Resumos
O cistoadenoma mucinoso do apêndice ceca l, um tipo de mucocele do apêndice, é uma neoplasia benigna caracterizada pela metaplasia focal ou difusa do epitélio superficial da mucosa, associada à dilatação do apêndice e produção de muco para a luz apendicular. No presente estudo os autores relatam um caso de cistoadenoma mucinoso do apêndice observado em uma mulher de 65 anos de idade, com dor e massa palpável no quadrante inferior direito do abdome, cujo quadro teve início há 1 ano. O diagnóstico de cistoadenoma do apêndice foi suspeitado através da ultrassonografia e tomografia computadorizada do abdome, e confirmado pelo exame histopatológico. A paciente também apresentava cálculos na vesícula biliar e um cisto renal à direita. A laparotomia foi indicada sendo realizada a apendicectomia, a colecistectomia e a exérese do cisto renal. Na presente discussão esperamos contribuir para o diagnóstico precoce dessa doença e a melhor compreensão de sua classificação e patogenia.
Apêndice; Mucocele; Adenoma
Mucinous cystadenoma of the vermiform appendix, a type of mucocele of appendix, is a benign neoplasm characterized by focal or diffuse metaplasia of the superficial epithelium of mucosae, associated with appendix dilation and mucinous secretion into the appendiceal lumen. At present study the authors report a case of mucinous cystadenoma of appendix observed in a 65-yr-old woman with pain and palpated mass in the right lower quadrant of the abdomen started one year ago. Cystadenoma of the appendix was suspected throughout ultrasonography and CT scan of abdomen and confirmed by histology. Pacient also presented gallstones, and a right renal cyst. Laparotomy was indicated, appendicectomy and cholecystectomy performed and, renal cyst removed. At present issue we hope to contribute for early detection of this disease, and better understanding of its classification and pathogenesis.
Appendix; Mucocele; Adenoma
11 - RELATO de CASO
CISTOADENOMA MUCINOSO DO APÊNDICE: RELATO DE CASO1 1 . Trabalho realizado no Hospital de Clínicas de Franco da Rocha, SP, e coordenado pela Disciplina de Cirurgia Geral do Departamento de Cirurgia da Faculdade de Medicina de Jundiaí (FMJ), São Paulo. 2 . Médico Residente do 3o ano de Cirurgia Torácica da Irmandade da Santa Casa de Misericórdia de Porto Alegre, RS. Ex-Residente de Cirurgia Geral da FMJ. 3 . Médico Residente do 3o ano de Cirurgia Plástica do Hospital Oswaldo Cruz, São Paulo. Ex-residente de Cirurgia Geral da FMJ. 4 . Professor Auxiliar de Ensino da Disciplina de Cirurgia Geral do Departamento de Cirurgia da FMJ. 5 . Professor Adjunto da Disciplina de Gastroenterologia Cirúrgica do Departamento de Cirurgia e Ortopedia da Faculdade de Medicina de Botucatu - UNESP.
Cristiano Feijó Andrade2 1 . Trabalho realizado no Hospital de Clínicas de Franco da Rocha, SP, e coordenado pela Disciplina de Cirurgia Geral do Departamento de Cirurgia da Faculdade de Medicina de Jundiaí (FMJ), São Paulo. 2 . Médico Residente do 3o ano de Cirurgia Torácica da Irmandade da Santa Casa de Misericórdia de Porto Alegre, RS. Ex-Residente de Cirurgia Geral da FMJ. 3 . Médico Residente do 3o ano de Cirurgia Plástica do Hospital Oswaldo Cruz, São Paulo. Ex-residente de Cirurgia Geral da FMJ. 4 . Professor Auxiliar de Ensino da Disciplina de Cirurgia Geral do Departamento de Cirurgia da FMJ. 5 . Professor Adjunto da Disciplina de Gastroenterologia Cirúrgica do Departamento de Cirurgia e Ortopedia da Faculdade de Medicina de Botucatu - UNESP.
Paulo Rogério Quieregatto do Espírito Santo3 1 . Trabalho realizado no Hospital de Clínicas de Franco da Rocha, SP, e coordenado pela Disciplina de Cirurgia Geral do Departamento de Cirurgia da Faculdade de Medicina de Jundiaí (FMJ), São Paulo. 2 . Médico Residente do 3o ano de Cirurgia Torácica da Irmandade da Santa Casa de Misericórdia de Porto Alegre, RS. Ex-Residente de Cirurgia Geral da FMJ. 3 . Médico Residente do 3o ano de Cirurgia Plástica do Hospital Oswaldo Cruz, São Paulo. Ex-residente de Cirurgia Geral da FMJ. 4 . Professor Auxiliar de Ensino da Disciplina de Cirurgia Geral do Departamento de Cirurgia da FMJ. 5 . Professor Adjunto da Disciplina de Gastroenterologia Cirúrgica do Departamento de Cirurgia e Ortopedia da Faculdade de Medicina de Botucatu - UNESP.
Mário Pantaroto4 1 . Trabalho realizado no Hospital de Clínicas de Franco da Rocha, SP, e coordenado pela Disciplina de Cirurgia Geral do Departamento de Cirurgia da Faculdade de Medicina de Jundiaí (FMJ), São Paulo. 2 . Médico Residente do 3o ano de Cirurgia Torácica da Irmandade da Santa Casa de Misericórdia de Porto Alegre, RS. Ex-Residente de Cirurgia Geral da FMJ. 3 . Médico Residente do 3o ano de Cirurgia Plástica do Hospital Oswaldo Cruz, São Paulo. Ex-residente de Cirurgia Geral da FMJ. 4 . Professor Auxiliar de Ensino da Disciplina de Cirurgia Geral do Departamento de Cirurgia da FMJ. 5 . Professor Adjunto da Disciplina de Gastroenterologia Cirúrgica do Departamento de Cirurgia e Ortopedia da Faculdade de Medicina de Botucatu - UNESP.
César Tadeu Spadella5 1 . Trabalho realizado no Hospital de Clínicas de Franco da Rocha, SP, e coordenado pela Disciplina de Cirurgia Geral do Departamento de Cirurgia da Faculdade de Medicina de Jundiaí (FMJ), São Paulo. 2 . Médico Residente do 3o ano de Cirurgia Torácica da Irmandade da Santa Casa de Misericórdia de Porto Alegre, RS. Ex-Residente de Cirurgia Geral da FMJ. 3 . Médico Residente do 3o ano de Cirurgia Plástica do Hospital Oswaldo Cruz, São Paulo. Ex-residente de Cirurgia Geral da FMJ. 4 . Professor Auxiliar de Ensino da Disciplina de Cirurgia Geral do Departamento de Cirurgia da FMJ. 5 . Professor Adjunto da Disciplina de Gastroenterologia Cirúrgica do Departamento de Cirurgia e Ortopedia da Faculdade de Medicina de Botucatu - UNESP.
Andrade CF, Santo PRQE, Pantaroto M, Spadella CT. Cistoadenoma mucinoso do apêndice: relato de caso. Acta Cir Bras [serial online] 2001 Out-Dez;16(4). Disponível em: URL: http://www.scielo.br/acb.
RESUMO: O cistoadenoma mucinoso do apêndice ceca l, um tipo de mucocele do apêndice, é uma neoplasia benigna caracterizada pela metaplasia focal ou difusa do epitélio superficial da mucosa, associada à dilatação do apêndice e produção de muco para a luz apendicular. No presente estudo os autores relatam um caso de cistoadenoma mucinoso do apêndice observado em uma mulher de 65 anos de idade, com dor e massa palpável no quadrante inferior direito do abdome, cujo quadro teve início há 1 ano. O diagnóstico de cistoadenoma do apêndice foi suspeitado através da ultrassonografia e tomografia computadorizada do abdome, e confirmado pelo exame histopatológico. A paciente também apresentava cálculos na vesícula biliar e um cisto renal à direita. A laparotomia foi indicada sendo realizada a apendicectomia, a colecistectomia e a exérese do cisto renal. Na presente discussão esperamos contribuir para o diagnóstico precoce dessa doença e a melhor compreensão de sua classificação e patogenia.
DESCRITORES: Apêndice. Mucocele. Adenoma.
INTRODUÇÃO
O cistoadenoma mucinoso do apêndice cecal é um tipo de "mucocele" do apêndice, considerada uma entidade clínica rara observada em 0,07 a 0,3% das apendicectomias realizadas(1,2). Caracteriza-se pela dilatação da luz apendicular, acompanhada do acúmulo de material mucoso no seu interior (2,3).
Embora o termo "mucocele" seja bastante difundido, a designação não abrange as diferentes alterações histológicas que ocorrem no apêndice acometido por essa patologia, que vão desde uma mucosa normal, regenerativa ou hiperplásica, até a transformação focal ou difusa das camadas superficiais da mucosa, assumindo caráter neoplásico benigno, como no cistoadenoma mucinoso, ou por vezes, invadindo as camadas mais profundas da mucosa, originando os cistoadenocarcinomas mucinosos do apêndice (3,4).
Por essas razões, o termo "mucocele" deve ser atribuído, apenas, ao achado macroscópico de um apêndice ectásico e, jamais utilizado para designar um diagnóstico anatomopatológico, necessariamente obtido pelo estudo histopatológico da peça cirúrgica(2,3).
Na prática médica, no entanto, a "mucocele" do apêndice, ainda que, na maioria das vezes, seja um achado incidental em laparotomias, deve ser um diagnóstico sempre lembrado em pacientes com história clínica de dor abdominal e/ou massa palpável no flanco ou fossa ilíaca direita, não raro envolvendo o diagnóstico diferencial de patologias originárias do trato uro-genital, da vesícula biliar, do cólon direito, do íleo terminal e, do próprio apêndice, como demonstrado no presente relato(5).
RELATO DE CASO
Paciente do sexo feminino, 65 anos, branca, que há aproximadamente 1 ano notou o aparecimento de uma massa em flanco direito, com aumento progressivo de tamanho e dor local. Não apresentava queixas urinárias ou alterações do hábito intestinal, tendo relatado emagrecimento de 3 kg nesse período. Ao exame físico apresentava-se em bom estado geral, anictérica, acianótica, PA: 140 x 90 mmHg, FC: 56 bpm, com aparelhos cardiovascular e respiratório sem alterações. O abdome era globoso, flácido, com massa palpável de consistência endurecida, móvel, dolorosa à palpação, com aproximadamente 8 cm de diâmetro, sendo bem delimitada entre o flanco e a fossa ilíaca direitos. Os ruídos hidroaéreos estavam normais, sem visceromegalias. Os exames laboratoriais não mostraram alterações. A ultrassonografia abdominal demonstrou cálculos no interior da vesícula biliar, presença de cisto renal à direita e imagem anecóica, não homogênea, em região anexial direita sugestiva, no laudo inicial, de patologia ovariana. Na tomografia abdominal observou-se cisto renal à direita com aproximadamente 10 cm de diâmetro (Figura 1 ) e imagem hipoatenuante com 8,5 x 4,5 x 4,0 cm, em contato com o ceco, sugestiva de "mucocele" do apêndice (Figura 2). A paciente foi submetida à laparotomia exploradora, com exérese do cisto renal à direita (Figura 3), colecistectomia e apendicectomia (Figura 4).
Os achados do exame anatomopatológico foram compatíveis como os diagnósticos de cistoadenoma mucinoso do apêndice, cisto renal simples e colecistite crônica calculosa.
DISCUSSÃO
Embora existam controvérsias quanto a etiologia e classificação das "mucoceles" do apêndice cecal, atualmente elas são consideradas verdadeiras neoplasias, cujas expressões histopatológicas mais importantes são o cistoadenoma mucinoso e o cistoadenocarcinoma mucinoso do apêndice (1,6,7).
Todavia, quatro entidades clínicas diferentes são classificadas como "mucocele" do apêndice, segundo a sua etiopatogenia; sendo importante a distinção entre elas(2,3,4).
O primeiro tipo trata-se de um quadro originado pela simples obstrução mecânica da luz apendicular, freqüentemente seguida de dilatação, produção de muco e infecção secundária, chamado de cisto de retenção do apêndice, mucocele simples ou ectasia do apêndice. Esta situação é semelhante àquela observada nas mucoceles da vesícula biliar, originadas pela obstrução do ducto cístico. Em ambas situações, no entanto, a mucosa mostra-se normal ou de padrão regenerativo, representado, na maioria das vezes, por tecido de granulação.
A segunda entidade clínica acontece quando a mucosa do apêndice obstruído e ectasiado sofre um processo de hiperplasia das células epiteliais determinando o aparecimento de uma mucosa hiperplásica, indistinguível dos "pólipos hiperplásicos do cólon", também conhecidos como "pólipos metaplásicos".
A mucosa do apêndice pode, ainda, sofrer um processo de transformação focal ou difusa, benigno e restrito ao epitélio superficial da mucosa, originando o cistoadenoma mucinoso do apêndice. Por vezes, no entanto, essa transformação do epitélio pode assumir caráter maligno, invadindo as camadas mais profundas da mucosa originando, assim, o cistoadenocarcinoma mucinoso do apêndice.
Embora a incidência precisa dos cistoadenomas mucinosos do apêndice seja desconhecida, sabe-se que a doença atinge preferentemente indivíduos do sexo feminino, com idade média de 45 anos, sem história familiar da doença. Clinicamente, os cistoadenomas podem ser assintomáticos ou determinar quadro de dor e/ou desconforto em flanco ou fossa ilíaca direitos e, por vezes, se manifestar por constipação, disúria ou massa palpável(4,8), como a apresentada pela paciente deste relato.
Como salientado anteriormente, o diagnóstico de cistoadenoma mucinoso ou de "mucocele" do apêndice impõe o diagnóstico diferencial com várias entidades clínicas localizadas no próprio apêndice, como o tumor carcinóide e a apendicite hiperplástica, ou mesmo no trato uro-genital, cólon direito, íleo terminal e vesícula biliar(3).
Esta dificuldade diagnóstica esteve presente no caso apresentado, onde encontrou-se, associados ao cistoadenoma, os diagnósticos de colecistite crônica calculosa e cisto renal à direita. Apesar dessas observações, não existem relatos na literatura da associação dessas entidades clínicas com o cistoadenoma mucinoso do apêndice, provavelmente muito mais relacionadas, no nosso caso, à elevada freqüência com que indivíduos na faixa etária dos 60 anos apresentam essas patologias (9).
Pelo exposto, é bem provável que na investigação diagnóstica das "mucoceles" do apêndice possam estar incluídos, além do ultrassom e da tomografia computadorizada do abdome, outros exames subsidiários como o enemaopaco e a colonoscopia(3).
O tratamento do cistoadenoma mucinoso do apêndice, bem como das demais "mucoceles" do apêndice é cirúrgico, através da apendicectomia, na grande maioria dos casos, sendo algumas vezes realizada a hemicolectomia direita. A intervenção cirúrgica, na maioria das vezes, é curativa e o prognóstico favorável(6,7,8).
Andrade CF, Santo PRQE, Pantaroto M, Spadella CT. Mucinous cystadenoma of the appendix: case report. Acta Cir Bras [serial online] 2001 Oct-Dec;16(4). Available from: URL: http://www.scielo.br/acb.
ABSTRACT: Mucinous cystadenoma of the vermiform appendix, a type of mucocele of appendix, is a benign neoplasm characterized by focal or diffuse metaplasia of the superficial epithelium of mucosae, associated with appendix dilation and mucinous secretion into the appendiceal lumen. At present study the authors report a case of mucinous cystadenoma of appendix observed in a 65-yr-old woman with pain and palpated mass in the right lower quadrant of the abdomen started one year ago. Cystadenoma of the appendix was suspected throughout ultrasonography and CT scan of abdomen and confirmed by histology. Pacient also presented gallstones, and a right renal cyst. Laparotomy was indicated, appendicectomy and cholecystectomy performed and, renal cyst removed. At present issue we hope to contribute for early detection of this disease, and better understanding of its classification and pathogenesis.
KEY WORDS: Appendix. Mucocele. Adenoma.
Conflito de interesses: nenhum
Fontes de financiamento: nenhuma
Endereço para correspondência:
César Tadeu Spadella
Departamento de Cirurgia e Ortopedia
Faculdade de Medicina de Botucatu UNESP
Botucatu - São Paulo
18618-970
Data do recebimento: 23/03/2001
Data da revisão: 02/04/2001
Data da aprovação: 15/05/2001
- 1. Qizilbash AH. Mucoceles of appendix. Arch Pathol 1975;99:548-55.
- 2. Resende MS, Oliveira EJM, Araújo JJ, Barros DE, Mendes MBP, Carvalho FA, Lassance PMS. Cistoadenoma mucinoso de apęndice: relato de um caso. Rev Bras Colo-Proct 1990;10(1):20-3.
- 3. Wolff M, Ahmed N. Epithelial neoplasmas of the vermiform appendix (exclusive of carcinoid). Cancer 1976;37:2511-22.
- 4. Higa E, Rosal J, Pizzimbono Ca, Wise L. Mucosal hyperplasia, mucinous cystadenoma, and mucinous cystoadenocarcinoma of the appendix: a re-evaluation of appendiceal "mucocele". Cancer 1973;32:1525-41.
- 5. Campbell TE. Mucinous neoplasms of appendix appearing as hernias. Arch Pathol Lab Med 1981;105:57-8.
- 6. Aho AJ, Heinonen R, Laurén P. Benign and malignant mucocele of appendix: histological types and prognosis. Acta Chir Scand 1973;139:392-400.
- 7. Gibbs NM. Mucinous cystoadenoma and cystadenocarcinoma of the vermiform appendix with particular reference to mucocele and pseudomyxoma peritonei. J Clin Pathol 1973;26:413-21.
- 8. Jalak MT, Curbelo MO, Montilla RP, Rodriguez LF, Toledo ET, Rodriguez BS; Mucocele apendicular. Rev Cubana Cir 1987;26(3):383-92.
- 9. Elkin M. Renal cystic disease: an overview. Semin Roentgenol 1975;10:99-104.
Datas de Publicação
-
Publicação nesta coleção
11 Set 2003 -
Data do Fascículo
Dez 2001
Histórico
-
Aceito
15 Maio 2001 -
Revisado
02 Abr 2001 -
Recebido
23 Mar 2001