Construção e validação de um cenário de simulação sobre sepse: estudo metodológico^*

Construcción y validación de un escenario de simulación sobre la sepsis: estudio metodológico

RESUMO

Objetivo

Construir, validar e testar um cenário de simulação clínica de alta fidelidade para o manejo da sepse.

Método

Estudo metodológico desenvolvido em três fases: construção do cenário de simulação utilizando o framework Modelo de Simulação de Ensino em Enfermagem e os protocolos instituídos pelo Instituto Latino Americano de Sepse; validação do conteúdo por nove juízes; e o teste do cenário por dois enfermeiros de uma instituição hospitalar. A análise dos dados se deu pelo Índice de Validade de Conteúdo, considerando-se adequado um valor > 0,90 entre os juízes.

Resultados

O cenário de simulação mostrou-se apropriado, obtendo valor geral > 0,90. No entanto, foram feitos alguns ajustes no cenário e no teste no que tange à clareza da redação, às funcionalidades e à pertinência de protocolos, conforme sugestão dos juízes.

Conclusão

Espera-se que o cenário de simulação validado seja um instrumento facilitador para docentes e profissionais de núcleos de educação permanente/continuada de instituições de ensino e saúde.

Simulação; Treinamento por Simulação; Simulação de Paciente; Sepse; Educação em Enfermagem; Modelos Educacionais

RESUMEN

Objetivo

Construir, validar y probar un escenario de simulación clínica de alta fidelidad para el manejo de la sepsis.

Método

Estudio metodológico desarrollado en tres fases: construcción del escenario de simulación utilizando el framework del Modelo de Simulación de Enseñanza de Enfermería y los protocolos instituidos por el Instituto Latinoamericano de Sepsis; validación del contenido por nueve jueces; y prueba del escenario por dos enfermeras de una institución hospitalaria. Los datos fueron analizados por el Índice de Validez de Contenido, considerando un valor > 0,90 entre los jueces.

Resultados

El escenario de la simulación fue apropiado, obteniendo un valor global > 0,90. Sin embargo, se hicieron algunos ajustes en el escenario y la prueba en cuanto a la claridad de la redacción, la funcionalidad y la pertinencia de los protocolos, como sugirieron los jueces.

Conclusión

Se espera que el escenario de simulación validado sea una herramienta facilitadora para los profesores y profesionales de los centros de educación permanente/continuada de las instituciones de educación y salud.

Simulación; Entrenamiento Simulado; Simulación de Paciente; Sepsis; Educación em Enfermería; Modelos Educacionales

ABSTRACT

Objective

To build, validate and test a high-fidelity clinical simulation scenario for sepsis management.

Method

Methodological study developed in three phases: construction of a simulation scenario using the framework Model of Nursing Training Simulation and protocols established by the Latin-American Sepsis Institute, content validation by nine judges, and scenario testing by two nurses from a hospital institution. Data analysis was carried out through Content Validity Index, with values > 0.90 among the judges being considered satisfactory.

Results

The simulation scenario was observed to be appropriate and obtained an overall value > 0.90. However, some adjustments to the scenario and the test were performed concerning textual clarity, functionality, and the protocol’s pertinence, following the judges’ suggestions.

Conclusion

The validated simulation scenario is expected to be a facilitator instrument for educators and professionals in the permanent/continued education nuclei of teaching and health institutions.

Simulation; Simulation Training; Patient Simulation; Sepsis; Education, Nursing; Models, Educational

INTRODUÇÃO

A sepse é uma síndrome complexa e com alto índice de mortalidade. No Brasil, estudos demonstraram que a letalidade de pacientes internados em Unidade de Terapia Intensiva se aproximou dos 55%(¹). Além disso, 62,4% dos pacientes que tiveram alta hospitalar após diagnóstico de sepse morreram ou foram gravemente incapacitados devido às sequelas deixadas pela sepse no sistema imunológico(²).

Estudos têm evidenciado uma lacuna no conhecimento sobre a sepse por parte dos alunos de enfermagem e enfermeiros(³-⁴). Os profissionais envolvidos precisam estar alertas, pois a sobrevida do paciente depende da detecção precoce, uma vez que a primeira dose do antibiótico dentro da primeira hora da sepse pode reduzir em até 80% os riscos de morte quando comparada à administração do antibiótico dentro das primeiras seis horas, para a qual a sobrevida foi de 40%(⁵). Nesse contexto, a formação e capacitação em saúde devem visar o preparo dos profissionais para uma assistência livre de riscos e a segurança do paciente.

A formação em enfermagem tem passado por diversas mudanças(⁶) e a simulação clínica surge como uma estratégia promissora no processo de ensino e de aprendizagem. O uso de tecnologias que replicam cenários que se assemelham à prática envolve a participação ativa de estudantes e profissionais em ambientes controlados e realísticos(⁷).

A simulação clínica permite o uso de recursos que proporcionam treinos de habilidades psicomotoras, cognitivas e afetivas, estimulando o raciocínio crítico-reflexivo, o julgamento clínico e a capacidade de tomada de decisão sem a exposição de um paciente real(⁷-⁹), além de melhorar o conhecimento, autoconfiança e satisfação na aprendizagem(¹⁰).

Na enfermagem, o julgamento clínico é uma função privativa do enfermeiro e refere-se à interpretação das necessidades de saúde do paciente, identificação do diagnóstico prioritário, tomada de decisão, melhor intervenção e reflexão sobre as ações(⁶,¹¹). Sendo assim, a partir de uma revisão da literatura, foi desenvolvido um modelo de julgamento clínico que envolve quatro aspectos: observar, interpretar, responder e refletir(¹¹).

Posteriormente ao desenvolvimento do Modelo do Julgamento Clínico, criou-se um instrumento para medir o julgamento clínico denominado de Lasater Clinical Judgment Rubric (LCJR)(¹²). Esse instrumento foi validado com alunos de enfermagem com base nos quatro aspectos do julgamento clínico proposto no Modelo do Julgamento Clínico(¹¹). Tal instrumento oferece a oportunidade de avaliar 11 comportamentos do julgamento clínico: observação focada, reconhecimento de desvios dos padrões esperados, busca por informações, priorização dos dados, compreensão dos dados, atuação calma e confiante, comunicação clara, intervenção bem planejada, habilidade técnica, avaliação/autoanálise e comprometimento com o aperfeiçoamento. Os escores dos 11 comportamentos do julgamento clínico reportam-se a quatro possíveis níveis de desenvolvimento do participante: iniciante, em desenvolvimento, proficiente ou exemplar.

No Brasil, o instrumento LCJR passou por processo de adaptação transcultural(¹³) e, posteriormente, por avaliação de sua confiabilidade e validade(¹⁴). Após as análises, o instrumento Lasater Clinical Judgment Rubric – Brazilian Version foi considerado satisfatório. Essas contribuições foram de extrema importância, pois permitiram ao facilitador a possibilidade de um instrumento confiável que medisse o julgamento clínico do enfermeiro.

Estudos apontam que o julgamento clínico se inicia na graduação e se desenvolve com a experiência profissional e a prática diária(⁶,¹⁵). Outros apontam que as habilidades inerentes ao enfermeiro começam a se desenvolver a partir de um a dois anos de prática profissional(¹⁶). Além disso, há também quem sugira que os treinamentos com possiblidades de reflexão possam contribuir para o aprimoramento do julgamento clínico(¹⁵).

A partir dessa lógica, a simulação torna-se uma estratégia eficiente para o desenvolvimento do julgamento clínico. No entanto, é necessário que os cenários permitam ao enfermeiro vivenciar situações com realismo em ambiente seguro para, posteriormente, refletir sobre suas ações sem colocar em risco a vida de um paciente real.

Nesse sentido, a construção do cenário é uma das etapas extremamente importantes da simulação e seu realismo dependerá do objetivo da simulação(¹⁷), da estrutura do laboratório, dos recursos disponíveis(⁷), da complexidade das ações(⁹) e do nível de fidelidade(¹⁷-¹⁸). Seu desenvolvimento requer tempo e habilidades; logo, a disponibilização de cenários validados pode contribuir para a qualidade e experiência da prática simulada(¹⁷,¹⁹).

O interesse pelo uso da simulação tem crescido em todo o mundo. Contudo, para que as contribuições sejam efetivas, é necessário que os facilitadores tenham capacidades de conduzir e planejar cenários de acordo com o nível de conhecimento dos participantes e os objetivos que desejam alcançar(²⁰).

Nesse contexto, o presente estudo teve como objetivo construir, validar e testar um cenário clínico de simulação de alta fidelidade para o manejo da sepse para enfermeiros com possibilidade de aplicação para alunos de enfermagem.

MÉTODO

TIPO DE ESTUDO

Tratou-se de uma pesquisa metodológica que descreveu as seguintes fases: elaboração do cenário de simulação clínica e do teste de conhecimento sobre sepse, validação do conteúdo por juízes e o teste do cenário com enfermeiros de uma instituição hospitalar.

CENÁRIO

A construção do cenário de simulação se deu a partir da pesquisa na literatura sobre sepse, baseada em melhores níveis de evidências propostos pelo Instituto Latino-americano de Sepse – ILAS e pela Surviving Sepsis Campaign – SSC(²¹).

Determinou-se a suspeita de sepse como os sinais da Síndrome da Resposta Inflamatória Sistêmica – SIRS, que incluem hipertermia > 37,8°C ou hipotermia < 35°C; leucocitose > 12.000, leucopenia < 4.000 ou desvio esquerdo > 10%; taquicardia > 90 batimento por minuto; taquipneia > 20 respirações por minuto e disfunção orgânica(²²).

Como tomada de decisão pelo enfermeiro, consideraram-se as ações propostas pelo ILAS e SSC denominadas Bundle da 1ª hora: coleta de exames de sangue, culturas, ressuscitação volêmica e antibioticoterapia(²²-²³).

Para a construção do cenário de simulação clínica, foi utilizado o framework Modelo de Simulação de Ensino em Enfermagem/NLN constituído por sete elementos, os quais são descritos a seguir(²⁴):

Context: esse elemento é o ponto de partida da simulação, ou seja, quem será o público alvo, local da simulação, recursos disponíveis, finalidade da simulação e conhecimento prévio dos participantes;

Background: nesse momento, devem ser definidos os objetivos gerais e específicos da simulação, seu tempo previsto e o referencial pedagógico a ser utilizado;

Design: esse elemento refere-se, propriamente, ao desenvolvimento do cenário e deve ser baseado nos objetivos e nas competências/habilidades a serem desenvolvidas. Inclui o cenário, a sua fidelidade, a complexidade de resolução do problema, o papel de cada integrante da equipe e dos atores e as pistas que proporcionem o objetivo esperado, o briefing e debriefing;

Simulation experience: esse momento faz referência à experiência da simulação e é caracterizado por um ambiente experiencial, interativo, colaborativo e centrado na aprendizagem;

Facilitator and educational strategies: nesse ponto, a simulação deve promover uma interação dinâmica entre o facilitador e o participante. Espera-se que o facilitador demonstre ter habilidades, técnicas educacionais e preparação;

Participant: o facilitador deve especificar o papel de cada um na prática simulada a fim de evitar a competitividade e fortalecer a motivação;

Outcomes: essa etapa refere-se aos resultados esperados pela prática simulada, podendo ser centrada no participante, nos resultados que remetem à instituição ou na qualidade dos cuidados prestados ao paciente.

COLETA DE DADOS

O instrumento de coleta de dados foi construído no programa Microsoft Office Word® e composto por duas partes. A primeira, para a caracterização dos juízes, incluía formação, titulação, tempo de formação e a experiência com simulação ou sepse. A segunda parte foi elaborada para a avaliação do conteúdo distribuído em dezoito itens relacionados a: título, material de estudo, disponibilização do material de estudo, tipo de simulador, objetivos, tempo de cada etapa da simulação, história do paciente, pistas, fidelidade, equipamentos e materiais, ações esperadas no cenário de simulação baseada nas etapas do julgamento clínico e debriefing. Também foram disponibilizados espaços para possíveis comentários e sugestões.

A amostra foi obtida por conveniência, realizada pela Plataforma Lattes para o Brasil, disponível no portal Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq). Inicialmente, onze juízes foram convidados a participar da pesquisa, uma vez que para uma taxa de concordância aceitável, ou seja, igual ou superior a 90%, autores sugerem seis ou mais juízes(²⁵).

Os juízes selecionados foram contatados por meio de endereço eletrônico e convidados a participar da pesquisa como avaliadores do cenário de simulação clínica. Os juízes especialistas em sepse e em simulação que aceitaram participar da pesquisa receberam um Termo de Consentimento Livre e Esclarecido (TCLE) assinado pela pesquisadora e o instrumento do cenário de simulação.

Os juízes foram orientados a assinar e escanear o TCLE, enquanto o instrumento do cenário de simulação foi avaliado no próprio impresso. Ao término da validação, os instrumentos e o TCLE foram devolvidos por endereço eletrônico para a pesquisadora.

Os juízes avaliaram o conteúdo do instrumento, atribuindo-lhe valores de 1 (irrelevante) a 4 (extremamente relevante). Essa etapa ocorreu em julho de 2018.

Nove juízes responderam e entregaram no prazo de 30 dias os instrumentos avaliados. Relativamente à titulação, os juízes incluíam uma mestranda e oito doutores. Seis possuíam experiência em simulação, dois em sepse e um em simulação e sepse. A avaliação de conteúdo teve como objeto os critérios de organização, a clareza da redação, a abrangência e a pertinência dos elementos propostos no cenário.

TESTE DO CENÁRIO DE SIMULAÇÃO CLÍNICA

O cenário de simulação clínica sobre sepse foi testado por duas enfermeiras, por fazerem parte do público-alvo, de forma aleatória, sendo uma responsável pelo setor de qualidade da instituição e a outra pelo Serviço de Controle de Infecção Hospitalar – SCIH. Tais enfermeiras não participaram do desenvolvimento da simulação. O convite foi feito pessoalmente pela pesquisadora e, após aceitarem participar, as enfermeiras foram orientadas sobre a proposta do teste, agendando-se a data de sua participação. O material para estudo sobre sepse foi enviado por e-mail.

O objetivo dessa etapa foi o de avaliar a clareza da descrição do cenário, os componentes da simulação no que tange aos ajustes de funcionalidades e tempo, bem como à estruturação do debriefing. As alterações e as sugestões das participantes foram adaptadas no instrumento pela pesquisadora. Essa etapa ocorreu em agosto de 2018.

ANÁLISE E TRATAMENTO DOS DADOS

Os dados provenientes dos juízes foram lançados numa planilha do programa Microsoft Office Excel®. Para a análise de validação de conteúdo do teste de conhecimento e do cenário de simulação, foi utilizado o índice de validade de conteúdo (IVC). Os itens foram representados por uma escala do tipo Likert com pontuação de 1 a 4, correspondendo a irrelevante e extremamente relevante, respectivamente. O escore foi calculado pela soma de concordância dos itens que foram marcados com “3” ou “4” pelos especialistas (IVC = concordância com pontuação “3” ou “4” / número de questões x 100). Os itens que receberam pontuação “1” ou “2” foram revisados(²⁵).

Para considerar o instrumento válido, as avaliações de todos os juízes foram compiladas e utilizou-se a média das proporções dos itens considerados relevantes por eles (IVC = número de concordâncias / número total de questões x 100). O valor igual ou superior a 0,90 foi considerado um índice de concordância aceitável para o instrumento(²⁵).

Os ajustes necessários referentes ao teste do cenário pelos enfermeiros foram realizados no próprio impresso do cenário de simulação e, posteriormente, alterados na versão original.

ASPECTOS ÉTICOS

Este estudo foi aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa da Universidade Federal de São Carlos, sob o Parecer n. 2.729.429, de 21 de junho de 2018, de acordo com a Resolução n.466/12, do Conselho Nacional de Saúde.

RESULTADOS

O instrumento de coleta de dados do cenário de simulação está demonstrado na Tabela 1. Os juízes avaliaram cada item em relação a sua organização, clareza, pertinência e abrangência, atribuindo-lhes uma pontuação de 1 (irrelevante) a 4 (extremamente relevante). Os itens que receberam pontuação 1 ou 2 foram alterados conforme sugestão dos juízes.

Tabela 1
– Avaliação dos juízes em relação à organização, clareza, aparência e pertinência do cenário de simulação e o IVC de cada item – São Carlos, SP, Brasil, 2018.

Itens avaliados	Juízes / Concordância
	O		C		A		P		IVC (%)
	Sim	Não	Sim	Não	Sim	Não	Sim	Não
O título do cenário	9		7	2	9		9		94%
Os materiais prévios para estudo	9		9		9		9		100%
A disponibilização online do material	7	2	7	2	8	1	8		83%
Local da simulação – laboratório	9		9		9				100%
Tipo de simulador – paciente simulado	9		8	1	8	1	8		92%
Objetivos primários	9		9		9		9		100%
Objetivos secundários	8	1	7	2	8	1	8	1	86%
Tempo da simulação	9	1	9		9		9		100%
História do paciente	8	1	8	1	8	1	8	1	89%
As pistas fornecidas	8	1	8	1	8	1	8	1	89%
Fidelidade do cenário-equipamentos e materiais	8	1	8	1	8	1	8	1	89%
Fidelidade do cenário-atores	9		9		9		9		100%
Briefing	7	2	7		7	2	7	2	78%
Ações realizadas pelo enfermeiro baseado no julgamento clínico	9		9		9		9		100%

A avaliação individual dos juízes está demonstrada na Tabela 2. Os itens que receberam sugestões ou avaliação menor que 90% foram revisados.

Tabela 2
– Avaliação individual dos juízes em relação à organização, clareza, aparência e pertinência do cenário de simulação – São Carlos, SP, Brasil, 2018.

Juízes	Organização	Clareza	Aparência	Pertinência
Juiz 1	100%	100%	100%	100%
Juiz 2	100%	100%	100%	100%
Juiz 3	89%	78%	94%	94%
Juiz 4	100%	100%	100%	100%
Juiz 5	94%	94%	94%	94%
Juiz 6	94%	94%	94%	94%
Juiz 7	100%	100%	100%	100%
Juiz 8	72%	61%	67%	72%
Juiz 9	100%	100%	100%	100%

Na Figura 1, encontra-se a compilação dos resultados da avaliação de todos os juízes em relação a cada critério, ou seja, organização, clareza, pertinência e abrangência. Logo, o instrumento foi considerado adequado para a aplicação.

Figura 1
– Avaliação do instrumento de cenário de simulação – São Carlos, SP, Brasil, 2018.

Os resultados da avaliação dos juízes foram significativos para modificar o cenário de simulação. As revisões na redação e as modificações de alguns itens resultaram na versão final do cenário de simulação, conforme demonstrado no Quadro 1.

Quadro 1
– Elementos do cenário de simulação sobre sepse – São Carlos, SP, Brasil, 2018.

1. CONTEXT
Título do cenário: Atuação do enfermeiro no manejo da sepse Público: Estudantes de enfermagem e enfermeiros Proposta de conhecimento prévia a simulação Material a ser utilizado - Literatura nacional e internacional, além do referencial teórico do Instituto Latino Americano de Sepse – ILAS. Fórum para discussão: Redes sociais Modalidade da simulação: Simulação cênica de alta fidelidade Local da simulação: Cenário de pronto socorro, contendo três espaços: sala de enfermagem, consultório médico e sala de espera Materiais necessários Sala da enfermagem: maca, luva, álcool gel, óculos de proteção, esfigmomanômetro, estetoscópio, termômetro, antibiótico, suporte de soro, soro fisiológico, equipo macrogotas, equipo conector de duas vias, cateter flexível para punção venosa, micropore, algodão, gaze, caneta, computador, identificação da sala, frascos de coleta de exame e cultura Consultório médico: Mesa, cadeira, prescrição medicamentosa, caneta, identificação da sala e impresso de acolhimento pendurado na entrada Sala de espera. Cadeiras e identificação do local Tipo de simulador Atores: Técnica em enfermagem para auxiliar nas ações pertinentes à categoria, à esposa, ao paciente e à médica Paciente deverá conter: pulseira de identificação, técnica de moulage para identificar a ferida operatória com curativo sujo de secreção amarelada. Proposta da simulação: Instrucional
2. BACKGROUND Objetivos Geral • Identificar precocemente o risco de sepse e rápida tomada de decisão Específicos • Demonstrar o julgamento clínico para o reconhecimento da sepse por meio da coleta de informações e exame físico específico; • Interpretar os resultados, suspeitar de sepse e abrir protocolo; • Priorizar e supervisionar o tratamento imediato.
Tempo Prebriefing – 10 dias Briefing– 5 minutos Cenário – 10 minutos Debriefing – 30 minutos
3. DESIGN Informações contidas na Ficha de acolhimento: Paciente de 35 anos com história de diabetes do tipo I controlada e acompanhada por endocrinologista, em uso de insulina regular 10 UI após o almoço e insulina NPH SC 15 UI pela manhã e 10 UI a noite. Deu entrada no pronto socorro, acompanhado pela esposa, a qual relata que seu marido esteve internado no hospital por 2 dias devido a cirurgia de apêndice e que há 3 dias recebeu alta. Ontem iniciou quadro de dor abdominal e diminuição do volume urinário. Hoje acordou com febre, dor no abdome, respiração rápida, secreção na ferida operatória, coração acelerado e sonolento. SSVV: PA: 80x50 mmHg (PAM 60 mmHg); FR – 25 irmp; Glicemia – 250 mg/dl; Temperatura – 38ºC; FC – 125 bpm. O paciente deverá ser classificação como amarelo, podendo aguardar até 1 hora. Pistas fornecidas pelos atores e que estão contidas na ficha de acolhimento: Hipotensão 80x50 mmHg (PAM 60 mmHg) Taquipneia – 25 irmp Hiperglicemia – 250 mg/dl Febre – 38ºC Oligúria – < 0,5 mL/kg/hora Taquicardia – 125 bpm Confusão mental - Glasgow 14 Prescrição medicamentosa 1- SF0,9% 2100ml EV pinça aberta agora 2- Amoxicilina + ácido clavulônico 1g diluído em SF 100 ml EV agora e de 8/8 h ou conforme protocolo institucional 3- Coleta de exames de sangue e culturas Fidelidade Simulação cênica de alta fidelidade Paciente e esposa devem ser atores profissionais para envolverem emocionalmente os profissionais no atendimento
4. SIMULATION EXPERIENCE Relato dos participantes no debriefing ou instrumentos validados
5. FACILITATOR AND EDUCATIONAL STRATEGIES Briefing Serão considerados dois enfermeiros no cenário de simulação, sendo um enfermeiro o responsável pela unidade e o outro considerado um trainee O cenário será apresentado da seguinte forma: paciente de 35 anos acompanhado pela esposa, passou pelo acolhimento de risco e está aguardando consulta na sala de espera há 40 minutos. O médico está numa emergência e poderá ser solicitado quando estiver no cenário. Se precisar colher exames, apenas diga que os exames foram colhidos e quais. Se for necessário administrar medicamentos ou aferir SSVV poderá solicitar ao técnico em enfermagem. Vocês não poderão solicitar ajuda de pessoas externas, somente quem está em cena. Fale alto para que todos possam ouvir. Mostrar o cenário, seus equipamentos, suas funcionalidades, o técnico em enfermagem e a médica. Tempo para adaptação. Debriefing Nessa etapa será possível identificar uma das etapas do julgamento clínico que é “Refletindo”. As seguintes perguntas poderão auxiliar nesse momento: Estágio emocional: Como vocês se sentiram atendendo a esse paciente? Estágio descritivo: Vocês poderiam descrever o quadro clínico encontrado? Estágio avaliativo: Quais foram as ações positivas que vocês realizaram? Estágio analítico: O que vocês fariam se tivessem outra oportunidade? Estágio conclusivo: O que vocês levam de aprendizado dessa experiência para a sua prática clínica?
6. PARTICIPANT Os participantes deverão executar uma ação de alta complexidade por meio da identificação dos três aspectos do julgamento clínico “observando, interpretando e respondendo” Observando: Colher informações da esposa e na ficha de acolhimento Interpretando: Realizar exame físico específico do abdome Verificar os valores dos SSVV na ficha de acolhimento Associar os sinais de taquicardia, confusão mental, diminuição da diurese, febre, taquipneia, hiperglicemia e hipotensão com a manifestação da SRIS e disfunção orgânica Suspeitar de Sepse Respondendo Abrir o protocolo de sepse Comunicar o médico Realizar coleta de exames de sangue e culturas Solicitar a administração do antibiótico imediatamente após a coleta de culturas
7. OUTCOMES – resultados esperados para o participante Julgamento clínico Facilitador: o facilitador deverá acompanhar cada etapa do julgamento clínico por meio de um checklist que é composto por: investigar, interpretar e compreender os dados, priorizar e planejar as ações, retomar com a reflexão da prática Participante: poderá ser avaliado o julgamento clínico do enfermeiro por meio do instrumento Lasater Clinical Judgment Rubric – Brazilian Version.

Considerou-se como limitação deste estudo a dificuldade dos juízes em responder no prazo o instrumento do cenário de simulação, o que resultou na amostra por conveniência.

DISCUSSÃO

A simulação realística é uma metodologia inovadora na área da saúde que auxilia na integração teórico-prática num ambiente seguro, estimulando a participação ativa dos integrantes e beneficiando a construção de competências e do pensamento crítico(²⁶).

As simulações devem ser elaboradas como um projeto; logo, o tempo gasto para seu desenvolvimento deve ser maior do que sua execução(¹⁷). As etapas da simulação, tais como projetar, testar, implantar e avaliar, devem ser apoiadas por ferramentas organizadas e sistematizadas, a fim de elucidar o objetivo que se pretende alcançar e os resultados esperados da aprendizagem.

A construção, validação e teste do cenário de simulação sobre sepse poderá subsidiar futuros treinamentos para estudantes e enfermeiros nessa temática. Um estudo demonstrou que alunos do último ano de enfermagem possuem pouco conhecimento sobre sepse. Os autores afirmam que futuros enfermeiros precisam conhecer essa síndrome para que possam identificá-la precocemente e intervir com rapidez(²⁷), principalmente quando se fala de hospitais públicos.

Um estudo demonstrou que os pacientes sépticos internados em hospitais públicos brasileiros apresentaram maior mortalidade do que aqueles internados em hospitais privados, sendo que o motivo estaria relacionado ao reconhecimento tardio. Assim, investir em treinamentos a fim de melhorar o reconhecimento da sepse e o diagnóstico precoce deve ser um alvo importante para melhorar o atendimento de pacientes sépticos em instituições públicas(²⁸).

O cenário desenvolvido foi guiado pelo framework Modelo de Simulação de Ensino em Enfermagem/NLN e demonstrou-se adequado no processo de construção, corroborando outros achados(¹⁹,²⁹). Esses roteiros estruturados e sistematizados são a base de sustentação para o desenvolvimento dessa metodologia e auxiliam facilitadores, educadores e pesquisadores na condução da simulação.

Estudos mostraram que, quando a simulação é bem planejada e com significado aos participantes, ela aumenta o nível de confiança e autoeficácia, reforça o conhecimento, melhora as habilidades para o cuidado, a comunicação e relações interpessoais, desenvolve o pensamento crítico e o julgamento clínico, promove a empatia e permite a reflexão das ações(²⁰,²⁹).

A validação de cenários é essencial para a garantia da qualidade da prática simulada(⁸,¹⁹,²⁹), assegurando o cumprimento do objetivo que se pretende alcançar(¹⁹).

Apesar de a simulação, em sua maioria, ser desenvolvida com alunos de enfermagem(⁶,²⁰,²⁶), esse instrumento foi desenvolvido para a simulação com enfermeiros de uma instituição de ensino. Há, no entanto, possibilidade de aplicação para alunos de enfermagem.

Ressalta-se a importância de o facilitador conhecer seu público-alvo para considerar o nível de conhecimento e as experiências prévias.

O teste do cenário com enfermeiros demonstrou-se adequado no quesito tempo; porém, algumas mudanças em relação às funcionalidades foram revisadas e alteradas. Os testes são importantes para os ajustes quanto aos recursos materiais e humanos e ao tempo de duração(¹⁹).

Como contribuições para a área da Enfermagem e Saúde, destacou-se a utilização de um cenário validado sobre sepse, buscando um ensino de qualidade para estudantes e enfermeiros.

CONCLUSÃO

O cenário intitulado “Atuação do enfermeiro no manejo da sepse” foi elaborado a partir de protocolos pautados nos melhores níveis de evidência, sendo validado por especialistas em sepse e simulação e testado com enfermeiros. Nesse contexto, esta pesquisa descreveu a importância dessas fases na construção de um cenário de simulação para a efetividade da aprendizagem.

Todas as sugestões dos juízes foram analisadas cautelosamente e alteradas conforme o objetivo do cenário, o público-alvo e os resultados que se pretendia atingir. O cenário de simulação adaptado mostrou-se adequado, obtendo valor geral > 0,90 entre os juízes.

Espera-se que esse instrumento seja um facilitador para docentes e profissionais dos núcleos de educação permanente/continuada de instituições de saúde na capacitação de enfermeiros e estudantes de enfermagem no que tange à atuação do manejo da sepse.

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  Extraído da tese: “Julgamento clínico e autoeficácia de enfermeiros para o manejo da sepse: uso da simulação clínica”, Departamento de Enfermagem, Universidade Federal de São Carlos, 2018.

Datas de Publicação

• Publicação nesta coleção
  27 Nov 2020
• Data do Fascículo
  2020

Histórico

• Recebido
  30 Jul 2019
• Aceito
  14 Jan 2020