Os Pacientes de Baixo Risco Cardiovascular Poderiam Ser Melhor Estratificados?

Baixo Risco Cardiovascular; Prevenção; DCVAS

Nesta edição dos Arquivos Brasileiros de Cardiologia, Cesena et al.¹ determinaram a distribuição de percentis do risco de doença cardiovascular aterosclerótica (DCVAS) em 10 anos de acordo com idade e sexo, em uma grande população brasileira, com base nas equações de coorte agrupadas ACC/AHA.¹ Eles excluíram pacientes com risco cardiovascular alto ou muito alto (por exemplo, aqueles com DCVAS conhecida, diabetes, hipercolesterolemia grave, doença renal crônica ou pessoas com idades fora da faixa de 40 a 75 anos). Os autores encontraram muitos indivíduos com baixo risco cardiovascular, mas acima do percentil 75 de risco de DCVAS para essa categoria. Esses achados fascinantes mostram as limitações da estimativa atual de risco cardiovascular em 10 anos, principalmente entre pacientes jovens. De fato, os autores apresentam uma ferramenta que pode ser muito útil para uma melhor sensibilização para o risco cardiovascular, abrindo a perspectiva para uma mudança precoce do estilo de vida ou para o início de terapêutica farmacológica.

Atualmente, muitos pacientes recebem terapia farmacológica ou mudam seu estilo de vida apenas no estágio avançado da doença cardiovascular.² , ³ Nesse ponto, o cuidado cardiovascular é muito mais especializado e caro, e a qualidade de vida muitas vezes permanece comprometida apesar de grandes esforços.

Nos últimos anos, Fuster e Braunwald, considerados grandes referências da cardiologia moderna, propuseram a prevenção primordial das doenças cardiovasculares, evitando o desenvolvimento de fatores de risco ou a progressão da aterosclerose.⁴ , ⁵

A principal causa de morte e incapacidade em todo o mundo continua sendo a DCVAS, especialmente o infarto do miocárdio. No entanto, independentemente de outros fatores de risco cardiovascular (por exemplo, hipertensão, diabetes ou tabagismo), a exposição a níveis mais baixos de colesterol ao longo da vida reduz drasticamente a incidência de doença cardíaca coronária.⁶

Assim, em harmonia com o futuro da cardiologia moderna, Cesena et al.¹ propõem uma abordagem que permite uma avaliação do risco cardiovascular futuro de nossos pacientes individuais. Neste momento, terapias menos intensivas podem ser implementadas, proporcionando melhor tolerabilidade e a adesão dos nossos pacientes.¹

De acordo com o estudo de Cesena et al.,¹ as principais características de baixo risco para DCVAS, mas acima do percentil 75 são, geralmente, pacientes com sobrepeso ou obesidade com dislipidemia e/ou tabagismo. Assim, os componentes da síndrome metabólica que não são contabilizados nas calculadoras de risco foram frequentemente identificados nesses pacientes, e todos esses fatores de risco podem ser abordados para uma diminuição a longo prazo do risco cardiovascular.¹

Outro aspecto importante dessa contribuição é a estimativa de risco sem imagem. Nesse contexto, o escore de cálcio coronariano tem sido proposto para melhor estratificação dos pacientes de risco intermediário pelas diretrizes.⁷ O risco percentual também pode ser útil para identificar aqueles pacientes que não precisam ser encaminhados para análise de imagem, diminuindo custos.

Finalmente, o uso de percentis para risco de DCVAS de acordo com sexo, idade, e a raça foi previamente determinado na população dos EUA.⁸ Curiosamente, algumas diferenças nos percentis 25, 50 e 75 foram encontradas, mostrando que não podemos extrapolar dados de uma população para outra. Portanto, iniciativas para estabelecer o risco de DCVAS em percentis de nossa própria população parecem realmente importantes.

Referências

• ¹
  Cesena F, Kashiwagi NM, Minnami CA, Santos RD. Determining Percentiles of the Atherosclerotic Cardiovascular Risk According to Sex and Age in a Healthy Brazilian Population. Arq Bras Cardiol. 2023; 120(6):e20220552. DOI: https://doi.org/10.36660/abc.20220552
  » https://doi.org/10.36660/abc.20220552
• ²
  Bacchin AS, Fonseca FAH, Povoa R, Szarf G, Pinto IM, Caixeta AM, et al. Pharmacoinvasive Strategy in Elderly Up to 75 Years or Non-Elderly: Analysis of Biochemical and Cardiac Magnetic Resonance Imaging Parameters. Arq Bras Cardiol. 2023;120(1):e20220177. doi: 10.36660/abc.20220177.
  » https://doi.org/10.36660/abc.20220177
• ³
  Faludi AA, Izar MCO, Saraiva JFK, Chacra APM, Bianco HT, Afiune A Neto, et al. Atualização da Diretriz Brasileira de Dislipidemias e Prevenção da Aterosclerose – 2017. Arq Bras Cardiol. 2017;109(2 Supl 1):1-76. doi: 10.5935/abc.20170121.
  » https://doi.org/10.5935/abc.20170121
• ⁴
  Joseph P, Roshandel G, Gao P, Pais P, Lonn E, Xavier D, et al. Fixed-Dose Combination Therapies with and without Aspirin for Primary Prevention of Cardiovascular Disease: An Individual Participant Data Meta-Analysis. Lancet. 2021;398(10306):1133-46. doi: 10.1016/S0140-6736(21)01827-4.
  » https://doi.org/10.1016/S0140-6736(21)01827-4
• ⁵
  Cholesterol Treatment Trialists’ (CTT) Collaboration; Fulcher J, O’Connell R, Voysey M, Emberson J, Blackwell L, et al. Efficacy and Safety of LDL-Lowering Therapy among Men and Women: Meta-Analysis of Individual daTa from 174,000 Participants in 27 Randomised Trials. Lancet. 2015;385(9976):1397-405. doi: 10.1016/S0140-6736(14)61368-4.
  » https://doi.org/10.1016/S0140-6736(14)61368-4
• ⁶
  Ference BA, Ginsberg HN, Graham I, Ray KK, Packard CJ, Bruckert E, et al. Low-Density Lipoproteins Cause Atherosclerotic Cardiovascular Disease. 1. Evidence from Genetic, Epidemiologic, and Clinical Studies. A Consensus Statement from the European Atherosclerosis Society Consensus Panel. Eur Heart J. 2017;38(32):2459-72. doi: 10.1093/eurheartj/ehx144.
  » https://doi.org/10.1093/eurheartj/ehx144
• ⁷
  Grundy SM, Stone NJ, Bailey AL, Beam C, Birtcher KK, Blumenthal RS, et al. 2018 AHA/ACC/AACVPR/AAPA/ABC/ACPM/ADA/AGS/APhA/ASPC/NLA/PCNA Guideline on the Management of Blood Cholesterol: A Report of the American College of Cardiology/American Heart Association Task Force on Clinical Practice Guidelines. J Am Coll Cardiol. 2019;73(24):e285-e350. doi: 10.1016/j.jacc.2018.11.003.
  » https://doi.org/10.1016/j.jacc.2018.11.003
• ⁸
  Navar AM, Pencina MJ, Mulder H, Elias P, Peterson ED. Improving Patient Risk Communication: Translating Cardiovascular Risk Into Standardized Risk Percentiles. Am Heart J. 2018;198:18-24. doi: 10.1016/j.ahj.2017.12.005.
  » https://doi.org/10.1016/j.ahj.2017.12.005

• Minieditorial referente ao artigo: Determinando Percentis do Risco Cardiovascular Aterosclerótico de acordo com Sexo e Idade numa População Saudável Brasileira

Datas de Publicação

• Publicação nesta coleção
  17 Jul 2023
• Data do Fascículo
  Jun 2023