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Etapas de acumulación y alianzas de clases en la Argentina

RESENHA BIBLIOGRÁFICA

Etapas de acumulación y alianzas de clases en la Argentina

Volia Regina Costa Kato

Etapas de Acumulación y Alianzas de Clases en la Argentina

Por Mônica Peralta Ramos. Argentina, Sigla XXI Argentina Editores, 1972. 187 p.

Mais do que o título sugere, o livro de Mônica Peralta Ramos é uma análise da situação argentina num sentido amplo e atual. O movimento peronista recebe um lugar de destaque nesta análise, explicado como decorrência de uma fase determinada de acumulação de capital naquele país. Os acontecimentos mais recentes na Argentina, como a vitória do peronismo, podem ser facilmente compreendidos na terceira parte do livro, onde ela esclarece as tendências mais modernas que este movimento assume. Além disso, a sua análise pode ser utilizada como modelo de aplicação de uma teoria a uma realidade empírica.

A autora propõe-se a lidar com dois níveis de análise - o econômico, para obter as bases do entendimento do outro nível - o político, aqui entendido em termos de interesses e alianças de classes.

No seu esquema, a autora mostra a dependência dos países subdesenvolvidos em nossos dias, como o reflexo de uma nova etapa da expansão capitalista. Uma vez que a exportação de capitais se faz principalmente através da exportação de tecnologia, esta dependência assume um caráter cada vez mais acentuado de dependência tecnológica. Se, por um lado, a industrialização destes países tende a crescer cada vez mais, por outro a mão-de-obra empregada tende a decrescer, contribuindo decisivamente para o aumento do desemprego e marginalidade de suas populações.

Á análise do caso argentino vem exemplificar e esclarecer como esta situação, que é comum aos países latino-americanos, assume detalhes específicos, de acordo com cada particularidade histórica.

O processo de industrialização na Argentina é visto através de duas fases principais que correspondem a níveis diferentes de acumulação de capital.

A primeira delas inicia-se a partir de 1930 e se estende pela década de 40. Após a crise de 1929, a indústria garantiu um lugar de destaque na economia, ao lado da crescente importância do mercado interno. Como indústria substitutiva de importações, dependia diretamente da expansão do setor agro-exportador. Neste período, foram implantadas indústrias leves, principalmente têxteis e alimentícias, caracterizadas por uma composição orgânica de capital relativamente estável, o que quer dizer que o incremento de capital constante (instalações industriais, máquinas, etc.) era proporcional ao incremento de capital variável (pagamento de mão-de-obra).

Uma mudança qualitativa na indústria ocorre numa segunda fase do processo de industrialização. A explicação para este fenômeno depende de fatores tanto internacionais, quanto nacionais.

A Inglaterra, principal responsável pelas inversões de capital no bloco subdesenvolvido perde, a partir de 1930, sua força hegemônica, em prol de outros países. Os Estados Unidos, que atingiam um elevado nível de acumulação de capital, passaram a liderar as novas inversões na América Latina. Estas inversões ganharam intensidade após a queda de Perón e se dirigiram principalmente ao setor manufatureiro.

Internamente, a política de Perón afetou consideravelmente a taxa de lucros da burguesia industrial, o que a motivou para uma alteração qualitativa da produção. De uma utilização extensiva de mão-de-obra passa à utilização intensiva de capital. As indústrias, ao contrário do período anterior, passam a organizar-se à base de uma elevada composição orgânica de capital, o que se traduz numa substituição paulatina de mão-de-obra por capital. Coincide com a liderança do setor metalúrgico, das indústrias de bens intermediários e de capital. Esta característica nova da indústria restringiu consideravelmente o acesso ao mercado de trabalho, redundando num aumento da população marginal, avolumando-se as fileiras do exército industrial de reserva. Além disso, a forte penetração de capital estrangeiro colocou limitadas possibilidades à pequena e média burguesia industrial.

Quais seriam as conseqüências políticas deste processo industrial? Na primeira fase, após 1930, o setor agropecuário é responsável pelo desenvolvimento da indústria, que conta com o apoio dos capitais estrangeiros. Frente a esta penetração de capital, ainda subsistem, apesar de frágeis, a pequena e média propriedade industrial, o que vai explicar, no futuro, as alianças destes setores com o proletariado. Por sua vez, nesta primeira fase, ocorre um incremento crescente de mão-de-obra industrial e sua progressiva filiação sindical.

Portanto, o que existe nesta primeira fase, é o predomínio dos setores agropecuários ligados ao capital estrangeiro. Entretanto um novo fator intervém e desarticula esta estrutura de poder; o peronismo.

Durante a II Guerra Mundial, uma política redistributiva de rendas foi a saída viável para se evitar o recesso econômico do país. A necessidade de ampliar o consumo interno forneceu as bases para uma nova aliança de classes que resultou no fenômeno conhecido do peronismo. Dois setores até então excluídos do sistema dominante aparecem no cenário político como fortes aliados: por um lado, a classe operária, nesta época relativamente homogênea quanto à situação salarial e forte quanto à capacidade de mobilização sindical e, por outro, a pequena e média burguesia industrial que não dispunha de canais institucionais para expressar seus interesses no nível das decisões econômicas e políticas.

Dão-se, com esta passagem, as condições para o aparecimento de uma nova estrutura de poder, acima dos interesses específicos de qualquer classe social. Este fenômeno é conhecido como "bonapartismo" ou "cesarismo", que se caracteriza pela figura de um "árbitro" entre as classes. No Brasil foi o caso de Vargas e, na Argentina, de Perón. Conseqüentemente, a política peronista nada mais foi do que uma tentativa de conciliação, de atendimento aos interesses de diferentes classes ou setores de classes.

A política de Perón pretende, assim, melhorar as condições objetivas da classe operária através de leis trabalhistas e melhorias salariais. No seu governo, o movimento sindical tornou-se uma força institucionalizada e atuante tanto econômica quanto politicamente. Por outro lado, as melhorias trabalhistas estenderamse ao campo.

Porém as metas prioritárias do Governo referem-se à industrialização do país, em especial à defesa da indústria nacional. Para tal, contou com o apoio decisivo da pequena e média burguesiaindustrial, principalmente das regiões do interior do país. Adotou medidas de transferência de renda do setor agrícola ao industrial, com o monopólio direto das exportações agropecuárias. Não pretendeu com isto destruir o poder das oligarquias, mas simplesmente debilitá-las para tornar viável a política de conciliação.

A política redistributiva tem seus limites, na medida em que começa a afetar seriamente a taxa de lucro do capital industrial. O golpe de Estado que derrubou o governo peronista tentou resolver este problema. É assim que se abre a segunda etapa de acumulação de capital que passou a depender da exploração intensiva de mão-de-obra. A importação de bens de capital e tecnologia tornou-se exigência para se restituir o nível satisfatório dos lucros industriais. Politicamente esta nova situação supõe a exclusão do operariado e a formação de uma aliança entre burguesia associada ao capital estrangeiro e à oligarquia latifundiária. Além disso, exige uma nova atitude da pequena e média burguesia nacional que rompe a aliança anterior com o operariado e cada vez mais busca vinculações com o capital estrangeiro.

Nesta segunda fase, a burguesia ligada aos capitais altamente tecnológicos, apossa-se progressivamente do poder político e consegue garantir sua hegemonia, em detrimento dos setores tradicionais, principalmente após o golpe militar do Gen. Aramburu, impondo sérias restrições ao movimento peronista.

Neste momento, a elevada produtividade industrial, o baixo incremento de mão-de-obra neste setor, resultou num elevado nível de desemprego, principalmente nas regiões do interior. Além disso, o processo de concentração industrial que atinge um grau considerável (pelo censo de 1963, 69% da indústria argentina é altamente concentrada) vai diversificar a situação da classe operária, relativamente homogênea no período anterior. As indústrias com maior participação de capital estrangeiro e, por isso mesmo, com elevada concentração de capital têm possibilidades de elevar os salários dos operários, criando uma elite em relação à classe como um todo.

De 1955 a 1966, ocorre um fracionamento do movimento peronista sindical e político. Surgem, no âmbito sindical, tendências conciliatórias, conhecidas freqüentemente como "integracionismo", "colaboracionismo" ou "participacionismo". É justamente esta aristocracia operária a defensora de uma política colaboracionista entre as classes, contribuindo, decisivamente, para o fracionamento do movimento peronista.

A partir de 1966, a fração colaboracionista é questionada pelo peronismo ortodoxo que passa por um processo de radicalização, adotando novas estratégias de cunho revolucionário. Neste momento, a política reformista está perdendo o apoio das bases sindicais frente a sua ineficiência em defesa dos interesses da classe.

Por outro lado, a marginalidade a que foi relegada a maioria da classe operária, em virtude do processo de acumulação de capital, forneceu as condições estruturais para a consolidação de uma estratégia revolucionária. O peronismo revolucionário, surgido em 1968, firma, no Congresso de Córdoba, em 1969, uma política radical de tomada do poder, fato que caracteriza a fase atual do peronismo.

Assim, este livro de Mônica Peralta Ramos, parte de sua tese de doutoramento, é uma obra rica em profundidade, principalmente porque revela as condições estruturais que explicam a emergência do processo político argentino. Além disso, apresenta uma quantidade considerável de dados sobre a indústria argentina que podem ser proveitosamente utilizados por outros estudiosos.

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    13 Maio 2015
  • Data do Fascículo
    Set 1973
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