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Avaliação da cicatrização de feridas em dorso de ratos tratados com mitomicina C tópica e posterior reforço com injetável

Resumos

Estudo experimental em animais. A mitomicina C vem sendo usada como inibidor de fibroblastos, acarretando, com isso, diminuição do processo cicatricial em feridas cirúrgicas. OBJETIVO: Este trabalho visa avaliar o uso de Mitomicina C para diminuir o processo cicatricial, através de seu uso tópico com reforços posteriores injetáveis. MATERIAL E MÉTODOS: Foi usado um modelo de feridas em dorso de ratos, com retirada circular da pele e cicatrização por segunda intenção. Foram usados 18 ratos, divididos em três grupos: controle; com uso tópico; e com reforço de mitomicina C injetável, mensalmente e por 2 meses. Após 3 meses os animais foram sacrificados e as cicatrizes retiradas cirurgicamente e submetidas a estudo histológico. RESULTADOS: Notou-se sob vários critérios que a cicatrização com o uso tópico é menos intensa, mas ao se usar o reforço injetável os parâmetros voltam a ser comparados ao do grupo controle. DISCUSSÃO: Acreditamos que a administração injetável de mitomicina C nas cicatrizes, pela sua elevada característica tóxica, acarreta destruição tecidual e neoformação cicatricial. CONCLUSÕES: A mitomicina C diminui o processo cicatricial quando usada topicamente, mas acarreta aumento da cicatrização quando nestas feridas são feitos reforços injetáveis.

cicatrização de feridas; injetável; mitomicina C; ratos


Experimental study in animals. Introduction: Mitomycin C has been used as a fibroblasts inhibitor, thus reducing the scaring process in surgical wounds. AIM: This paper aims at assessing the use of Mitomycin C to reduce the scaring process through its topical use and later injected reinforcements. MATERIALS AND METHODS: We used a model of a creating a wound in the dorsum of rats, removing a circular piece of skin and letting it heal by itself. We used 18 rats, divided in three groups. The first group - Control, the second with topical use, and a third group with injected mitomycin C reinforcement, monthly for 2 months. After 3 months the animals were slaughtered and the scars were surgically removed and sent for histology study. RESULTS: We noticed, under different criteria, that healing with topical mitomycin is less intense; however, when it was injected, the parameters were again comparable to those from the control group. DISCUSSION: We believe that injected mitomycin C in the scar, since it is highly toxic, it destroys tissue and brings about scar neoformation. CONCLUSIONS: Mitomycin C reduces the scaring process when used topically; however, it increases scar tissue formation when injected in these wounds.

wound healing; topical; mitomycin-C; rats


ARTIGO ORIGINAL

Avaliação da cicatrização de feridas em dorso de ratos tratados com mitomicina C tópica e posterior reforço com injetável

Fernando de Andrade Quintanilha RibeiroI; Janaína de Pádua BorgesII; Lusiele GuaraldoIII; Maria Regina ViannaIV

IProf. Adjunto do Departamento de Otorrinolaringologia da Faculdade de Ciências Médicas da Santa Casa de São Paulo

IIMestrado pelo Dep. de Farmacologia da USP, Farmacêutica da técnica cirúrgica da Faculdade de Ciências Médicas da Santa Casa de São Paulo

IIIProf. Adjunto do Departamento de Ciências Fisiológicas da Faculdade de Ciências Médicas da Santa Casa de São Paulo

IVProf. Dra. pela USP. Anatomopatologista do Hospital Alemão Oswaldo Cruz

Endereço para correspondência Endereço para correspondência: Rua Itapeva 500 10B Bela Vista São Paulo SP 01332-000

RESUMO

Estudo experimental em animais. A mitomicina C vem sendo usada como inibidor de fibroblastos, acarretando, com isso, diminuição do processo cicatricial em feridas cirúrgicas.

OBJETIVO: Este trabalho visa avaliar o uso de Mitomicina C para diminuir o processo cicatricial, através de seu uso tópico com reforços posteriores injetáveis.

MATERIAL E MÉTODOS: Foi usado um modelo de feridas em dorso de ratos, com retirada circular da pele e cicatrização por segunda intenção. Foram usados 18 ratos, divididos em três grupos: controle; com uso tópico; e com reforço de mitomicina C injetável, mensalmente e por 2 meses. Após 3 meses os animais foram sacrificados e as cicatrizes retiradas cirurgicamente e submetidas a estudo histológico.

RESULTADOS: Notou-se sob vários critérios que a cicatrização com o uso tópico é menos intensa, mas ao se usar o reforço injetável os parâmetros voltam a ser comparados ao do grupo controle.

DISCUSSÃO: Acreditamos que a administração injetável de mitomicina C nas cicatrizes, pela sua elevada característica tóxica, acarreta destruição tecidual e neoformação cicatricial.

CONCLUSÕES: A mitomicina C diminui o processo cicatricial quando usada topicamente, mas acarreta aumento da cicatrização quando nestas feridas são feitos reforços injetáveis.

Palavras-chave: cicatrização de feridas, injetável, mitomicina C, ratos.

INTRODUÇÃO

A Mitomicina C é amplamente usada como quimioterápico1, mas ultimamente, e cada vez mais, sua característica como inibidora de fibroblastos2 a faz ser usada para conter o processo cicatricial, principalmente em cirurgias onde seqüelas como estenoses ou aderências podem ocorrer. Muitos trabalhos na literatura mostram este efeito em cirurgias, vários deles dentro da área da otorrinolaringologia3-7. Trabalhos em modelos animais também têm sido feitos8,9, mas um consenso a este respeito ainda não foi proposta e há evidências contraditórias quanto a sua real eficácia. Como há trabalhos demonstrando que o uso apenas tópico da mitomicina C pode não surtir os efeitos esperados10, foi proposto o uso injetável desta droga para fazer um reforço seqüencial nas cicatrizes e com isso diminuir ainda mais a fibrose cirúrgica11-13.

OBJETIVO

Este trabalho visa avaliar, em modelo de feridas em dorso de ratos, o efeito comparativo entre o uso apenas tópico e o com reforço mensal injetável.

MATERIAL E MÉTODOS

Este trabalho foi aprovado pela comissão de ética em pesquisa animal da instituição, protocolo nº 10 de 14/05/2002. Foram utilizados 18 ratos adultos machos jovens, todos da linhagem Wistar, com pesos entre 355 e 400g, que foram acomodados em gaiolas individuais no biotério da Unidade de Técnica Cirúrgica da Instituição. Estes ratos foram anestesiados com Quetamina (Francotar®) 10ml na concentração de 100mg/ml na dose de 0,5 ml/rato e Xilasina (Rompun®) 10ml na concentração de 20mg/ml na dose de 0,1ml/rato. Sob anestesia geral foram feitas, em seus dorsos, feridas circulares idênticas de 2cm de diâmetro. Os 18 ratos foram numerados de 1 a 18 e divididos em três grupos de 6. No grupo controle as feridas foram tratadas topicamente com gaze embebida em soro fisiológico por 5 minutos. Nos dois outros grupos foram colocadas em suas feridas gazes embebidas em 1ml de mitomicina C na concentração de 0,5ml/mg por 5 minutos e depois lavadas com 10ml de soro fisiológico. No grupo de número 3, a cada 30 dias, e por duas vezes, foi injetada na cicatriz uma solução de mitomicina C na concentração de 0,01mg/ml. O mesmo volume de soro fisiológico foi injetado como controle nos outros dois grupos. A concentração tópica foi usada baseando-se no que usualmente é relatado na literatura10,13. A escolha da concentração injetada foi baseada em trabalho anterior onde a mesma foi a única que não apresentou necrose tecidual no dorso dos ratos11. Houve perda de dois ratos do grupo controle no ato anestésico. Os ratos foram sacrificados após 90 dias (KCl 19,1% intracardíaco, após anestesia geral), suas cicatrizes retiradas cirurgicamente e encaminhadas para exame histológico. As peças foram renumeradas aleatoriamente, sem o conhecimento do anatomopatologista que as examinou, emblocadas, cortadas e coradas com hematoxilina-eosina. As lâminas foram avaliadas sobre o grau de fibrose, proliferação vascular, número de fibroblastos e de fibrócitos.

RESULTADOS

O material foi observado e cada parâmetro recebeu o grau de +, ++ ou +++, de acordo com a intensidade avaliada. Estes resultados são observados no Quadro 1.


DISCUSSÃO

Quanto ao grau de fibrose

Podemos caracterizar a intensidade de um tecido cicatricial pelo seu grau de fibrose constituída.

Quanto à proliferação vascular

Esta se faz mais presente em tecidos cicatriciais menos definidos ou evoluídos.

Quanto ao número de fibroblastos

O maior número de fibroblastos caracteriza um processo cicatricial menos maduro e menos constituído.

Quanto ao número de fibrócitos

Seu maior número caracteriza uma cicatriz mais antiga e intensa.

Como podemos notar, o grupo 2, referente ao uso apenas tópico da mitomicina C é o que tem um quadro cicatricial menos intenso e mais jovem. O grupo 3, tópico mais injetável, que deveria ser ainda menos intenso, pois houve o reforço a cada 30 dias de mitomicina C injetável, se mostra com grau de cicatrização mais intensa. Isto talvez se deva às características altamente tóxicas e necrosantes da mitomicina C. Assim, a cada 30 dias uma nova agressão se fazia no tecido em cicatrização, o que retomava o processo. Talvez a concentração de 0,01ml/mg, mesmo muito baixa, possa ser diminuída, com resultados melhores. O fator mecânico da injeção foi descartado, pois os outros grupos também foram injetados na mesma quantidade e pelas mesmas vezes, com soro fisiológico.

Além da constatação visual tentamos uma avaliação estatística, mas o n se mostrou pequeno para tanto. Assim consideramos, também, uma avaliação por escores de +. Para cada rato avaliado somamos ou diminuímos as cruzes dependendo do parâmetro avaliado quanto ao grau de cicatrização. Demos sinais (+) para fibrose e fibrócito e (-) para proliferação vascular e fibroblasto. Assim, os ratos tiveram os seguintes dados:

Somando os escores dos ratos do número 1 ao 4 (controle) obtivemos-2

Somando os escores dos ratos do número 5 ao 10 (Tópico) obtivemos-14

Somando os escores dos ratos do numero 11 ao 16 (Tópico+injetável)+12

Mesmo retirando o resultado mais discrepante de cada grupo (número 3 no controle, 10 no tópico e 12 no tópico +injetável), obtivemos os resultados:

Controle - 6

Tópico- 17

Tópico+injetável+ 16

Assim, considerando que a cicatrização possa ser avaliada como mais intensa quanto ao grau de fibrose e número de fibrócitos (+) e menos intensa quanto ao grau vascularização e número dede fibroblastos (-), notamos que após 90 dias, e comparativamente, o grupo de uso apenas tópico da Mitomicina C tem um grau de cicatrização menor que o controle, mas o grupo de uso tópico mais injetável tem um grau de cicatrização muito maior.

Devemos observar que o grande número de fibroblastos e de proliferação vascular no grupo de uso tópico lhe confere a característica de cicatrização mais frouxa ou delicada neste momento (90 dias), mas se faz necessário estudo a prazo ainda maior para averiguar se estas características perduram.

CONCLUSÕES

A mitomicina C se mostrou, após um prazo de 90 dias, um fator de controle do processo cicatricial mais eficiente se usada apenas topicamente. Quando usados 2 reforços injetáveis, 1 a cada 30 dias a cicatrização se tornou mais intensa que no grupo controle.

Este artigo foi submetido no SGP (Sistema de Gestão de Publicações) da RBORL em 13 de janeiro de 2007. Cod. 3597.

Artigo aceito em 4 de agosto de 2007.

Departamento de ORL da Faculdade de Ciências Médicas da Santa Casa de São Paulo.

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  • Endereço para correspondência:

    Rua Itapeva 500 10B
    Bela Vista São Paulo SP 01332-000
  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      21 Jul 2008
    • Data do Fascículo
      Jun 2008

    Histórico

    • Aceito
      04 Ago 2007
    • Recebido
      13 Jan 2007
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