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Melhorando as Metanálises

Infarto do Miocárdio; Intervenção Coronária Percutânea; Metanálise; Estatística; Análise de Dados; Idoso; Tratamento Conservador/tendências

A metanálise (MA) de Meng-jin et al.,11. Meng-jin H, Li X, Yang Y. Invasive versus conservative management of NSTEMI Patients Aged ≥ 75 Years. Arq Bras Cardiol. 2023;120(6):e20220658. doi:10.36660/abc.20220658
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publicada nesta edição da revista, traz informações importantes sobre o tratamento invasivo de pacientes idosos (≥ 75 anos) com infarto agudo do miocárdio sem supradesnivelamento do segmento ST (IAMSSST) versus tratamento conservador.

Mesmo ciente dos benefícios da revascularização precoce em pacientes idosos e jovens,22. Graham MM, Ghali WA, Faris PD, Galbraith PD, Norris CM, Knudtson ML. Survival after coronary revascularization in the elderly. Circulation. 2002;105(20):2378-84. doi:10.1161/01.cir.0000016640.99114.3d
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no primeiro grupo, sabe-se que a preocupação com os riscos de complicações em procedimentos invasivos reduz o número de intervenções nesse grupo.33. Rashid M, Fischman DL, Gulati M, Tamman K, Potts J, Kwok CS, et al. Temporal trends and inequalities in coronary angiography utilization in the management of non-ST-Elevation acute coronary syndromes in the U.S. Sci Rep. 2019;9(1):240. doi:10.1038/s41598-018-36504-y
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Por outro lado, com o rápido crescimento da população idosa no mundo, a Organização Mundial da Saúde prevê um aumento significativo da mortalidade por doença arterial coronariana nas próximas décadas,44. Beevers DG. The atlas of heart disease and stroke. J Hum Hypertens. 2005;19(6):505. doi:10.1038/sj.jhh.1001852
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tornando-se essencial desenvolver estratégias de tratamento eficazes em pacientes idosos com IAMSSST.

Os autores realizaram uma extensa pesquisa em várias bases de dados e terminaram por incluir 27 estudos em sua análise, 5 dos quais foram randomizados e 22 observacionais. Os desfechos primários foram morte por todas as causas, infarto do miocárdio (IM), acidente vascular cerebral e sangramento maior. Os desfechos secundários incluíram efeitos cardiovasculares adversos maiores (MACE), morte cardíaca, revascularização e readmissão.

No entanto, a metodologia utilizada pelos autores foi o mais nos chamou a atenção neste interessante artigo. Além das ferramentas clássicas utilizadas na MA, os autores também empregaram um recurso denominado trial sequence analysis (TSA), que, embora útil, é muito pouco conhecido pela maioria dos pesquisadores. A análise sequencial é um método estatístico no qual o número final de pacientes analisados não é predeterminado, mas a amostragem ou inscrição de pacientes é decidida por uma regra de parada predeterminada, como a satisfação de uma significância estatística. Assim, os investigadores podem concluir antes dos métodos estatísticos tradicionais, reduzindo tempo, custo, esforço e recursos.55. Kang H. Trial sequential analysis: novel approach for meta-analysis. Anesth Pain Med. 2021;16(2):138-50. doi:10.17085/apm.21038
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MAs adequadamente conduzidas são consideradas as melhores evidências na literatura científica. No entanto, as MAs estão expostas a resultados significativamente enganosos (erros tipo I; α) ou resultados erroneamente insignificantes (erros tipo II; β) causados por ensaios de baixa qualidade ou com potência inadequada, viés de publicação e testes de significância repetidos.66. Wetterslev J, Thorlund K, Brok J, Gluud C. Trial sequential analysis may establish when firm evidence is reached in cumulative meta-analysis. J Clin Epidemiol. 2008;61(1):64-75. doi:10.1016/j.jclinepi.2007.03.013
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TSA é um método de MA cumulativo desenvolvido para pesar os erros α e β enquanto estima quando o efeito é grande o suficiente para ser improvável de ser afetado por estudos posteriores.66. Wetterslev J, Thorlund K, Brok J, Gluud C. Trial sequential analysis may establish when firm evidence is reached in cumulative meta-analysis. J Clin Epidemiol. 2008;61(1):64-75. doi:10.1016/j.jclinepi.2007.03.013
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O TSA é exibido como um gráfico cartesiano com um escore z cumulativo no eixo y e o número de pacientes no eixo x, subdividido em quatro zonas por quatro linhas: limites de monitoramento para benefícios e danos e dois limites de futilidade (Figura 1). Duas linhas paralelas ao eixo x geralmente são exibidas, mostrando a linha estatisticamente significativa convencional em z, correspondendo a 1,96. TSA é geralmente usada em ensaios clínicos randomizados (ECR).

Figura 1
– Gráfico de análise sequencial experimental. O gráfico apresenta limites de monitoramento, limites de futilidade, limites convencionais e tamanho de informações necessárias. O gráfico é dividido pelo limite de monitoramento e limite de futilidade em quatro zonas: área de benefício, área de dano, cunha interna e zona não estatisticamente significativa. Adaptado de Kang H.5

A linha estatística cumulativa z é construída sequencialmente, adicionando um estudo com critérios cronológicos.77. De Cassai A, Tassone M, Geraldini F, Sergi M, Sella N, Boscolo A, et al. Explanation of trial sequential analysis: using a post-hoc analysis of meta-analyses published in Korean Journal of Anesthesiology. Korean J Anesthesiol. 2021;74(5):383-93. doi:10.4097/kja.21218
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O final da linha corresponde ao último estudo adicionado. Ele ficará em uma das seguintes zonas: “benefício”, “dano”, “cunha interna” ou “não significativo estatisticamente”, representando um resultado estatisticamente significativo para as duas primeiras áreas (“benefício” e “dano”) ou fortes evidências de que estudos posteriores dificilmente conseguirão alterar os resultados sem efeito (área de “cunha interna”). A presença na área “não estatisticamente significativa” significa que mais estudos são necessários.

No estudo de Meng-jin et al.,11. Meng-jin H, Li X, Yang Y. Invasive versus conservative management of NSTEMI Patients Aged ≥ 75 Years. Arq Bras Cardiol. 2023;120(6):e20220658. doi:10.36660/abc.20220658
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a TSA revelou que informações suficientes dos ECRs foram obtidas apenas para os desfechos de IM, MACE e revascularização, mas não para outros desfechos, provavelmente devido a um número insuficiente de pacientes.11. Meng-jin H, Li X, Yang Y. Invasive versus conservative management of NSTEMI Patients Aged ≥ 75 Years. Arq Bras Cardiol. 2023;120(6):e20220658. doi:10.36660/abc.20220658
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Portanto, os autores decidiram adicionar estudos observacionais à revisão para aumentar o tamanho da amostra e diminuir o viés o máximo possível. Isso permitiu mostrar um efeito positivo do tratamento invasivo em quase todos os parâmetros e apenas um efeito negativo: o aumento do sangramento no subgrupo de pacientes ≥ 85 anos.

Este estudo tem algumas limitações, e os autores as discutem brevemente, como diferentes formas de tratamentos invasivos (ICP ou CABG) e diferentes definições de resultados. Outra limitação, não mencionada diretamente, diz respeito à combinação de estudos randomizados com observacionais.88. Dekkers OM. Meta-analysis: Key features, potentials and misunderstandings. Res Pract Thromb Haemost. 2018;2(4):658-63. doi:10.1002/rth2.12153
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Mesmo após o ajuste multivariado, sabemos que são dois tipos de estudos clínicos muito diferentes, e sempre é preciso cautela na interpretação dos resultados. Estudos randomizados continuam sendo o padrão-ouro e devem sempre guiar nossa prática, embora às vezes seja desejável incorporar estudos observacionais em uma MA.

Assim, podemos concluir que a MA de Meng-jin et al.11. Meng-jin H, Li X, Yang Y. Invasive versus conservative management of NSTEMI Patients Aged ≥ 75 Years. Arq Bras Cardiol. 2023;120(6):e20220658. doi:10.36660/abc.20220658
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confirma os achados de alguns ECR e estudos observacionais, mas talvez ainda mais importante do que isso, nos lembra de recursos muito interessantes que podemos (e devemos) usar quando decidimos realizar uma MA.

Referências

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    Meng-jin H, Li X, Yang Y. Invasive versus conservative management of NSTEMI Patients Aged ≥ 75 Years. Arq Bras Cardiol. 2023;120(6):e20220658. doi:10.36660/abc.20220658
    » https://doi.org/10.36660/abc.20220658
  • 2
    Graham MM, Ghali WA, Faris PD, Galbraith PD, Norris CM, Knudtson ML. Survival after coronary revascularization in the elderly. Circulation. 2002;105(20):2378-84. doi:10.1161/01.cir.0000016640.99114.3d
    » https://doi.org/10.1161/01.cir.0000016640.99114.3d
  • 3
    Rashid M, Fischman DL, Gulati M, Tamman K, Potts J, Kwok CS, et al. Temporal trends and inequalities in coronary angiography utilization in the management of non-ST-Elevation acute coronary syndromes in the U.S. Sci Rep. 2019;9(1):240. doi:10.1038/s41598-018-36504-y
    » https://doi.org/10.1038/s41598-018-36504-y
  • 4
    Beevers DG. The atlas of heart disease and stroke. J Hum Hypertens. 2005;19(6):505. doi:10.1038/sj.jhh.1001852
    » https://doi.org/10.1038/sj.jhh.1001852
  • 5
    Kang H. Trial sequential analysis: novel approach for meta-analysis. Anesth Pain Med. 2021;16(2):138-50. doi:10.17085/apm.21038
    » https://doi.org/10.17085/apm.21038
  • 6
    Wetterslev J, Thorlund K, Brok J, Gluud C. Trial sequential analysis may establish when firm evidence is reached in cumulative meta-analysis. J Clin Epidemiol. 2008;61(1):64-75. doi:10.1016/j.jclinepi.2007.03.013
    » https://doi.org/10.1016/j.jclinepi.2007.03.013
  • 7
    De Cassai A, Tassone M, Geraldini F, Sergi M, Sella N, Boscolo A, et al. Explanation of trial sequential analysis: using a post-hoc analysis of meta-analyses published in Korean Journal of Anesthesiology. Korean J Anesthesiol. 2021;74(5):383-93. doi:10.4097/kja.21218
    » https://doi.org/10.4097/kja.21218
  • 8
    Dekkers OM. Meta-analysis: Key features, potentials and misunderstandings. Res Pract Thromb Haemost. 2018;2(4):658-63. doi:10.1002/rth2.12153
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  • Minieditorial referente ao artigo: Manejo Invasivo versus Conservador de Pacientes com IAMSSST Com Idade ≥ 75 Anos

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    26 Jun 2023
  • Data do Fascículo
    Jun 2023
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