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Caracterização do meio físico da microbacia quatro bocas, em Angelim, PE, e sua quantificação por sistema de informação geográfica

Characterization of physical environment in the quatro bocas watershed in Angelim, PE, and its quantification by a geographic information system

Resumos

Este trabalho teve por objetivos fazer a caracterização fisiográfica da microbacia Quatro Bocas, quantificar por meio de Sistema de Informação Geográfica (SIG) as classes de ocupação do meio físico (área por classe de solo; área por classe de solo e de declividade; área por classe de solo, de declividade e de uso atual das terras) e, paralelamente, fazer considerações sobre o seu planejamento. Os planos de informações utilizados para entrada no SIG foram os mapas de solo, de declividade e de uso atual das terras (ano 1989). Os solos apresentam uma forte deficiência na fertilidade natural e o Podzólico Vermelho-Amarelo abrúptico plíntico abrange 87% da área, com 63% em relevo forte ondulado, o que favorece a erosão, impede a mecanização e exige cuidados especiais com relação ao uso e manejo. O Regossolo distrófico e o Aluvial distrófico ocupam 13% da área, com relevos suave ondulado e plano, favorecendo o uso de culturas anuais.

classes de solo; declividade; uso atual das terras


The objectives of this paper were to characterize the physical environment of a watershed and to use a Geographic Information System (GIS) to evaluate: area by soil class; area by soil class and slope; area by soil class, slope and current land use. Additionally some considerations about the watershed planning are also made. The basic information layers used were: soils map, slope map and current land use map (year of 1989). The soils presented a high deficiency of natural fertility with the Red-Yellow Podzolic soil (Abruptic Plinthaqult) occupying 87% of the area, mostly in accentuated slopes favoring, therefore, the erosion process, posing difficulties to the mechanization and requiring special care regarding its use and management. The Dystrophic Regosol (Arenic Entisol) and the Dystrophic Alluvial (Fluvic Entisol) soils represent 13% of the area in a relief suitable to the establishment of annual crops.

soil classes; slope; current land use


CARACTERIZAÇÃO DO MEIO FÍSICO DA MICROBACIA QUATRO BOCAS, EM ANGELIM, PE, E SUA QUANTIFICAÇÃO POR SISTEMA DE INFORMAÇÃO GEOGRÁFICA1 1 Aceito para publicação em 19 de junho de 1998. 2 Eng. Agr., M.Sc., Embrapa-Centro Nacional de Pesquisa de Solos (CNPS-UEP/Recife), Rua Antonio Falcão, 402, Boa Viagem, CEP 51020-240 Recife, PE. E-mail: Fbarreto@embrapacnpsuep.com.br 3 Eng. Agr., Ph.D., Dep. de Engenharia Florestal, UFV, CEP 36570-000 Viçosa, MG. 4 Eng. Agr., D.Sc., IPA, Avenida General San Martin, 1371, Bongi, Caixa Postal 1022, CEP 50761-000 Recife, PE.

ADEMAR BARROS DA SILVA2 1 Aceito para publicação em 19 de junho de 1998. 2 Eng. Agr., M.Sc., Embrapa-Centro Nacional de Pesquisa de Solos (CNPS-UEP/Recife), Rua Antonio Falcão, 402, Boa Viagem, CEP 51020-240 Recife, PE. E-mail: Fbarreto@embrapacnpsuep.com.br 3 Eng. Agr., Ph.D., Dep. de Engenharia Florestal, UFV, CEP 36570-000 Viçosa, MG. 4 Eng. Agr., D.Sc., IPA, Avenida General San Martin, 1371, Bongi, Caixa Postal 1022, CEP 50761-000 Recife, PE. , RICARDO SEIXAS BRITES3 1 Aceito para publicação em 19 de junho de 1998. 2 Eng. Agr., M.Sc., Embrapa-Centro Nacional de Pesquisa de Solos (CNPS-UEP/Recife), Rua Antonio Falcão, 402, Boa Viagem, CEP 51020-240 Recife, PE. E-mail: Fbarreto@embrapacnpsuep.com.br 3 Eng. Agr., Ph.D., Dep. de Engenharia Florestal, UFV, CEP 36570-000 Viçosa, MG. 4 Eng. Agr., D.Sc., IPA, Avenida General San Martin, 1371, Bongi, Caixa Postal 1022, CEP 50761-000 Recife, PE. e ANTONIO RAIMUNDO DE SOUSA4 1 Aceito para publicação em 19 de junho de 1998. 2 Eng. Agr., M.Sc., Embrapa-Centro Nacional de Pesquisa de Solos (CNPS-UEP/Recife), Rua Antonio Falcão, 402, Boa Viagem, CEP 51020-240 Recife, PE. E-mail: Fbarreto@embrapacnpsuep.com.br 3 Eng. Agr., Ph.D., Dep. de Engenharia Florestal, UFV, CEP 36570-000 Viçosa, MG. 4 Eng. Agr., D.Sc., IPA, Avenida General San Martin, 1371, Bongi, Caixa Postal 1022, CEP 50761-000 Recife, PE.

RESUMO - Este trabalho teve por objetivos fazer a caracterização fisiográfica da microbacia Quatro Bocas, quantificar por meio de Sistema de Informação Geográfica (SIG) as classes de ocupação do meio físico (área por classe de solo; área por classe de solo e de declividade; área por classe de solo, de declividade e de uso atual das terras) e, paralelamente, fazer considerações sobre o seu planejamento. Os planos de informações utilizados para entrada no SIG foram os mapas de solo, de declividade e de uso atual das terras (ano 1989). Os solos apresentam uma forte deficiência na fertilidade natural e o Podzólico Vermelho-Amarelo abrúptico plíntico abrange 87% da área, com 63% em relevo forte ondulado, o que favorece a erosão, impede a mecanização e exige cuidados especiais com relação ao uso e manejo. O Regossolo distrófico e o Aluvial distrófico ocupam 13% da área, com relevos suave ondulado e plano, favorecendo o uso de culturas anuais.

Termos para indexação: classes de solo, declividade, uso atual das terras.

CHARACTERIZATION OF THE PHYSICAL ENVIRONMENT IN THE QUATRO BOCAS WATERSHED IN ANGELIM, PE, AND ITS QUANTIFICATION BY A GEOGRAPHIC INFORMATION SYSTEM

ABSTRACT - The objectives of this paper were to characterize the physical environment of a watershed and to use a Geographic Information System (GIS) to evaluate: area by soil class; area by soil class and slope; area by soil class, slope and current land use. Additionally some considerations about the watershed planning are also made. The basic information layers used were: soils map, slope map and current land use map (year of 1989). The soils presented a high deficiency of natural fertility with the Red-Yellow Podzolic soil (Abruptic Plinthaqult) occupying 87% of the area, mostly in accentuated slopes favoring, therefore, the erosion process, posing difficulties to the mechanization and requiring special care regarding its use and management. The Dystrophic Regosol (Arenic Entisol) and the Dystrophic Alluvial (Fluvic Entisol) soils represent 13% of the area in a relief suitable to the establishment of annual crops.

Index terms: soil classes, slope, current land use.

INTRODUÇÃO

A exploração das terras e o crescimento econômico do meio rural de grande parte das regiões brasileiras têm sido constantemente prejudicados pela falta de um planejamento real, que tenha como base o conhecimento dos recursos naturais e agrossocioeconômicos disponíveis. A exploração desordenada das terras contribui para a degradação dos ecossistemas regionais com conseqüente deterioração do nível de vida da população rural e urbana. Segundo Corrêa (1995), lamentavelmente, o homem ao realizar a adaptação das terras para as explorações agrícolas, modifica as características dos solos e não observa os fatores limitantes, favorecendo a agressão das mais variadas formas, tornando-os degradados. Mais impressionante ainda é constatar que o agricultor que depende basicamente do solo agrícola para sobreviver concorra para facilitar a sua destruição.

Para reverter essa situação é importante que sejam levantadas as características e propriedades dos recursos solo, água e vegetação, bem como a disposição deles na paisagem geral, o que possibilitará uma avaliação do seu potencial e de suas limitações.

O primeiro passo na direção de uma agricultura racional é o uso adequado da terra (Lepsch et al., 1983). Portanto, informações integradas, atuais e precisas sobre os recursos naturais, numa escala detalhada, são indispensáveis para a tomada de decisões na área de planejamento rural, possibilitando uma produção agrossilvopastoril sustentada no tempo e compatível com uma boa qualidade ambiental.

Segundo Macedo, na apresentação de Assad & Sano (1993), o perfeito conhecimento dos recursos naturais (solos, água, vegetação, recursos minerais de interesse agrícola) e das características sócio-econômicas (população, produção, evolução da fronteira agrícola e uso atual das terras) constituem o embasamento indispensável para a avaliação das áreas passíveis de utilização com atividades agrícolas sustentáveis e das áreas que devem ser preservadas.

De acordo com Brasil (1987), os trabalhos de manejo de solo e de água praticados no país restringem-se a algumas ações isoladas feitas em nível de propriedade agrícola, sem levar em consideração o aproveitamento integrado dos recursos naturais. A microbacia hidrográfica é a unidade geográfica ideal para o planejamento integrado do manejo dos recursos naturais no ecossistema por ele envolvido. Segundo Costa (1987), o grande trunfo do manejo integrado de microbacias hidrográficas é, de um lado, o manejo a partir de um limite natural, ou seja, envolve não a demarcação artificial da propriedade rural apenas, mas todo o sistema natural, e de outro, a tentativa de conscientizar a população que habita a microbacia da necessidade de conservar o solo.

No planejamento de uma microbacia é indispensável o seu diagnóstico, obtido por meio das caracterizações fisiográfica e sócio-econômica, além da identificação das práticas de uso atual e manejo dos solos. O tratamento dessas informações espaciais é fundamental para o controle, organização e ocupação das unidades físicas do meio ambiente.

Segundo Meneses, no prefácio de Assad & Sano (1993), para acompanhar a dinâmica da ocupação e utilização do solo é preciso dispor de técnicas que facilitem a ordenação dessa ocupação e que sejam passíveis de tratamentos automatizados. Entre tais técnicas estão os sistemas de informações geográficas (SIGs) destinados ao tratamento automatizado de dados georreferenciados. Esses sistemas manipulam dados de diversas fontes e formatos, dentro de um ambiente computacional ágil e capaz de integrar as informações espaciais temáticas e gerar novos dados derivados dos originais.

Nas caracterizações fisiográfica e sócio-econômica de determinada área, vários planos de informação são obtidos para entrada nos SIGs. Como exemplos, podem ser relacionados os mapas de: classes de solo, classes de declividade, uso atual das terras, aptidão agrícola dos solos, rede de drenagem, recursos hídricos, suscetibilidade dos solos à erosão, estrutura fundiária, sistemas de produção e outros. Dependendo da finalidade do trabalho, os planos são selecionados e armazenados no SIG, em que, por meio de cruzamentos, geram novas informações, as quais, interpretadas convenientemente, servirão de base para o planejamento e recomendações de uso e manejo do ambiente.

Objetivou-se neste trabalho fazer a caracterização fisiográfica da microbacia Quatro Bocas, quantificar por meio de Sistema de Informação Geográfica as áreas de solos, de declividades e de uso atual das terras (ano 1989), e, paralelamente, fazer considerações sobre o planejamento de uso e manejo dos solos.

MATERIAL E MÉTODOS

A microbacia Quatro Bocas localiza-se no município de Angelim, agreste meridional do Estado de Pernambuco (microrregião 109 - IBGE), ocupa uma área aproximada de 931 ha, distante 220 km de Recife. Suas coordenadas em UTM (Universal Transversa de Mercator) estão entre N=9.010.107 m e 9.013.424 m e E=792.643 m e 798.635 m. Tem como vias de acesso as rodovias: PE-187, PE-177 e BR-104. A altitude média da sede do município é de 648 m.

O tipo climático da área segundo Thornthwaite & Mather (1955) é DdA' a' semi-árido megatérmico. A precipitação pluvial média anual é de 900 mm, apresentando uma faixa de concentração entre os meses de março a julho, nos quais se localizam 60% do total médio anual, tendendo a diminuir até novembro.

Quanto à geologia de superfície do local, a área está embasada em rochas do complexo cristalino, datadas do Pré-Cambriano (CD), constituindo-se na principal fonte de material de origem dos solos. As rochas mais importantes na formação dos solos são os gnaisses, com freqüentes inclusões de granitos.

A vegetação predominante na área é a caatinga hipoxerófila, já bastante alterada pela presença da atividade humana. Entre as espécies principais encontradas estão a Cassia excelsa Scharad (canafístula), Parkinsonia aculeata L. (turco), Erythrina velutina Willd (mulungu), Mimosa hostilis Benth (jurema-preta), Anadenanthera macrocarpa (angico), Bromelia laciniosa Mart. (macambira), Spondias tuberosa Arruda (imbuzeiro), Schinopsis brasiliensis Engl. (braúna) e Croton sp. (marmeleiro). Com menor freqüência também estão presentes Anacardium occidentale L. (cajueiro), Mangifera indica L. (mangueira) e Citrus sp. (laranja e limão).

Para atender aos objetivos deste trabalho, escolheram-se como planos de informação para entrada no SIG os mapas de solo, de declividade (confeccionado a partir de mapa planialtimétrico com espaçamento de 5,0 m entre curvas de nível) e de uso atual das terras (ano 1989), na escala aproximada de 1:10.700 (proveniente da ampliação de material básico original na escala de 1:25.000). Esse material foi elaborado pela Empresa Pernambucana de Pesquisa Agropecuária (IPA), utilizando-se fotografias aéreas verticais, ortofotos e observações de campo. O levantamento de solos foi feito segundo as normas da Reunião Técnica de Levantamento de Solos (1979), e as descrições morfológicas de acordo com Lemos & Santos (1984).

Os solos identificados e classificados na microbacia foram: PV: Podzólico Vermelho-Amarelo abrúptico plíntico textura argilosa fase caatinga hipoxerófila relevo suave ondulado a forte ondulado; REd: Regossolo distrófico com fragipã fase caatinga hipoxerófila relevo plano a suave ondulado; e Ad: Aluvial distrófico textura indiscriminada relevo plano. Quanto às classes de declividade, quatro foram identificadas: 0 - 3% (relevo plano); 3 - 8% (relevo suave ondulado); 8 - 20% (relevo ondulado); e 20 - 45%+ (relevo forte ondulado). Com referência ao uso atual das terras (ano 1989), foram considerados como principais sistemas, os seguintes: milho+feijão+mandioca; pastagem; capoeira/pousio; e mata secundária.

O SIG utilizado foi o IDRISI, desenvolvido pela Universidade de Clark (Eastman, 1992). Para cada mapa original utilizou-se uma rede de quadrículas, cujo tamanho de célula foi de 5 mm de lado equivalentes a 2.862,25 m2 no campo (pixel com resolução de 5 x 5 mm) e um total de 62 linhas por 112 colunas. A numeração das linhas foi de 0 a 61 de cima para baixo, e a das colunas de 0 a 111, da esquerda para a direita. A digitação foi feita pelo teclado do computador. Os mapas foram armazenados de forma individual e posteriormente cruzados no sistema para gerar, respectivamente, as informações de meio físico área por classe de solo; área por classe de declividade; área por classe de uso atual das terras; e área por classe de solo e de declividade; área por classe de solo, de declividade, e de uso atual das terras. As operações para se chegar ao resultado final podem ser verificadas no diagrama de blocos (Fig. 1).


RESULTADOS E DISCUSSÃO

Observando-se as Tabelas 1 a 5, verifica-se que os totais das áreas não apresentam coincidência de valores. Segundo Walsh et al. (1987), isto é decorrente de erros presentes nos documentos originais (mapas, cartogramas) armazenados no SIG, chamados de "erros inerentes" e que não comprometem o resultado final do trabalho.

Na microbacia predomina o solo Podzólico Vermelho-Amarelo abrúptico plíntico textura argilosa (Fig. 2), ocupando uma área de 87% (Tabela 1), principalmente em relevos forte ondulado (63%) e suave ondulado (21%) (Tabela 4). É desenvolvido de material gnáissico e apresenta horizonte A espesso (em média 0,70 m de profundidade) de textura arenosa, pobre em matéria orgânica (0,95%), baixos teores de Ca2+ (1,1 cmolc/dm3) e de Mg2+ (0,4 cmolc/dm3), teor médio de K+ (0,16 cmolc/dm3), pobre em P disponível (3,0 mg/dm3), pH em água em torno de 5,0, acidez potencial média (H++Al3+= 4,2 cmolc/dm3) e teor médio de Al3+ (0,5 cmolc/dm3). O horizonte B textural (0,7 m a 1,3 m de profundidade) apresenta uma redução nos teores de matéria orgânica e P disponível, um pequeno acréscimo no teor de K+, e condições semelhantes ao horizonte A para os demais valores. Pelo visto, verifica-se que esse sistema possui baixa saturação de bases, pouca reserva de minerais facilmente intemperizáveis, e, conseqüentemente, uma forte deficiência na fertilidade natural. Para aproveitamento sustentável desse solo é necessário o uso da adubação química e da adubação orgânica.


No que se refere às características físicas, esse solo apresenta um aumento muito acentuado do teor de argila entre o horizonte A (9%) e o horizonte B textural (40%). Essa mudança textural abrupta proporciona uma descontinuidade pronunciada no sistema poroso. A água penetra com mais facilidade no horizonte superficial arenoso e mais lentamente no horizonte subsuperficial argiloso (mais microporos e muito menos poroso). Entre outros aspectos, isso facilita a erosão, particularmente quando se verifica que a maior parte desse solo está localizada em relevo forte ondulado (Tabela 4); devendo-se, portanto, evitar o cultivo de culturas como milho, feijão, mandioca e outras que não propiciem boa cobertura ao solo. Reflorestamentos, pastagens com manejo racional (sem queima e sem superpastoreio) e vegetação permanente, de preferência fruteiras (cajueiros e cítricas de modo geral), são os usos mais adequados. Parte dessa área deve ser reservada para a preservação da flora e da fauna. Manter o solo coberto a maior parte do tempo, reduzindo o impacto direto das gotas de chuva sobre a superfície do solo (causa primeira da erosão hídrica), deve ser a preocupação principal. O uso das áreas com relevos suave ondulado e ondulado requer a implementação de práticas simples de conservação de solos, tais como: preparo do solo e plantio em contorno, uso de renques de vegetação permanente em contorno, rotação de culturas e incorporação dos restos culturais ao solo.

O Regossolo distrófico com fragipã é a segunda classe de solo encontrada na microbacia (Fig. 2). Abrange uma área de 7% (Tabela 1), com predomínio dos relevos suave ondulado (4%) e plano (2%) (Tabela 4). Solo jovem (pouco desenvolvido) originado de material granito gnáissico, apresentando aspecto de areia branca quando visto a distância, com cortes nos barrancos tendendo a ser verticalizados, indicando a ausência de horizonte B textural. Possui horizontes A e C arenosos com profundidade média de 0,7 m e de 1,4 m, respectivamente. O horizonte A é muito pobre em matéria orgânica (0,62%), Ca2+ (0,4 cmolc/dm3), Mg2+ (0,2 cmolc/dm3), K+ (0,06 cmolc/dm3) e P disponível (2,0 mg/dm3). A acidez potencial é média (H++Al3+=3,1 cmolc/dm3), o teor de Al3+ baixo (0,2 cmolc/dm3) e o pH em água igual a 5,5. Com referência ao horizonte C, há um decréscimo nos teores de matéria orgânica, H+, Ca2+, Mg2+, P disponível e um ligeiro aumento de K+ (0,08 cmolc/dm3) e Al3+ (0,5 cmolc/dm3). De acordo com essas características químicas, percebe-se que é um solo extremamente pobre, exigindo para o incremento da produção adubações química e orgânica.

Apesar da limitação química (mas com possibilidades de redução), o REd possui uma característica física importante. Ele apresenta em profundidades variáveis (1,1 m a 1,4 m) uma camada denominada fragipã, que é definida por Oliveira et al. (1992) como: camada compacta, pouco permeável, muito dura e com aparência de cimentado quando seca. Todavia, com o umedecimento, a rigidez abranda-se; sob pressionamento, o torrão do material in natura apresenta rompimento. Essa camada, que constitui sério problema quando ocorre próxima à superficie, em virtude de restringir o arejamento e o crescimento radicular, tem, no caso dessa microbacia e em geral no agreste pernambucano, efeito benéfico. O Regossolo, por ser bastante arenoso, absorve com facilidade a água das chuvas, que, retida pelo fragipã, fica em grande parte à disposição das raízes, facilitando o enraizamento, pela disponibilidade de oxigênio, até onde a água encontra-se em maior quantidade. De acordo com Resende (1989), a cor branca dos feldspatos e quartzo (principais constituintes do Regossolo) proporciona um albedo muito elevado e o solo só se aquece muito na superfície, em virtude da má condutividade térmica desses constituintes. Portanto, tanto o aquecimento do solo quanto as perdas de água por capilaridade são mínimas. Segundo Silva (1986), mesmo quando esses solos não são muito eutróficos, a agricultura (mandioca, milho, feijão, tomate, batatinha) tem sido praticada com relativo sucesso. Os relevos plano e suave ondulado aliados à presença do fragipã (controlando a drenagem interna do perfil e favorecendo a manutenção da água no solo por mais tempo) tornam esse ambiente potencialmente favorável ao uso agrícola com culturas anuais, embora possua fertilidade natural baixa. Além do mais, a alta permeabilidade faz desse solo resistente à erosão. Mesmo assim, práticas simples de conservação do solo, como sugeridas para o PV, são também indicadas para o REd.

Por último, pode-se verificar a classe de solo Aluvial distrófico textura indiscriminada (Fig. 2) ocupando 6% da área (Tabela 1) em relevo plano (5%) (Tabela 4). Solo pouco desenvolvido, apresentando horizonte A com espessura em torno de 0,25 m sobre camadas estratificadas cuja profundidade ultrapassa 1,3 m. Quimicamente, possui valores muito semelhantes ao REd; portanto, também de fertilidade natural baixa. Graças principalmente ao relevo plano e à boa retenção de umidade, os pequenos agricultores da microbacia devem aproveitar esse solo para o cultivo de hortaliças usando a pequena irrigação, já que no local passa um pequeno riacho com água corrente e de boa qualidade. Sugere-se, no caso de opção pelo cultivo de hortaliças, a construção de um pequeno açude para evitar a falta de água no período de verão. Para correção da fertilidade do solo é indispensável o uso de adubos químicos e orgânicos. Culturas anuais e também o plantio de capim de corte são outras opções. Os problemas de drenagem que por ventura ocorram podem ser resolvidos com práticas relativamente simples (construção de canais de drenagem superficial), utilizando-se a mão-de-obra disponível na própria microbacia.

Com relação às classes de declividade (Fig. 3), a microbacia apresenta 64% da área na classe de relevo forte ondulado (Tabela 2). Esse é um aspecto muito importante em relação ao uso e manejo dos solos, pois, além da acentuada pobreza química dos pedossistemas, o relevo implica sérias limitações ao ambiente, tornando-o mais suscetível à erosão e impedindo a mecanização. A cobertura vegetal nesse caso deve ser, de preferência, permanente, como já sugerido.


Analisando-se o uso atual das terras no ano de 1989, observa-se a distribuição aleatória de quatro classes de uso (Fig. 4): milho+feijão+mandioca (23%), pastagem (37%), capoeira/pousio (22%) e mata secundária (18%) (Tabela 3). Nota-se que 77% da microbacia encontrava-se com o solo relativamente protegido contra a ação direta da precipitação pluvial e, conseqüentemente, minimizando o processo erosivo. Verifica-se, entretanto, a ausência de um planejamento de uso levando em consideração a aptidão agrícola dos solos. As diversas classes de uso ocupavam indistintamente todas as classes de solo e de declividade, quando na realidade as culturas permanentes deveriam ocupar, principalmente, a área de relevo forte ondulado. As pastagens, desde que obedeçam a um planejamento preestabelecido, sem excesso de consumo e pisoteio pelos animais, assim como a mata secundária e a capoeira/pousio são práticas que, entre outras, garantem boa proteção ao solo contra a erosão. O pousio é uma prática agrícola muito comum na região semi-árida nordestina, e revela-se como uma forma de o pequeno agricultor conviver com os solos que apresentam baixa fertilidade natural, deixando-os em recuperação por 5-6 anos após a utilização por 3-4 anos seguidos.


Finalmente, analisando-se o resultado do cruzamento no sistema dos dados de solos, de declividade e de uso atual das terras (1989), verificam-se 34 classes de ocupação do meio físico (Tabela 5). A classe de meio físico milho+feijão+mandioca ocupava uma área de 114,49 ha (12,3%) no solo PV na declividade 20-45%+. Esse uso não está de acordo com a aptidão agrícola do solo em relevo forte ondulado, já que ele tende a acelerar um processo que é francamente erosivo mesmo em condições naturais. De posse dessa informação, os técnicos da extensão rural juntamente com a associação de agricultores, sabendo das características intrínsecas do PV e dos riscos de erosão, podem planejar a atividade milho+feijão+mandioca, para a mesma classe de solo, só que na declividade de 3 a 8%, já que existe área disponível nessa condição (Tabela 4) e onde os riscos de degradação do solo por erosão são menores. Além do mais, deve-se disciplinar o uso, concentrando-se as culturas anuais nas áreas de relevo menos movimentado. As pastagens, o reflorestamento, a preservação da flora e da fauna e a fruticultura devem ser planejados para a área de relevo forte ondulado.

CONCLUSÕES

1. Os solos da microbacia apresentam fertilidade natural baixa e necessitam de fertilizantes químicos e orgânicos.

2. O solo Podzólico Vermelho-Amarelo abrúptico plíntico é predominante na área, com 63% na classe de relevo forte ondulado e 21% na classe de relevo suave ondulado; no relevo forte ondulado, o solo apresenta como limitações ao uso e manejo, alta suscetibilidade à erosão e impedimento à mecanização; reflorestamentos, pastagens e culturas permanentes são os usos mais adequados; na classe de relevo suave ondulado, o solo requer, no cultivo de plantas anuais e bianuais, o uso de práticas simples de conservação de solos.

3. O Regossolo distrófico e o Aluvial distrófico ocupam 13% da área, com quantidades próximas entre eles e predomínio em relevos suave ondulado e plano, respectivamente; essa condição de relevo aliada às boas características físicas desses solos reduzem a erosão, possibilitam a mecanização e favorecem um aproveitamento agrícola preferencialmente com as culturas milho, feijão, tomate, batatinha, mandioca e abacaxi.

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    Aceito para publicação em 19 de junho de 1998.
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    Eng. Agr., M.Sc., Embrapa-Centro Nacional de Pesquisa de Solos (CNPS-UEP/Recife), Rua Antonio Falcão, 402, Boa Viagem, CEP 51020-240 Recife, PE. E-mail:
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    Eng. Agr., Ph.D., Dep. de Engenharia Florestal, UFV, CEP 36570-000 Viçosa, MG.
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    Eng. Agr., D.Sc., IPA, Avenida General San Martin, 1371, Bongi, Caixa Postal 1022, CEP 50761-000 Recife, PE.
  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      19 Jul 2006
    • Data do Fascículo
      Jan 1999
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