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Uma análise de custo-efetividade de propofol versus midazolam para sedação de pacientes adultos admitidos à unidade de terapia intensiva

RESUMO

Objetivo:

Construir um modelo de custo-efetividade para comparar o uso de propofol com o de midazolam em pacientes críticos adultos sob uso de ventilação mecânica.

Métodos:

Foi construído um modelo de árvore decisória para pacientes críticos submetidos à ventilação mecânica, o qual foi analisado sob a perspectiva do sistema privado de saúde no Brasil. O horizonte temporal foi o da internação na unidade de terapia intensiva. Os desfechos foram custo-efetividade por hora de permanência na unidade de terapia intensiva evitada e custo-efetividade por hora de ventilação mecânica evitada. Foram obtidos os dados do modelo a partir de metanálise prévia. Assumiu-se que o custo da medicação estava incluído nos custos da unidade de terapia intensiva. Conduziram-se análises univariada e de sensibilidade probabilística.

Resultados:

Pacientes mecanicamente ventilados em uso de propofol tiveram diminuição de sua permanência na unidade de terapia intensiva e na duração da ventilação mecânica, respectivamente, em 47,97 horas e 21,65 horas. Com o uso de propofol, ocorreu redução média do custo de U$2.998,971 em comparação ao uso do midazolam. A custo-efetividade por hora de permanência na unidade de terapia intensiva evitada e por hora de ventilação mecânica evitada foi dominante, respectivamente, em 94,40% e 80,8% do tempo.

Conclusão:

Ocorreu diminuição significante do custo associado ao uso de propofol, no que se refere à permanência na unidade de terapia intensiva e à duração da ventilação mecânica para pacientes críticos adultos.

Descritores:
Custo-efetividades; Midazolam; Propofol; Adulto; Estado terminal; Respiração artificial; Unidades de terapia intensiva

ABSTRACT

Objective:

To build a cost-effectiveness model to compare the use of propofol versus midazolam in critically ill adult patients under mechanical ventilation.

Methods:

We built a decision tree model for critically ill patients submitted to mechanical ventilation and analyzed it from the Brazilian private health care system perspective. The time horizon was that of intensive care unit hospitalization. The outcomes were cost-effectiveness per hour of intensive care unit stay avoided and cost-effectiveness per hour of mechanical ventilation avoided. We retrieved data for the model from a previous meta-analysis. We assumed that the cost of medication was embedded in the intensive care unit cost. We conducted univariate and probabilistic sensitivity analyses.

Results:

Mechanically ventilated patients using propofol had their intensive care unit stay and the duration of mechanical ventilation decreased by 47.97 hours and 21.65 hours, respectively. There was an average cost reduction of US$ 2,998.971 for propofol when compared to midazolam. The cost-effectiveness per hour of intensive care unit stay and mechanical ventilation avoided were dominant 94.40% and 80.8% of the time, respectively.

Conclusion:

There was a significant reduction in costs associated with propofol use related to intensive care unit stay and duration of mechanical ventilation for critically ill adult patients.

Keywords:
Cost-effectiveness; Midazolam; Propofol; Adult; Critical illness; Respiration; artificial; Intensive care units

INTRODUÇÃO

Sedativos são frequentemente utilizados em pacientes críticos para melhorar o conforto durante a ventilação mecânica, assim como a sincronia.(11 Reardon DP, Anger KE, Adams CD, Szumita PM. Role of dexmedetomidine in adults in the intensive care unit: an update. Am J Health Syst Pharm. 2013;70(9):767-77.) As atuais diretrizes Clinical Practice Guidelines for the Prevention and Management of Pain, Agitation/Sedation, Delirium, Immobility, and Sleep Disruption in Adult Patients in the ICU (PADIS) recomendam uma estratégia de sedação na qual se aconselha contra a utilização de benzodiazepínicos.(22 Devlin JW, Skrobik Y, Gélinas C, Needham DM, Slooter AJ, Pandharipande PP, et al. Clinical Practice Guidelines for the Prevention and Management of Pain, Agitation/Sedation, Delirium, Immobility, and Sleep Disruption in Adult Patients in the ICU. Crit Care Med. 2018;46(9):e825-73.) Entretanto, estes ainda são comumente empregados; os agentes sedativos mais amplamente utilizados em pacientes críticos adultos são o propofol e o midazolam.(33 Epstein D, Steinfeld Y, Marcusohn E, Ammouri H, Miller A. Health care professionals’ knowledge of commonly used sedative, analgesic and neuromuscular drugs: a single center (Rambam Health Care Campus), prospective, observational survey. PLoS One. 2020;15(1):e0227499.,44 Wunsch H, Kahn JM, Kramer AA, Rubenfeld GD. Use of intravenous infusion sedation among mechanically ventilated patients in the United States. Crit Care Med. 2009;37(12):3031-9.)

Embora o midazolam seja amplamente utilizado, uma das principais características desse fármaco é seu caráter lipofílico, fator que influencia em seu metabolismo, levando ao acúmulo no tecido adiposo. Além disso, o metabolismo do midazolam produz metabólitos ativos, que podem ser armazenados nos rins. Esse efeito cumulativo pode desempenhar um papel no prolongamento do processo de desmame da ventilação mecânica, em razão da demora para que o paciente desperte. Outra preocupação é o maior risco de delirium em pacientes sedados com midazolam, assim como suas consequências em longo prazo, como a síndrome pós-terapia intensiva.(11 Reardon DP, Anger KE, Adams CD, Szumita PM. Role of dexmedetomidine in adults in the intensive care unit: an update. Am J Health Syst Pharm. 2013;70(9):767-77.,55 Patel SB, Kress JP. Sedation and analgesia in the mechanically ventilated patient. Am J Respir Crit Care Med. 2012;185(5):486-97.)

Por outro lado, o propofol, que também é um sedativo amplamente utilizado na unidade de terapia intensiva (UTI), apresenta um rápido início de ação (da ordem de segundos), com acelerada redistribuição para os tecidos periféricos. Essas propriedades permitem ao paciente rápida recuperação da consciência após cessada a administração de propofol, mesmo quando administrado por longos períodos. Assim, o uso de propofol em pacientes mecanicamente ventilados se associa com necessidade de menos tempo para recuperar respiração espontânea.(55 Patel SB, Kress JP. Sedation and analgesia in the mechanically ventilated patient. Am J Respir Crit Care Med. 2012;185(5):486-97.) Contudo, existe uma percepção de que o propofol pode ter custo mais elevado do que os benzodiazepínicos.(66 Newman LH, McDonald JC, Wallace PG, Ledingham IM. Propofol infusion for sedation in intensive care. Anaesthesia. 1987;42(9):929-37.)

Apesar dos benefícios clínicos de evitar o uso de benzodiazepínicos em pacientes mecanicamente ventilados,(22 Devlin JW, Skrobik Y, Gélinas C, Needham DM, Slooter AJ, Pandharipande PP, et al. Clinical Practice Guidelines for the Prevention and Management of Pain, Agitation/Sedation, Delirium, Immobility, and Sleep Disruption in Adult Patients in the ICU. Crit Care Med. 2018;46(9):e825-73.) o impacto econômico da escolha ainda não foi amplamente avaliado. Assim, o objetivo deste estudo foi realizar uma análise econômica para comparar o uso do propofol com o do midazolam em pacientes adultos críticos submetidos à ventilação mecânica com permanência na UTI por mais de 24 horas.

MÉTODOS

Estrutura do modelo e população

Desenvolveu-se um modelo de árvore decisória para simular a administração de propofol ou midazolam em pacientes adultos críticos (idade ≥ 18 anos) sob ventilação mecânica com permanência na UTI por mais de 24 horas (Figura 1).

Perspectiva da análise

A perspectiva desta análise foi a do sistema suplementar de saúde brasileiro (sistema de saúde privado) no ano de 2018.

Intervenções comparadas

As intervenções avaliadas foram dois fármacos sedativos utilizados em pacientes sob ventilação mecânica internados na UTI. Foram comparados o propofol, um fármaco não diazepínico, e o midazolam, um fármaco benzodiazepínico. Na tabela 1S (Material suplementar), apresenta-se o gerenciamento da analgesia.

Figura 1
Modelo analítico de árvore decisória.

UTI - unidade de terapia intensiva; VM - ventilação mecânica.


Horizonte temporal

O horizonte temporal corresponde ao período de internação na UTI nos estudos incorporados à metanálise previamente desenvolvida por este grupo. Nos estudos incluídos na metanálise, o período de internação variou entre 224 e 660 horas.(77 Garcia R, Salluh JI, Andrade R, Farah D, da Silva PS, Bastos DF, et al. Propofol versus midazolam for sedation in adult patients in intensive care unit (ICU): a meta-analysis. Value Health. 2020;23 Suppl 1:S233.)

Por ser o horizonte temporal inferior a 1 ano, não se aplicou taxa de desconto.

Dados clínicos e custos

Os dados clínicos inseridos foram os de uma metanálise previamente publicada,(77 Garcia R, Salluh JI, Andrade R, Farah D, da Silva PS, Bastos DF, et al. Propofol versus midazolam for sedation in adult patients in intensive care unit (ICU): a meta-analysis. Value Health. 2020;23 Suppl 1:S233.) na qual o uso de propofol reduziu o tempo de permanência na UTI em 47,97 horas e o tempo sob ventilação mecânica em 21,65 horas.

Para construção do modelo, utilizou-se a diferença média no tempo de permanência na UTI obtido na metanálise, assim como a diferença média nos dias sob ventilação mecânica. Assim, não se teve o número de horas em que cada paciente esteve sob ventilação mecânica e nem se chegou ao número de horas que cada paciente permaneceu na UTI para os grupos com propofol ou midazolam, mas apenas a disponibilidade da diferença em termos de tempo com uso de propofol ou midazolam para cada um dos desfechos.

O custo médio de 1 dia na UTI para um paciente adulto sob ventilação mecânica, independentemente de internação na UTI, foi obtido de uma base de dados de seguros-saúde no Estado de São Paulo.(88 Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS). Procedimentos hospitalares por UF. Brasília (DF): Secretaria de Tecnologia da Informação, Ministério do Planejamento, Desenvolvimento e Gestão, Agência Nacional de Saúde; 2019 [citado 2021 Ago 6]. Disponível em: https://dados.gov.br/dataset/procedimentos-hospitalares-por-uf
https://dados.gov.br/dataset/procediment...
)

Expressaram-se os valores em dólares americanos (US$). A taxa de câmbio em 2018 para conversão de Reais em dólares americanos foi de US$1,00 americano para cada R$3,6552. O custo total médio de 1 dia na UTI para um paciente sob ventilação mecânica foi de US$1.500,42.(88 Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS). Procedimentos hospitalares por UF. Brasília (DF): Secretaria de Tecnologia da Informação, Ministério do Planejamento, Desenvolvimento e Gestão, Agência Nacional de Saúde; 2019 [citado 2021 Ago 6]. Disponível em: https://dados.gov.br/dataset/procedimentos-hospitalares-por-uf
https://dados.gov.br/dataset/procediment...
)

Para calcular os custos, a diferença em termos de horas de permanência na UTI implicou em diferentes custos nos braços do modelo.

Os desfechos de interesse avaliados neste modelo foram custo-efetividade por hora de permanência na UTI evitada e a custo-efetividade por hora de ventilação mecânica evitada.

Pressuposições do modelo

Nosso modelo pressupôs que os custos dos sedativos avaliados são incluídos no custo total de hospitalização do paciente. Os custos obtidos na base de dados de planos de saúde privado representaram os custos do mercado privado de saúde no Brasil, e os custos da permanência na UTI por dia foi o mesmo para ambos os braços do modelo.

Análise de sensibilidade

Realizou-se uma análise univariada de sensibilidade modificando um parâmetro do modelo por vez. Além disso, foi realizada uma análise de sensibilidade probabilística, por meio de uma simulação de Monte Carlo com dez mil interações. Na análise de sensibilidade probabilística, variaram diversos parâmetros ao mesmo tempo. Os parâmetros variados dentro de suas respectivas faixas e referências são mostrados na tabela 1. Utilizou-se o programa Palisade @RISK para realizar as análises de sensibilidade.

RESULTADOS

Caso base

O uso de propofol em pacientes críticos com necessidade de sedação para ventilação mecânica resultou em redução média de 47,97 horas no tempo de permanência na UTI e de 21,65 horas no tempo de ventilação mecânica, acarretando diminuição média de US$2.998,97 nos custos, em comparação aos pacientes com midazolam. Assim, a proporção média de custo-efetividade (ICER - incremental cost-effectiveness ratio) por hora de permanência na UTI evitada foi de US$62,52, e a ICER por hora de ventilação mecânica evitada foi de US$138,52. Convém observar que a ICER foi positiva porque as diferenças, tanto em custo quanto em efetividade, foram negativas.

Análise de sensibilidade

Na análise univariada de sensibilidade, o parâmetro que mais influenciou na custo-efetividade por hora de permanência na UTI evitada foi o custo diário. Em contraste, o parâmetro que mais influenciou na custo-efetividade por hora de ventilação mecânica evitada foi o tempo de permanência na UTI.

A análise de sensibilidade probabilística para custo-efetividade por hora de permanência na UTI evitada mostrou que a maior parte dos pontos (94,4%) se localizavam no terceiro quadrante do gráfico, indicando custos menores e menor tempo de permanência na UTI quando os pacientes utilizaram propofol. Propofol foi a alternativa dominante (Figura 2).

A análise de sensibilidade probabilística para a custo-efetividade por hora de ventilação mecânica evitada mostrou que a maioria das interações (80,8%) se encontrava no terceiro quadrante. Nesse quadrante, os custos e a duração da ventilação mecânica foram menores. Assim, propofol foi, novamente, a alternativa dominante (Figura 3).

Figura 2
Análise de sensibilidade probabilística para custo-efetividade por hora de permanência na unidade de terapia intensiva evitada com 10 mil interações.
Tabela 1
Valores utilizados na análise de sensibilidade
Figura 3
Análise de sensibilidade probabilística para custo-efetividade por hora de ventilação mecânica evitada com 10 mil interações.

DISCUSSÃO

Em 2018, a Society of Critical Care Medicine (SCCM) publicou as diretrizes PADIS, uma revisão das diretrizes previamente publicadas em 2013. Nessas diretrizes atualizadas, recomenda-se que se devem preferir fármacos não benzodiazepínicos para a sedação de pacientes sob ventilação mecânica.

Como a recomendação é condicional, é crucial determinar o impacto do uso de fármacos não benzodiazepínicos nos custos de saúde. Ao que se sabe, nenhum outro estudo de custo-efetividade comparou os regimes de sedação com utilização de propofol com os que utilizam midazolam.(99 Holger JS, Satterlee PA, Haugen S. Nursing use between 2 methods of procedural sedation: midazolam versus propofol. Am J Emerg Med. 2005;23(3):248-52.

10 Costa J, Cabré L, Molina R, Carrasco G. Cost of ICU sedation: comparison of empirical and controlled sedation methods. Clin Intensive Care. 1994;5(5 Suppl):17-21.
-1111 Barrientos-Vega R, Mar Sánchez-Soria M, Morales-García C, Robas-Gómez A, Cuena-Boy R, Ayensa-Rincon A. Prolonged sedation of critically ill patients with midazolam or propofol: impact on weaning and costs. Crit Care Med. 1997;25(1):33-40.)

Nosso grupo realizou previamente uma revisão sistemática seguida de metanálise, comparando o uso de propofol (um não benzodiazepínico) com o de midazolam (um benzodiazepínico).(77 Garcia R, Salluh JI, Andrade R, Farah D, da Silva PS, Bastos DF, et al. Propofol versus midazolam for sedation in adult patients in intensive care unit (ICU): a meta-analysis. Value Health. 2020;23 Suppl 1:S233.) Assim, construiu-se um modelo simples de árvore decisória, com base nos resultados desse estudo prévio. Este estudo sugere que um regime baseado em propofol para sedação de pacientes adultos críticos sob ventilação mecânica na UTI é custo-efetivo quando comparado ao regime de sedação com base em midazolam.

As diferenças clínicas, em termos de tempo de permanência na UTI e duração da ventilação mecânica, entre os regimes com incorporação de propofol e midazolam ao modelo, provêm dos resultados de metanálise de 24 ensaios controlados, diferentemente de estudo prévio cujos dados vieram de apenas dois pequenos ensaios controlados.(77 Garcia R, Salluh JI, Andrade R, Farah D, da Silva PS, Bastos DF, et al. Propofol versus midazolam for sedation in adult patients in intensive care unit (ICU): a meta-analysis. Value Health. 2020;23 Suppl 1:S233.)

Semelhantemente a outros estudos que compararam regimes de sedação com fármacos não benzodiazepínicos a regimes de sedação baseados em benzodiazepínicos, nosso modelo demonstrou que o uso de propofol para sedar pacientes críticos sob ventilação mecânica predominantemente proporciona redução de custos, em comparação ao uso de midazolam.(99 Holger JS, Satterlee PA, Haugen S. Nursing use between 2 methods of procedural sedation: midazolam versus propofol. Am J Emerg Med. 2005;23(3):248-52.,1111 Barrientos-Vega R, Mar Sánchez-Soria M, Morales-García C, Robas-Gómez A, Cuena-Boy R, Ayensa-Rincon A. Prolonged sedation of critically ill patients with midazolam or propofol: impact on weaning and costs. Crit Care Med. 1997;25(1):33-40.

12 Cox CE, Reed SD, Govert JA, Rodgers JE, Campbell-Bright S, Kress JP, et al. Economic evaluation of propofol and lorazepam for critically ill patients undergoing mechanical ventilation. Crit Care Med. 2008;36(3):706-14.
-1313 Carrasco G, Molina R, Costa J, Soler JM, Cabré L. Propofol vs midazolam in short-, medium-, and long-term sedation of critically iii patients. A cost-benefit analysis. Chest. 1993;103(2):557-64.) Essa economia de custos ocorre em razão da redução do tempo de permanência na UTI e na duração da ventilação mecânica. A custo-efetividade por hora de permanência na UTI evitada e por hora de ventilação mecânica evitada se mostrou dominante em 95% e 81% do tempo, respectivamente.

A duração da ventilação mecânica é um crítico desfecho relacionado ao paciente. Em pacientes hospitalizados por mais de 24 horas, o uso prolongado de ventilação mecânica leva a riscos maiores de complicações, especialmente pneumonia.(1414 Wałaszek M, Kosiarska A, Gniadek A, Kołpa M, Wolak Z, Dobroś W, et al. The risk factors for hospital-acquired pneumonia in the intensive care unit. Przegl Epidemiol. 2016;70(1):15-20, 107-10.) A pneumonia associada à ventilação mecânica (PAV) é uma infecção frequente e grave que geralmente se associa com elevadas taxas de mortalidade.(1515 Martin-Loeches I, Povoa P, Rodríguez A, Curcio D, Suarez D, Mira JP, Cordero ML, Lepecq R, Girault C, Candeias C, Seguin P, Paulino C, Messika J, Castro AG, Valles J, Coelho L, Rabello L, Lisboa T, Collins D, Torres A, Salluh J, Nseir S; TAVeM study. Incidence and prognosis of ventilator-associated tracheobronchitis (TAVeM): a multicentre, prospective, observational study. Lancet Respir Med. 2015;3(11):859-68.) Na base de dados de um plano privado de saúde, ocorreram 24 casos de PAV a cada 1.000 horas de ventilação mecânica.(1616 Kock KS, Rosa BC, Martignago N, Maurici R. Ventilator-associated pneumonia (VAP): clinical outcome and impact on an intensive care unit in south of Santa Catarina. ACM Arq Catarin Med. 2017;46(1):2-11. Portuguese.) Logo, com base nos dados atuais, estima-se que o propofol reduziria 520 casos de PAV em cada 10 mil pacientes.

Análises de custo-efetividade frequentemente apresentam potenciais limitações.(1717 McGhan WF, Al M, Doshi JA, Kamae I, Marx SE, Rindress D. The ISPOR Good Practices for Quality Improvement of Cost-Effectiveness Research Task Force Report. Value Health. 2009;12(8):1086-99.) Aqui, foi consultada uma base de dados que representa apenas o estado de São Paulo, e assumiu-se que esses dados são representativos do sistema privado de saúde no país. O custo do fármaco foi incluído no custo diário da internação na UTI e, lamentavelmente, a base de dados consultada não apresentava os custos associados com possíveis eventos adversos relacionados aos fármacos em investigação, como delirium e infecção. Por outro lado, um evento adverso relacionado a esses fármacos provavelmente aumentaria a duração da ventilação mecânica, que se manifestaria nos resultados.(1818 Devlin JW, Mallow-Corbett S, Riker RR. Adverse drug events associated with the use of analgesics, sedatives, and antipsychotics in the intensive care unit. Crit Care Med. 2010;38(6 Suppl):S231-43.) Também não se incorporou ao nosso modelo a interrupção diária da sedação ou a sedação guiada por protocolo de enfermagem que, potencialmente, poderia reduzir o tempo de ventilação mecânica.(1919 Girard TD, Kress JP, Fuchs BD, Thomason JW, Schweickert WD, Pun BT, et al. Efficacy and safety of a paired sedation and ventilator weaning protocol for mechanically ventilated patients in intensive care (Awakening and Breathing Controlled trial): a randomised controlled trial. Lancet. 2008;371(9607):126-34.) Finalmente, como só foram avaliados os custos relacionados à internação hospitalar, não foi possível captar os potenciais efeitos em longo prazo. Essa limitação é relevante, porque a ventilação mecânica prolongada e o uso de benzodiazepínicos se associam com a ocorrência de delirium e síndrome pós-terapia intensiva, ambos com grande impacto na morbidade, nos custos relacionados à saúde e na mortalidade em longo prazo.(2020 Salluh JI, Wang H, Schneider EB, Nagaraja N, Yenokyan G, Damluji A, et al. Outcome of delirium in critically ill patients: systematic review and meta-analysis. BMJ. 2015;350:h2538.,2121 Robinson CC, Rosa RG, Kochhann R, Schneider D, Sganzerla D, Dietrich C, et al. Quality of life after intensive care unit: a multicenter cohort study protocol for assessment of long-term outcomes among intensive care survivors in Brazil. Rev Bras Ter Intensiva. 2018;30(4):405-13.)

CONCLUSÃO

Sob uma perspectiva do sistema de saúde privado brasileiro, o uso de propofol como sedativo de escolha para pacientes adultos críticos tratados na unidade de terapia intensiva que necessitam de ventilação mecânica por mais de 24 horas comprovou poupar custos por sua capacidade de reduzir o tempo de permanência na unidade de terapia intensiva e a duração da ventilação mecânica. Estes resultados são coerentes com as recomendações da diretriz PADIS, para que se utilizem fármacos não benzodiazepínicos na sedação de pacientes críticos adultos mecanicamente ventilados.

https://minio.scielo.br/documentstore/1982-4335/9bPSGBdcjY4PH98q8mqcK9J/75d7a8f7d7773b5a469d8bcee0b1473f693cb3cc.pdf

AGRADECIMENTOS

À Aspen Pharma, pelo financiamento deste estudo.

REFERÊNCIAS

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Editado por

Editor responsável: Viviane Cordeiro Veiga

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    25 Out 2021
  • Data do Fascículo
    Jul-Sep 2021

Histórico

  • Recebido
    24 Nov 2020
  • Aceito
    10 Fev 2021
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