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Escala de Autoeficácia para dirigir: construção e avaliação preliminar das propriedades psicométricas

Driving Self-efficacy Scale: Construction and preliminary evaluation of psychometric properties

Resumo

Este trabalho relata a construção da Escala de Autoeficácia para dirigir e a verificação preliminar de suas propriedades psicométricas. Na primeira etapa, procedeu-se com o levantamento sobre o tema culminando na elaboração de 20 itens, os quais foram ampliados após avaliação de juízes. A etapa seguinte consistiu no estudo piloto com a aplicação dos 25 itens resultantes em 40 motoristas. Os resultados indicaram a necessidade de algumas adequações e a construção de mais dez itens. Na última etapa, o instrumento foi aplicado em 500 motoristas em processo de renovação da Carteira Nacional de Habilitação, com idades entre 23 e 78 anos, sendo 60,40% deles do sexo masculino. Após a análise fatorial, a escala foi reduzida para 15 itens alocados em um único fator, com variância explicada de 41,75% e fidedignidade adequada (α = 0,91). Sugere-se que sejam realizados novos estudos com a escala a fim de ampliar as evidências de validade.

Palavras-chave:
Autoeficácia; Psicologia do trânsito; Testes psicológicos.

Abstract

This paper reports the construction of the Driving Self-efficacy Scale and the preliminary evaluation of its psychometric properties. Initially, the topic was thoroughly investigated and 20 items were created; the number of items was increased after evaluation of judges. The next step consisted of carrying out a pilot study applying the 25-item scale to 40 drivers. The results indicated the need for some adjustments and the creation of ten more items. In the last step, the instrument was applied to 500 drivers, aged 23-78 years, 60.40% male, who were getting their driving license renewed. Factor analysis was conducted, and the scale was then reduced to 15 items allocated to a single factor; with 41.75% of variance explained and good reliability (α = 0.91). Further studies are necessary to confirm the validity of the scale.

Keywords:
Self-efficacy; Traffic psychology; Psychological tests.

A autoeficácia é definida como as crenças das pessoas em suas capacidades para reunir recursos cognitivos, motivacionais, afetivos e comportamentais, organizá-los e executar cursos de ação requeridos para alcançar determinados tipos de desempenho, lidar com uma situação ou desempenhar uma tarefa (Bandura, 1977Bandura, A. (1977). Social learning theory. New Jersey: Prentice-Hall., 2006aBandura, A. (2006a). Toward a psychology of human agency. Association for Psychological Science1(2), 164-180.). Essas crenças produzem efeitos diversos por meio de quatro processos principais, a saber, cognitivos, motivacionais, afetivos e de seleção, os quais influenciam a forma como as pessoas sentem, pensam, motivam-se e comportam-se (Bandura, 1994Bandura, A. (1994). Self-efficacy. In V. S. Ramachaudran (Ed.), Encyclopedia of human behavior (pp.71-81). New York: Academic Press. Retrieved August 21, 2012, from Retrieved August 21, 2012, from http://www.des.emory.edu/mfp/Ban Ency.html
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). Para o autor, indivíduos com autoeficácia elevada tendem a estabelecer objetivos mais complexos e desafiadores, a explorar mais o seu ambiente e a persistir na tarefa diante de obstáculos.

Segundo Bandura (1977Bandura, A. (1977). Social learning theory. New Jersey: Prentice-Hall., 1994Bandura, A. (1994). Self-efficacy. In V. S. Ramachaudran (Ed.), Encyclopedia of human behavior (pp.71-81). New York: Academic Press. Retrieved August 21, 2012, from Retrieved August 21, 2012, from http://www.des.emory.edu/mfp/Ban Ency.html
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, 1997Bandura, A. (1977). Social learning theory. New Jersey: Prentice-Hall.), essas crenças são desenvolvidas por meio de quatro fontes de informações. A primeira delas diz respeito às experiências pessoais na realização das atividades, visto que, com base nos resultados alcançados, as pessoas adquirem crenças sobre a própria capacidade para realizá-las. A segunda é referente às experiências vicárias que resultam da observação do sucesso em determinadas tarefas, obtido, principalmente, por pessoas semelhantes, o que conduz à crença de que o observador também possui as capacidades necessárias para ser bem sucedido. A terceira fonte envolve a persuasão verbal/social de julgamentos feitos por outras pessoas, que fornecem sugestões sobre como lidar adequadamente com uma dada situação. Por fim, a última fonte é advinda de estados psicofisiológicos e afetivos, tais como ansiedade, estresse, excitação e estados de humor, os quais proporcionam informações que impactam positiva ou negativamente sobre as crenças de autoeficácia.

Pajares e Olaz (2008Pajares, F., & Olaz, F. (2008). Teoria social cogntiva e autoeficácia: uma visão geral. In A. Bandura, R. A. Azzi, & S. A. J. Polydoro (Eds.), Teoria social cognitiva: conceitos básicos (pp.97-114). Porto Alegre: Artmed.) salientam que um dos aspectos os quais afetam preponderantemente a decisão sobre a melhor forma de se enfrentar uma dada tarefa é a confiança na capacidade para executá-la. Os autores consideram que esses julgamentos são embasados na interpretação dos resultados de acontecimentos similares ocorridos anteriormente. Assim, dependem da seleção, integração, recordações dos fatos e dos sentimentos neles envolvidos, além da recordação das regras empregadas em cada julgamento e das respectivas estratégias no enfretamento das situações vivenciadas.

As crenças de autoeficácia têm sido estudadas em vários domínios do comportamento tais como saúde, esporte, no âmbito acadêmico e nas organizações (Bandura, 1997Bandura, A. (1997). Self-efficacy: The exercise of control. New York: W. H. Freman and Company.), o que tem garantido reconhecida importância no campo da investigação psicológica (Polydoro, Azzi, & Vieira, 2010Polydoro, S. A. J., Azzi, R. G., & Vieira, D. (2010). Orientações de construção e aplicações de escalas na avaliação de crenças de autoeficácia. In A. A. A. Santos, F. F. Sisto, E. Boruchovitch, & E. Nascimento (Eds.), Perspectivas em avaliação psicológica (pp.189-210). São Paulo: Casa do Psicólogo.). Entretanto, poucos trabalhos têm sido realizados sobre essa temática no campo da condução veicular (Delhome & Meyer, 2004Delhome, P., & Meyer, T. (2004). Risk taking and selfefficacy among young male drivers: Self-efficacy and changing task demands. In T. Rothengatter & R. D. Huguenir (Eds.), Traffic & Transport Psychology (pp.135-146)Amsterdam: Elsevier.). Para os autores, a autoeficácia abre uma nova perspectiva de investigação, sendo importante ampliar o conhecimento sobre como ela se relaciona com o processo de aprendizagem, ajudando os futuros motoristas a mobilizar e sustentar os esforços no cumprimento das tarefas de direção. Eles se preocupam também em esclarecer se as crenças de autoeficácia podem provocar uma avaliação irrealista na condução dos motoristas experientes.

É tido como pressuposto que essas crenças podem contribuir para que o motorista sinta-se capaz de conduzir o seu veículo com segurança, podendo chegar a níveis tão altos de modo a inflar a sua autoconfiança na direção. Com objetivo de compreender como as crenças de autoeficácia podem contribuir para o desempenho no ato de dirigir, Delhome e Meyer (2004Delhome, P., & Meyer, T. (2004). Risk taking and selfefficacy among young male drivers: Self-efficacy and changing task demands. In T. Rothengatter & R. D. Huguenir (Eds.), Traffic & Transport Psychology (pp.135-146)Amsterdam: Elsevier.) realizaram uma pesquisa com 80 jovens, com média de idade de 21 anos e de dois anos de habilitação. Os resultados indicaram que os motoristas com baixa autoeficácia para dirigir cometeram mais erros no trânsito; por outro lado, os que tinham pouca experiência e crenças consideradas muito altas também cometeram mais erros.

Para Delhome e Meyer (2004Delhome, P., & Meyer, T. (2004). Risk taking and selfefficacy among young male drivers: Self-efficacy and changing task demands. In T. Rothengatter & R. D. Huguenir (Eds.), Traffic & Transport Psychology (pp.135-146)Amsterdam: Elsevier.), é comum verificar que muitos condutores acreditam que conseguem alcançar um alto nível de desempenho, sem apresentarem capacidade real para executar a tarefa. No estudo de Taubman-Ben-Ari, Mikulincer e Iram (2004Taubman-Ben-Ari, O., Mikulincer, M., & Iram, A. (2004). A multi-factorial framework for understanding reckless driving appraisal indicators and perceived environmental determinants. Transportation Research Part F: Traffic Psychology and Behavior 7(6), 333-349.) foi avaliada a autoeficácia para condução imprudente em 294 jovens, com idade entre 18 e 21 anos. Os resultados indicaram que a autoeficácia no motorista, quando acrescida de influências ambientais negativas (e.g., atos imprudentes cometidos por familiares e amigos no trânsito), mostrou-se relacionada à maior frequência de condução arriscada, bem como previu fortemente a direção perigosa nos homens.

Sundströn (2008aSundströn, A. (2008a). Construct validation and psychometric evaluation of the self-efficacy scale for driver competence. European Journal of Psychological Assessment, 24(3), 198-206.) alerta para o fato de que é comum a identificação de condutores que acreditam dirigir melhor e serem mais hábeis do que os outros, ou ainda, que creem ser mais competentes na direção do que realmente são. O problema dos motoristas acreditarem fortemente na sua capacidade para dirigir é que podem subestimar os riscos envolvidos, por exemplo, dirigindo mais rápido e reduzindo a margem de segurança. Podem, também, acreditar que conseguem controlar qualquer situação, o que aumenta a exposição a riscos na direção (Morriset, Terrade, & Somat, 2010Morisset, N., Terrade, F., & Somat, A. (2010). Perceived self-efficacy and risk driving behaviors. Swiss Journal of Psychology69(4), 233-238.).

Segundo McLernon (2013McLernon, M. Y. (2013). Risk propensity, self-efficacy, and driving behaviours among off-duty emergency (Doctoral dissertation unpublished). Southern Illinois University Carbondale, Illinois. Retrieved February 9, 2014, from Retrieved February 9, 2014, from http://opensiuc.lib.siu.edu/dissertations/ 837/
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), as crenças de autoeficácia contribuem para que o motorista perceba que consegue realizar com sucesso as tarefas na direção. No entanto, quando essa crença se associa à tendência do condutor para assumir riscos, especialmente quando não há a ocorrência de consequências negativas diante de imprudências no trânsito, pode ser criado um efeito cíclico em que essas características acabam sendo reforçadas. Com isso, o enfrentamento bem sucedido dos desafios encontrados no trânsito fortalece ainda mais o sentido de autoeficácia tanto para tarefas cotidianas, quanto para as arriscadas e estressantes, podendo, nesse caso, ocasionar um sentimento de invencibilidade na direção (Hubble, Zontek, & Richards, 2011Hubble, M. W., Zontek, T. L., & Richards, M. E. (2011). Predictors of influenza vaccination among emergency medical services personnel. Prehospital Emergency Care15(2), 175-183.).

No estudo de Horsthuis (2011Horsthuis, S. M. G. M. (2011). De bijdrage van demografische en psychologische determinanten aan riskant rijgedrag door jonge en oudere automobilisten (Doctoral dissertation unpublished). University of Twente Student Theses, Netherlands. Retrieved May 23, 2013, from Retrieved May 23, 2013, from http//www.essay.utwente.nl/61050
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) o objetivo foi demonstrar que os fatores psicológicos, dentre eles a autoeficácia para dirigir, podem explicar o comportamento de condução arriscada. Participaram 160 motoristas holandeses, com idade entre 18 e 50 anos e foi utilizado o Drive Behaviour Questionnaire (DBQ), cujos fatores são: violações, erros perigosos, atenção inadequada e lapsos. Os resultados indicaram que a autoeficácia para dirigir apareceu como melhor preditora para os comportamentos de risco na condução quando comparada à idade e ao sexo do participante. Além disso, também foi melhor preditora para os fatores atenção inadequada e lapsos no DBQ.

Já os motoristas inexperientes foram o foco do estudo de Šeibokaitë, Endriulaitienë, Markðaitytë, Þardeckaitë-Matulaitienë e Pranckevièienë (2013Šeibokaitë, L., Endriulaitienë, A., Markðaitytë, R., Þardeckaitë-Matulaitienë, K., & Pranckevièienë, A. (2013). The relationship between self-reported risky driving and personality traits in different samples of drivers. Psichologija48, 20-38.) que avaliaram 78 futuros condutores da Lituânia com média de idade de 19 anos. O objetivo foi examinar a congruência entre as avaliações sobre as habilidades de condução de alunos candidatos à obtenção de carteira de motorista e os respectivos instrutores de autoescola. A avaliação foi realizada imediatamente após a conclusão do treinamento prático, usando o Adelaide Driving Self-efficacy Scale (ADSES), o DBQ e um questionário que envolvia questões sobre a probabilidade de dirigir de forma arriscada, sendo que este último era respondido tanto pelos alunos como pelos instrutores. Os resultados indicaram que os alunos com maior percepção de autoeficácia para dirigir foram justamente os indicados pelos instrutores como aqueles com potencial para conduzir de forma arriscada. Além do mais, a autoeficácia para dirigir se correlacionou, de forma positiva e fraca, com a probabilidade para assumir riscos no trânsito e violar as regras. Por outro lado, a baixa autoeficácia para a tarefa apareceu como preditora de maiores escores no fator erros perigosos do DBQ.

A literatura recuperada sobre autoeficácia para dirigir é ainda escassa, mas os resultados dos trabalhos empíricos mostram que é um construto importante para a formação dos motoristas, visto que baixas crenças apareceram associadas com erros na direção (Delhome & Meyer, 2004Delhome, P., & Meyer, T. (2004). Risk taking and selfefficacy among young male drivers: Self-efficacy and changing task demands. In T. Rothengatter & R. D. Huguenir (Eds.), Traffic & Transport Psychology (pp.135-146)Amsterdam: Elsevier.; Šeibokaitë et al., 2013Šeibokaitë, L., Endriulaitienë, A., Markðaitytë, R., Þardeckaitë-Matulaitienë, K., & Pranckevièienë, A. (2013). The relationship between self-reported risky driving and personality traits in different samples of drivers. Psichologija48, 20-38.), enquanto as elevadas com comportamentos de risco (Delhome & Meyer, 2004Delhome, P., & Meyer, T. (2004). Risk taking and selfefficacy among young male drivers: Self-efficacy and changing task demands. In T. Rothengatter & R. D. Huguenir (Eds.), Traffic & Transport Psychology (pp.135-146)Amsterdam: Elsevier.; Horsthuis, 2011Horsthuis, S. M. G. M. (2011). De bijdrage van demografische en psychologische determinanten aan riskant rijgedrag door jonge en oudere automobilisten (Doctoral dissertation unpublished). University of Twente Student Theses, Netherlands. Retrieved May 23, 2013, from Retrieved May 23, 2013, from http//www.essay.utwente.nl/61050
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; Šeibokaitë et al., 2013Šeibokaitë, L., Endriulaitienë, A., Markðaitytë, R., Þardeckaitë-Matulaitienë, K., & Pranckevièienë, A. (2013). The relationship between self-reported risky driving and personality traits in different samples of drivers. Psichologija48, 20-38.; Taubman-Ben-Ari, et al., 2004Taubman-Ben-Ari, O., Mikulincer, M., & Iram, A. (2004). A multi-factorial framework for understanding reckless driving appraisal indicators and perceived environmental determinants. Transportation Research Part F: Traffic Psychology and Behavior 7(6), 333-349.). No entanto, ainda faltam discussões aprofundadas sobre como ela também pode favorecer esses dois polos.

Outra questão a ser ponderada acerca dos estudos relatados é de que apenas em um deles a avaliação da autoeficácia foi realizada por meio de instrumentos psicométricos. Nas demais pesquisas, foram utilizadas de uma a duas questões para avaliar a crença do motorista sobre a sua capacidade para dirigir, o que fragiliza a comparação entre os resultados. Com isso, faz-se necessária à construção de instrumentos de medida com parâmetros psicométricos satisfatórios (Sundströn, 2008aSundströn, A. (2008a). Construct validation and psychometric evaluation of the self-efficacy scale for driver competence. European Journal of Psychological Assessment, 24(3), 198-206.), os quais poderão contribuir para a explicação dos fatores envolvidos nos comportamentos dos motoristas e, também, facilitar a comparação dos resultados encontrados em diferentes pesquisas.

Considerando a pertinência dessa observação, no presente trabalho foram realizadas consultas em 2012, 2013 e no segundo semestre de 2014 nas bases de dados científicas (SciELO, PEPsic, Redalyc e Capes Periódicos), no banco de teses e dissertações da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (Capes) e no Google Acadêmico com o descritor 'self-efficacy to drive'. Ressalta-se que não foram encontrados instrumentos brasileiros construídos com esse propósito, e no exterior foram identificados apenas três finalizados e um em andamento.

A primeira medida encontrada foi a Adelaide Driving Self-efficacy Scale (ADSES) desenvolvida na Austrália por George, Clark e Crotty (2007George, S., Clark, M., & Crotty, M. (2007). Development of the Adelaide Driving Self-efficacy Scale. Clinical Rehabilitation21(1), 56-61.). Ela possui 12 itens, distribuídos em uma escala Likert, com opções de 0 (nada confiante) a 10 (totalmente confiante). O instrumento foi aplicado em 160 participantes e o coeficiente alfa de Cronbach encontrado para a escala geral foi de 0,98. Na Suécia, Sundströn (2008aSundströn, A. (2008a). Construct validation and psychometric evaluation of the self-efficacy scale for driver competence. European Journal of Psychological Assessment, 24(3), 198-206.) elaborou a Self-Efficacy Scale for Driver Competence (SSDC), tendo sido os itens construídos com base na teoria de autoeficácia e no modelo conceitual de educação na direção, que envolve conhecimento do veículo, de regras e segurança no trânsito. A autora propôs duas escalas (A e B) e cada versão incluía 28 itens, sendo 17 comuns para ambas as versões e 11 únicos, distribuídos em escalas Likert com pontuação variando de 0 (nada confiante) a 100 (totalmente confiante). Elas foram aplicadas em 1.526 participantes e a análise fatorial exploratória indicou dois fatores com melhor variância explicada, os quais se correlacionaram fortemente (r = 0,78) e com consistência interna elevada para ambas (α = 0,97).

O Self-efficacy Driver Questionnaire (Taubman-Ben-Ari, 2008Taubman-Ben-Ari, O. (2008). Motivational sources of driving and their associations to reckless driving cognitions and behavior. European Review of Applied Psychology, 58(1), 51-64.) foi desenvolvido em Israel, sendo constituído por 17 itens que descrevem uma variedade de situações na condução (e.g., quando se está cansado, em um carro novo, com mau tempo, à noite, etc.), distribuídos em uma escala com pontuações também do tipo Likert de sete pontos, variando de 1 (nada) a 7 (muito). Participaram do estudo 290 motoristas, com idades entre 18 e 25 anos e com pelo menos um ano de habilitação. A avaliação da consistência interna geral do questionário foi elevada (α = 0,94). Na Austrália, está em desenvolvimento, a partir da tese de doutorado de McLernon (2013McLernon, M. Y. (2013). Risk propensity, self-efficacy, and driving behaviours among off-duty emergency (Doctoral dissertation unpublished). Southern Illinois University Carbondale, Illinois. Retrieved February 9, 2014, from Retrieved February 9, 2014, from http://opensiuc.lib.siu.edu/dissertations/ 837/
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), a Risky Driving Self-Efficacy Scale que terá como objetivo avaliar a autoeficácia percebida com relação a comportamentos de condução de risco em motoristas de ambulâncias. O instrumento possui 10 itens e pontuações do tipo Likert com seis opções de resposta, variando de "nunca é verdade" a "totalmente verdade". Os dados encontrados são iniciais e não foram, ainda, divulgadas informações sobre as evidências de validade do instrumento.

Com base no exposto, verifica-se que a avaliação da autoeficácia para dirigir é viável e promissora e que seus resultados poderão ser somados ao de outras variáveis que podem influenciar os comportamentos dos motoristas no contexto do trânsito. Assim, a potencial contribuição dessa medida e a inexistência de um instrumento similar no Brasil impulsionaram o objetivo do presente estudo de construir uma escala de autoeficácia para dirigir e analisar as suas propriedades psicométricas por meio da análise fatorial exploratória e da análise de sua consistência interna.

Método

Participantes

Para este estudo de busca de evidências de validade, realizou-se uma pesquisa com 500 motoristas em processo de renovação da Carteira Nacional de Habilitação em duas clínicas credenciadas ao Departamento de Trânsito do Paraná (Detran/PR) da cidade de Curitiba. Os critérios de inclusão dos participantes eram ser candidato de renovação nas clínicas onde foi realizada a pesquisa e ter obtido resultado de 'apto' na avaliação de aptidão física e mental. As idades variaram entre 23 e 78 anos (Média - M = 40,61; Desvio-Padrão DP = 12,88), sendo que 60,4% (n = 302) eram de sexo masculino. Quanto à escolaridade, 88,2% (n = 441) apresentaram escolaridade mínima de ensino médio até pós-graduação. A escolha se deu por conveniência.

Instrumentos

A escala em estudo é um instrumento de autorrelato que objetiva identificar a autoeficácia para dirigir com segurança em motoristas. Inicialmente, foram construídos 20 itens para a Escala de Autoeficácia para Dirigir (EADir), com base no conceito da Teoria Social Cognitiva e também nas duas escalas encontradas em estudos no exterior: ADSES, (George et al., 2007George, S., Clark, M., & Crotty, M. (2007). Development of the Adelaide Driving Self-efficacy Scale. Clinical Rehabilitation21(1), 56-61.) e SSDC (Sundströn, 2008aSundströn, A. (2008a). Construct validation and psychometric evaluation of the self-efficacy scale for driver competence. European Journal of Psychological Assessment, 24(3), 198-206.).

O passo seguinte envolveu uma análise de juízes, com objetivo de verificar se os itens estavam adequados à definição de autoeficácia proposta por Bandura.Participaram da análise de conteúdo da EADir três juízes doutores com experiência em avaliação psicológica e conhecimento do construto e quatro doutorandos que têm trabalhado em suas pesquisas com a temática. Várias sugestões dos juízes foram incorporadas à escala desde a instrução inicial, reformulação de alguns itens e até a elaboração de outros. Os novos cinco itens desenvolvidos foram "transitar em pista molhada", "dirigir em trechos de terra", "entender a sinalização de trânsito", "dirigir com o rádio ligado" e "usar mapas/Global Positioning System (GPS)".

Os 25 itens foram aplicados em um estudo piloto com objetivo de verificar possíveis dúvidas sobre a escala e, também, para desenvolver outros itens a fim de aumentar sua amplitude sobre o ato de dirigir. Participaram 40 motoristas em processo de renovação da CNH com idades entre 23 e 70 anos (M = 41,13; DP = 12,50), sendo 55% (n = 22) homens, 87,5% (n = 35) com escolaridade mínima de ensino médio até ensino superior e o tempo que os motoristas possuíam de habilitação variou de 5 a 46 anos (M = 16,78; DP = 11,96). Foram realizadas alterações simples referentes à grafia. Contudo, em nenhum dos itens houve dúvidas sobre a estrutura como um todo e não foi necessária a exclusão de nenhum deles. Pelo contrário, durante essa etapa foram acrescentados mais 10 itens, com base nas sugestões dos participantes, os quais foram estimulados pela pesquisadora. Assim, "dirigir no trânsito de uma grande metrópole", "dirigir com neblina", "conduzir com passageiros", entre outros, foram incluídos na escala.

Dessa forma chegou-se à versão final da escala a qual apresentou o seguinte enunciado: "abaixo você encontrará frases que descrevem situações que podem ocorrer no trânsito diariamente. Você deverá ler atentamente cada uma e marcar o quanto acredita que é atualmente capaz de fazer o que está descrito. Para responder, considere as pontuações entre 1 e 10". Os itens foram organizados em uma escala Likert com 10 opções de respostas, variando de 1 (nada confiante) a 10 (totalmente confiante). Optou-se iniciar pelo valor mínimo de 1 e não zero com base na pressuposição de que os motoristas teriam um sentimento mínimo de eficácia, já que conseguiram obter a CNH e a estavam renovando, enquanto que a opção de ir até 10 segue as orientações de Bandura (2006bBandura, A. (2006b). Guide for constructing self-efficacy scales. In F. Pajares & T. Urdan (Eds.), Self-efficacy beliefs of adolescents (pp.307-337). Greenwich: Information Age.) para a construção de escalas de autoeficácia. O autor orienta que as respostas devem ter números organizados em intervalos de dez pontos, com término em 100, ou em estrutura simplificada até 10. Após todos esses ajustes a escala foi aplicada em uma amostra maior de participantes, visando-se o estudo de suas propriedades psicométricas.

Procedimentos

Mediante a autorização do Detran/PR e das proprietárias das clínicas, bem como da aprovação do Comitê de Ética em Pesquisa com Seres Humanos da Universidade São Francisco (Parecer n° 07513612.7.0000.5514), iniciou-se a coleta dos dados. Todos os candidatos à renovação que tiveram resultado de 'apto' na avaliação de aptidão física e mental eram encaminhados a uma sala e, individualmente, a pesquisadora apresentava os objetivos da pesquisa, explicava que a participação era voluntária e que os dados seriam mantidos em sigilo. Além disso, era enfatizado aos participantes que as respostas ao instrumento não tinha nenhuma relação com o resultado da renovação da CNH e que eles já haviam sido considerados 'aptos' no exame médico. Os condutores que aceitaram participar da pesquisa assinaram o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido e foram orientados sobre a forma de responder ao instrumento. O tempo aproximado de cada aplicação foi de 7 a 10 minutos.

As propriedades psicométricas da escala foram analisadas com base na Teoria Clássica de Testes, sendo utilizado o software SPSS (Statistical Package for the Social Sciences, versão 18) para realizar a Análise Fatorial Exploratória (AFE). O coeficiente de consistência interna ao qual se recorreu para atestar a fidedignidade da escala foi o alfa de Cronbach. Já para a Análise Paralela utilizou-se o programa Factor (versão 9.2).

Resultados

Inicialmente foi analisado o tamanho da amostra para realização da análise fatorial. Levando-se em conta o critério de número de sujeitos (14 observações por item), o tamanho da amostra foi considerado adequado (Tabachnick & Fidell, 2001Tabachnick, B., & Fidell, L. S. (2001). Using multivariate statistics. San Francisco: Allyn & Bacon.). Adicionalmente, foram realizadas análises sobre os casos omissos e as respostas extremas, os quais poderiam prejudicar a confiabilidade dos dados. Constatou-se a inexistência de valores omissos e, pela inspeção dos extremos, verificou-se a existência de muitos deles em 13 itens, que afetavam sensivelmente os índices de assimetria (os quais variaram de -5,77 a 0,08) e de curtose (variação de -1,50 a 31,53), indicando que os dados não são normais. Em consequência, a linearidade avaliada também ficou prejudicada. No entanto, a matriz de correlação indicou relações estatisticamente significativas acima de 57% entre os itens com valor superior a 0,30, fato que encorajou a realização das análises com os dados originais.

Para a análise fatorial, foram seguidas as orientações de Damásio (2012Damásio, B. F. (2012). Uso da análise fatorial exploratória na Psicologia. Avaliação Psicológica11(2), 213-228.) na utilização de dois métodos de avaliação, o critério de Kaiser-Meyer-Olkin (KMO) e o Teste de Esfericidade de Bartlett. Os resultados identificaram que o KMO foi de 0,94 e do Bartlett (χ² = 8535,620; p < 0,001), indicando que a fatoração era adequada. Logo, dada a falta de normalidade nos dados, os 35 itens do instrumento foram submetidos a uma análise fatorial dos eixos principais com o emprego da rotação oblíqua (direct oblimin), uma vez que há o pressuposto de os fatores serem correlacionados (Damásio, 2012). Foram analisados os resultados obtidos de comunalidade onde, segundo Figueiredo Filho e Silva Júnior (2010Figueiredo Filho, D. B., & Silva Júnior, J. A. (2010). Visão além do alcance: uma introdução à análise fatorial. Opinião pública16(1), 160-185.), o valor mínimo aceitável usualmente é de 0,50. Assim, foram excluídos três itens próximos de 0,40. Para a decisão sobre o número de fatores, foram contrastados os resultados de dois testes scree plot e análise paralela, tendo como referência eigenvalues superiores a um.

Na Análise Fatorial Exploratória foram retidos sete componentes e o total da variância explicada foi de 60,19%. No entanto, o gráfico de sedimentação (scree plot) sugeriu um grande fator. A fim de confirmar a existência do número de fatores relevantes na escala, foi utilizada a análise paralela como critério, mediante simulação de matrizes de correlação randômicas, considerando eigenvalue correspondente ao percentil 95 pelo método de extração Unweighted Least Squares (ULS). Segundo Damásio (2012Damásio, B. F. (2012). Uso da análise fatorial exploratória na Psicologia. Avaliação Psicológica11(2), 213-228.), a análise paralela propõe que os dados empíricos devem explicar mais da variância que uma matriz de dados gerada aleatoriamente. Os resultados encontrados no presente estudo confirmaram a presença de três fatores com essa característica, conforme é mostrado na Figura 1.

Figura 1
Gráfico de sedimentação dos fatores da Escala de Autoeficácia para Dirigir.

Diante dos resultados do scree plot e da análise paralela sobre o número de fatores a ser extraído, decidiu-se submeter novamente os dados à análise fatorial dos eixos principais com critério de extração de três fatores e carga fatorial > 0,40. Os resultados indicaram que a variância explicada pelos três fatores foi de 47,05%, além da necessidade de exclusão de doze itens por terem cargas cruzadas ou por não carregarem em nenhum fator, resultando em uma versão com 19 itens. Foram verificadas as correlações entre os fatores 1 e 2 (r = 0,449), 1 e 3 (r = 0,472) e 2 e 3 (r = 0,324). Os resultados indicaram que, possivelmente, eles avaliam os mesmos conteúdos, o que torna a manutenção de um deles desnecessária, já que ultrapassam correlações de 0,30 (Hair, Black, Babin, Anderson, & Tatham, 2009Hair, J. F., Black, W. C., Babin, B. J., Anderson, R. E., & Tatham, R. L. (2009). Análise multivariada de dados (6ª ed.). Porto Alegre: Bookman.).

Posteriormente, testou-se a AFE com dois fatores que indicaram a exclusão de seis itens, no entanto, os dados continuaram interpretáveis e a correlação entre os fatores aumentou (r = 0,513). Diante disso, e da possibilidade teórica da EADir ser unifatorial, optou-se por um único fator. Para chegar ao número final de itens do instrumento, foi rodada novamente a AFE com os mesmos critérios já citados e verificada a variação nos valores de confiabilidade, avaliada pelo alfa de Cronbach, quando cada item fosse retirado da escala, chegando-se ao número de 15 itens. As cargas fatoriais do modelo final da EADir são apresentadas na Tabela 1.

Tabela 1
Cargas fatoriais dos Itens da Escala de Autoeficácia para dirigir (EADir). Curitiba (PR), 2012

As informações da mesma tabela referentes à versão final da EADir indicam que os itens apresentaram cargas fatoriais adequadas variando de 0,41 a 0,73 e com valores de comunalidade acima de 0,50. A variância explicada pelo único fator foi de 41,75% e, no que diz respeito ao índice de confiabilidade, o resultado encontrado foi 0,91 para o alfa de Cronbach, podendo, assim, ser considerado bom (Urbina, 2007Urbina, S. (2007). Fundamentos da testagem psicológica (pp.155-212). São Paulo: Artmed.).

Discussão

O presente estudo teve por objetivo apresentar a construção da Escala de Autoeficácia para dirigir (EADir) desenvolvida com base em outros instrumentos existentes no exterior e nas orientações de Bandura (1997Bandura, A. (1997). Self-efficacy: The exercise of control. New York: W. H. Freman and Company., 2006bBandura, A. (2006b). Guide for constructing self-efficacy scales. In F. Pajares & T. Urdan (Eds.), Self-efficacy beliefs of adolescents (pp.307-337). Greenwich: Information Age.). Partiu-se do pressuposto de que as crenças dos motoristas sobre a sua capacidade para dirigir com segurança podem ajudar a compreender comportamentos no trânsito tanto em condutores iniciantes como nos experientes. Visto que, as pessoas que acreditam ser capazes de realizar alguma tarefa mostram-se mais motivadas e se empenham mais na sua realização (Bandura, 1997Bandura, A. (1997). Self-efficacy: The exercise of control. New York: W. H. Freman and Company.), enquanto que nos motoristas experientes, têm sido encontradas relações significativas entre a autoeficácia com comportamentos de risco, tais como erros na direção (Delhome & Meyer, 2004Delhome, P., & Meyer, T. (2004). Risk taking and selfefficacy among young male drivers: Self-efficacy and changing task demands. In T. Rothengatter & R. D. Huguenir (Eds.), Traffic & Transport Psychology (pp.135-146)Amsterdam: Elsevier.), direção perigosa (Taubman-Ben-Ari et al., 2004Taubman-Ben-Ari, O., Mikulincer, M., & Iram, A. (2004). A multi-factorial framework for understanding reckless driving appraisal indicators and perceived environmental determinants. Transportation Research Part F: Traffic Psychology and Behavior 7(6), 333-349.), atenção inadequada, lapsos na direção (Horsthuis, 2011Horsthuis, S. M. G. M. (2011). De bijdrage van demografische en psychologische determinanten aan riskant rijgedrag door jonge en oudere automobilisten (Doctoral dissertation unpublished). University of Twente Student Theses, Netherlands. Retrieved May 23, 2013, from Retrieved May 23, 2013, from http//www.essay.utwente.nl/61050
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), assumir riscos e violar as regras de trânsito (Šeibokaitë et al., 2013Šeibokaitë, L., Endriulaitienë, A., Markðaitytë, R., Þardeckaitë-Matulaitienë, K., & Pranckevièienë, A. (2013). The relationship between self-reported risky driving and personality traits in different samples of drivers. Psichologija48, 20-38.).

Além disso, em termos metodológicos tem sido salientado que um ponto crítico dos estudos sobre autoeficácia com motoristas refere-se à forma como os resultados têm sido obtidos, geralmente pelo uso de perguntas pouco estruturadas, as quais limitam as comparações dos resultados e podem provocar vieses. Assim, é recomendada a construção de escalas de autoeficácia que facilitariam a comparação dos dados (Sundströn, 2008bSundströn, A. (2008b). Self-assessment of driving skill: A review from a measurement perspective. Transportation Research Part F: Traffic Psychology and Behavior11(1), 1-9.). Dessa forma, um instrumento com propriedades psicométricas adequadas para avaliar as crenças de autoeficácia, tal como proposto no presente estudo, torna-se relevante.

A verificação dos resultados da análise fatorial exploratória mostrou que a unifatorialidade apresentou-se como a solução mais adequada para a EADir. A decisão tomada foi com base nos dados estatísticos, tendo sido considerados os indicativos contidos no scree plot, nas tabelas de distribuição dos itens e nos valores de alfa de Cronbach.

Vale acrescentar, também, que a consideração da escala com um fator geral apoiou-se no estudo empírico de George et al. (2007George, S., Clark, M., & Crotty, M. (2007). Development of the Adelaide Driving Self-efficacy Scale. Clinical Rehabilitation21(1), 56-61.) o qual encontrou resultado semelhante na ADSES, além do alto valor de consistência interna encontrado para a EADir. O valor de alfa alto para o instrumento geral também foi verificado no estudo de Sundströn (2008aSundströn, A. (2008a). Construct validation and psychometric evaluation of the self-efficacy scale for driver competence. European Journal of Psychological Assessment, 24(3), 198-206.) e Taubman-Ben-Ari (2008Taubman-Ben-Ari, O. (2008). Motivational sources of driving and their associations to reckless driving cognitions and behavior. European Review of Applied Psychology, 58(1), 51-64.) em outras culturas, os quais encontraram alfas de 0,98 e 0,94, respectivamente, indicando a mesma tendência a valores de alfa altos. Dessa forma, foi principalmente o respaldo teórico que sustentou a decisão sobre a estrutura fatorial da EADir. No entanto, ressalta-se que são importantes novos estudos testando a estrutura interna da escala com outras técnicas estatísticas como a análise fatorial confirmatória e a Teoria de Resposta ao Item.

Uma possibilidade de pesquisa futura com a EADir seria com amostras de candidatos à CNH no momento da prova prática de direção. Nesse caso, a correlação do escore total com a aprovação ou reprovação na avaliação, bem como o envolvimento em multas e acidentes em motoristas habilitados, poderiam fornecer evidência de validade de critério. Seria interessante também explorar a autoeficácia para dirigir com comportamentos de risco no trânsito, dentre eles lócus de controle, erros, violações e lapsos, estilos de direção, normas sociais e outros construtos.

Embora os resultados obtidos e relatados neste trabalho indiquem boas perspectivas para a avaliação da autoeficácia para dirigir por meio da EADir, há necessidade de estudos que ampliem as evidências de validade para a escala e a exploração do construto com amostras distintas de motoristas. É importante levar em consideração que a identificação das crenças de autoeficácia para dirigir pode ser uma das maneiras para que os motoristas tomem contato com o que acreditam conseguir fazer no trânsito e possam, assim, compreender suas limitações e procurar maneiras para compensá-las.

Nessa perspectiva, um possível campo de estudos seria com pessoas que têm medo de dirigir, seja pela falta de segurança em sua habilidade na direção ou pelo comprometimento das crenças de autoeficácia após a ocorrência de acidentes de trânsito, por exemplo. Outra possibilidade interessante a ser explorada envolveria a coleta de dados com motoristas que sofreram acidentes de trânsito graves, onde seria possível analisar o quanto isso afetou suas crenças de autoeficácia para dirigir. A EADir também poderia ser usada na avaliação de motoristas idosos em que há preocupação em identificar aspectos cognitivos e atitudes as quais podem afetar negativamente a condução, sendo que isso já tem sido foco de estudos no exterior (George et al., 2007George, S., Clark, M., & Crotty, M. (2007). Development of the Adelaide Driving Self-efficacy Scale. Clinical Rehabilitation21(1), 56-61.).

Espera-se ainda que com o avanço dos estudos possa ser mais bem compreendida a ambivalência que envolve o construto da autoeficácia no domínio de dirigir, uma vez que as crenças são importantes para o processo de aprendizagem nos motoristas inexperientes, mas podem tornar-se motivo de preocupação em relação a comportamentos de risco. Dessa maneira, são necessários estudos que estabeleçam perfis de autoeficácia com níveis variando de baixo até extremamente altos, bem como comparações com outros construtos e variáveis. Com isso, será possível discutir a existência desse limiar tênue entre os diversos níveis de classificação da autoeficácia, analisar até que ponto o construto é influenciado por outras variáveis de personalidade ou, ainda, identificar o contexto social que pode ocasionar comportamentos de risco.

Em síntese, é possível afirmar que a EADir apresenta evidências de validade de conteúdo e semântica obtida na etapa inicial do trabalho. Além disso, foi possível identificar também evidência de validade relativa à estrutura interna dos itens, obtida pela AFE, que apontou para a sua unifatorialidade. Adicionalmente, obteve-se uma estimativa de fidedignidade suficiente para que possa ser usada para o objetivo que se propõe.

Destaca-se, contudo, a existência de limitações, especialmente devidas às características da amostra, motoristas oriundos de uma única cidade do sul do Brasil e que participavam do processo de renovação da CNH. Isso pode tê-los tornado mais suscetíveis a manifestações de desejabilidade social, influenciando em escores altos na escala de autoeficácia para dirigir justamente por serem motoristas de renovação em processo de avaliação nas clínicas do Detran. Sugere-se assim, que novos estudos sejam realizados com a escala de forma a analisar se a interpretação que ela permite é sustentável com amostras diversificadas em outras situações de avaliação.

Referências

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  • 2
    Artigo elaborado a partir da dissertação de J.F. MOGNON, intitulada: "Estudos para a construção de uma escala de autoeficácia para dirigir (EADir)". Universidade São Francisco, 2013.
  • Apoio: Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico e Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior.
  • 4
    Agradecimentos: As autoras agradecem a colaboração do Departamento de Transportes do estado do Paraná, especialmente Carine Côas e a todos os envolvidos na realização da pesquisa.

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    2016

Histórico

  • Recebido
    17 Out 2013
  • Revisado
    15 Set 2014
  • Aceito
    29 Out 2014
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