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Cirurgia de revascularização do miocárdio minimamente invasiva

EDITORIAL

Cirurgia de revascularização do miocárdio minimamente invasiva

Robinson Poffo; Alex Luiz Celullare

Hospital Israelita Albert Einstein, São Paulo, SP - Brasil

Correspondência Correspondência: Robinson Poffo Avenida Albert Einstein, 627, Morumbi CEP 05652-901, São Paulo, SP - Brazil E-mail: drpoffo@einstein.br

Palavras-chave: Doença das coronárias/cirurgia; revascularização miocárdica; procedimentos cirúrgicos minimamente invasivos.

A cirurgia de revascularização do miocárdio (CRVM) é o padrão de referência para o tratamento definitivo da doença coronariana. Com o advento da angioplastia transluminal percutânea, a cirurgia cardíaca perdeu terreno especialmente no tratamento das lesões coronarianas uni e biarteriais, o que fez que os cirurgiões deixassem sua zona de conforto e fossem em busca de novas técnicas cirúrgicas, com o objetivo de se obter, com menores incisões, resultados semelhantes à cirurgia convencional e uma melhor evolução pós-operatória, culminando na chamada cirurgia minimamente invasiva.

Esse tipo de CRVM pode ser encontrado na literatura médica como aquela que se realiza sem o auxílio da circulação extracorpórea; porém, acreditamos que uma melhor denominação seria uma cirurgia realizada por pequenas incisões. Milani e cols.1 descrevem neste trabalho a evolução dos primeiros cem pacientes submetidos a esse tipo de cirurgia em seu grupo.

Os primeiros relatos de CRVM minimamente invasiva datam de 1995, quando Stanbridge e cols.2, Robinson e cols.3, Benetti e Ballester4 e Subramanian e cols.5 descreveram suas técnicas e resultados iniciais. Dentro desse conceito, temos na literatura nacional alguns artigos demonstrando essa técnica realizada por pequenas incisões desde os artigos publicados por Jatene e cols.6-8; mais tarde, Poffo e cols.9 demonstraram a possibilidade de se realizar essa cirurgia associada a outras doenças intracardíacas com acessos mínimos e auxílio de equipamento de videocirurgia.

Apesar de a revascularização do miocárdio uniarterial, por meio de uma pequena incisão com ou sem circulação extracorpórea (CEC), mostrar-se eficaz, com menor índice de transfusão sanguínea, menor tempo de internação em UTI, menor índice de complicações em relação à cirurgia convencional10, ela não foi amplamente empregada. Dentre os fatores que levaram à baixa adesão da técnica estão sua maior complexidade, campo operatório restrito, dificuldade de dissecção completa da artéria torácica interna esquerda e impossibilidade de se realizar anastomoses proximais na aorta ascendente11; em contrapartida, a cardiologia intervencionista apresentou uma rápida evolução, especialmente após a introdução dos stents farmacológicos, o que fez que o paciente com doença coronariana uniarterial dificilmente fosse encaminhado à cirurgia.

Durante as décadas de 1990 e 2000 muito se desenvolveu na área de materiais cirúrgicos para propiciar a realização de cirurgias com menores incisões, permitindo assim ampliar a aplicação da CRVM para casos mais complexos, com lesões triarteriais. No artigo de Milani e cols.1, os autores mostram uma alternativa menos agressiva à esternotomia para os pacientes submetidos a revascularização do miocárdio; não apenas em casos uniarteriais, mas também em casos mais complexos em que haviam duas artérias acometidas. A partir do domínio da técnica utilizando-se modificações propostas por McGinn e cols.12, os autores puderam incorporar variantes técnicas que facilitaram o emprego da minitoracotomia lateral. Realizando-se um acesso mais lateral, melhora-se a exposição, tendo-se acesso não somente à região anterior do coração, mas também à sua região lateral. Com esse acesso mais lateral, há maior mobilidade dos arcos costais, levando a uma melhor exposição do coração e a uma ampliação do campo operatório. Outro ponto é a possibilidade do acesso total à artéria torácica interna esquerda, podendo essa ser dissecada desde a sua origem até a sua bifurcação. Há também a possibilidade de se realizar anastomoses proximais na aorta.

Mesmo havendo seleção de pacientes no estudo em questão, observou-se uma média de 1,53 anastomose distal por paciente, e em alguns casos foi possível a realização de 3 anastomoses distais. O fato de as cirurgias terem sido realizadas sem a utilização da CEC pode ser um fator positivo na redução da ocorrência de eventos cardiovasculares maiores13, como mortalidade e AVC.

Do ponto de vista de complicações pulmonares, que são consideradas frequentes e que podem chegar a ser maiores que 87% nas CRVM convencionais, segundo Ortiz e cols.14, os autores encontraram em sua série um nível relativamente baixo de complicações em torno de 11% (somando pneumonia 8% e reintubações 3%) nas cirurgias minimamente invasivas, corroborando os resultados encontrados no estudo comparativo de Guizilini e cols.15, onde a miniesternotomia se mostrou melhor quanto à preservação pulmonar quando comparado à esternotomia total.

A complicação mais frequente nesta série de 100 pacientes foi a fibrilação atrial (17%), seguida da pneumonia (8%); e os fatores de risco foram: idade avançada, euroscore alto e tempo de ventilação mecânica prolongada. Dentre esses fatores, os autores acreditam que, com uma maior experiência, o tempo total de cirurgia possa ser diminuído de forma significativa, a ponto de reduzir-se a incidência de infecção pulmonar.

Outra questão abordada foi a melhor evolução do paciente, com curto período de internação hospitalar e retorno precoce às atividades habituais, não sendo necessário aguardar os 45 dias para voltar a dirigir, fato que ocorre após a esternotomia.

Os autores apresentaram uma excelente opção para o tratamento de casos menos complexos, em que o grande objetivo é prover uma cirurgia segura, com resultados duradouros superponíveis aos encontrados na técnica tradicional com um baixo índice de complicações, e menor tempo de recuperação desses pacientes.

Artigo recebido em 02/08/12; revisado em 02/08/12; aceito em 02/08/12.

"Editorial sob responsabilidade do Cardiosource em Português. http://cientifico.cardiol.br/cardiosource2/default.asp"

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  • 2. Stanbridge R L, Symons G V, Banwell P E . Minimal-acess surgery for coronary artery revascularization. Lancet. 1995;346(8978):837.
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  • 15. Guizilini S, Bolzan DW, Faresin SM, Alves FA, Gomes WJ. Miniesternotomia na cirurgia de revascularização miocárdica preserva função pulmonar pós-operatória. Arq Bras Cardiol. 2010;95(5):587-93.
  • Correspondência:
    Robinson Poffo
    Avenida Albert Einstein, 627, Morumbi
    CEP 05652-901, São Paulo, SP - Brazil
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  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      20 Set 2012
    • Data do Fascículo
      Set 2012
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