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Cirurgia de catarata a laser

EDITORIAL

Cirurgia de catarata a laser

José Beniz

Doutor em Oftalmologia, Professor Adjunto de Oftalmologia da Universidade Federal de Goiás - UFG - Goiânia (GO), Brasil

Será que a velha pergunta - Doutor, minha cirurgia de catarata vai ser feita a laser? - poderá finalmente ter uma resposta verdadeira? Ou pelo menos em parte, quando o médico opta por responder sim? Em parte, porque apenas algumas etapas do ato cirúrgico já podem ser realizadas usando este tipo de energia.

A magia da palavra LASER rendeu ultimamente grandes benefícios à prática oftalmológica, e também aos pacientes. Porém sempre encontrou uma incômoda barreira quando o assunto é cirurgia de catarata. Eis que surge no horizonte a oportunidade de quebra deste paradigma através da introdução em nosso meio do laser de femtossegundo para este fim. Ambrósio fez excelente revisão sobre este tipo de laser recentemente nesta revista(1). A primeira facectomia em humanos assim realizada foi em 2008, na cidade de Budapeste(2). Até o momento, já passam de dois mil casos operados em todo o mundo.

Algumas empresas já desenvolveram tal equipamento, que usa energia com comprimento de onda em fração de segundo na ordem de 10-15. Daí o nome femtossegundo, tecnologia já conhecida para cirurgia refrativa corneana há alguns anos. Além das incisões na córnea, tanto astigmáticas, quanto a principal e acessórias, este laser realiza também a capsulotomia e a quebra do núcleo(3). No entanto, a facoemulsificação propriamente dita ainda tem que ser feita através de outro aparelho, utilizando ultrassom convencional. Daí o primeiro questionamento, se é prático termos dois procedimentos para atingir um único resultado refrativo.

Este é exatamente um dos grandes problemas do processo, já que o paciente deve submeter-se a parte da cirurgia em uma sala, em seguida mudando para outra, para tê-la terminada. Tal logística é bastante complexa, já que exige maior dispêndio de tempo e espaço, ou até de duas equipes para o mesmo fim. O desafio futuro está então em colocar as duas tecnologias no mesmo equipamento. Outro grande entrave na difusão desta técnica é seu alto custo atual. As companhias cobram caríssimo por tais avanços tecnológicos, o que não é justo, pois os oftalmologistas já carregam o ônus de grandes investimentos em constantes novidades em propedêutica e cirurgia. Além disso, os pacientes entenderão, e estarão dispostos a pagar mais caro por um resultado final talvez imperceptível?

Não há dúvida de que as três etapas realizadas pelo laser de femtossegundo fazem a remoção da catarata não só mais segura, como também mais previsível, com repercussão na posição efetiva da lente(4), especialmente importante em época de lentes intraoculares premium. Normalmente efetuadas de maneira inversa, primeiro é dividido o núcleo. Em seguida, a capsulorrexe é executada em círculo perfeito. E, por último, as incisões corneanas são desenhadas com precisão. Tanta automação parece diminuir a arte, privilegiando a menor experiência cirúrgica. Saudosismo à parte, é verdade que torna passos estressantes para o cirurgião em ações com alto nível de confiança e reprodutibilidade(5).

Mas nem tudo é só alegria. O processo de acoplamento (docking), para fixação do globo ocular, provoca hemorragias subconjuntivais(6). Estas sim, são perceptíveis no pós-operatório imediato, em contraste aos olhos calmos dos dias atuais, após anestesias tópicas. Existe também o risco de pequenas imperfeições nos bordos da rexe promoverem rasgos inconvenientes no momento da remoção da cápsula anterior. Não custa repetir que, após tudo isso, passamos às mesmas emulsificação nuclear e aspiração cortical já conhecidas por todos nós.

É certo que o fascínio por ter um procedimento a laser pode promover alvoroço em um mercado tão competitivo. Resta saber se os altos custos poderão ser compensados. Com certeza esta realidade não se aplica a maior parte do Brasil, ou mesmo do mundo. Podemos entretanto ter um olhar, e tomarmos como exemplo, o que ocorre na cirurgia refrativa corneana com laser de femtossegundo.

Este editorial estará defasado em pouco tempo. O progresso da ciência é irrefutável, não podemos ficar parados. Verdades surgirão sobre o assunto, com avanço ou estagnação de tecnologias que poderão ser buscadas como degraus para outras conquistas. Neste caso, especialmente quando se vislumbra a vitória sobre a presbiopia através do amolecimento do núcleo cristaliniano com laser de femtossegundo(7), em um horizonte ainda impreciso.

  • 1. Ambrósio Jr R. A revolução dos lasers de femtossegundo na Oftalmologia. Rev Bras Oftalmol. 2011;70(4):207-10.
  • 2. Nagy Z, Takacs A, Filkorn T, Sarayba M. Initial clinical evaluation of an intraocular femtosecond laser in cataract surgery. J Refract Surg. 2009;25(12):1053-60.
  • 3. Casanova F, Lake, J. Cirurgia de catarata a laser: uma nova realidade na era do femtosegundo. Oftalmologia em Foco. 2011;132:19-22.
  • 4. Mamalis N. Femtosecond laser: The future of cataract surgery? J Cataract Refract Surg. 2011;37(7):1177-8.
  • 5. Friedman NJ, Palanker DV, Schuele G, Andersen D, Marcellino G, Seibel BS, Batlle J, Feliz R, Talamo JH, Blumenkranz MS, Culbertson WW. Femtosecond laser capsulotomy. J Cataract Refract Surg. 2011;37(7):1189-98.
  • 6. Rezende F. Cirurgia de catarata com Femtosecond Laser. Oftalmologia em Foco. 2011;132:14.
  • 7. Trindade FC. Faco com laser de femtossegundo. Onde estamos? XXXVI Congresso Brasileiro de Oftalmologia; 2011. Porto Alegre (RS):CBO; 2011.

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    01 Fev 2012
  • Data do Fascículo
    Dez 2011
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