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EVENTOS DE FORMAÇÃO DE PROFESSORES: UMA PERSPECTIVA ETNOGRÁFICA SOBRE APRENDER A ENSINAR

TEACHER EDUCATION EVENTS: AN ETHNOGRAPHIC PERSPECTIVE ON LEARNING TO TEACH

RESUMO

O presente trabalho tem como objetivo apresentar evento de formação como um conceito produtivo para a pesquisa sobre formação de professores. O conceito foi desenvolvido com base em um estudo etnográfico (COSTA, 2013) que analisou as práticas de formação em reuniões de professores e em períodos entre as aulas em uma instituição de ensino de português como língua adicional. A formação de professores observada orientou-se por elementos da racionalidade prática e técnica (PÉREZ GÓMEZ, 1995) e por atividades de conhecimento na prática e reflexão na prática, conforme proposto por Schön (2000). As abordagens sobre formação de professores propostas por esses autores são discutidas à luz de fundamentos da pesquisa etnográfica (HAMMERSLEY; ATKINSON, 1995). Com base nos eventos de formação observados, o estudo mostra como as perspectivas teóricas de atividades de formação de professores podem ser descritas com base em dados etnográficos relativos às ações, aos tópicos e aos papéis de mais e menos experientes que os participantes constroem conjuntamente na interação. Os resultados da análise apontam que um evento de formação é um momento propício para aprender a ensinar, e, em sua constituição, são fundamentais as ações desempenhadas pelos participantes de solicitar ajuda e de narrar experiências prévias, tópicos relacionados a práticas de sala de aula, e a experiência dos participantes como agentes formadores e em formação.

Palavras-chave:
Formação de professores; Português como língua adicional; Prática profissional.

ABSTRACT

This article aims to present teacher education event as a productive concept for research on teacher education. The concept was developed based on an ethnographic study (COSTA, 2013) that examined the in-service teacher practices in teacher meetings and in breaks between classes in a Portuguese as an additional language school. The teacher education practices observed showed elements of practical rationality and technical rationality (PEREZ GOMEZ, 1995) and activities of knowledge-in-practice and reflection-in-action, as proposed by Schön (2000). The approaches to teacher education proposed by these authors are discussed in the light of an ethnographic research perspective (HAMMERSLEY; ATKINSON, 1995). Based on the teacher education events observed, the study shows how the theoretical perspectives on teacher education activities can be described based on ethnographic data concerning the actions, the topics and the more and less experienced roles the participants jointly construct in interaction. The results show that a teacher education event is a moment conducive to learning how to teach, and that it is constituted by the participants’ actions of asking for help and narrating previous experiences, topics dealing with classroom practices, and the participants’ experience both as teacher educators and in-service learners.

Keywords:
Teacher education; Portuguese as an additional language; Professional practice.

INTRODUÇÃO

Nas duas últimas décadas, as discussões e ações sobre formação de professores têm avançado, pouco a pouco, para perspectivas mais sociais e situadas. O relatório “Formação Continuada de Professores: Uma análise das modalidades e das práticas em estados e municípios brasileiros” (2011)1 1 Realizado pela Fundação Carlos Chagas, por encomenda da Fundação Victor Cívita. apresenta os resultados de uma pesquisa sobre a configuração atual das ações de formação continuada de professores em distintos estados e municípios brasileiros, as modalidades por meio das quais são implementadas e os processos de monitoramento e avaliação empregados. São identificadas duas abordagens de formação de professores: a primeira vê a formação continuada como desenvolvimento do sujeito professor, e a segunda vê a escola como locus de desenvolvimento de equipes pedagógicas e a formação de comunidades colaborativas de aprendizagem (FCC, 2011, p. 15).

O mesmo relatório traz o resultado de um estudo que buscou verificar quais são as ações mais comuns, nos estados e municípios brasileiros, em termos de formação continuada. Segundo a análise, em grande parte das Secretarias de Educação, o mais recorrente é uma formação instrumentalista e que não leva em consideração os saberes dos professores, sobretudo naqueles contextos em que se observou predominância de uma perspectiva individualizada de formação (FCC, 2011, p. 16-22). Por outro lado, em formações que privilegiam uma perspectiva colaborativa, as atividades em geral acontecem nas escolas, por meio de grupos de estudos, produção coletiva de materiais didáticos, envolvimento dos professores nos processos de planejamento e de implementação da sua própria avaliação, elaboração de projetos pedagógicos relativos aos conteúdos do currículo ou a problemas identificados em sala de aula, além da formação de redes virtuais de colaboração entre comunidades escolares (FCC, 2011, p. 23-29). Em suma, há ações de formação que investem na pessoa do professor, em sua vontade de aprender e em seu compromisso com os seus alunos, e as que veem, nos problemas, nos embates e nas virtudes do contexto de trabalho, oportunidades de aprendizagem docente.

Pensando o indivíduo, a profissão e o espaço escolar como três pilares de desenvolvimento do professor, entendemos que a observação das experiências produzidas e compartilhadas entre os participantes de um dado contexto situado historicamente é decisiva para compreender como acontece a formação de professores. Desde essa perspectiva, o presente trabalho tem o objetivo de apresentar evento de formação como conceito produtivo para a análise de ações de formação de professores. Como veremos a seguir, as práticas de formação de professores que caracterizam os eventos discutidos aqui são orientadas por elementos da racionalidade prática e técnica (PÉREZ GÓMEZ, 1995PÉREZ GÓMEZ, A. (1995). O pensamento prático do professor: a formação do professor como profissional reflexivo. In: Nóvoa, A. (Org.). Os professores e a sua formação . 2 ed. Lisboa: Dom Quixote . ), envolvem conhecimento na prática e reflexão na prática (SCHÖN, 2001) e podem ser dimensionadas no âmbito pessoal, profissional e das equipes escolares (NÓVOA, 1995NÓVOA, A. Formação de professores e profissão docente. (1995). In: Nóvoa, A. (Org.). Os professores e a sua formação. 2 ed. Lisboa: Dom Quixote,. ; 2007NÓVOA, A. (2007). O Regresso dos Professores. Conferência Desenvolvimento profissional de professores para a qualidade e para a equidade da Aprendizagem ao longo da Vida. Lisboa: Presidência Portuguesa do Conselho da União Europeia.). Alinhados aos fundamentos da pesquisa etnográfica (HAMMERSLEY; ATKINSON, 1995HAMMERSLEY, M.; ATKINSON, P. (1995). Etnografía: Métodos de Investigación. Barcelona: Paidós. ), apresentamos o conceito de evento de formação, mostrando como a formação pode ser descrita, considerando a univocidade de cada aqui e agora e analisando as ações, os tópicos e a configuração de papéis de mais e menos experientes dos participantes.

Nas próximas seções, apresentamos as concepções teóricas que embasam este trabalho. Primeiramente, apresentamos a noção de racionalidade técnica e prática, segundo a visão de Pérez Gomes (1995) e, posteriormente, discutimos os conceitos de conhecimento na ação e reflexão na ação, de Schön (2000SCHÖN, D. (2000). Educando o Profissional Reflexivo: um novo design para o ensino e aprendizagem. Porto Alegre: ARTMED .), e as propostas de formação de Nóvoa (1995NÓVOA, A. Formação de professores e profissão docente. (1995). In: Nóvoa, A. (Org.). Os professores e a sua formação. 2 ed. Lisboa: Dom Quixote,. ; 2007NÓVOA, A. (2007). O Regresso dos Professores. Conferência Desenvolvimento profissional de professores para a qualidade e para a equidade da Aprendizagem ao longo da Vida. Lisboa: Presidência Portuguesa do Conselho da União Europeia.), refletindo sobre como as orientações dos autores podem servir como paradigma de formação em pesquisas qualitativas de cunho etnográfico. Na seção 4, apresentamos a instituição que foi cenário da pesquisa, o processo de geração dos dados etnográficos, bem como os procedimentos de análise adotados. Na seção 5, apresentamos e discutimos dois dados etnográficos de interações entre professores, representativos da coleção de 107 dados etnográficos gerados em observação-participante no ano de 2012 em um instituto cultural brasileiro, localizado em um país latino-americano, e analisamos como ambos se configuram em eventos de formação. De modo abrangente, eventos de formação são momentos propícios para aprender a ensinar, e, a partir de dados gerados com professores de português como língua adicional2 2 Adotamos o termo língua adicional, ao invés de língua estrangeira, com base no documento Teaching Additional Languages, do International Bureau of Education/UNESCO (JUDD et al, 2001). Para os autores do documento, a escolha do termo “adicional” em lugar de “estrangeira” enfatiza que nenhuma língua é inferior ou superior à outra, nem tampouco deve ser entendida como substituta da primeira língua de um estudante. Desse ponto de vista, a opção privilegia a perspectiva do usuário, que, ao aprender e usar essa língua, para a realização dos propósitos sociais e interlocuções em que se engajam, a adiciona a outras línguas que já tenha em seu repertório. (SCHLATTER; GARCEZ, 2012). , defendemos que tais eventos se constituem na interação entre os participantes em torno de um tema relacionado a práticas de sala de aula, possuem caráter técnico-prático, podem ser observados nas ações desempenhadas e nas narrativas de experiências vividas.

TEORIA E PRÁTICA NA FORMAÇÃO DE PROFESSORES

Para Pérez Gómez (1995)PÉREZ GÓMEZ, A. (1995). O pensamento prático do professor: a formação do professor como profissional reflexivo. In: Nóvoa, A. (Org.). Os professores e a sua formação . 2 ed. Lisboa: Dom Quixote . , há duas abordagens distintas nas intervenções educativas, sobretudo, nas atividades docentes, focalizando o profissional: primeiramente, o professor é um técnico-especialista, que trabalha rigorosamente baseado em regras derivadas do conhecimento científico, e, por outro lado, um “prático autônomo, como artista que reflete, que toma decisões e que cria durante a sua própria ação” (PÉREZ GÓMEZ, 1995PÉREZ GÓMEZ, A. (1995). O pensamento prático do professor: a formação do professor como profissional reflexivo. In: Nóvoa, A. (Org.). Os professores e a sua formação . 2 ed. Lisboa: Dom Quixote . , p. 96). Ambas as concepções estão baseadas em linhas de racionalidade distintas: a técnica e a prática.

A abordagem de formação de professores baseada na racionalidade técnica pressupõe que a atividade profissional seja instrumental, baseada na resolução de problemas, mediante o cumprimento de orientações teóricas e aplicação de técnicas cientificamente comprovadas. Nessa perspectiva, os professores enfrentam os problemas de sua prática usando conhecimentos e princípios advindos da pesquisa, o que sugere uma hierarquia entre profissionais e produtores de conhecimento.

A racionalidade técnica impõe, pela própria natureza da produção do conhecimento, uma relação de subordinação dos níveis mais aplicados e próximos da prática aos níveis mais abstratos de produção do conhecimento, ao mesmo tempo que as condições para o isolamento dos profissionais e para a sua confrontação corporativa. (PÉREZ GÓMEZ, 1995PÉREZ GÓMEZ, A. (1995). O pensamento prático do professor: a formação do professor como profissional reflexivo. In: Nóvoa, A. (Org.). Os professores e a sua formação . 2 ed. Lisboa: Dom Quixote . , p. 97)

Por outro lado, a racionalidade prática busca superar a relação que a racionalidade técnica estabeleceu entre o conhecimento científico-técnico e a prática de sala de aula. O modelo prático parte da análise das práticas dos professores e do modo como enfrentam os problemas que a vida escolar traz. A complexidade de tais práticas está, segundo Pérez Gómez (1995)PÉREZ GÓMEZ, A. (1995). O pensamento prático do professor: a formação do professor como profissional reflexivo. In: Nóvoa, A. (Org.). Os professores e a sua formação . 2 ed. Lisboa: Dom Quixote . , no modo como os professores usam o conhecimento científico, resolvem situações incertas ou desconhecidas, elaboram e modificam rotinas, na experimentação de hipóteses de trabalho, na utilização de técnicas e instrumentos conhecidos e na recriação de estratégias e inovação de procedimentos e recursos. Nessa perspectiva, o professor é um sujeito social que interfere em um meio ecológico complexo, psicossocial, mutável e defronta-se com problemas oriundos da prática, desafios que podem estar relacionados com situações individuais de aprendizagem ou com comportamentos dos grupos com os quais convive.

Todos os elementos que compõem o ecossistema dos cenários escolares requerem de todos os envolvidos, mas dos professores de maneira central, um tratamento singular, que leva em conta as situações complexas específicas, de caráter individual ou coletivo e com características contextuais e históricas do grupo social de professores e de turmas de alunos.

A vida quotidiana de qualquer profissional prático depende do conhecimento tácito que mobiliza e elabora durante a sua própria ação. Sob pressão de múltiplas e simultâneas solicitações da vida escolar, o professor ativa os seus recursos intelectuais [...] (conceitos, teorias, crenças, dados, procedimentos, técnicas), para elaborar um diagnóstico rápido da situação, desenhar estratégias de intervenção e prever o curso futuro dos acontecimentos. [...] A maioria dos recursos intelectuais que se ativam na ação são de caráter tácito e implícito. (PÉREZ GÓMEZ, 1995PÉREZ GÓMEZ, A. (1995). O pensamento prático do professor: a formação do professor como profissional reflexivo. In: Nóvoa, A. (Org.). Os professores e a sua formação . 2 ed. Lisboa: Dom Quixote . , p. 102-103)

Conforme veremos mais adiante, os dados que analisamos sugerem que as fronteiras entre a racionalidade técnica e a prática talvez não sejam tão claras. O que se observa é que os eventos em que a formação está relacionada à prática dos participantes também apresentam aportes técnicos, caracterizando, assim, um entrelaçamento entre as duas perspectivas. Apesar de ser uma taxonomia produtiva para a reflexão que empreendemos neste trabalho, o modo como Pérez Gómez (1995)PÉREZ GÓMEZ, A. (1995). O pensamento prático do professor: a formação do professor como profissional reflexivo. In: Nóvoa, A. (Org.). Os professores e a sua formação . 2 ed. Lisboa: Dom Quixote . apresenta o tema parece dar um status autônomo a cada uma das racionalidades, entendimento talvez construído sem o amparo de dados concretos. Essa é uma das razões pela qual advogamos pela adoção da perspectiva etnográfica nos estudos sobre formação de professores. Ao trazer a perspectiva do participante para a construção de eventos de formação, buscamos analisar se e de que modo os fazeres técnicos e práticos se tornam relevantes para os professores nas suas práticas profissionais. Como veremos nos dados analisados aqui, tanto a racionalidade prática como a técnica são mobilizadas e se inter-relacionam, o que sugere que uma perspectiva de análise ancorada em uma racionalidade técnico-prática é produtiva para estudar cenários de formação de professores.

A formação profissional por um viés integrador da técnica e da prática encontra profundidade de análise no trabalho de Schön (2000SCHÖN, D. (2000). Educando o Profissional Reflexivo: um novo design para o ensino e aprendizagem. Porto Alegre: ARTMED .), que propõe como modelo de formação o paradigma do profissional reflexivo, segundo o qual a formação pode ser entendida como um processo de reflexão-na-ação ou diálogo reflexivo com situações problemáticas concretas a partir do conhecimento-na-ação. De acordo com o autor, conhecimento-na-ação trata do saber fazer, da ação inteligente orientadora de toda atividade humana, e é construído, mesmo que por esquemas automáticos ou rotineiros, a partir da experiência ou reflexões passadas. Neste caso, o conhecimento está relacionado ao saber fazer e não necessariamente ao saber explicar o que se faz, sendo essas capacidades intelectuais distintas. A primeira envolve um tipo de conhecimento primário que supõe uma espécie de diálogo com as situações problemáticas para intervenções concretas; a segunda caracteriza-se por um metaconhecimento na ação.

Schön (2000SCHÖN, D. (2000). Educando o Profissional Reflexivo: um novo design para o ensino e aprendizagem. Porto Alegre: ARTMED .) argumenta que, em toda ação inteligente na qual nos engajamos, conhecimentos são mobilizados e revelam-se por meio do caráter procedimental de nosso desempenho: “uma variante poderosa e esotérica do tipo mais familiar de competência que todos nós exibimos no dia a dia, em um sem número de atos de reconhecimento, julgamento e performance habilidosa” (SCHÖN, 2000SCHÖN, D. (2000). Educando o Profissional Reflexivo: um novo design para o ensino e aprendizagem. Porto Alegre: ARTMED ., p. 29, grifo do autor). Por meio da observação e reflexão sobre nossas ações se faz possível descrever o saber tácito implícito nelas. As descrições do conhecimento-na-ação configuram-se como construções que explicitam simbolicamente um tipo de inteligência, primariamente tácito: “conhecer sugere a qualidade dinâmica de conhecer-na-ação, a qual, quando descrevemos, convertemos em conhecimento-na-ação” (SCHÖN, 2000SCHÖN, D. (2000). Educando o Profissional Reflexivo: um novo design para o ensino e aprendizagem. Porto Alegre: ARTMED ., p. 32).

A reflexão-na-ação significa pensar sobre o que se está fazendo ao mesmo tempo em que se faz: “pensamos retrospectivamente sobre o que fizemos, de modo a descobrir como nosso ato de conhecer-na-ação pode ter contribuído para um resultado inesperado” (SCHÖN, 2000SCHÖN, D. (2000). Educando o Profissional Reflexivo: um novo design para o ensino e aprendizagem. Porto Alegre: ARTMED ., p. 32). Refletir na ação pode supor rigor, sistematização e distanciamento, mas principalmente “a riqueza da captação viva e imediata das múltiplas variáveis intervenientes e com a grandeza da improvisação e criação” (PÉREZ GÓMEZ, 1995PÉREZ GÓMEZ, A. (1995). O pensamento prático do professor: a formação do professor como profissional reflexivo. In: Nóvoa, A. (Org.). Os professores e a sua formação . 2 ed. Lisboa: Dom Quixote . , p. 104). Um profissional flexível e aberto às complexidades da interação prática tem na reflexão-na-prática o melhor instrumento de aprendizagem: “No contato com a situação prática, não só se adquirem e constroem novas teorias, esquemas e conceitos, como se aprende o próprio processo dialético da aprendizagem” (PÉREZ GÓMEZ, 1995PÉREZ GÓMEZ, A. (1995). O pensamento prático do professor: a formação do professor como profissional reflexivo. In: Nóvoa, A. (Org.). Os professores e a sua formação . 2 ed. Lisboa: Dom Quixote . , p. 104).

Ao caracterizar a reflexão-na-ação como um conjunto de ações observável, Schön (2000SCHÖN, D. (2000). Educando o Profissional Reflexivo: um novo design para o ensino e aprendizagem. Porto Alegre: ARTMED .) reconhece que os momentos de reflexão raramente são claros e não são facilmente relacionáveis, e as experiências podem ser as próprias interpretações levadas a cabo. Conhecer e refletir na ação não apresentam fronteiras claras, pois são processos interdependentes que se distinguem sutilmente. A cada nova tarefa as ações são ajustadas ativando, momento a momento, um repertório de experiências e memórias.

Com base no paradigma da reflexão-na-ação, Nóvoa (1995NÓVOA, A. Formação de professores e profissão docente. (1995). In: Nóvoa, A. (Org.). Os professores e a sua formação. 2 ed. Lisboa: Dom Quixote,. ) propõe que a formação de professores pode se dar em três modalidades: a) desenvolvimento pessoal dos sujeitos; b) desenvolvimento profissional; e c) desenvolvimento organizacional da escola. O desenvolvimento pessoal dos sujeitos entende a formação como estímulo a uma atitude crítico-reflexiva, que promova meios para “dinâmicas de autoformação participada” (NÓVOA, 1995NÓVOA, A. Formação de professores e profissão docente. (1995). In: Nóvoa, A. (Org.). Os professores e a sua formação. 2 ed. Lisboa: Dom Quixote,. , p. 25). Estar em formação significa, nessa modalidade, entrega pessoal, trabalho livre e criativo com vista à construção de uma identidade pessoal e profissional. Sendo o professor a pessoa, parte integrante da pessoa é ser professor. Para o autor, a formação não se constrói por acúmulos de conhecimentos de ordem técnica, mas por meio de um processo constante de reflexividade sobre as práticas juntamente com a construção da identidade pessoal. Assim, a formação valoriza o saber da experiência e está diretamente atrelada ao local e à vida dos profissionais, entendendo o conhecimento como um processo ativo construído ao longo da vida, não necessariamente produzido somente em nível formal, como nas licenciaturas ou em treinamentos específicos, por exemplo. A proposta de Nóvoa (1995)NÓVOA, A. Formação de professores e profissão docente. (1995). In: Nóvoa, A. (Org.). Os professores e a sua formação. 2 ed. Lisboa: Dom Quixote,. aponta que trocar experiências e saberes consolida espaços de formação mútua, nos quais cada professor pode ser “chamado a desempenhar, simultaneamente, o papel de formador e formando.” (NÓVOA, 1995NÓVOA, A. Formação de professores e profissão docente. (1995). In: Nóvoa, A. (Org.). Os professores e a sua formação. 2 ed. Lisboa: Dom Quixote,. , p. 26). Nessa modalidade, o diálogo entre professores é fundamental no processo de formação: encontros dialogados possibilitam consolidar saberes emergentes da prática profissional e constituem-se em um fator decisivo de socialização profissional e afirmação de valores próprios de ser um profissional professor.

A segunda modalidade de práticas de formação de professores referida por Nóvoa (1995NÓVOA, A. Formação de professores e profissão docente. (1995). In: Nóvoa, A. (Org.). Os professores e a sua formação. 2 ed. Lisboa: Dom Quixote,. ) privilegia o desenvolvimento profissional e toma como referência as dimensões coletivas para a independência profissional e a consolidação da profissão como autônoma em produzir saberes e valores. Nóvoa (1995)NÓVOA, A. Formação de professores e profissão docente. (1995). In: Nóvoa, A. (Org.). Os professores e a sua formação. 2 ed. Lisboa: Dom Quixote,. apregoa que a formação deve estimular o desenvolvimento profissional favorecendo a autonomia em cada contexto de atuação.

É preciso investir positivamente nos saberes de que o professor é portador, trabalhando-os de um ponto de vista teórico e conceitual. Os problemas da prática profissional docente não são meramente instrumentais; todos eles comportam situações problemáticas que obrigam a decisões num terreno de grande complexidade, incerteza, singularidade e de conflito de valores (SCHÖN, 1990). As situações que os professores são obrigados a enfrentar (e a resolver) apresentam características únicas, exigindo, portanto, respostas únicas: o profissional competente possui capacidades de autodesenvolvimento reflexivo. (NÓVOA, 1995NÓVOA, A. Formação de professores e profissão docente. (1995). In: Nóvoa, A. (Org.). Os professores e a sua formação. 2 ed. Lisboa: Dom Quixote,. , p. 27, grifos no original)

Segundo o autor, tais práticas de formação opõem-se ao que se tem feito tradicionalmente desde a pedagogia científica. Esta tem desvalorizado os repertórios de saberes que os professores construíram ao longo de suas vidas, impondo o saber dito “científico” (NÓVOA, 1995NÓVOA, A. Formação de professores e profissão docente. (1995). In: Nóvoa, A. (Org.). Os professores e a sua formação. 2 ed. Lisboa: Dom Quixote,. , p. 27), numa lógica guiada pela racionalidade técnica sempre oposta “ao desenvolvimento de uma práxis reflexiva” (NÓVOA, 1995NÓVOA, A. Formação de professores e profissão docente. (1995). In: Nóvoa, A. (Org.). Os professores e a sua formação. 2 ed. Lisboa: Dom Quixote,. , p. 27). A posição do autor não despreza o conhecimento técnico científico produzido nas instituições de pesquisa, mas propõe que se planeje a formação a partir das práticas locais.

A terceira modalidade referida por Nóvoa (1995NÓVOA, A. Formação de professores e profissão docente. (1995). In: Nóvoa, A. (Org.). Os professores e a sua formação. 2 ed. Lisboa: Dom Quixote,. ) trata do desenvolvimento organizacional, que entende a escola como espaço integral de formação. Para o autor, formação tem a ver com transformação e mudança, e isso significa transformar e mudar práticas pedagógicas e também organizações escolares e seu funcionamento. Assim, formação pode ser vista como um investimento educativo dos projetos políticos pedagógicos.

Para a formação de professores, o desafio consiste em conceber a escola como um ambiente educativo, onde trabalhar e formar não sejam atividades distintas. A formação deve ser encarada como um processo permanente, integrado no dia a dia dos professores e das escolas, e não como uma função que intervém à margem dos projetos profissionais e organizacionais. (NÓVOA, 1995NÓVOA, A. Formação de professores e profissão docente. (1995). In: Nóvoa, A. (Org.). Os professores e a sua formação. 2 ed. Lisboa: Dom Quixote,. , p. 29)

Como veremos mais adiante, nos eventos de formação analisados neste trabalho, no contexto estudado, os participantes constroem essas diferentes modalidades de formação por meio do compartilhamento de conhecimentos relacionados ao ensino de português como língua adicional e propõem tanto transformações pessoais e profissionais quanto institucionais.

UM OLHAR ETNOGRÁFICO PARA AS PRÁTICAS DE FORMAÇÃO DE PROFESSORES

O instituto no qual este trabalho foi realizado é uma instituição privada que contava, no período de geração de dados, com 12 professores de língua portuguesa, sendo quatro deles formados na área de Letras e outros em outras áreas como Geografia, Turismo e Administração. Todos os professores, equipe diretiva e funcionários consentiram por escrito em participar da pesquisa. Os professores ministram aulas desde o nível básico até o avançado e colaboram em atividades de difusão cultural como sessões de cinema brasileiro e festas de Carnaval. O instituto é o único posto aplicador do exame Celpe-Bras3 3 O Celpe-Bras, Certificado de Proficiência de Língua Portuguesa para Estrangeiros, é outorgado pelo Ministério da Educação do Brasil a candidatos estrangeiros. O exame certifica os níveis Intermediário, Intermediário Superior, Avançado e Avançado Superior, e caracteriza-se por uma perspectiva de uso da linguagem para o desempenho de ações no mundo com um propósito social. As tarefas que compõem as partes escrita e oral utilizam materiais autênticos e integram leitura, escrita, compreensão e produção oral, e não testam gramática e vocabulário separadamente. no país onde está localizado e alguns dos professores participantes da pesquisa também são aplicadores do exame.

Com base nos princípios etnográficos de estranhamento e reflexividade (HAMMERSLEY; ATKINSON, 1995HAMMERSLEY, M.; ATKINSON, P. (1995). Etnografía: Métodos de Investigación. Barcelona: Paidós. ), um dos autores deste trabalho (COSTA, 2013COSTA, E.V. (2013). Práticas de formação de professores de Português Língua Adicional em um instituto cultural brasileiro no exterior. Dissertação de Mestrado em Letras. Universidade Federal do Rio Grande do Sul, Porto Alegre.) empreendeu o trabalho de campo com uma observação participante, que consistiu em acompanhar por dois meses as rotinas dos professores, fora de sala de aula, tomando notas de campo e registrando, em fotos e gravações de áudio, interações entre os participantes. Os materiais gerados em campo foram posteriormente convertidos em diários de campo e transcrições. Os encontros dos professores observados ocorreram em diferentes momentos e ambientes, sendo os intervalos entre as aulas e as reuniões pedagógicas os momentos de maior ocorrência dos eventos de formação. A análise dos dados se deu a partir de repetidas leituras dos diários de campo e das transcrições tendo como base a noção de evento social (RIBEIRO; GARCEZ, 2006).

Para Ribeiro e Garcez (1998RIBEIRO, B. T.; GARCEZ, P. M. (1998). Sociolinguística Interacional: antropologia, linguística e sociologia em análise do discurso. Porto Alegre: Loyola.), evento ou evento social é

[...] uma definição social da atividade de fala que se desenvolve na situação dependendo das oportunidades e restrições à interação proporcionadas pela mudança dos participantes e/ou objeto da interação. Os eventos se desenvolvem ao redor de um tópico ou no máximo de um âmbito limitado de tópicos e se distinguem por suas estruturas sequenciais. Eles são marcados por rotinas de abertura e fechamento estereotipadas e, portanto, reconhecíveis. (RIBEIRO; GARCEZ, 1998RIBEIRO, B. T.; GARCEZ, P. M. (1998). Sociolinguística Interacional: antropologia, linguística e sociologia em análise do discurso. Porto Alegre: Loyola., p. 261-262)

Para os autores, um evento é determinado pelo cumprimento de certas normas e ganham diferentes arranjos em cada nova interação. Assim, dois professores reunidos discutindo uma reformulação no sistema de avaliação em uma escola segue determinados padrões de fala, ao passo que propor à coordenadora pedagógica as implementações de novas formas de avaliar os alunos, mesmo que trate do mesmo tema e envolva os mesmos participantes no mesmo local, pode envolver outras maneiras de abrir e fechar o evento. A partir da análise dos dados relatada no presente artigo, os eventos, nos quais foi possível identificar a formação dos professores como parte integrante dos propósitos desempenhados pelos participantes, foram descritos como eventos de formação.

Adotamos a noção de evento como foco analítico, já que, em termos de formação de professores, conforme explicado anteriormente, entendemos que os problemas não existem na prática4 4 Adotamos aqui uma perspectiva de prática social conforme os estudos de Bourdieu (1977), segundo os quais uma prática é um conjunto de ações imbuídas de história e constituído pelas disposições do habitus. Portanto, não podemos assumir que uma prática seja em si um problema, mas que, sim, na contingência das ações há situações problemáticas que são interpretadas desse modo pelos praticantes (sujeitos da prática). , mas sim em situações problemáticas, ou seja, casos únicos que não se enquadram, a priori, em categorias genéricas já identificadas em modelos teóricos (PÉREZ GÓMEZ, 1995PÉREZ GÓMEZ, A. (1995). O pensamento prático do professor: a formação do professor como profissional reflexivo. In: Nóvoa, A. (Org.). Os professores e a sua formação . 2 ed. Lisboa: Dom Quixote . ). A opção por descrever eventos sociais nos quais os professores do instituto estudado (re)atualizam os significados sobre sua prática também se baseia na importância de colocar a figura do professor no centro das ações de formação, conforme a discussão apresentada na seção anterior.

Após reunir 107 eventos em que formação era relevante para o que os participantes estavam fazendo, chegou-se a 30 eventos que mostraram um tipo de organização recorrente e que caracterizamos como evento de formação. Um evento de formação se organiza em torno de ações que os participantes desempenham conjuntamente: apresentar modelos e estratégias de ensino; relatar experiências de sala de aula; responder a perguntas sobre questões de sala de aula; oferecer ajuda quando solicitada. O tópico tratado nas interações em eventos de formação tem relação com as práticas de sala de aula e constitui o foco específico de ensino em pauta entre os participantes. Os tópicos mais recorrentes foram: estratégias para o ensino de gramática; elaboração de instrumentos de avaliação; e elaboração de materiais didáticos.

A formulação do conceito de evento de formação descreve os padrões de formação que acontecem no instituto, os quais são orientados pela combinação de ações com tópicos de relevância para a prática de sala de aula. O argumento central, no entanto, é de que um evento de formação, além de ser em si um momento em que os participantes se orientam para aprender com o outro, é um momento que tem como foco o ensino, já que as ações e os tópicos orientam-se pela necessidade de ensinar, em uma lógica de racionalidade técnico-prática5 5 Chamamos a atenção para o fato de que, na definição do que é um evento de formação, os tópicos são uma combinação do que poderíamos chamar de “conteúdos técnicos” (gramática, avaliação e materiais didáticos) e as ações que designam o uso desses conhecimentos nas práticas de sala de aula (apresentar, modelar, relatar, elaborar). Isso aponta para uma caracterização do evento numa perspectiva de racionalidade técnico-prática, ao invés de racionalidades técnica e prática separadamente, conforme proposto por Pérez Gómez (1995) e discutido anteriormente. Embora não seja objetivo deste trabalho discutir a distinção entre conhecimento técnico e conhecimento prático, consideramos importante chamar a atenção para essa decisão, fruto da análise dos dados gerados, e reconhecer que essa questão merece aprofundamento em futuros trabalhos. . Dito de outra forma: aprender a ensinar certos conteúdos é o propósito geral dos eventos descritos neste trabalho. Além disso, todas as ações dos participantes aqui analisadas caracterizam-se pela narratividade: articular e apresentar o que consideram uma experiência relevante para o tópico em foco é o modo de sustentar as ações que constroem o evento de formação. Isso quer dizer que, em um evento de formação, recorrer às narrativas do vivido é parte constitutiva das ações dos participantes.

EVENTOS DE FORMAÇÃO: PRÁTICAS SITUADAS DE FORMAÇÃO DE PROFESSORES

Conforme dito anteriormente e como poderemos ver nos dados analisados a seguir, um evento de formação caracteriza-se pela resolução de problemas e compartilhamento de experiências de prática pedagógica relacionados a uma gama de tópicos específicos tornados relevantes pelos participantes, tais como modos de explicar uma regra gramatical, de organizar atividades em sala de aula ou de elaborar um instrumento de avaliação. Um evento de formação se organiza em torno de ações que os participantes desempenham conjuntamente: apresentar modelos e estratégias de ensino; relatar experiências de sala de aula; responder perguntas sobre questões de sala de aula; oferecer ajuda quando solicitada6 6 Garcez e Salimen (2011) caracterizam “‘Pedir ajuda’ como a ação de um participante direcionar um turno de fala a outro pedindo ajuda para fazer algo que não consegue ou não quer fazer sozinho. O outro participante, então, pode prover ou não a ajuda solicitada”. Entende-se ‘oferta de ajuda’ como uma ação em que “um participante oferece ajuda sem que a ajuda tenha sido solicitada”. (GARCEZ; SALIMEN, 2011, p. 99) . O tópico tratado nas interações em eventos de formação tem relação com as práticas de sala de aula e constitui o foco específico de ensino em pauta entre os participantes. Os tópicos mais recorrentes foram: estratégias para o ensino de gramática; elaboração de instrumentos de avaliação; elaboração de materiais didáticos.

O dado que apresentamos a seguir ocorre na cozinha do instituto. Por ser um espaço para atividades variadas, como conversar, comer e também discutir sobre gramática, avaliação e métodos, quem estiver presente pode participar. O tópico para discussão, no dado abaixo, são explicações de gramática, com base no uso do livro didático. No excerto, Lúcia7 7 Todos os nomes utilizados no presente artigo são pseudônimos. procura responder a Priscila dúvidas sobre o Infinitivo Pessoal, com a ocasional contribuição de Alberto. Bianca, que está sentada sobre a mesa, ao lado de Lúcia, acompanha os colegas. Priscila começa a folhear e procurar algo entre as folhas do fichário. Bianca e Alberto as observam8 8 As transcrições utilizadas neste trabalho seguem as seguintes convenções: (.) pausa de até um segundo; (..) pausas de mais de 1 segundo, (…) pausas longas, acima de três segundos. Entre parênteses, em itálico constam descrições da cena. .

Excerto I
Vamos ver então as dúvidas da Priscila para que todos aprendam

Priscila apresenta sua dúvida para Lúcia, apontando para uma folha com frases escritas e com a apostila (fotocópia do livro Avenida Brasil 2 - Lima et al, 1992) aberta sobre a mesa. Priscila descreve qual é sua dúvida (linhas 5 a 7) e direciona uma pergunta para Lúcia (linha 7), que por sua vez observa atentamente. As duas professoras leem duas frases idênticas, uma delas com o infinitivo pessoal, e procuram inferir qual é a razão pela dupla possibilidade de flexão do mesmo verbo. A informação “sujeito expresso” não é interpretada imediatamente como a resolução para a dúvida. As duas frases estão tanto no livro didático como na folha que Priscila traz consigo. No material há a descrição da regra.

O espaço de tempo entre a chegada de Lúcia à cozinha e o início do período de aulas das 16h e a atividade na qual se engajam os participantes nesse período, que inicia com a formulação de uma dúvida sobre como explicar a regra gramatical do infinitivo pessoal (linhas 9 a 14) e segue com diferentes propostas de explicação e de exemplificação para resolver a questão, constroem o que estamos chamando de evento de formação: uma ocorrência em uma faixa de tempo, envolvendo dois ou mais participantes, na qual os propósitos da interação entre eles dizem respeito a resolver uma questão relevante para a sala de aula. Esses eventos são, assim, potenciais formadores de professores no instituto onde os dados foram gerados.

A base para afirmar que há potencialidade de formação (embora usemos diretamente o termo “formação”) está no fato de que os eventos apontam para uma prática de aprender a ensinar. As ações que as participantes desempenham se centralizam nas perguntas de Priscila a Lúcia, o que caracteriza um pedido de ajuda nesse caso, visto que Priscila necessita formular a explicação em aula. Lúcia, por sua vez, procura prover respostas às inquietações da colega, com olhares direcionados para a folha manuscrita e para a apostila. Tanto o comentário inicial de Bianca, “Vamos ver então as dúvidas da Priscila, para que todos aprendam” (linha 4), como a introdução do problema por Priscila, “Lembra que tu tava me mostrando aqui a história de por não ter o sujeito antecedendo aqui o verbo no infinitivo, então ele não é flexionado de acordo, não é?” (linhas 5 a 7), e ainda o comentário “Tu tinha me explicado isto, Lu” (linha 41), feito mais adiante por Bianca, retomam outras situações semelhantes vivenciadas por elas anteriormente, sinalizando que esses eventos fazem parte das práticas sociais nesse instituto. Trocam-se relatos de experiências e explicações e, nesses eventos, pode-se aprender com a dúvida e o conhecimento do outro, o que confere centralidade para a experiência na formação de professores.

Nesse evento, Lúcia e Priscila estão reunidas em torno do material de quinto nível (intermediário superior), e Priscila tem uma demanda que gera um pedido de ajuda: como explicar o uso do infinitivo pessoal. Sua preocupação é com uma regra que possa esclarecer para os alunos como utilizar essa forma gramatical da língua portuguesa, mas também que ela mesma entenda tal regra. O trabalho interacional das duas professoras consiste em uma análise conjunta de frases soltas, que são aquelas que o livro traz, visando à resolução de um problema prático: a explicação da matéria em sala de aula. Bianca, Lisiane (que entra na cozinha depois que a explicação se inicia) e Alberto observam as duas colegas e mais adiante se engajam na resolução do problema. Pelo fato de a pergunta ser dirigida à Lúcia, e ela responder a essa solicitação, a ela é atribuído o status de mais experiente no quinto nível, mas isso não significa que ela também não possa ter dúvidas, como de fato ocorre. A orientação de olhar de Lúcia para Alberto é interpretada como um pedido de ajuda, que ele atende (linhas 38 a 40). A explicação de um terceiro participante é assim autorizada para a resolução do problema em foco.

O conteúdo apresentado no livro didático e a iminência de ter que ensiná-lo originam e justificam o evento de formação. A partir do que o livro propõe, a professora Priscila procura Lúcia, pois o livro não traz orientação suficiente que possibilite entender de uma maneira clara como explicar o conteúdo gramatical específico. Esse fato sinaliza que a formação continuada acontece a partir do que se torna relevante no aqui e agora das práticas docentes, o que inclui, nesse caso, o livro didático e a linguagem usada por suas autoras. Certos tópicos de gramática oferecem dificuldades de compreensão aos participantes, especialmente, se desvinculados de seu uso. As professoras, nesse evento, lidam com o que o livro propõe, e é com isso que o aluno também se confrontará. O propósito em questão é o ensino exitoso de um conteúdo gramatical, e, para tratar disso, Lúcia tem experiência para poder ajudar quem ainda não teve tais experiências, conforme lembra Bianca (linha 41). Com a dúvida ainda não resolvida, outros participantes são autorizados a intervir, como é caso de Alberto, que contribui com algumas explicações: “quando o sujeito é o mesmo nos dois verbos aí ele fica facultativo” (linha 48).

O excerto analisado compõe uma das ocorrências observadas nos intervalos entre uma aula e outra no instituto, em um dia de aulas habitual, configurando um evento de formação emergente das contingências do dia a dia dos professores. A seguir passamos a apresentação e análise de um dado gerado em uma reunião pedagógica do mesmo instituto, lócus para a ocorrência de eventos de formação planejados institucionalmente. Como veremos, de modo complementar à ação formativa projetada pela coordenação pedagógica, a contingência das interações provê relevância aos eventos segundo a perspectiva dos participantes e de acordo com sua experiência no tópico. A experiência funciona como um critério tácito na formação no instituto, isto é, em certas ocasiões algum participante pode orientar o trabalho dos outros visando à oportunidade de formação que participantes menos experientes possuem em um determinado tópico.

No excerto a seguir, os participantes estão em uma reunião pedagógica. Sônia propõe que a reunião seja em pequenos grupos, pois há demandas a serem resolvidas, especialmente relacionadas à adoção do livro didático. O instituto adotou por muitos anos o livro Avenida Brasil 1 e 2, o qual, com sua divisão de doze lições em cada um, em um total de vinte e quatro, possibilitou a divisão do curso em seis níveis, cada um com quatro lições. Com a adoção do Novo Avenida Brasil 1, 2, 3, a estrutura dos níveis mudou, e cada um passou a ter apenas três lições até o quarto nível e quatro lições nos níveis finais. Além disso, a nova edição do Avenida Brasil modificou a disposição de algumas lições, o que acarretou a necessidade de readequação das provas que os professores utilizavam. É nesse contexto que é proposta a pauta da reunião: revisão e reelaboração de instrumentos de avaliação.

Excerto II
Então, gente, vamos nos dividir

Sônia está gerenciando a reunião e designa pequenos grupos de trabalho para o cumprimento de diferentes tarefas. Sônia pede confirmação a Flávia e Karen sobre o que vão trabalhar, e ela mesma confirma, os elementos provocadores do exame Celpe-Bras (linhas 4 e 5) para utilização destes nas provas orais do instituto. Jaqueline vai trabalhar com Augusto na elaboração de uma prova escrita. Em meio a um clima bastante descontraído de início de reunião, onde conversas paralelas sobre assuntos variados estão se desenvolvendo e o cartão de aniversário de uma funcionária circula para que todos assinem, Sônia vai gerenciando e designando tarefas. Ela verifica de quais materiais cada um dos professores dispõe, conversa com um e com outro, tira dúvidas de Augusto.

Karen e Flávia trabalham no mesmo grupo, por designação de Sônia, mas não ficarão sozinhas nesse trabalho. Sônia, após verificar que Caroline não trouxe materiais para a reunião, que se depreende tratar de provas escritas dos níveis que ela ensina, designa a professora para trabalhar com as duas colegas. Karen e Flávia têm um trabalho a fazer e uma colega para acompanhá-las. A designação por parte de Sônia tem uma motivação explícita: Caroline não conhece os elementos provocadores do Exame Celpe-Bras (linhas 17 a 20). O trabalho específico desse grupo é analisado a seguir.

Na reunião dividida em pequenos grupos, em diferentes salas, Flávia, Karen e Caroline reuniram-se na sala 3.

Excerto III
Vou separar os livrinhos com as fotinhos

Flávia lidera o trabalho e conta episódios sobre as aplicações orais do exame. O material se encontra desorganizado, e é ela quem decide as prioridades. O trabalho de Flávia é cooperativo, pois presta atenção no que as colegas estão fazendo e oferece ajuda quando percebe dúvidas no trabalho das outras. O início do trabalho das professoras centra-se na organização de elementos provocadores. Antes de selecionar, há que organizar. Desse modo, Caroline acaba por ter a oportunidade de manusear e observar o que são elementos provocadores e como o trabalho deve ser realizado. A modalidade de reunião pedagógica em grupos de trabalho não necessariamente tem como meta a formação, mas a formação acontece para participantes como Caroline, que, neste caso, terá seu primeiro contato com um artefato relevante para as reflexões dos professores do instituto. Não cabe neste trabalho aprofundar como o exame Celpe-Bras tem um papel formador decisivo nesse lugar, o que exigiria uma pesquisa com outro foco analítico. No entanto, neste evento de formação, é possível observar que o exame é tacitamente interpretado pelos participantes como um construto de avaliação válido o suficiente para que interfira em suas práticas cotidianas. Toda a atividade é orientada em torno do construto da parte oral do exame. Mesmo que o construto não seja discutido explicitamente, as professoras lidam com o que o exame pressupõe como proficiência oral e com o formato da prova, e sinalizam desejar que tal formato passe a integrar suas práticas de avaliação.

O exame também exerce papel na constituição histórica da professora Flávia como profissional. Ela já é aplicadora da parte oral há muitos anos, e tem muitas vivências nessa função. Relatar a história vivida possibilita a Caroline acesso a um repertório de práticas relevantes para os professores do instituto. Caroline está engajada no trabalho, compreende que a primeira etapa do trabalho se relaciona com organizar conjuntos de elementos provocadores com seus respectivos cadernos de questões, mesmo que a nomenclatura que as outras professoras utilizem se diferencie da sua.

Numa reunião em pequenos grupos de trabalho, relatar experiências é uma prática reconhecida pelos participantes como frutífera para que alguns tenham contato com a história compartilhada do instituto. O compartilhamento das histórias que têm por base as experiências é reforçado por Karen, que, no excerto seguinte, solicita que Flávia dê mais detalhes sobre a história de aplicações do exame Celpe-Bras no instituto.

Excerto IV
E desde quando tem os preparatórios, Flávia

A pergunta de Karen (linha 1) gera uma retomada da história das aplicações a partir da existência dos cursos preparatórios para o exame Celpe-Bras e da experiência de Flávia com o curso (linhas 11 a 13). Os cursos preparatórios são oferecidos no instituto um mês antes da aplicação do exame, e há determinados professores que o ministram. A pergunta de Karen leva Flávia a relatar sua própria história como ministrante de cursos preparatórios e abre espaço para a curiosidade de Caroline de saber mais sobre o funcionamento logístico dos cursos oferecidos pelo instituto. Em eventos como esse as perguntas dos participantes provocam relatos e explicações que, por sua vez, podem gerar novas perguntas. Caroline está em contato com as práticas das duas colegas, com o conhecimento terminológico sobre o exame Celpe-Bras, e também toma conhecimento sobre o significado do exame dentro do instituto, por meio de seus desdobramentos, como os cursos preparatórios. Para Flávia e Karen, sua função de formadoras advém da designação de Sônia de colocar Caroline no grupo porque ambas já têm tempo de experiência como examinadoras. A ação de Sônia de colocar Caroline para acompanhar o trabalho de Flávia e Karen revela que há convicção de que o contato com pares mais experientes oferece oportunidade de formação. Karen provoca o relato de Flávia, que, por sua vez, passa a proporcionar a Caroline o contato com a história de preparar para o exame e com o próprio funcionamento do instituto de oferecer curso preparatório e contar com os professores que conhecem o exame para ministrá-lo.

No excerto seguinte, Karen oferece uma explicação sobre a aplicação da parte oral do exame Celpe-Bras, enquanto Flávia se ausenta. Com a volta de Flávia à sala, Karen solicita à colega que observe seu trabalho de explicar para Caroline, tornando-se central o papel da experiência de cada uma para organizar suas participações na interação como formadora mais experiente (Flávia), formadora experiente (Karen) colocando à prova seu conhecimento para explicar procedimentos à professora iniciante (Caroline).

Excerto V
Tem a parte escrita e depois tem a parte oral

Com a saída de Flávia da sala, Karen passa a se responsabilizar pelo gerenciamento do trabalho. Karen, ao ofertar ajuda, elabora perguntas e as responde (linhas 2, 5, 6, 7 e 8), Caroline se engaja, o que se percebe por meio dos recibos (linhas, 3, 4, 10 e 17) que dá a Karen de que está acompanhando as explicações. O treinamento dos professores aplicadores do exame é recriado e reinterpretado por Karen ao desenvolver sua explicação a Caroline. Em sua explicação, Karen descreve o processo de aplicação e treinamento passo a passo (leitura das fichas dos candidatos, leitura dos elementos provocadores, seleção de elementos provocadores para candidatos). Karen procura dar concretude a sua explicação por meio da escolha de um exemplo prático: uma aluna, possível candidata ao exame, para que o processo de escolha de um elemento fique mais claro para Caroline (linhas 21 a 24).

Os modos de participação são definidos entre as duas participantes, sendo que Karen gerencia uma explicação e Caroline sustenta isso, e a atividade que se interpõe (as explicações de Karen sobre como funciona o Celpe-Bras) é compreendida pelas participantes como fundamental para o bom cumprimento da tarefa de selecionar os elementos para a prova oral. Karen reconhece que, para Caroline, é difícil realizar o trabalho com qualidade sem entender precedentes importantes, como a aplicação do exame. O espaço da reunião pedagógica em pequenos grupos propicia viver a experiência dos professores como formadores e formandos. Karen assume uma postura de formadora e Caroline sustenta tal postura assumindo a de formanda. Com a chegada de Flávia de volta à sala, tais papéis se reatualizam, e Karen passa a ser uma formadora em formação, ao solicitar a Flávia (linhas 70 a 77) que observe suas explicações para avaliar se estão corretas.

Interpretar e narrar a experiência vivida com um dado aspecto que compõe a realidade desse instituto (um posto aplicador do Celpe-Bras) é componente essencial para a formação dos professores com base na prática. A estratégia de Sônia ao escolher os integrantes dos grupos surte efeito pelo modo como os mais experientes gerenciam o trabalho com colegas menos experientes, o que se observa pelo modo como os participantes se engajam em atividades colaborativas para dar ao menos experiente acesso aos modos de funcionamento das práticas vigentes.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

A participação em eventos como os aqui apresentados e discutidos é estruturada em torno do esforço em responder às dúvidas do outro, oferecendo modos de explicar um tópico específico, integrante dos conteúdos curriculares que os participantes devem ensinar em suas aulas, ou na introdução dos menos experientes às práticas do local em questão. Há uma base que possibilita o desenho das ações desempenhadas em um evento de formação: a cultura de que se compartilha o que se sabe. A colaboração pode ocorrer por meio do oferecimento de respostas às dúvidas ou da oferta de uma explicação com base na relevância desta para a prática de outro participante. A relevância da ajuda provida pode ser vista no modo como a participação segue, ou em sinalizações verbais de que se entende o propósito de uma oferta de ajuda. Nóvoa (1995NÓVOA, A. Formação de professores e profissão docente. (1995). In: Nóvoa, A. (Org.). Os professores e a sua formação. 2 ed. Lisboa: Dom Quixote,. ) enfatiza que as experiências dos professores compõem a pedagogia essencial da formação e, conforme o que autores como Pérez Gómez (1995) e Perrenoud (2002PERRENOUD, P. (2002). A Prática Reflexiva no Ofício de Professor: Profissionalização e Razão Pedagógica. Porto Alegre: ARTMED.) propõem, seria desejável que a formação de professores priorizasse a resolução de problemas oriundos da prática, e é isso, juntamente ao compartilhamento de experiências, que pode ser apreciado nos dados. Além disso, em eventos de formação, os problemas não são necessariamente expostos, discutidos e resolvidos em um único evento, mas eles incorporam ações que podem promover a resolução de problemas em uma ou diversas etapas. O evento em que as três participantes trabalham com os elementos provocadores da prova oral do exame Celpe-Bras tem início quando Sônia designa as atividades a serem cumpridas naquela reunião decidindo previamente que o encontro entre Flávia, Karen e Caroline seria produtivo como momento de aprendizagem para Caroline.

Algumas questões devem ser levantadas quanto à proposição de que são os eventos de formação o lócus onde a formação se desenvolve. Primeiramente, os eventos de formação descritos aqui, representativos de uma coleção de 30 eventos selecionados de uma coleção mais ampla, sinalizam que há formação na medida em que os participantes demonstram uns para os outros quais conhecimentos são relevantes para serem aprendidos. Por um lado, há eventos em que uma necessidade de ordem prática e um pedido de ajuda desencadeiam explicações de conhecimentos de ordem teórica, como no dado em que Lúcia e Alberto explanam os usos do infinitivo pessoal a Priscila. Por outro lado, há momentos em que conhecimentos de ordem teórica podem ser mobilizados sem uma necessidade premente de uso em sala de aula ou sem um pedido explícito de ajuda, como no caso do dado em que Karen e Flávia ensinam a Caroline como o exame Celpe-Bras funciona. Além disso, vemos que os participantes mais experientes podem se responsabilizar ou serem responsabilizados pela formação de colegas menos experientes e que definem, na interação, as estratégias de compartilhamento de tais experiências.

O fato de todos os eventos acontecerem no local de trabalho dos participantes e pela demanda sempre presente de uso imediato do conhecimento, uma possível ênfase no tratamento técnico de algum problema logo passa a ser contextualizada e adaptada às necessidades prementes do aqui e agora. Nesse sentido, vale ressaltar, conforme aponta Nóvoa (1995NÓVOA, A. Formação de professores e profissão docente. (1995). In: Nóvoa, A. (Org.). Os professores e a sua formação. 2 ed. Lisboa: Dom Quixote,. ), que a troca de experiências e saberes consolida espaços de formação mútua por meio de um processo constante de reflexividade sobre as práticas. Nos dados aqui analisados, foi possível observar que essas práticas dizem respeito a esse local de trabalho específico, o que implica uma construção da identidade pessoal de ser professor que reflete e refrata o que é valorizado nesse instituto.

Em segundo lugar, seriam necessários mais estudos para confirmar que são as perguntas o que move os eventos de formação. Pelo que podemos ver nos dados até aqui, perguntas são fundamentais, e configuram pedidos de ajuda a participantes legitimados como os mais experientes. No entanto, trabalhos microanalíticos com o foco em aprendizagem poderiam contribuir para uma conceituação mais robusta de eventos de formação, no sentido de incluir na caracterização do evento, além do momento propício para aprender, a evidência de que houve aprendizado.

Procuramos argumentar que eventos de formação são eventos em que os participantes têm o ensino como foco de suas ações. Os eventos analisados sugerem uma visão dos participantes sobre ser professor nesse instituto: o professor é um profissional que conhece as regras gramaticais e o Celpe-Bras, está preparado para explicá-los, e para lançar mão de estratégias de ensino10 10 Nos dados analisados em COSTA (2013), o escopo de ações que os participantes desempenham e de conhecimentos que exibem e compartilham é mais amplo que o apresentado aqui. Estratégias para aplicação de provas orais, elaboração e uso de materiais didáticos em sala de aula, aprendizagens sobre a cultura do local onde a pesquisa foi realizada são outras manifestações que caracterizam os eventos de formação. . Os eventos de formação podem ser vistos, assim, como momentos propícios para aprender a ser professor nesse local de trabalho. Estudiosos como Schön (2000SCHÖN, D. (2000). Educando o Profissional Reflexivo: um novo design para o ensino e aprendizagem. Porto Alegre: ARTMED .) e Nóvoa (1995NÓVOA, A. Formação de professores e profissão docente. (1995). In: Nóvoa, A. (Org.). Os professores e a sua formação. 2 ed. Lisboa: Dom Quixote,. ), fundamentais para a conceituação de formação de professores que adotamos neste trabalho, não diferenciam aprendizagem de formação, e usam os termos em algumas situações como sinônimos. Nos dados discutidos, a relação entre ensinar e aprender a ser professor parece ser bastante estreita, pois, como vimos, as explicações sobre regras e sobre como explicá-las, a apresentação de modelos de como fazer ensinar, os relatos do que foi feito são motivados por problemas comuns e que demandam o uso imediato desse conhecimento para seguir adiante no que os participantes estão fazendo e no futuro muito próximo e concreto das próximas aulas.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

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    » http://www.ibe.unesco.org/fileadmin/user_upload/archive/Publications/educationalpracticesseriespdf/prac06e.pdf
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  • SCHÖN, D. (2000). Educando o Profissional Reflexivo: um novo design para o ensino e aprendizagem Porto Alegre: ARTMED .
  • 1
    Realizado pela Fundação Carlos Chagas, por encomenda da Fundação Victor Cívita.
  • 2
    Adotamos o termo língua adicional, ao invés de língua estrangeira, com base no documento Teaching Additional Languages, do International Bureau of Education/UNESCO (JUDD et al, 2001). Para os autores do documento, a escolha do termo “adicional” em lugar de “estrangeira” enfatiza que nenhuma língua é inferior ou superior à outra, nem tampouco deve ser entendida como substituta da primeira língua de um estudante. Desse ponto de vista, a opção privilegia a perspectiva do usuário, que, ao aprender e usar essa língua, para a realização dos propósitos sociais e interlocuções em que se engajam, a adiciona a outras línguas que já tenha em seu repertório. (SCHLATTER; GARCEZ, 2012).
  • 3
    O Celpe-Bras, Certificado de Proficiência de Língua Portuguesa para Estrangeiros, é outorgado pelo Ministério da Educação do Brasil a candidatos estrangeiros. O exame certifica os níveis Intermediário, Intermediário Superior, Avançado e Avançado Superior, e caracteriza-se por uma perspectiva de uso da linguagem para o desempenho de ações no mundo com um propósito social. As tarefas que compõem as partes escrita e oral utilizam materiais autênticos e integram leitura, escrita, compreensão e produção oral, e não testam gramática e vocabulário separadamente.
  • 4
    Adotamos aqui uma perspectiva de prática social conforme os estudos de Bourdieu (1977), segundo os quais uma prática é um conjunto de ações imbuídas de história e constituído pelas disposições do habitus. Portanto, não podemos assumir que uma prática seja em si um problema, mas que, sim, na contingência das ações há situações problemáticas que são interpretadas desse modo pelos praticantes (sujeitos da prática).
  • 5
    Chamamos a atenção para o fato de que, na definição do que é um evento de formação, os tópicos são uma combinação do que poderíamos chamar de “conteúdos técnicos” (gramática, avaliação e materiais didáticos) e as ações que designam o uso desses conhecimentos nas práticas de sala de aula (apresentar, modelar, relatar, elaborar). Isso aponta para uma caracterização do evento numa perspectiva de racionalidade técnico-prática, ao invés de racionalidades técnica e prática separadamente, conforme proposto por Pérez Gómez (1995) e discutido anteriormente. Embora não seja objetivo deste trabalho discutir a distinção entre conhecimento técnico e conhecimento prático, consideramos importante chamar a atenção para essa decisão, fruto da análise dos dados gerados, e reconhecer que essa questão merece aprofundamento em futuros trabalhos.
  • 6
    Garcez e Salimen (2011) caracterizam “‘Pedir ajuda’ como a ação de um participante direcionar um turno de fala a outro pedindo ajuda para fazer algo que não consegue ou não quer fazer sozinho. O outro participante, então, pode prover ou não a ajuda solicitada”. Entende-se ‘oferta de ajuda’ como uma ação em que “um participante oferece ajuda sem que a ajuda tenha sido solicitada”. (GARCEZ; SALIMEN, 2011, p. 99)
  • 7
    Todos os nomes utilizados no presente artigo são pseudônimos.
  • 8
    As transcrições utilizadas neste trabalho seguem as seguintes convenções: (.) pausa de até um segundo; (..) pausas de mais de 1 segundo, (…) pausas longas, acima de três segundos. Entre parênteses, em itálico constam descrições da cena.
  • 9
    Os elementos provocadores do exame Celpe-Bras são os materiais que servem de base para a interação oral que constitui a Parte Oral do exame. Eles são cartões com propostas de temas de conversa entre entrevistador e candidato retirados de meios de comunicação impressos publicados no Brasil. A seleção de cada três elementos para cada candidato deve se dar com base no questionário respondido por ele no ato da inscrição.
  • 10
    Nos dados analisados em COSTA (2013), o escopo de ações que os participantes desempenham e de conhecimentos que exibem e compartilham é mais amplo que o apresentado aqui. Estratégias para aplicação de provas orais, elaboração e uso de materiais didáticos em sala de aula, aprendizagens sobre a cultura do local onde a pesquisa foi realizada são outras manifestações que caracterizam os eventos de formação.

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    Abr 2017

Histórico

  • Recebido
    04 Ago 2016
  • Aceito
    13 Fev 2017
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