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A UNIVERSIDADE BRASILEIRA NA DÉCADA DE 70

Durante a década de 70 a Universidade brasileira foi objeto de extensa controvérsia. Numericamente, as críticas prevaleceram sobre os elogios.

Ocorre, porém, que os aspetos negativos são mais fáceis de apontar e, em geral, dispensam comprovação; ao passo que os dados positivos não são assim acessíveis e valorizados, nem divulgados com igual açodamento. Ademais, a Universidade realiza investimentos culturais e o seu rendimento prático difunde-se, anonimamente, sob a forma de contribuição ao progresso do país, sem ser creditado à instituição de origem.

No entanto, o desenvolvimento de todas as nações modernas está sustentado pelo substrato de uma vigorosa cultura de nível superior. Além disso, ao longo do último decênio a Universidade brasileira teve de conciliar a sua própria expansão com o dever de participar do processo de desenvolvimento nacional.

Em verdade, durante esse período, o ensino superior cresceu sem freios. Os 456.134 alunos de 1970 passaram a 1.345.000 em 1980. As 50 universidades e 466 unidades isoladas ou federações de escolas multiplicaram-se, em uma década, para 65 e 810, respectivamente. Seria difícil imaginar-se uma expansão dessa grandeza, sem atropelos. Os novos contingentes reclamaram sucessivas mudanças que as estruturas de ensino não estavam preparadas para absorver. Daí as perplexidades vigentes e um sentimento quase generalizado de saturação.

Contudo, a atividade acadêmica também se enriqueceu aceleradamente, nessa fase. Os

2.166 cursos oferecidos em 1970 atingiram, dez anos mais tarde, o número de 4.079. Em apenas cinco anos (1974 -79), os estabelecimentos que dispunham de 8.085 doutores começaram a abrigar mais de 11.000, e os titulares de mestrado, que apenas somavam 7.627, ultrapassaram, em 1979, a casa dos 17.400.

Ora, o conjunto desses indicadores denota que a Universidade brasileira percorreu um árduo período de reformas e de adaptações. Mas, a diversificação da oferta e a melhoria na qualificação do corpo docente demonstram ainda, por si sós, a retomada de uma política qualitativa, atenta ao mercado e a outras solicitações da sociedade brasileira. Os resultados dessa política já se evidenciam na produção científica de nossos dias, não somente através das 3.000 teses anuais de pós-graduação, como na provisão direta dos docentes e alunos ao processo de desenvolvimento nacional.

Essas contribuições tanto dizem respeito à análise e terapêutica de problemas sociais, como a estudos que vão desde a cultura do algodão no nordeste até à sofisticada microeletrônica reclamada pelos grandes parques industriais. Por esses caminhos tem-se conhecido melhor a realidade do país, além de se estar ampliando o subsídio efetivo ao crescimento econômico.

Boletim do Banco Central do Brasil registra, por exemplo, um expressivo aumento da receita brasileira, aurida com a transferência de tecnologia, sobretudo no uso de marcas e patentes, assistência técnica, prestação de serviços de engenharia, ou aluguel de equipamentos.

Mas esse incremento no comércio da tecnologia não pode deixar de ser atribuído em grande parte, à renovação da Universidade brasileira. Nesse, como em outros segmentos, a pesquisa fundamental e aplicada, ao lado da formação de técnicos de alto nível, constituem os elementos essenciais de viabilização.

Assim, na área biomédica, a pesquisa básica universitária permitiu o fabrico de válvulas com dura-mater e de outras peças para cirurgia cardíaca, com bom índice de exportação. Por outro lado, o último volume do American Journal of Obstetrics and Gynecology, referentes às publicações científicas em "Reprodução Humana" durante a década 1968-1977 (Ten Years Cumulative Index - Vol. 100-129), revela que o departamento de uma Universidade brasileira está situado entre os cinco núcleos de maior produção do mundo, durante esse período.

No terreno da Saúde Pública a participação da Universidade brasileira tem sido, igualmente, significativa. A título de ilustração, basta referir a realização de um Congresso Internacional sobre "Doença de Chagas" (1979), no qual os trabalhos apresentados pelas Universidades brasileiras constituíram mais da metade do total das pesquisas expostas.

Também no campo da Engenharia Aeronáutica registra-se a relevância do papel da Universidade, desde quando foi a investigação funda­ mental que capacitou a indústria brasileira a com petir no mercado internacional, propiciando a exportação de aviões de pequeno e médio porte.

Dados semelhantes são ainda assinalados no setor de construção das grandes estruturas, agora realizadas no país e no estrangeiro, mercê da assessoria prestada pelas universidades.

Aliás, a avaliação de conjunto, efetuada pela Biblioteca da Universidade Autônoma do México, a respeito da produtividade científica na América Latina durante os últimos 3 anos, documenta a atuação das nossas instituições de ensino superior. O citado estudo - que se baseia tanto nos parâmetros quantitativos, quanto na excelência das investigações - classifica o Brasil em primeiro lugar, confirmando, pois, o alto nível acadêmico de nossas produções.

Os dados referidos - e muitos outros elementos semelhantes que poderiam ser acrescentados - demonstram que, apesar das limitações econômico-financeiras, ainda assim, nossas unidades de ensino superior se têm revitalizado durante a última década. Com isso não se deseja negar deficiências na qualidade do ensino. Pretende-se, porém, realçar aspetos que desmentem a hipótese de uma Universidade amorfa e sem destino.

Os bolsões de excelência, espalhados em todo o Brasil, impõem uma revisão daquelas análises críticas que apenas sublinham as transparências negativas. Pois, sem dúvida, com o apoio da Universidade brasileira, o país capacitou-se a definir o seu destino com os seus próprios recursos humanos.

Luiz Fernando Macêdo Costa
Reitor da Universidade Federal da Bahia

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    14 Jan 2022
  • Data do Fascículo
    May-Aug 1981
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