelo “espírito de YHWH”, como os profetas de outrora.14 14 Pode-se falar de um “ecologismo dos pobres”, que “se organizam para defender a terra, quando está ameaçada”, pois “se reconhecem parte dela”, daí lutarem por sua “sustentabilidade” (MOZOS, 2016, p. 95-96). Contudo, são homens e mulheres de iniciativa e de ação, bem diferente dos que têm boas ideias e excelentes intenções, desprovidos da capacidade de darem o passo para concretizá-las.

7 Do ser humano descartado ao ser humano interligado, um percurso profético de ecologia integral como sedaqah-shalom

O profetismo bíblico oferece uma excelente chave de leitura para a vivência do profetismo cristão, na atualidade, focando a ecologia integral, entendida como humanidade integral na qual todos os humanos são respeitados em sua condição de filhas e filhos de Deus e a fraternidade se torna o alicerce das relações interpessoais.15 15 O Papa Francisco tem se constituído em profeta da humanidade integral, expressão da ecologia integral, em seus ensinamentos e em seus gestos carregados de questionamento para a consciência adormecida de tantos cristãos (BARBOSA, 2020, p. 51-64). Na Exortação Apostólica Evangelii Gaudium n. 186, o Papa, ao falar da “inclusão social dos pobres”, alude à “preocupação pelo desenvolvimento integral dos mais abandonados da sociedade”. A partir daí, justifica-se falar em proteção da Casa Comum e sustentabilidade do planeta, locus onde se torna possível viver a fraternidade e a partilha.

Eis alguns tópicos do profetismo ecológico humanista, nos passos dos profetas de Israel:

  1. Na base do profetismo bíblico, está a experiência de fé que aponta para um Deus comprometido com a ética, distinto das divindades de outros povos, pouco afetadas pelo que se passa no mundo dos mortais. A imagem do Deus de Israel aponta para a libertação do povo da escravidão egípcia e sua condução para a Terra Prometida, com o propósito de viver como irmãos e irmãs. A Lei dada a Israel visava garantir a fraternidade e coibir toda sorte de vilipêndio dos direitos de cada israelita. A atenção de Deus foca, em primeiro lugar, o ethos do povo. Não lhe interessa um culto pomposo, desprovido da prática da justiça entre seus adoradores. Esse se torna o ponto de partida da pregação profética, com o entendimento aguçado dos profetas de Israel. Será, igualmente, o ponto de partida do profetismo cristão preocupado com a ecologia integral.

  2. A concepção de ser humano (antropologia) faz eco à concepção de Deus (teologia) na pregação profética. Uma antropologia em descompasso com a teologia seria incompatível com a hermenêutica profética. A grandeza de Deus transborda para o ser humano, criado à “sua imagem e semelhança” (Gn 1,27). Logo, cada pessoa deverá ser respeitada e valorizada, no que tem de mais valioso e dignificante. Qualquer ação em seu detrimento afetará de cheio o Deus da fé de Israel. Esse jamais ficará indiferente, no confronto com pessoas privadas da elevada identidade com a qual foram criadas. O profeta verdadeiro terá suficiente sensibilidade para detectar as antropologias que falam da pessoa humana de forma incorreta ou insuficiente, dando margem para as falsas posturas de quem se dá o direito de oprimir e marginalizar o próximo.

  3. O profetismo bíblico, no sulco da antropologia bíblica, pensa sempre o ser humano como ser de relação. A cultura atual, na linha do egocentrismo e do narcisismo, não faz eco da tradição judaico-cristã, preocupada com a vida comunitária, em seus variados âmbitos e níveis, a serem, devidamente, integrados. Nessa visão bíblica de sociedade, o indivíduo desconectado da comunidade está fadado à morte. De fato, não tinha como subsistir, caso lhe viessem a faltar a presença e a solidariedade dos irmãos e das irmãs. Os profetas pensam a sociedade como resultado da perfeita integração de todas as pessoas, embora com papeis e responsabilidades distintos. A sociedade classista e hierárquica causava-lhes arrepios, visto que os poderosos se impunham aos fracos, os ricos se prevaleciam dos pobres, os indigentes e os desfavorecidos eram fadados a uma vida indigna. Ao revés, os profetas pensavam todos interligados como irmãos e irmãs, o povo de Deus.

  4. A vivência consolidada da fé e a preocupação com as circunstâncias em que viviam os concidadãos permitiam aos profetas bíblicos fazer uma contínua avaliação da história e, nela, detectar os atropelos da fraternidade. Essa convicção crítico-teológica capacitava-os para ver o que os demais, especialmente os ricos e os detentores do poder, eram incapazes de ver. A percepção profética ultrapassa a superfície e penetra os meandros mais profundos do tecido social, invisíveis aos olhares facciosos, intolerantes, corporativistas, excludentes e preconceituosos das elites. As primeiras vítimas desse estado de coisas são as camadas sociais onde se encontra a grande maioria das pessoas, reduzidas a objeto nas mãos de seus exploradores. O quadro socioambiental dos tempos dos profetas bíblicos não difere muito do nosso, apenas, pelas proporções infinitamente menores. Diferentes em proporções, ainda assim, tremendamente iguais em termos humanos e existenciais.

  5. Os profetas bíblicos ergueram as vozes para denunciar as injustiças e seus causadores. Em momento algum, lhes faltou coragem para atingir o ponto fraco e desmascarar as tramoias dos prepotentes, com palavras incisivas. Quem os ouvia, jamais teria que se dar ao trabalho de se perguntar: o que estão dizendo? Contra quem estão falando? Por que essas palavras contundentes? Antes, ninguém teria dificuldade de identificar quem estava na mira dos profetas, seja lá quem fosse o promotor da injustiça. Como consequência, as perseguições vinham na certa! Com isso, eles servem de alerta contra os discursos vazios de certos pregadores que pretendem denunciar os desmandos sociais, passando à margem do pesado preço a ser pago. Torna-se difícil ser profeta, com a densidade dos profetas bíblicos, caso alguém tenha a pretensão de salvaguardar o nome, a reputação, os privilégios ou os cargos. O profetismo, numa linha de ecologia humanista, exige pessoas totalmente livres, apenas interessadas em fazer acontecer o anseio divino para suas criaturas, a despeito de sofrer calúnias, perseguições e, eventualmente, a morte violenta.

  6. O olhar profético dirige-se para a sociedade, em seu conjunto. No entanto, os pobres, os fracos, os marginalizados e os indefesos ocupam o maior espaço. O menosprezo pelo programa ético de Deus, neles, aflora com toda crueza. O grito calado dessa porção da sociedade ressoa estridente aos ouvidos dos profetas, que se deixam afetar e, por consequência, sentem-se na obrigação de denunciar os abusos dos quais os últimos da sociedade são vítimas. Entrementes, ao culpabilizar os geradores de opressão, fazem-no em nome do compromisso com Deus. A fé, desse modo, visibiliza-se na ação profética em prol dos últimos da sociedade, como expressão da solidariedade compassiva dos profetas. O confronto com os sofredores desencadeava um dinamismo espiritual que os levava a falar em nome de Deus. Experiência semelhante fazem os profetas contemporâneos que, tocados pelo clamor dos oprimidos e marginalizados, tornam-se “boca de Deus”, a denunciar o desacerto ecológico, representado por uma sociedade de opressores e oprimidos, exploradores e explorados, senhores e servos, em total descompasso com o querer do Criador.

  7. A liberdade perante todas as instituições constituía-se numa marca registrada dos profetas verdadeiros em Israel, diferente dos falsos profetas. A certeza da origem divina de sua vocação e missão impedia-os de se curvarem aos promotores de injustiça, tanto menos de nutrirem medo deles. Importava-lhes, tão somente, dar mostras de total fidelidade ao seu Deus. Em consequência, denunciaram os reis e os ricos proprietários, mas, também, os sacerdotes, os profetas áulicos, os juízes, as grã-finas da sociedade, os comerciantes, os militares. A consciência crítica dos profetas permitia-lhes detectar o calcanhar de Aquiles de cada uma dessas categorias sociais, no tocante aos desvios de conduta e seus reflexos sobre os estratos inferiores da sociedade. Tamanha criticidade desdobrava-se em denúncias contundentes, na esperança de reverter a tragédia social. Nessa mesma direção, atuam os profetas de todos os tempos, no que tange à ecologia integral, como humanidade integral. Jamais se dobrarão ao se defrontarem com os responsáveis pelo caos social, sejam eles quem forem, até mesmo as instituições eclesiásticas.

  8. A sociedade dos tempos dos profetas girava em torno da religião. O fenômeno do ateísmo era coisa impensável. Entretanto, causava-lhes desconforto ver a religião instrumentalizada em função da ganância das elites, com seu culto magnífico, porém, desprovido de misericórdia e de compaixão em favor dos pequenos e desprotegidos. Uma imagem distorcida de Deus, à margem da ética, abria-lhes espaço para a conjunção de culto e injustiça, louvor a Deus e exploração do próximo, santidade no templo e nos santuários e perversidade nas relações sociais. Os profetas davam-se conta de que o Deus de Israel fora reduzido ao nível dos ídolos cananeus e seu desinteresse pelo que se passava no âmbito do convívio humano. Daí denunciarem impávidos o culto des-agradável a Deus, que não se contenta com liturgias grandiosas, carentes do respaldo da justiça. Os profetas modernos, preocupados com a ecologia integral, serão impávidos em questionar as igrejas e as religiões com suas lideranças, na medida em que investem na construção de templos majestosos, em liturgias bem elaboradas, em cultos espalhafatosos, esquecendo-se do que mais agrada a Deus: a prática da misericórdia e o serviço fraterno e desinteressado aos irmãos e às irmãs sofredores, cuja nobreza de filhos e filhas de Deus deve ser restaurada.

  9. A dureza de seus oráculos pode passar a impressão de os profetas estarem desiludidos com seu universo de atuação, incrédulos em torno do futuro. Ledo engano! A esperança está sempre diante de seus olhos, como perspectiva de reviravolta nas estruturas sociais – revolução (?) – onde a integração social seja recuperada com o banimento das injustiças e a instauração do shalom. Suas palavras afiadas têm caráter pedagógico, considerando a ausência do bom-senso e da sabedoria geradoras de bem-estar e conformidade com o escopo de Deus para seu povo. Ao anunciar o fim, simultaneamente, os profetas anseiam pela eclosão do mundo novo, com misericórdia, direito, justiça e fidelidade. Os profetas da desgraça inapelável tendem a ser falsos, ao considerarem a possibilidade da frustração definitiva do desígnio de Deus ou sua inexequibilidade, como se Deus fosse vencido por suas criaturas. Uma teologia desse porte carece de respaldo na tradição de Israel e não serve de inspiração para os profetas que denunciam os transtornos ecológicos e, ao mesmo tempo, sentem-se impelidos a anunciar o mundo querido por Deus.

  10. A cosmovisão bíblico-profética não comporta a defesa implacável da Casa Comum e da sustentabilidade do planeta, nos moldes da ecologia integral, pensada a partir das convicções e da ciência atuais. Todavia, oferece uma pista valiosa de reflexão e de ação quando insiste numa forma de humanidade integral, mirando a sociedade para além de suas fraturas, geradoras de desigualdade, de servidão, de fome, de violência, de guerra e de morte. Se se pensa a Casa Comum e o planeta como lugares de vivência da humanidade integral, com facilidade se poderá passar do profetismo bíblico ao profetismo hodierno voltado para questões de meio-ambiente e ecologia. Com certeza, no horizonte dos profetas da ecologia integral, está presente a sorte e o destino de largas faixas dos habitantes do planeta vitimados pela pobreza, carentes dos recursos básicos para sobreviverem com um mínimo de dignidade. A luta pela humanidade integral deve, necessariamente, desdobrar-se como luta pela ecologia integral. Afinal, os profetas dos tempos bíblicos e os profetas de hoje se encontram numa mesma empreitada.

Conclusão

O profetismo bíblico tem muito a ensinar aos cristãos e às cristãs empenhados na luta pela ecologia integral, com espírito profético. Seu olhar se volta para o explorado, o marginalizado, o despido da grandeza de filhos e filhas de Deus. Assim, a defesa da ecologia integral assume a face da defesa da humanidade a ser articulada em sintonia com o querer de Deus para os que criou à sua “imagem e semelhança”16 16 As catequeses evangélicas narram Jesus de Nazaré comprometido com a construção de uma nova humanidade, nos passos dos profetas bíblicos (VITÓRIO, 2020, p. 559-583). .

A preocupação com a sustentabilidade do planeta e tantas outras pautas ecológicas tornam-se relevantes, na medida em que têm os seres humanos como centro de seu interesse, dentre eles, as largas faixas da população que vivem abaixo da linha da pobreza ou com o mínimo de condições para satisfazer suas necessidades elementares. A questão passa à margem das discussões acadêmicas, interessadas em determinar um ponto de vista para a compreensão do universo, teológico, antropológico, biológico ou cosmológico. Trata-se, sim, do cultivo de um espírito filantrópico, no sentido etimológico do termo, a criar compaixão misericordiosa diante do grito da humanidade aflita a suplicar, pelo menos, as migalhas da mesa dos ricos para sobreviver. Apresenta-se, assim, uma “alternativa para cultivar um novo estilo de vida, alegre, simples, equilibrado, em comunhão com todos os seres que habitam nossa casa comum” (MURAD, 2022MURAD, A. Janelas abertas: fé cristã e ecologia integral. Paulinas: São Paulo, 2022., p. 77).

O ideal bíblico do shalom pode servir de pano de fundo para o profetismo cristão preocupado com a ecologia integral, ao chamar-lhe a atenção para o drama humano a clamar por uma espécie de humanidade integral, articulada em todas as suas dimensões, como pressuposto da preocupação pela sorte do planeta terra e sua sustentabilidade. Os profetas bíblicos de ontem têm muito a ensinar aos profetas cristãos dos nossos tempos, no âmbito da ecologia integral!

  • 1
    “Ao longo das últimas décadas, sentiu-se a necessidade de acrescentar adjetivos ao substantivo ‘ecologia’ para, assim, explicitar dimensões outras que não fossem redutíveis apenas ao âmbito da biologia. E isto se deu, basicamente, pelo fato de o termo ecologia ter sido, impropriamente, identificado sempre mais com ‘ambiente’ apenas. E, consequentemente, discursos e práticas ecológicas foram sendo cada vez mais compreendidos como relativos única e exclusivamente à defesa do ambiente, concebido como mero cenário da presença e atividade humanas. Em última instância, reduzir a complexidade da ecologia à dimensão ambiental trairia a presença do inveterado antropocentrismo moderno. [...] A ecologia [deve ser] concebida a partir de uma visão sistêmica e, portanto, como singular complexidade composta por quatro dimensões: ambiental, social, mental e espiritual/integral” (TAVARES, 2020TAVARES, S. S. Ecologia Integral: um novo paradigma. In: FOLLMANN, J. I. (Org.). Ecologia Integral: abordagens (im)pertinentes. São Leopoldo: Casa Leiria, 2020. v. 1, p. 23-35., p. 24-25).
  • 2
    O cap. IV da Encíclica Laudato Si’ (LS), sob o título Uma ecologia integral, apresenta uma concepção ampla de ecologia que abarca, não apenas, o ambiental, mas, também, o econômico, o social, o cultural, a vida cotidiana e o intergeracional (2015, p. 85-97).
  • 3
    Esse texto se deterá nos profetas bíblicos do século VIII a.C., quais sejam: Amós e Oseias (Reino do Norte) e Isaías e Miqueias (Reino do Sul). Textos desses profetas serão, prioritariamente, citados. Por outro lado, o tetragrama divino será referido como YHWH.
  • 4
    A expressão humanidade integral pode evocar a obra de Jacques Maritain, Humanisme intégral (1936). Qualquer semelhança é mera coincidência! Humanidade integral pensa o ser humano concreto, de carne e osso, passando à margem de reflexões filosóficas, focando a criação da humanidade em sua pluralidade e diversidade, sim, porém, sem excluídos, explorados e marginalizados.
  • 5
    A Encíclica Laudato Si’ (LS) repete, várias vezes, a declaração: “tudo está interligado” (n. 91, 117, 138 e 240), ou “tudo está estreitamente ligado no mundo” (n. 16).
  • 6
    Uma leitura da tradição profética bíblica à luz do tema da ecologia, encontra-se em LEÓN, 2010LEÓN, L. E. G. Profetismo bíblico, cuidado da Terra e agroecologia, Annales FAJE, Belo Horizonte, v. 5, n. 3, p. 149-172, 2010., p. 149-172.
  • 7
    A LS descreve a “crise do antropocentrismo moderno e suas consequências” (n. 115-136).
  • 8
    “Maat era um atributo essencial do estado egípcio e uma das principais funções do faraó era garantir tratamentos corretos em relação a pessoas e situações” (FERGUSON, 2020FERGUSON, J., The Ancient Egyptian Concept of Maat: Reflections on Social Justice and Natural Order. Culture Mandala, Austrália, v. 13, special issue 3, p. 1-90, Mar. 2020., p. 20-21).
  • 9
    O autor estuda o profetismo na perspectiva da ecologia integral, a partir de Os 2,18-25; Is 65,16b-25; Mq 4,1-5 (= Is 2,2-4) e Ez 47,1-12.
  • 10
    “O direito corresponde às normas e leis precisas e concretas, aos ‘códigos’ e corpus jurídicos, ao passo que a ‘justiça’ representa o horizonte em que tais códigos pretendem se encarnar, sem jamais consegui-lo. Os códigos não ‘esgotam’ a justiça, tampouco a justiça se reduz aos códigos” (ASURMENDI, 2015-2016ASURMENDI, J. Profetas, Escatologia, Ecologia. Revista Biblica, San Miguel, v. 77, p. 249-270, Dez. 2015-2016., p. 253).
  • 11
    Sicre Díaz enumera os dez temas ligados à injustiça que mais chamam a atenção nas denúncias proféticas: “administração da justiça nos tribunais, comércio, escravidão, latifundismo, salário, tributos e impostos, roubo, assassinato, fianças e empréstimos, luxo” (SICRE DÍAZ, 2012SICRE DÍAZ, J. L. Introdução ao Profetismo Bíblico. Petrópolis: Vozes, 2012., p. 375).
  • 12
    O culto a Baal, deus da natureza e da fertilidade, representou um enorme desafio para a fé de Israel, colocando em risco o culto a YHWH, por sua larga difusão no tempo e no espaço (NOCQUET, 2004NOCQUET, D. Le “livret noir de Baal”: la polemique contre le dieu Baal dans la Bible hebraïque et l’ancien Israël. Génève: Labor et Fides, 2004., p. 289).
  • 13
    Na Bíblia, ao Código Deuteronômico (Dt 12–26), somam-se o Código da Aliança (Ex 20–23) e o Código Sacerdotal (Lv 17–26).
  • 14
    Pode-se falar de um “ecologismo dos pobres”, que “se organizam para defender a terra, quando está ameaçada”, pois “se reconhecem parte dela”, daí lutarem por sua “sustentabilidade” (MOZOS, 2016MOZOS, P. A. Defender al pobre y proteger la naturaleza. Revista de Fomento Social, Córdoba-Espanha, v. 71, p. 81-98, jan. 2016., p. 95-96).
  • 15
    O Papa FranciscoFRANCISCO, Papa Carta Encíclica Laudato Si’ sobre o cuidado da casa comum. São Paulo: Paulus; Loyola, 2015. tem se constituído em profeta da humanidade integral, expressão da ecologia integral, em seus ensinamentos e em seus gestos carregados de questionamento para a consciência adormecida de tantos cristãos (BARBOSA, 2020BARBOSA, I. M. Profetismo ecoteológico do Papa Francisco diante das feridas socioambientais atuais. Espaços, São Paulo, v. 28, n. 1, p. 51-64, jan.-jun. 2020., p. 51-64). Na Exortação Apostólica Evangelii Gaudium n. 186, o Papa, ao falar da “inclusão social dos pobres”, alude à “preocupação pelo desenvolvimento integral dos mais abandonados da sociedade”.
  • 16
    As catequeses evangélicas narram Jesus de Nazaré comprometido com a construção de uma nova humanidade, nos passos dos profetas bíblicos (VITÓRIO, 2020VITÓRIO, J. Uma nova humanidade: o horizonte messiânico de Jesus de Nazaré no Evangelho de Mateus. Perspectiva Teológica, Belo Horizonte, v. 52, n. 3 p. 559-583, set./dez. 2020., p. 559-583).

Referências

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  • BARBOSA, I. M. Profetismo ecoteológico do Papa Francisco diante das feridas socioambientais atuais. Espaços, São Paulo, v. 28, n. 1, p. 51-64, jan.-jun. 2020.
  • CETINA, E. S. Paz na Bíblia. Revista de Interpretação Bíblica Latino-Americana, São Bernardo do Campo, n. 74, p. 61-80. 2017.
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  • FERGUSON, J., The Ancient Egyptian Concept of Maat: Reflections on Social Justice and Natural Order. Culture Mandala, Austrália, v. 13, special issue 3, p. 1-90, Mar. 2020.
  • FRANCISCO, Papa. Exortação Apostólica Evangelii Gaudium sobre o anúncio do Evangelho no mundo atual. São Paulo: Paulus; Loyola, 2013.
  • FRANCISCO, Papa Carta Encíclica Laudato Si’ sobre o cuidado da casa comum. São Paulo: Paulus; Loyola, 2015.
  • JENSEN, J. Dimensões éticas dos profetas São Paulo: Loyola, 2009.
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  • MOZOS, P. A. Defender al pobre y proteger la naturaleza. Revista de Fomento Social, Córdoba-Espanha, v. 71, p. 81-98, jan. 2016.
  • MURAD, A. Janelas abertas: fé cristã e ecologia integral. Paulinas: São Paulo, 2022.
  • NOCQUET, D. Le “livret noir de Baal”: la polemique contre le dieu Baal dans la Bible hebraïque et l’ancien Israël. Génève: Labor et Fides, 2004.
  • PRADO, M. L. C. Ecología y desarrollo humano integral. Revista de Fomento Social, Córdoba-Espanha, v. 71, n. 1, p. 161-165, mar. 2016.
  • REIMER, H. Sobre pássaros e ninhos: olhar ecológico em leis do Deuteronômio. Revista de Interpretação Bíblica Latino-Americana, São Bernardo do Campo, n. 39, p. 34-45, 2001.
  • SICRE DÍAZ, J. L. Introdução ao Profetismo Bíblico Petrópolis: Vozes, 2012.
  • TAVARES, S. S. Ecologia Integral: um novo paradigma. In: FOLLMANN, J. I. (Org.). Ecologia Integral: abordagens (im)pertinentes. São Leopoldo: Casa Leiria, 2020. v. 1, p. 23-35.
  • VITÓRIO, J. Uma nova humanidade: o horizonte messiânico de Jesus de Nazaré no Evangelho de Mateus. Perspectiva Teológica, Belo Horizonte, v. 52, n. 3 p. 559-583, set./dez. 2020.
  • VITÓRIO, J. “A justiça será o seu cinturão” (Is 11,5): esperança messiânico-política no profetismo bíblico. In: ALVES, C. F.; SOUZA, R. S. R.; PENZIM, A. M. B. (Orgs.), Igreja e Sociedade: análises em perspectiva. Belo Horizonte: NESP, 2015. p. 25-53.
  • VITÓRIO, J. Culto desagradável a Deus – A denúncia profética da falsa religião em Is 1,10-20. Estudos Bíblicos, Petrópolis. v. 33, n. 129, p. 71-84, jan/mar. 2016.

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    23 Out 2023
  • Data do Fascículo
    May-Aug 2023

Histórico

  • Recebido
    18 Maio 2023
  • Aceito
    28 Jul 2023
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