Acessibilidade / Reportar erro

Taxa de infecção e sorotipos de Streptococcus agalactiae em amostras de recém-nascidos infectados na cidade de Campinas (SP), Brasil

Infection rate and Streptococcus agalactiae serotypes in samples of infected neonates in the city of Campinas (São Paulo), Brazil

Resumos

OBJETIVO: Descrever os casos e o perfil microbiológico dos sorotipos de Streptococcus agalactiae provenientes de recém-nascidos em um Centro de Referência da Saúde da Mulher na cidade de Campinas, São Paulo, Brasil. MÉTODOS: Estudo transversal clínico-laboratorial realizado de janeiro de 2007 a dezembro de 2011. As cepas suspeitas, isoladas em amostras de sangue e líquor, foram identificadas a partir da hemólise em ágar sangue, coloração de Gram, provas de catalase, teste de CAMP, hidrólise do hipurato ou por automação microbiológica Vitek 2 BioMerieux®. A seguir, estas cepas foram tipadas por PCR utilizando sucessivamente primers específicos para espécie e para nove sorotipos de S. agalactiae. RESULTADOS: Foram isoladas sete amostras de sangue, uma de líquor e uma de secreção ocular provenientes de nove recém-nascidos com infecções causadas pelo S. agalactiae, sendo sete casos de infecção de início precoce e duas de início tardio. Apenas um destes casos foi positivo para amostras pareadas mãe-filho. Para um total de 13.749 partos no período, os 7 casos correspondem a 0,5 caso de infecção precoce por Streptococcus do Grupo B a cada 1 mil nascidos vivos (ou 0,6 casos por 1 mil, incluindo os 2 de infecção tardia), tendo ocorrido 1, 3, 2, nenhum e 3 casos (um precoce e dois tardios), respectivamente, nos anos de 2007 a 2011. Foi possível realizar o PCR para sete amostras, sendo duas de cada um dos sorotipos Ia e V e o sorotipo III em três amostras, uma delas em um recém-nascido e outras duas em amostra pareada mãe-filho. CONCLUSÕES: Embora com casuística limitada, os sorotipos encontrados coincidem com os mais prevalentes na literatura mundial, mas diferem dos estudos brasileiros, exceto para o sorotipo Ia.

Streptococcus agalactiae; Infecções estreptocócicas; Sepse; Recém-nascido; Reação em cadeia da polimerase


PURPOSE: To describe the epidemiological cases and microbiological profile of Streptococcus agalactiae serotypes isolated from infected newborns of a Women's Health Reference Centre of Campinas, São Paulo, Brazil. METHODS: Cross-sectional laboratory survey conducted from January 2007 to December 2011. The newborns' strains, isolated from blood and cerebrospinal fluid samples, were screened by hemolysis on blood ágar plates, Gram stain, catalase test, CAMP test, hippurate hydrolysis or by microbiological automation: Vitek 2 BioMerieux®. They were typed by PCR, successively using specific primers for species and nine serotypes of S. agalactiae. RESULTS: Seven blood samples, one cerebrospinal fluid sample and an ocular sample, were isolated from nine newborns with infections caused by S. agalactiae, including seven cases of early onset and two of late onset. Only one of these cases was positive for paired mother-child samples. Considering that 13,749 deliveries were performed during the study period, the incidence was 0.5 cases of GBS infections of early onset per 1 thousand live births (or 0.6 per 1 thousand, including two cases of late onset) with 1, 3, 2, zero and 3 cases (one early and two late onset cases), respectively, for the years from 2007 to 2011. It was possible to apply PCR to seven of nine samples, two each of serotypes Ia and V and three of serotype III, one from a newborn and the other two from a paired mother-child sample. CONCLUSIONS: Although the sample was limited, the serotypes found are the most prevalent in the literature, but different from the other few Brazilian studies available, except for type Ia.

Streptococcus agalactiae; Streptococcal infections; Sepsis; Infant; newborn; Polymerase chain reaction


ARTIGO ORIGINAL

Taxa de infecção e sorotipos de Streptococcus agalactiae em amostras de recém-nascidos infectados na cidade de Campinas (SP), Brasil

Infection rate and Streptococcus agalactiae serotypes in samples of infected neonates in the city of Campinas (São Paulo), Brazil

Kateli FioloI; Cibele Esteves ZanardiII; Marizete SalvadegoIII; Carmem Silvia BertuzzoIV; Eliana AmaralV; Roseli CalilVI; Carlos Emilio LevyVII

IPrograma de Saúde da Criança e do Adolescente, Universidade Estadual de Campinas - UNICAMP - Campinas (SP), Brasil

IIInstituto de Biologia da Universidade Estadual de Campinas - UNICAMP - Campinas (SP), Brasil

IIILaboratório de Microbiologia do Hospital de Clínicas, Universidade Estadual de Campinas - UNICAMP - Campinas (SP), Brasil

IVDepartamento de Genética Médica da Faculdade de Ciências Médicas, Universidade Estadual de Campinas - UNICAMP - Campinas (SP), Brasil

VProfessora Associada do Departamento de Tocoginecologia da Faculdade de Ciências Médicas, Universidade Estadual de Campinas - UNICAMP - Campinas (SP), Brasil

VIComissão de Controle de Infecção Hospitalar do Centro de Atenção Integral à Saúde da Mulher (CAISM), Universidade Estadual de Campinas - UNICAMP - Campinas (SP), Brasil

VIIDepartamento de Patologia Clínica da Faculdade de Ciências Médicas, Universidade Estadual de Campinas - UNICAMP - Campinas (SP), Brasil

Endereço para correspondência Endereço para correspondência: Carlos Emilio Levy Av. Vital Brasil, 251, 2° andar Cidade Universitária "Zeferino Vaz" - Barão Geraldo CEP: 13083-888 Campinas (SP), Brasil

RESUMO

OBJETIVO: Descrever os casos e o perfil microbiológico dos sorotipos de Streptococcus agalactiae provenientes de recém-nascidos em um Centro de Referência da Saúde da Mulher na cidade de Campinas, São Paulo, Brasil.

MÉTODOS: Estudo transversal clínico-laboratorial realizado de janeiro de 2007 a dezembro de 2011. As cepas suspeitas, isoladas em amostras de sangue e líquor, foram identificadas a partir da hemólise em ágar sangue, coloração de Gram, provas de catalase, teste de CAMP, hidrólise do hipurato ou por automação microbiológica Vitek 2 BioMerieux®. A seguir, estas cepas foram tipadas por PCR utilizando sucessivamente primers específicos para espécie e para nove sorotipos de S. agalactiae.

RESULTADOS: Foram isoladas sete amostras de sangue, uma de líquor e uma de secreção ocular provenientes de nove recém-nascidos com infecções causadas pelo S. agalactiae, sendo sete casos de infecção de início precoce e duas de início tardio. Apenas um destes casos foi positivo para amostras pareadas mãe-filho. Para um total de 13.749 partos no período, os 7 casos correspondem a 0,5 caso de infecção precoce por Streptococcus do Grupo B a cada 1 mil nascidos vivos (ou 0,6 casos por 1 mil, incluindo os 2 de infecção tardia), tendo ocorrido 1, 3, 2, nenhum e 3 casos (um precoce e dois tardios), respectivamente, nos anos de 2007 a 2011. Foi possível realizar o PCR para sete amostras, sendo duas de cada um dos sorotipos Ia e V e o sorotipo III em três amostras, uma delas em um recém-nascido e outras duas em amostra pareada mãe-filho.

CONCLUSÕES: Embora com casuística limitada, os sorotipos encontrados coincidem com os mais prevalentes na literatura mundial, mas diferem dos estudos brasileiros, exceto para o sorotipo Ia.

Palavras-chave: Streptococcus agalactiae; Infecções estreptocócicas; Sepse, Recém-nascido; Reação em cadeia da polimerase

ABSTRACT

PURPOSE: To describe the epidemiological cases and microbiological profile of Streptococcus agalactiae serotypes isolated from infected newborns of a Women's Health Reference Centre of Campinas, São Paulo, Brazil.

METHODS: Cross-sectional laboratory survey conducted from January 2007 to December 2011. The newborns' strains, isolated from blood and cerebrospinal fluid samples, were screened by hemolysis on blood ágar plates, Gram stain, catalase test, CAMP test, hippurate hydrolysis or by microbiological automation: Vitek 2 BioMerieux®. They were typed by PCR, successively using specific primers for species and nine serotypes of S. agalactiae.

RESULTS: Seven blood samples, one cerebrospinal fluid sample and an ocular sample, were isolated from nine newborns with infections caused by S. agalactiae, including seven cases of early onset and two of late onset. Only one of these cases was positive for paired mother-child samples. Considering that 13,749 deliveries were performed during the study period, the incidence was 0.5 cases of GBS infections of early onset per 1 thousand live births (or 0.6 per 1 thousand, including two cases of late onset) with 1, 3, 2, zero and 3 cases (one early and two late onset cases), respectively, for the years from 2007 to 2011. It was possible to apply PCR to seven of nine samples, two each of serotypes Ia and V and three of serotype III, one from a newborn and the other two from a paired mother-child sample.

CONCLUSIONS: Although the sample was limited, the serotypes found are the most prevalent in the literature, but different from the other few Brazilian studies available, except for type Ia.

Keywords: Streptococcus agalactiae; Streptococcal infections; Sepsis; Infant, newborn; Polymerase chain reaction

Introdução

Streptococcus agalactiae ou Streptococcus do Grupo B (EGB) é uma bactéria gram-positiva cocóide em forma de cadeias, beta hemolítica e de potencial invasivo, especialmente no período perinatal, envolvendo recém-nascidos (RN), mulheres grávidas ou no pós-parto e, mais recentemente, descrito em pacientes idosos e em casos de infecção hospitalar1,2. A doença em RNs, em geral ocorre na primeira semana de vida e é denominada sepse neonatal de início precoce3,4. As formas clínicas em recém-nascidos abrangem a sepse, osteomielite, artrite séptica, pneumonia e meningite, podendo acarretar sequelas neurológicas, visuais e auditivas graves em 15 a 30% dos nascidos acometidos, ou podendo ainda levar ao óbito4.

Aproximadamente 10 a 30% das gestantes são colonizadas pelo EGB na vagina ou no reto3,4. Na ausência de qualquer intervenção, estima-se que 1 a 2% dos RNs de mães colonizadas desenvolvem doença precoce por EGB4. Em 1996, o Centers for Disease Control and Prevention (CDC) publicou diretrizes para a prevenção de infecção estreptocócica do grupo B no período perinatal5. As normas foram atualizadas em 2002 pelo CDC, padronizando a triagem de mulheres grávidas para a detecção de colonização pelo EGB entre a 35ª e a 37ª semanas de gestação, indicando profilaxia antibiótica nas infectadas durante o trabalho de parto6.

Em 2010, nova atualização reavaliou as estratégias de prevenção dando novas orientações referentes ao uso racional dos antibióticos, triagem de urina e metodologias laboratoriais4.

Do ponto de vista microbiológico, cada etapa do processo laboratorial (coleta, isolamento, uso de meio seletivo e apropriada identificação do EGB) é crítica para o sucesso da caracterização deste agente, assim como a experiência do profissional que executa estas tarefas4,7-12. Além de técnicas convencionais de identificação para EGB, foram desenvolvidas sondas de DNA4,13 e testes de amplificação de ácido nucléico, como reação em cadeia da polimerase (PCR)14-16.

O S. agalactiae é classificado em sorotipos de acordo com diferenças antigênicas capsulares detectados classicamente pela técnica de imunodifusão ou por PCR4,9,10.

Existem atualmente dez sorotipos capsulares distintos (Ia, Ib, II, III, IV, V, VI, VII, VIII), incluindo o mais novo, IX, descrito em 200717. A variedade capsular tem relação com a virulência, e identificar os sorotipos é fundamental para estudos clínicos e epidemiológicos4,9.

Dentre os dez sorotipos conhecidos, o III é o mais encontrado nas doenças do neonato, principalmente meningite e septicemia, e é o segundo mais detectado em amostra vaginal de gestantes assintomáticas, enquanto o sorotipo Ia é o mais isolado em amostra vaginal e o V tem predominado em casos de infecção em adultos, excluindo-se as gestantes4.

Para o desenvolvimento de uma vacina visando à prevenção das infecções pelo EGB, o planejamento da sua composição antigênica depende da distribuição dos sorotipos de EGB nas diferentes populações. Estudos em fase I e II têm revelado que mães imunizadas, produzindo anticorpos IgG tipo específico, protegem seus RNs de doença invasiva4,18-20, sendo, para este fim, importante conhecer a distribuição dos sorotipos prevalentes a regional e nacionalmente.

Assim, este trabalho teve como objetivos contribuir para o melhor conhecimento da importância do S. agalactiae em nosso meio e avaliar o impacto das medidas de prevenção preconizadas pelo CDC e a distribuição dos sorotipos de EGB detectados pela técnica de PCR em RNs4,9.

Métodos

Trata-se de um estudo clínico-laboratorial e transversal. Foram selecionados os casos correspondentes às amostras que tiveram cepas de S. agalactiae isoladas de líquidos biológicos, de RNs atendidos no Centro de Atenção Integral à Saúde da Mulher (CAISM) do Hospital da Mulher Prof Dr José Aristodemo Pinotti, durante o período de 1º de janeiro de 2007 a 31 de dezembro de 2011. O projeto foi aprovado pelo Comitê de Ética Médica em Pesquisa da Faculdade de Medicina da Universidade Estadual de Campinas (UNICAMP) sob parecer nº 640/2008.

Foram excluídas deste estudo as amostras clínicas não identificadas corretamente, as repetidas do mesmo paciente e cepas que não foram confirmadas como S. agalactiae.

As amostras de sangue foram processadas no equipamento de automação BacT/Alert BioMerieux® e as amostras positivas semeadas em ágar sangue de carneiro e incubadas a 37ºC com 5% de CO2, permanecendo por 24 horas na estufa. Desta mesma forma, foram semeadas as amostras de líquor (LCR).

A rotina microbiológica de identificação de S. agalactiae baseou-se em técnicas padronizadas compreendendo a beta hemólise em ágar sangue de carneiro, prova da catalase, teste de CAMP, hidrólise do hipurato9,10. Nos casos de provas com resultados duvidosos, as amostras foram identificadas pelo equipamento de automação Vitek 2 Compact (BioMeriéux Vitek Inc., St. Louis, MO). As confirmadas foram estocadas a -80ºC, em caldo BHI com 15% de glicerol.

O protocolo de extração de DNA baseou-se no trabalho de Ausubel et al.21 utilizando colônias crescidas diretamente no ágar sangue. O DNA genômico foi quantificado por espectrofotometria, pelo NanoVue, General Eletric Company. Para a reação de PCR foram designados um par de primers para cada sorotipo de EGB (Ia, Ib, II-VIII) e um par para confirmar o microrganismo realmente como sendo S. agalactiae22,23. Foram feitas três reações no termociclador, sendo a primeira apenas com os primers que definiam a espécie. As amostras amplificadas nessa etapa, assim o foram com os outros nove pares de primers. Por fim, realizou-se uma última reação, para confirmar o sorotipo, apenas com o par de primers que amplificou na reação anterior, descartando-se reações cruzadas.

O ciclo do termociclador foi de 15 minutos a 94°C, 60°C por 30 segundos, 72°C por 1 minuto, 72°C por 10 minutos e final de 22°C24. Os produtos das PCRs foram submetidos à eletroforese em gel de ágarose 1,5% e utilizou-se 2,0 µL de marcador de peso molecular 100 Kb e 50 Kb (Fermentas Life Science, USA). As imagens foram capturadas pelo analisador Amersham Biosciences/GE Healthcare Typhoon 9400® e, posteriormente, analisadas.

Os prontuários dos recém-nascidos e de suas mães foram revisados para a coleta de informações clínicas e demográficas. Os dados foram tabulados no Microsoft Excel e o programa utilizado para as análises estatísticas foi o PASW Statistics 18.0, no qual executaram-se análises comparando as médias dos resultados apresentados.

Resultados

No período de 2007 a 2011 foram detectados nove casos de RNs com culturas positivas para S. agalactiae, sendo sete isoladas de hemocultura, uma de líquor e uma de secreção ocular. Em apenas um deles houve amostras positivas pareadas da mãe e do RN, totalizando dez amostras analisadas.

Entre os nove RNs com processos infecciosos causados por S. agalactiae, em cinco foi diagnosticado quadro de sepse neonatal precoce (sendo dois gemelares), um de bacteremia neonatal precoce, um de meningite neonatal associada a sepse precoce e dois de infecção tardia (um de conjuntivite purulenta e outro de sepse e pneumonia). Das amostras, apenas seis estavam disponíveis para estudos moleculares.

A triagem inicial por PCR de espécie S. agalactiae confirmou as sete amostras selecionadas (seis de RN e uma de mãe). O PCR dos sorotipos das seis amostras de RNs revelou a participação dos tipos Ia, III e V, com dois casos cada um. Na única amostra pareada mãe-RN, que eram casos de bacteremia sem evolução para sepse, o subtipo III foi encontrado nas duas amostras de sangue. Os demais sorotipos não foram encontrados e nenhuma amostra deixou de ter o sorotipo identificado pelos primers utilizados.

Dos nove RNs com amostras positivas para S. agalactiae, quatro evoluíram para óbito, sendo dois casos de gemelares com diagnóstico de sepse neonatal. Destes quatro, apenas um foi submetido ao PCR e teve identificação do sorotipo V. Entre os cinco que sobreviveram, um apresentou meningite neonatal causada pelo sorotipo III e na evolução clínica foram detectadas sequelas neurológicas caracterizadas por atrofia cerebral fronto-parietal, com crises convulsivas e atraso no desenvolvimento motor. Nos outros quatro casos de sepse e um de conjuntivite, os RNs não tiveram sequelas. Todas as mães também tiveram alta sem complicações.

Das oito parturientes (uma com gemelares), cujos nove RNs apresentaram infecção por S. agalactiae, cinco foram acompanhadas em Centro de Saúde, sendo que três fizeram cultura reto-vaginal para S. agalactiae e tiveram resultado negativo. A mãe dos gemelares não fez cultura por ser prematuro. Das três parturientes acompanhadas pelo CAISM, duas eram casos de trabalho de parto prematuro e uma não fez pré-natal.

A taxa de doença de início precoce por EGB foi 0,51 casos/1 mil nascidos vivos e a letalidade no período, 44,4%. Quando considerados também os dois casos de infecção de início tardio, a taxa foi de 0,65 casos/1 mil nascidos vivos (Tabela 1).

Discussão

A triagem com exame reto-vaginal para pesquisa de S. agalactiae, entre a 35ª e 37ª semana de gestação, seguida de tratamento profilático das gestantes colonizadas, aplicado na rotina do CAISM desde janeiro de 2007, mostrou-se pertinente e efetiva. O número de amostras reduzido pode ser atribuído à eficiência deste programa. A técnica de PCR foi útil e de elevada especificidade.

Tais protocolos seguem orientações do Centro de Controle de Doenças (CDC)4,6 e do Projeto Diretrizes da Associação Médica Brasileira sobre Rotura Prematura das Membranas, de 200824. A conduta baseia-se na estimativa de risco 25 vezes maior de uma grávida colonizada por EGB ter parto de RN com doença de início precoce, comparada com uma gestante com cultura negativa no pré-natal4-7,25. Nos Estados Unidos, a taxa alcançou patamar de aproximadamente 0,5 casos por 1 mil nascidos vivos4, e, mais recentemente, 0,3 a 0,4 casos por 1 mil nascidos vivos, graças à estratégia de prevenção que incluiu a triagem universal em 20026. No CAISM, encontramos uma taxa semelhante, de 0,51 casos por 1 mil nascidos vivos, para o período de 2007 a 2011, após o início do monitoramento vaginal/retal de gestantes. Segundo dados disponíveis de período anterior (1996 a 2006), a taxa estimada era de 0,8 casos por 1 mil nascidos vivos (dados não publicados - Comissão de Controle de Infecção Hospitalar do CAISM).

Devemos considerar que a reduzida casuística pode ser atribuída aos resultados positivos alcançados pelas medidas de prevenção adotadas. Os recursos laboratoriais tradicionais utilizados para isolamento e identificação de EGB, associados ao caldo seletivo Todd-Hewitt, com ou sem o uso de meios cromogênicos, o adequado treinamento do pessoal técnico e o reconhecimento da sua importância clínica permitem a adequada caracterização e estiveram presentes em nosso estudo4. Por outro lado, possíveis problemas com a coleta ou técnica de isolamento e identificação podem justificar os três casos seguidos em Centros de Saúde que tiveram amostras reto-vaginais colhidas e resultados negativos e apresentaram sepse neonatal precoce (dois casos) e bacteremia (um caso), mostrando as limitações possíveis da triagem e a consequente falha na profilaxia. Um caso seguido em Centro de Saúde foi um parto prematuro gemelar, não tendo sido colhida a cultura; outro caso não fez pré-natal. Nos três atendimentos de pré-natal no CAISM, as amostras não foram colhidas, pois se encontravam antes da 35ª semana de gestação.

Não se pode afastar a possibilidade de transmissão hospitalar do S. agalactiae nos dois casos de início tardio, que ocorreram em 2011, no CAISM, com dois meses de intervalo e o mesmo sorotipo Ia.

Fatores como tratamento prévio com antimicrobianos, ausência de coleta de material para diagnóstico ou menor sensibilidade da hemocultura para casos com baixa bacteremia poderiam ter dificultado um número maior de isolamentos de casos de infecção por S. agalactiae. Novos recursos moleculares para detecção do S. agalactiae diretamente em amostras de sangue estão sendo utilizados, alguns automatizados, que, além de mais sensíveis, rápidos e padronizados, poderão superar algumas destas limitações e serem úteis para fins clínicos e epidemiológicos23,26.

Quanto à prevalência dos sorotipos Ia, III e V em nosso estudo, condizem com os achados em outros países em amostras reto-vaginais2,4,7,27-36, sendo exceção o Japão, onde predominam o VI e VIII37. Estes sorotipos, por nós encontrados, também estão relacionados à maior virulência e, portanto, associados à maioria das infecções neonatais, maternas e em outras populações1-4,9.

Os dados sobre os sorotipos mais prevalentes no Brasil são poucos, todos obtidos pela técnica de imunodifusão, em diferentes períodos e com resultados distintos do padrão internacional. No Rio de Janeiro, em 1982, os mais frequentes foram Ib e Ia38. Em Florianópolis, em 1986, o II e o III39. Um estudo em 2005 encontrou o sorotipo Ib predominante entre gestantes de Jundiaí (SP), seguido pelos sorotipos II e Ia40,41. Mais recentemente, em 2010, um estudo de Curitiba (PR) revelou os tipos Ia e Ib como os mais frequentes em doença de início precoce, e o IV na infecção tardia, com apenas sete casos descritos42. O que chama a atenção é que os sorotipos Ib e II, que predominaram na maioria dos estudos brasileiros, não são considerados de maior virulência. Este fato justifica a ampliação destes estudos de sorotipagem em diferentes situações clínicas para melhor conhecimento de nossa realidade epidemiológica e, eventualmente, da revisão dos conceitos de virulência associados aos sorotipos.

A elevada gravidade da doença pode ser constatada pela também elevada letalidade (44%), especialmente nos casos de instalação precoce, e apesar de imediata introdução de antibioticoterapia específica. Diverge, neste sentido, o quadro apresentado de bacteremia transitória num caso envolvendo mãe e RN, pois apesar de apresentarem um episódio febril, que indicou a coleta de hemoculturas, tomou-se a conduta de não usar antibiótico pelo fato de estarem bem e afebris quando o resultado da hemocultura de ambos revelou a presença de S. agalactiae, com boa evolução.

A técnica de PCR demonstrou-se útil na caracterização dos sorotipos de S. agalactiae pela excelente especificidade e relativa facilidade de execução em relação à técnica sorológica, cuja limitação é a dificuldade na obtenção dos soros específicos. Trabalhos semelhantes com técnicas padronizadas e reprodutíveis de PCR poderão contribuir para um melhor delineamento do perfil de sorotipos prevalentes nas diferentes regiões brasileiras, assim como mais conhecimentos sobre a importância clínica do EGB e do impacto das medidas atualmente preconizadas para a sua prevenção.

Agradecimentos

Aos funcionários do Laboratório de Microbiologia do Hospital de Clínicas da UNICAMP e aos funcionários do LMHC, em especial à bióloga Eni Dagnon, e ao LGHM da FCM da UNICAMP.

Apoio FAEPEX - FCM-UNICAMP convênio 519.292 - 837/07.

Recebido: 15/07/2011

Aceito com modificações: 28/08/2012

Conflito de interesses: não há.

Trabalho realizado na Faculdade de Ciências Médicas da Universidade Estadual de Campinas - UNICAMP - Campinas (SP), Brasil.

  • 1. Phares CR, Lynfield R, Farley MM, Mohle-Boetani J, Harrison LH, Petit S, et al. Epidemiology of invasive group B streptococcal disease in the United States, 1999-2005. JAMA. 2008;299(17):2056-65.
  • 2. Farley MM. Group B streptococcal disease in nonpregnant adults. Clin Infect Dis. 2001;33(4):556-61.
  • 3. Campbell JR, Hillier SL, Krohn MA, Ferrieri P, Zaleznik DF, Baker CJ. Group B streptococcal colonization and serotype-specific immunity in pregnant women at delivery. Obstet Gynecol. 2000;96(4):498-503.
  • 4. Verani JR, McGee L, Schrag SJ; Division of Bacterial Diseases, National Center for Immunization and Respiratory Diseases, Centers for Disease Control and Prevention (CDC). Prevention of perinatal group B streptococcal disease - revised guidelines from CDC, 2010. MMWR Recomm Rep. 2010;59(RR-10):1-36.
  • 5. Prevention of perinatal group B streptococcal disease: a public health perspective. Centers for Disease Control and Prevention. MMWR Recomm Rep. 1996;45(RR-7):1-24.
  • 6. Schrag S, Gorwitz R, Fultz-Butts K, Schuchat A. Prevention of perinatal group B streptococcal disease. Revised guidelines from CDC. MMWR Recomm Rep. 2002;51(RR-11):1-22.
  • 7. Borger IL, D'Oliveira REC, Castro ACD, Mondinho SSB. [Streptococcus agalactiae in pregnant women: prevalence of colonization and antimicrobial susceptibility evaluation]. Rev Bras Ginecol Obstet. 2005;27(10):575-9. Portuguese.
  • 8. Nomura ML, Passini Júnior R, Oliveira UM. Selective versus non-selective culture medium for group B streptococcus detection in pregnancies complicated by preterm labor or preterm-premature rupture of membranes. Braz J Infect Dis. 2006;10(4):247-50.
  • 9. Winn WC Jr, Alen SD, Janda WW, Koneman EW, Procop GV, Schrenkenberger PC, et al. Koneman's color atlas and textbook of diagnostic microbiology. 6th ed. Philadelphia: Lippincott Williams & Wilkins; 2006. Chapter 13: Gram-Positive Cocci: Part II: Streptococci, Enterococci and the "Streptococcus-Like" Bacteria; p. 683-713.
  • 10. Versalovic J, editor. Manual of clinical microbiology. 10th ed. Washington (DC): ASM; 2011.
  • 11. Tazi A, Réglier-Poupet H, Dautezac F, Raymond J, Poyart C. Comparative evaluation of Strepto B ID chromogenic medium and Granada media for the detection of group B streptococcus from vaginal samples of pregnant women. J Microbiol Methods. 2008;73(3):263-5.
  • 12. Votava M, Tejkalová M, Drábková M, Unzeitig V, Braveny I. Use of GBS media for rapid detection of group B streptococci in vaginal and rectal swabs from women in labor. Eur J Clin Microbiol Infect Dis. 2001;20(2):120-2.
  • 13. Peltroche-Llacsahuanga H, Fiandaca MJ, von Oy S, Lütticken R, Haase G. Rapid detection of Streptococcus agalactiae from swabs by peptide nucleic acid fluorescence in situ hybridization. J Med Microbiol. 2010;59(Pt 2):179-84.
  • 14. Goodrich JS, Miller MB. Comparison of culture and 2 real-time polymerase chain reaction assays to detect group B Streptococcus during antepartum screening. Diagn Microbiol Infect Dis. 2007;59(1):17-22.
  • 15. Block T, Munson E, Culver A, Vaughan K, Hryciuk JE. Comparison of carrot broth - and selective Todd-Hewitt broth-enhanced PCR protocols for real-time detection of Streptococcus agalactiae in prenatal vaginal/anorectal specimens. J Clin Microbiol. 2008;46(11):3615-20.
  • 16. Scicchitano LM, Bourbeau PP. Comparative evaluation of the AccuProbe group B Streptococcus culture test, the BD GeneOhm Strep B assay, and culture for detection of group B streptococci in pregnant women. J Clin Microbiol. 2009;47(9):3021-3.
  • 17. Slotved HC, Kong F, Lambertsen L, Sauer S, Gilbert GL. Serotype IX, a proposed new Streptococcus agalactiae serotype. J Clin Microbiol. 2007;45(9):2929-36.
  • 18. Heath PT, Feldman RG. Vaccination against group B streptococcus. Expert Rev Vaccines. 2005;4(2):207-18.
  • 19. Edwards MS. Group B streptococcal conjugate vaccine: a timely concept for which the time has come. Hum Vaccin. 2008;4(6):444-8.
  • 20. Baker CJ, Paoletti LC, Rench MA, Guttormsen HK, Carey VJ, Hickman ME, et al. Use of capsular polysaccharide-tetanus toxoid conjugate vaccine for type II group B Streptococcus in healthy women. J Infect Dis. 2000;182(4):1129-38.
  • 21. Ausubel FM, Brent R, Kingston RE, Moore DD, Seidman JG, Smith JA, et al. Current protocols in molecular biology. 2nd ed. New York: John Wiley & Sons; 2003.
  • 22. Kong F, Ma L, Gilbert GL. Simultaneous detection and serotype identification of Streptococcus agalactiae using multiplex PCR and reverse line blot hybridization. J Med Microbiol. 2005;54(Pt 12):1133-8.
  • 23. Kong F, Gowan S, Martin D, James G, Gilbert GL. Serotype identification of group B streptococci by PCR and sequencing. J. Clin Microbiol. 2002;40(1):216-26.
  • 24. Federação Brasileira de Ginecologia e Obstetrícia. [Internet]. Rotura prematura das membranas. In: Associação Médica Brasileira. Conselho Federal de Medicina. Projeto diretrizes. São Paulo: AMB; 2008. [citado 2008 Fev 2]. Disponível em: <http://www.projetodiretrizes.org.br/projeto_diretrizes/087.pdf>
  • 25. Schrag SJ, Zywicki S, Farley MM, Reingold AL, Harrison LH, Lefkowitz LB, et al. Group B streptococcal disease in the era of intra-partum antibiotic prophylaxis. N Engl J Med. 2000;342:15-20.
  • 26. Mancini N, Carletti S, Ghidoli N, Cichero P, Burioni R, Clementi M. The era of molecular and other non-culture-based methods in diagnosis of sepsis. Clin Microbiol Rev. 2010;23(1):235-51.
  • 27. Kvam AL, Efstratiou A, Bevanger L, Cookson BD, Marticorena IF, George RC, et al. Distribution of serovariants of group B streptococci in isolates from England and Norway. J Med Microbiol. 1995;42(4):246-50.
  • 28. Shen A, Zhu Y, Zhang G, Yang Y, Jiang Z. Experimental study on distribution of serotypes and antimicrobial patterns of group B streptococcus strains. Chin Med J. 1998;111(7):615-8.
  • 29. Berg S, Torllfors B, Lagergard T, Zackrisson G, Claesson BA. Serotypes and clinical manifestations of group B streptococcal infections in western Sweden. Clin Microbiol Infect. 2000;6(1):9-13.
  • 30. Moyo SR, Mudzori J, Tswana SA, Maeland JA. Prevalence, capsular type distribution, anthropometric and obstetric factors of group B Streptococcus (Streptococcus agalactiae) colonization in pregnancy. Cent Afr Med. 2000;46(5):115-20.
  • 31. Davies HD, Raj S, Adair C, Robinson J, McGeer A; Alberta GBS Study Group. Population-based active surveillance for neonatal group B streptococcal infections in Alberta, Canada: implications for vaccine formulation. Pediatr Infect Dis J. 2001;20(9):879-84.
  • 32. Toresani I, Limansky A, Bogado I, Guardati MC, Viale A, Sutich EG. Phenotypic and genotypic study of Streptococcus agalactiae in vagina of pregnant women in Argentina. Medicina (B Aires). 2001;61(3):295-300.
  • 33. Lopardo HA, Vidal P, Jeric P, Centron D, Paganini H, Facklam RR, et al. Six-month multicenter study on invasive infections due to group B streptococci in Argentina. J Clin Microbiol. 2003;41(10):4688-94.
  • 34. Andrews JI, Diekema DJ, Hunter SK, Rhomberg PR, Pfaller MA, Jones RN, et al. Group B streptococci causing neonatal bloodstream infection: antimicrobial susceptibility and serotyping results from Sentry centers in Western Hemisphere. Am J Obstet Gynecol. 2000;183(4):859-62.
  • 35. Gherardi G, Imperi M, Baldassarri L, Pataracchia M, Alfarone G, Recchia S, et al. Molecular epidemiology and distribution of serotypes, surface proteins, and antibiotic resistance among group B streptococci in Italy. J Clin Microbiol. 2007;45(9):2909-16.
  • 36. Lee K, Shin JW, Chong Y, Mikamo H. Trends in serotypes and antimicrobial susceptibility of group B streptococci isolated in Korea. J Infect Chemother. 2000;6(2):93-7.
  • 37. Lachenauer CS, Kasper DL, Shimada J, Ichiman J, Ohtsuka H, Kaku M, et al. Serotypes VI and VIII predominate among group B streptococci isolated from pregnant Japanese woman. J Infect Dis. 1999;179(4):1030-3.
  • 38. Benchetrit LC, Fracalanzza SE, Peregrino H, Camelo AA, Sanches LA. Carriage of Streptococcus agalactiae in women and neonates and distribution of serological types: a study in Brazil. J Clin Microbiol. 1982;15(5):787-90.
  • 39. Smânia Júnior A, Benchetrit LC, Smânia EFA, Fracalanzza SEL. Isolamento de estreptococos do grupo B, de gestantes e neonatos, em Florianópolis, Santa Catarina. Rev Bras Anal Clin. 1986;18(4):103-8.
  • 40. Amaral E. Group B streptococcus: to screen or not to screen in Brazil? That is the question. Rev Bras Ginecol Obstet. 2005;27(4):165-7.
  • 41. Simoes JA, Alves VM, Fracalanzza SE, de Camargo RP, Mathias L, Milanez HM, et al. Phenotypical characteristics of group B streptococcus in parturients. Braz J Infect Dis. 2007;11(2):261-6.
  • 42. Palmeiro JK, Dalla-Costa LM, Fracalanzza SE, Botelho AC, da Silva Nogueira K, Scheffer MC, et al. Phenotypic and genotypic characterization of group B streptococcal isolates in southern Brazil. J Clin Microbiol. 2010;48(12):4397-403.
  • Endereço para correspondência:
    Carlos Emilio Levy
    Av. Vital Brasil, 251, 2° andar
    Cidade Universitária "Zeferino Vaz" - Barão Geraldo
    CEP: 13083-888 Campinas (SP), Brasil
  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      11 Jan 2013
    • Data do Fascículo
      Dez 2012

    Histórico

    • Recebido
      15 Jul 2011
    • Aceito
      28 Ago 2012
    Federação Brasileira das Sociedades de Ginecologia e Obstetrícia Av. Brigadeiro Luís Antônio, 3421, sala 903 - Jardim Paulista, 01401-001 São Paulo SP - Brasil, Tel. (55 11) 5573-4919 - Rio de Janeiro - RJ - Brazil
    E-mail: editorial.office@febrasgo.org.br