Acessibilidade / Reportar erro

Os alicerces sociopolíticos do cooperativismo de crédito rural solidário na Zona da Mata de Minas Gerais

Resumos

O objetivo deste artigo é analisar processos e estruturas sociais que sustentaram e condicionaram a constituição e a atuação das cooperativas de crédito vinculadas ao sistema Ecosol na Zona da Mata Mineira. A coleta de dados ocorreu em 2010 nos municípios onde a Ecosol possui unidades de atendimento: Araponga, Tombos, Espera Feliz, Divino e Simonésia, por meio de observação participante, análise documental e aplicação de entrevistas semiestruturadas. Os principais atores e fatores identificados como alicerces sociopolíticos dessas cooperativas foram: mística e religiosidade, introduzida por setores da Igreja Católica, que interferiu diretamente nas representações sociais e manifestações simbólicas que orientaram as intervenções para uma mudança da realidade; a política, marcada pelo movimento sindical e partidário (Partido dos Trabalhadores); e a técnica e estilo de vida, consolidados a partir da adoção de um projeto de agricultura sustentável e desenvolvimento alternativo introduzida por uma ONG.

Cooperativas de crédito; agricultura familiar; redes sociais


The objective of this paper is to analyze processes and social structures that supported and conditioned the constitution and actuation of credit unions linked to the system Ecosol at Zona da Mata Mineira. Data collection occurred in 2010 in the municipalities where the Ecosol has service units, Araponga, Tombos, Espera Feliz, Divino and Simonésia, through participant observation, document analysis and application of semi-structured interviews. The main actors and factors identified as socio-political foundations of these cooperatives were: mystical and religious, introduced by sectors of the Catholic Church, which directly interfere in the social representations and symbolic manifestations that guided interventions for a change of reality; politics, marked by the union movement and party (Workers Party); and the technical and lifestyle, consolidated with the adoption of a project of sustainable agriculture and alternative development introduced by an NGO.

Credit unions; family farms; social network


Os alicerces sociopolíticos do cooperativismo de crédito rural solidário na Zona da Mata de Minas Gerais

Alair Ferreira de FreitasI; Alan Ferreira de FreitasII

IDoutorando em Administração pela Universidade Federal de Minas Gerais. E-mail: alairufv@yahoo.com.br

IIProfessor do Departamento de Administração e Contabilidade da Universidade Federal de Viçosa (MG). E-mail: freitasalan@yahoo.com.br

RESUMO

O objetivo deste artigo é analisar processos e estruturas sociais que sustentaram e condicionaram a constituição e a atuação das cooperativas de crédito vinculadas ao sistema Ecosol na Zona da Mata Mineira. A coleta de dados ocorreu em 2010 nos municípios onde a Ecosol possui unidades de atendimento: Araponga, Tombos, Espera Feliz, Divino e Simonésia, por meio de observação participante, análise documental e aplicação de entrevistas semiestruturadas. Os principais atores e fatores identificados como alicerces sociopolíticos dessas cooperativas foram: mística e religiosidade, introduzida por setores da Igreja Católica, que interferiu diretamente nas representações sociais e manifestações simbólicas que orientaram as intervenções para uma mudança da realidade; a política, marcada pelo movimento sindical e partidário (Partido dos Trabalhadores); e a técnica e estilo de vida, consolidados a partir da adoção de um projeto de agricultura sustentável e desenvolvimento alternativo introduzida por uma ONG.

Palavras-chaves: Cooperativas de crédito, agricultura familiar, redes sociais.

ABSTRACT

The objective of this paper is to analyze processes and social structures that supported and conditioned the constitution and actuation of credit unions linked to the system Ecosol at Zona da Mata Mineira. Data collection occurred in 2010 in the municipalities where the Ecosol has service units, Araponga, Tombos, Espera Feliz, Divino and Simonésia, through participant observation, document analysis and application of semi-structured interviews. The main actors and factors identified as socio-political foundations of these cooperatives were: mystical and religious, introduced by sectors of the Catholic Church, which directly interfere in the social representations and symbolic manifestations that guided interventions for a change of reality; politics, marked by the union movement and party (Workers Party); and the technical and lifestyle, consolidated with the adoption of a project of sustainable agriculture and alternative development introduced by an NGO.

Key-words: Credit unions, family farms, social network.

Classificação JEL: Z1, Z13.

1. Introdução

A partir da década de 1990, o cooperativismo de crédito brasileiro viu surgir experiências inovadoras no meio rural. Um exemplo são as chamadas cooperativas de crédito rural solidárias, que atuam exclusivamente com populações rurais de baixa renda. Segundo Búrigo (2006), além de demarcar um campo político próprio de articulação que emergiu dentro do cooperativismo brasileiro, o termo "solidárias" pretendeu sinalizar um conjunto de procedimentos e princípios que orientam essas organizações. Esse tipo de cooperativa, portanto, busca se diferenciar de outros tipos tradicionais de cooperativas de crédito, focando no público de baixa renda e buscando modelos de governança que permitam manter a proximidade entre a gestão e os cooperados e a flexibilidade da concessão do crédito conjugada com taxas mais adequadas à realidade financeira daquele público.

Esse modelo de cooperativa se insere no campo da Economia Solidária no Brasil, que envolve um conjunto de empreendimentos econômicos de iniciativa coletiva que privilegiam o trabalho em detrimento do capital (SINGER, 2003). A Economia Solidária parte do princípio de uma organização administrativa autogestionária, ancorada em um ideal de democracia econômica e gestão coletiva (FRANÇA FILHO e LAVILLE, 2004). Valores como a solidariedade, cooperação, autonomia e ajuda mútua são componentes fundamentais e estruturantes das formas de organização dos empreendimentos econômicos solidários. Assim, além da dimensão econômica de uma instituição financeira, que caracteriza as cooperativas de crédito rural solidárias, a partir da qual são monitoradas pelo Banco Central do Brasil, elas carregam uma dimensão sociopolítica bem delineada por sua "perspectiva solidária".

Essa perspectiva é lastreada em sua origem, que remete ao período de redemocratização do País, entre os anos 1980 e 1990. O processo de surgimento destas cooperativas é protagonizado por movimentos populares rurais, sindicatos de trabalhadores rurais e setores vinculados à Igreja Católica. Estava em pauta nas mobilizações a exclusão financeira das populações rurais, a falta de políticas de crédito rural específicas ao segmento e a "bancarização" das cooperativas de crédito, representando um movimento histórico de vinculação das cooperativas de crédito a uma estrutura centralizada e excludente, especialmente quando ligadas a grandes cooperativas agroindustriais (BÚRIGO, 2007). Portanto, a organização sociopolítica precede a organização econômica.

O caso do sistema Ecosol em Minas Gerais é emblemático neste sentido. Com o apoio irrestrito do movimento sindical rural, constituíram-se duas cooperativas, uma no município de Araponga (Ecosol Araponga), em novembro de 2004, e outra no município de Tombos (Ecosol Zona da Mata e Leste de Minas - Ecosol ZM), em fevereiro de 2005. Posteriormente, a cooperativa sediada em Tombos se expandiu e criou postos de atendimento ao cooperado (PACs) em Catuné, distrito de Tombos, e nos municípios de Espera Feliz, Simonésia e Divino, e a Ecosol Araponga permaneceu restrita ao município de Araponga. São cooperativas em que os agricultores familiares, além de donos e usuários, são também seus dirigentes e gestores. Tendo esse público como alvo exclusivo, estas organizações trabalham com um nicho de mercado pouco explorado por outras instituições financeiras e historicamente negligenciado pelas políticas públicas de crédito rural.

No caso das cooperativas do sistema Ecosol/MG, mesmo frente às limitações para seu crescimento e sustentabilidade, elas estão conseguindo resultados importantes no que concerne a capilaridade dos serviços financeiros. A Ecosol alcançou, em julho de 2010, 1.549 sócios, que mantinham R$ 649.591,65 depositados nesse período, e R$ 428.003,50 estavam emprestados (DADOS DA PESQUISA, 2010). São números modestos para uma instituição financeira, mas quando contextualizados para a realidade de um público rural de baixa renda representam valores significativos. Existe, porém, um grande potencial de crescimento para essas organizações, no sentido de ampliarem sua participação no mercado de microfinanças no meio rural dos municípios em que atuam, já que essas modalidades de serviços financeiros dificilmente são ofertadas em condições adequadas àquele público por outro tipo de instituição financeira.

Destaca-se, assim, que a Zona da Mata sedia as duas únicas cooperativas do sistema Ecosol em MG, o que suscita indagações sobre esta particularidade, que parece estar associada à trajetória histórica dos agricultores familiares da região. Torna-se relevante, então, analisar os processos sociais e históricos sobre os quais se edificam e se modificam essas organizações, considerando a história particular que fundamentou sua constituição para compreender o "tornar-se", buscando superar uma análise reificada e estática sobre seu "estado de ser". Neste sentido, alguns questionamentos orientaram o desenvolvimento deste trabalho: Sobre que contexto sociopolítico emergiram essas cooperativas? Processos históricos de cooperação antecederam sua constituição? Como eles influenciaram a constituição e o funcionamento das cooperativas de crédito? Quais atores sociais estiveram envolvidos nesses processos?

A partir destes questionamentos centrais, o objetivo geral desse artigo é analisar os processos e estruturas sociais que sustentaram e condicionaram a constituição e a atuação das cooperativas de crédito rural solidárias na Zona da Mata Mineira, sinalizando os principais fatores que denotam a construção social desse modelo "alternativo" de cooperativismo de crédito nesta região. Não se trata, assim, de descrever e analisar a situação atual das cooperativas mineiras, mas compreender seus antecedentes. Pondera-se aqui que os processos sócio-históricos são fundamentais para se compreender a dinâmica e a atualidade de uma organização, estando esta questão no âmago dos estudos das origens sociais dos fenômenos econômicos. Considerando-se a história como o curso da ação empreendida pelos indivíduos, não atomizados, mas sujeitos, as organizações e as estruturas sociais, definidas como padrões de interação e comportamentos mais ou menos institucionalizados, podem ser compreendidas como socialmente construídas (BERGER e LUCKMANN, 1996).

O acesso ao crédito para os segmentos sociais de baixa renda, especialmente no meio rural, e a mobilização de poupança para investimento nas pequenas localidades têm sido tradicionalmente um gargalo para o desenvolvimento rural (CAZELLA e BÚRIGO, 2009). Estas cooperativas podem ser um mecanismo eficiente de superação desta limitação, entretanto, elas não se criam espontaneamente, nem alcançam estabilidade e legitimidade no mercado financeiro facilmente. É de grande relevância entender, portanto, como elas surgem e quais são os fatores que interferem em seu desenvolvimento.

Para apresentar os resultados da pesquisa, esse trabalho está organizado em seis seções, além desta introdução. Na próxima seção é apresentada a fundamentação teórica que orientou a investigação. A seção quatro traz a análise do papel do movimento das Comunidades Eclesiais de Base (CEBs)1 1 Quando mencionado "movimento das CEBs", referencia-se seu caráter dinâmico e processual, sempre se (re)construindo a partir das mobilizações sociais, envolvendo atores, práticas e processos ao longo de sua atuação. Essa caracterização é feita também para contrapor uma visão estática das CEBs como entidade, que acaba por limitar seu potencial de mudança e homogeneizar os atores que lhe constituem. e sua influência na organização social de agricultores familiares. Na quinta seção analisa-se a construção social das formas organizacionais da agricultura familiar na Zona da Mata Mineira e dos mercados de microfinanças rurais. Por fim, são apresentadas algumas conclusões da pesquisa.

2. Fundamentação teórica

Como fundamento teórico para as análises empíricas buscou-se referência na Nova Sociologia Econômica (NSE), com o propósito de compreender fatores sócio-históricos que influenciaram a forma e as práticas de organizações cooperativas de crédito vinculadas à agricultura familiar. A NSE contribui diretamente para a análise das estruturas de relacionamento e das bases sociais e simbólicas dos mercados e das organizações. Diferentemente de abordagens baseadas no determinismo econômico e no individualismo metodológico, a NSE sublinha as relações entre os atores e seu papel na mediação de ações econômicas e na modelagem das instituições.

Na NSE, datada principalmente a partir dos anos 1980, Mark Granovetter emerge como um dos autores de maior destaque internacional. Ele toma emprestado de Karl Polanyi a noção de que a economia está enraizada em instituições econômicas e não econômicas, considerando que, além de objetivos econômicos, os atores perseguem objetivos sociais, como reconhecimento, poder e sociabilidade (POLANYI, 2000). Segundo Raud-Mattedi (2005), a filiação intelectual de Granovetter se restringe nisso, pois ele recusa a clivagem estabelecida por Polanyi entre sociedades tradicionais, com economia embutida, e modernas, com economia autônoma.

Para Granovetter, a maior parte do comportamento humano (inclusive as atividades econômicas nas sociedades modernas) encontra-se profundamente enraizada (embedded) em redes sociais, questionando abordagens ortodoxas que caracterizavam o indivíduo como subsocializado ou supersocializado (GRANOVETTER, 1985). Esta perspectiva gera subsídios essenciais para compreender, de acordo com Fligstein (2003), que os atores envolvem-se em ações sociopolíticas e constroem culturas locais que orientam a sua interação numa trama de relações concretas e contextualizadas. Sob esse aporte, a noção de enraizamento social (social embeddedness) nos trará um enfoque particular para a compreensão da trama de relações sociais que sustentam as cooperativas de crédito.

A perspectiva de Granovetter descortina a dimensão estrutural da sociedade ao enfatizar as redes como categoria analítica na interpretação dos fenômenos econômicos. Para Steiner (2006), esta perspectiva "[...] propõe uma descrição original do alicerce social das relações mercantis; da mesma forma, desponta como uma configuração irrepreensível das relações sociais que garantem a articulação entre os agentes no mercado" (p. 41).

Frente a essa abordagem deve-se elucidar o papel das relações sociais na modelagem das instituições e como as instituições orientam essas relações. Ressalta-se que as instituições resultam das interações sociais, são estruturas e práticas regulativas, normativas e cognoscitivas que dão estabilidade, significado e coerência ao comportamento social (SCOTT, 1995). Enquanto as organizações caracterizam-se como estruturas e práticas que permitem o funcionamento das instituições, são entidades construídas em torno de processos definidos que asseguram o alcance de objetivos definidos (SCOTT, 1995). As instituições, dessa forma, podem ser formais ou informais e são socialmente construídas. Parafraseando Abramovay (2004b), o importante neste trabalho é mostrar as instituições não como premissas, mas, antes de tudo, como resultados das interações sociais.

Com efeito, as redes sociais importam para a construção e a modelagem de instituições. Elas podem transmitir regras definidas de comportamento convencionadas em certos grupos sociais e, por isso, influenciam diretamente as organizações e suas dinâmicas. O não cumprimento de convenções coletivas pode resultar em sanções que podem ser subjetivas, como a repressão moral ou o desprezo. A confiança, por exemplo, pode ser uma forte marca das relações sociais, que determina padrões de interação e certas regras tácitas, respeitando os acordos e elementos que a motivaram e a sustentam.

Redes sociais constituem padrões de relações que existem porque ações individuais (e também coletivas) colocam os atores (indivíduos ou organizações) em contato. A estrutura das relações sociais que tece contatos continuados configura, portanto, uma rede social. A operacionalização empírica das redes sociais, como argumenta Marques (2007), parte de que estas sejam concebidas como representações analíticas dos contextos e padrões de relações que circunscrevem uma dada situação social.

De acordo com Granovetter (1973), redes sociais são compostas por diferentes tipos de vínculos entre os atores, que podem se distinguir em laços fortes ou laços fracos, de acordo com a intensidade do vínculo, e também por seu conteúdo. Para este autor, "[...] a força de um laço é uma combinação (provavelmente linear) de tempo, intensidade emocional, intimidade (confiança mútua) e os serviços recíprocos, os quais caracterizam esse laço" (GRANOVETTER, 1973, p. 1361, tradução dos autores). Laços fracos (weak ties) são aqueles vínculos definidos por pouca frequência nos contatos (colegas, amigos dos amigos, conhecidos etc.), mas que oferecem às pessoas acesso a informações e recursos além daqueles disponíveis em seu círculo social mais próximo. Os laços fortes são formados por relações de maior frequência e com maior proximidade no círculo de convívio mais íntimo (pais, filhos, cônjuges e amigos) (GRANOVETTER, 1973, 1983).

As conclusões de Granovetter derivaram da observação da mobilidade no mercado de trabalho. O autor considera que os laços fracos são melhores pontes para novos contatos e empregos do que os laços fortes, pois possibilitam informações inovadoras e não superpostas. Ao generalizar esta descoberta, Granovetter defende que o papel dos laços fracos é, com frequência, lançar "pontes locais" entre um conjunto de atores que de outra forma se encontrariam isolados em suas redes sociais particulares ou se relacionariam entre si por meio de desvios estruturais mais longos, ou seja, por meio de contatos indiretos mediados por uma série de outros atores (LEMIEUX e OUIMET, 2008).

Outros estudos alegam que existem certos níveis de solidariedade que vinculam os membros de uma rede social (FERRARY, 2003). A solidariedade é expressa na natureza do conteúdo que flui (informações, afeições e recursos), pois pode alterar a natureza das próprias trocas (materiais ou imateriais) efetuadas ao longo da rede. As redes sociais podem permitir, consequentemente, descrever e explicar as interações entre os indivíduos, vínculos entre organizações e também as relações no interior de grupos.

Um conceito bastante operacional de rede social é apresentado por Castilla et al. (2000, tradução dos autores), definindo-a como "[...] um conjunto de 'nós' ou atores (pessoas ou organizações) ligados por relações sociais ou vínculos de um tipo específico" (p. 219). Nesse sentido, as relações em uma estrutura de rede têm sempre força e conteúdo, que podem incluir informações, conselhos, amizade, interesse partilhado e algum nível de confiança.

Como um elo para as redes sociais, a confiança2 2 Alguns autores consideram a confiança como um capital social (FUKUYAMA, 1996). Entretanto, não será aprofundada aqui a discussão da noção de capital social, apesar de sua importância teórica. Tendo em vista a complexidade de se delimitar um conceito de capital social, devido à amplitude e diversidade de abordagens, optou-se por não aprofundar, e sim tratar paralelamente dois conceitos que, com frequência, aparecem como atributos do capital social: redes sociais e a confiança. torna-se, então, fundamental na construção das atividades econômicas e dos mercados. A manifestação da confiança pelos atores econômicos ocorre principalmente quando, em situações de baixa informação e incerteza, expõem-se apesar disso aos riscos, porque têm razões para acreditar que os atores com quem transacionam não tirarão proveito desta oportunidade (LOCKE, 2001). Assim, a confiança parte de uma predisposição dos atores em situações de incerteza, ao sustentarem expectativas positivas sobre os comportamentos futuros dos outros atores com quem se relacionam.

Como assinala Gambetta (1988), confiança e interação podem promover condições favoráveis à honestidade e à cooperação, influenciando, assim, as relações econômicas3 3 A confiança, no entanto, não elimina comportamentos oportunistas ou o rompimento das expectativas positivas dos atores, pois confiar pressupõe a exposição dos mesmos e esta vulnerabilidade pode resultar em consequências danosas a alguma das partes. . Para o autor, a reputação de "ser confiável", produzida nessa interação, se reforça mutuamente na busca de interesses comuns. A reputação, como um elemento constituinte da confiança, pode ser considerada um ativo intangível das relações econômicas, pois sua perda pode incorrer em custos para os atores, na medida em que limita a confiança e exige a intervenção de mecanismos formais (e mais custosos) de controle. Não se trata de uma abordagem instrumental sobre a confiança, no sentido de sua "economização", mas de indicar relações entre o nível de confiança entre os atores e o grau de controle necessário sobre as transações nos mercados.

Esta breve síntese resulta em um pano de fundo para se alcançar uma das principais contribuições da sociologia econômica, o estudo da origem social dos fenômenos econômicos, de fato pertinente aos propósitos deste artigo. Como assinala Steiner (2006), a preocupação não é apenas revelar um conjunto de representações, instituições, normas e valores que salientam comportamentos egoístas e sistemas mercantis, mas, sim, relações sociais cuja lógica não é econômica, mesmo quando elas facultam aos mercados funcionalidades. Trata-se, pois, de revelar os processos e relações sociais que estão na origem dos fenômenos econômicos e que, por isso, os condicionam. Mesmo uma análise profunda dos mais complexos e competitivos mercados e organizações capitalistas pode indicar sua origem social através da história da constituição de redes, dos contatos informais e da mobilização de certos recursos (sociais, políticos ou econômicos).

O aporte teórico da sociologia econômica, portanto, traz subsídios essenciais para se compreender os processos e estruturas sociais que condicionam a constituição de uma organização. O mercado de microfinanças, a organização cooperativa, o gerente financeiro, a transação financeira são produtos de uma construção social, de maneira que não é possível descrever adequadamente essas questões "econômicas" sem considerar que foram mediadas por rela

ções sociais e que possuem sua historicidade. Assim, sem tentar opor o "social" e o "econômico", busca-se aqui sua integração para desvelar os alicerces sociopolíticos do cooperativismo de crédito rural solidário na Zona da Mata Mineira. A abordagem sociológica dos fenômenos econômicos adotada neste trabalho visa destacar uma dimensão relacional e processual na constituição das organizações, operando nas análises os condicionantes "sociais" e "políticos" que definem o "econômico" e o "organizacional".

3. Métodos de pesquisa

Para analisar processos sociais e históricos que influenciaram a constituição e a atuação das cooperativas de crédito do sistema Ecosol em Minas Gerais, o método de pesquisa escolhido é o estudo de caso, de natureza qualitativa e exploratória. O estudo de caso busca uma ampla descrição e explicação dos muitos componentes de uma determinada situação social, com vistas à compreensão da natureza dos fenômenos que a compõem e que lhe dão sentido (BABBIE, 1992). Partindo do pressuposto da particularidade das cooperativas do sistema Ecosol em MG e da realidade sobre a qual emergiram, o estudo de caso se mostrou mais adequado ao permitir aprofundar as análises ao nível dos elementos subjacentes que condicionaram a trajetória histórica do cooperativismo na agricultura familiar da Zona da Mata Mineira.

A coleta de dados da pesquisa foi realizada nos meses de agosto e setembro de 2010 nos municípios onde as cooperativas têm unidades de atendimento aos cooperados: Araponga, Tombos (incluindo o distrito de Catuné), Espera Feliz, Simonésia e Divino. Como instrumentos de coleta de dados foram utilizados a observação participante, entrevistas de roteiro semiestruturado e a pesquisa documental, os quais se mostraram potencialmente complementares e permitiram mobilizar um material empírico significativo.

Os documentos coletados e analisados incluem sistematizações e registros produzidos no âmbito de atuação das cooperativas e de organizações ligadas a elas (como os sindicatos de trabalhadores rurais - STRs e o Centro de Tecnologias Alternativas da Zona da Mata Mineira - CTA) e documentos de normatização e controle interno. A observação participante foi realizada em 13 ocasiões de reunião do sistema Ecosol/MG e de organizações parceiras, dentre planejamentos, reuniões de conselhos administrativos e capacitações de cooperados, visando verificar manifestações simbólicas sobre o passado, identificando remições à trajetória da agricultura familiar, do movimento sindical, da Igreja Católica, e de outros elementos que contribuíssem para compreender os antecedentes sócio-históricos das cooperativas. Todas as observações foram registradas em um "caderno de campo", que se tornou importante instrumento de coleta de dados, onde foram anotadas as falas, comportamentos e atitudes dos sujeitos da pesquisa.

Outro instrumento utilizado foram as entrevistas focalizadas ou focused-interview (MERTON, FISKE e KENDALL, 1998), que têm como principal função centrar a atenção do respondente sobre a experiência concreta que se pretende abordar a partir da delimitação de pontos ou aspectos que merecem relevância para o encadeamento da argumentação. Por este aspecto, seguiu-se um roteiro semiestruturado, elaborado com base na análise documental e nas referências teóricas. Foram elaborados três roteiros distintos, direcionados a cooperados, dirigentes das cooperativas e dirigentes da Base de Serviços Ecosol/MG4 4 A Base de serviços Ecosol/MG possui formato legal de associação e tem a função de dar suporte técnico às cooperativas, desde assessoria contábil à articulação política. , por representarem sujeitos com diferentes envolvimentos na trajetória das cooperativas e de outras organizações locais e formas de liderança distintas. Os roteiros de entrevista foram submetidos a um pré-teste para avaliar sua eficácia, e as questões que geraram ambiguidade foram readequadas para a realização das entrevistas definitivas. A seleção da amostra levou em consideração os critérios de acessibilidade (facilidade de acesso aos informantes) e exaustão (repetição e reincidência das informações), sendo, assim, critérios não probabilísticos (VERGARA, 1998). No total, foram realizadas 39 entrevistas com cooperados e dirigentes, sendo que nove não foram gravadas por solicitação dos entrevistados. Todos os entrevistados eram vinculados a alguma outra organização local de agricultura familiar, principalmente aos STRs. Do total de entrevistados, 21 declararam ser sócios-fundadores das unidades às quais estavam vinculados.

Como técnica de organização e análise dos dados utilizou-se a "análise de conteúdo". Para Bardin (2011), a análise de conteúdo pode ser caracterizada como um conjunto de técnicas de análise das comunicações que utiliza procedimentos sistemáticos e objetivos de descrição do conteúdo empírico que permitam inferências sobre as condições de produção de significados e sentidos que os atores sociais exteriorizam no discurso.

A análise de conteúdo seguiu quatro etapas (BARDIN, 2011): organização da análise, codificação, categorização e inferência. A organização da análise visou sistematizar as ideias iniciais e explorar o material coletado, dando tratamento aos dados brutos, tornando-os mais significativos e inteligíveis para os propósitos da pesquisa. A codificação foi o processo pelo qual os dados foram alocados em unidades, permitindo o recorte e a descrição das características pertinentes do conteúdo. O recorte de conteúdos teve a finalidade de agrupar elementos em função de seu significação, seguindo uma proximidade de sentido, agrupando fragmentos do discurso e ideias temáticas similares.

A categorização buscou classificar os componentes do conteúdo por diferenciação e, em seguida, reagrupou-os segundo sua similaridade. Para Bardin (2011), as categorias são rubricas ou classes, que reúnem um grupo de elementos sob um título genérico, agrupados em função de características comuns entre eles. Adotou-se aqui o critério de categorização por temáticas, agrupando temas relacionados a questões específicas priorizadas pelos pesquisadores. As categorias mobilizadas para este artigo foram: (1) a atuação da Igreja Católica no meio rural por meio das comunidades Eclesiais de Base - CEBs; (2) o mercado de microfinanças rurais e (3) as formas organizacionais da agricultura familiar. Por fim, a fase de indução diz respeito à análise dos dados categorizados para inferir sobre as predisposições causais, os aspectos relacionais e estruturais que compõem os fenômenos analisados, destacando elementos importantes para balizar a discussão teórico-empírica. A análise dos dados se deu de forma integrada, explorando analiticamente cada categoria constituída, de forma que pudesse ser realizado o cotejo das informações. Simultaneamente, construíram-se relações entre o sistematizado pelo campo e as definições conceituais que orientavam a pesquisa, buscando definir e organizar uma linha de argumentação coerente com o objetivo proposto.

4. Resultados e discussão

4.1. As Comunidades Eclesiais de Bases e suas influências na Zona da Mata Mineira

Nas primeiras incursões exploratórias da pesquisa foi possível perceber a influência significativa de setores da Igreja Católica na organização socioeconômica no meio rural dos municípios onde se constituíram as cooperativas de crédito do sistema Ecosol. Os depoimentos sobre as denominadas Comunidades Eclesiais de Base (CEBs) reiteradamente convocavam a (re)visitar o processo histórico de organização da agricultura familiar e de sua atuação política.

Historicamente, a Igreja Católica desempenhou um papel relevante à sociedade brasileira, principalmente ao lado da classe dominante, com a qual buscava legitimar a ordem e as hierarquias estabelecidas. Na Zona da Mata Mineira não foi diferente. O domínio dos grandes fazendeiros era legitimado pela ação da Igreja, que mediava as relações verticais com os agricultores. De acordo com Cintrão (1996), "[...] Os agricultores da zona da mata se lembram que, até os anos 70, até mesmo a relação com os padres passava quase que exclusivamente pelos fazendeiros: os padres frequentavam apenas as casas dos fazendeiros e as missas eram celebradas nas capelas das fazendas" (p. 56).

Entretanto, segundo Azevedo (2004), é perceptível que em certo momento de sua trajetória a Igreja Católica tentou integrar-se, cada vez mais, à sociedade civil e aos movimentos sociais. O principal reforço institucional nessa direção provém das Conferências Episcopais Latino-Americanas, realizadas em Medellín, Colômbia, em 1968; em Puebla, México, em 1979, e em Santo Domingo, República Dominicana, em 1982. Para o autor, a prática gerada por esse processo leva a Igreja a direcionar a sua atuação, na sociedade brasileira, a partir da situação dos pobres e dos excluídos.

Nesse contexto floresce no Brasil o movimento das CEBs, promovidas desde a Conferência de Medellín,que integram o que Azevedo (2004) discutiu como componentes políticos da atuação da Igreja Católica Apostólica Romana no Brasil. De acordo com Gomes e Andrade (2011), a atuação política da Igreja Católica foi reforçada por estímulos da Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB), que estimulou o clero das dioceses a vivenciarem processos de renovação eclesial e de atuação social, desenvolvendo, neste contexto, as CEBs e as pastorais sociais, como a pastoral da terra e a pastoral operária; elementos históricos que transformaram radicalmente o quadro das relações vivenciadas antes pela Igreja.

As CEBs se constituem como congregações católicas nos quais o clero e os agentes pastorais eram engajados, de uma forma ou de outra, em esforços para despertar a consciência política e social. Outro aspecto característico das CEBs foi a presença de pequenos grupos de reflexão, principalmente no meio rural, nos quais seus membros liam a bíblia juntos e discutiam suas implicações no que diz respeito ao dia-a-dia de suas vidas (BURDICK, 1996).

Pode-se identificar, com base em Petrini (1984), três principais fatores que deram suporte ao dinamismo dessa atuação política da Igreja Católica e ao trabalho das CEBs: (i) Utopia; (ii) Método e (iii) Ideologia, os quais implicitamente também aparecem em Burdick (1996). A utopia revelou-se a fonte da crítica radical à realidade social, política e econômica, pois evocava critérios éticos e religiosos com os quais eram comparados e julgados todos os aspectos da realidade, inclusive a submissão e a exploração dos grupos e indivíduos em vulnerabilidade. O método utilizado pelas CEBs para realização dos trabalhos de base edifica-se sobre o princípio de aproximações progressivas entre os filhos de Deus para a construção de seu Reino. Trata-se da própria vida em comunidade, baseada em relações solidárias e de corresponsabilidade assumidas pelos membros com o enfrentamento dos conflitos (externos e internos), normalmente discutidos e avaliados no seio da comunidade. A ideologia se edificava sobre a crença religiosa com seus valores, seu horizonte transcendente e seus livros sagrados, por um lado, e a realidade social, cada vez mais desmistificada, por outro.

No meio rural da Zona da Mata Mineira, a intervenção das CEBs foram de fato marcantes, desencadeando uma série de mudanças na estrutura social e nas relações de poder, constituindo novas relações políticas e engendrando processos de organização. De acordo com Silva (2010), essa foi uma região de domínio de fazendeiros em que as relações políticas eram entremeadas pelas relações entre oligarquias rurais. Tais oligarquias, na expressão maior de domínio dos fazendeiros, se impunham como orientação social e política das dinâmicas das relações sociais e das organizações de trabalhadores no meio rural. A atuação das CEBs frente a essa elite dominante inicia-se na base popular com um processo de aproximação da realidade que era chamado de "conscientização", indicado também com as palavras "acordar" ou "despertar" para a realidade. A formação das comunidades atinou a reflexão dos agricultores da região em busca de mudanças, assim como revelado a partir do depoimento abaixo.

Com as CEBs... acontecia culto dominical nas comunidades; ia pessoas de Tombos para fazer o culto na minha comunidade, por exemplo, então lia a palavra de Deus, a bíblia, fazia celebração, rezava, pedia a Deus e tal... Mas foi muito bom. As pessoas começaram a enxergar a vida com outros olhos, juntando fé e vida (Entrevistada 1T, arrendatária, sócia-fundadora da Ecosol Tombos)

5 5 Os informantes foram nominados por meio de um código representado pelo número ordinal de sua entrevista e a primeira letra do município a que pertencem (por exemplo, o primeiro entrevistado de Tombos foi codificado como 1T). Após o código, foram acrescentadas algumas informações que caracterizam o informante.

.

O trabalho das CEBs, em relação às comunidades, reordenou os espaços de convivência e a interação dos trabalhadores rurais a partir de sua realidade local. Essa passagem corrobora a constatação de Burdick (1996) de que "[...] as pessoas estavam tendo sua consciência política despertada pela ação da igreja" (p. 7), que cumpria o papel de fomentar a transformação social e incentivar o espírito de comunidade. O processo de reflexão sobre a realidade era ancorado nos espaços de sociabilidade criados pelas reuniões comunitárias e os contatos pessoais consequentes. A referência comunitária tornou-se palco para emergência de relações de confiança, respaldadas pela fé, em um projeto religioso, e pelas interações sociais, em um projeto político de transformação da realidade desse segmento.

A confiança como mecanismo de coesão comunitária e produto das relações constituídas e reforçadas a partir das CEBs também foi identificada por Petrini (1984), que constatou que:

O grau de convivência e de participação nas vidas uns dos outros, os gestos rituais, os encontros e os trabalhos que são desenvolvidos na comunidade e, especialmente, a comum adesão à mesma crença religiosa, geram clima de confiança que torna possível o acolhimento de juízos e de decisões a respeito da realidade social e política que, de outra forma, seria muito difícil (p. 53).

Como afirmou Gambetta (1988), a confiança é um pressuposto a ser considerado em processos de cooperação e de organização. O desenvolvimento de processos de cooperação, como a formação de organizações locais (sindicatos, associações e cooperativas), é respaldado pela confiança, que sustenta as ações coletivas. Esta é uma herança importante para as cooperativas de crédito, que lidam cotidianamente com o exercício da confiança nas atividades financeiras. Organizações constituídas por trabalhadores rurais, historicamente formados nos movimentos da Igreja Católica, sinalizam a importância das relações de confiança para sua sustentação.

A Ecosol lá em Espera Feliz... É a questão da amizade, da confiança... A gente sabe que quem está lá realmente se identifica com a causa. É o que eu estava falando, é uma cooperativa, em minha opinião, de confiança. Têm pessoas que vieram da base, que sentiram na pele, lá na roça, o que é ser um agricultor. E hoje lá [na cooperativa] procuram dar valor pra quem está no campo, e lutando para que essas pessoas tenham uma vida digna no campo (Entrevistado 2EF, meeiro, sócio do PAC Ecosol Espera Feliz).

O sentido de pertencimento a uma causa, expressado ao se remeter à cooperativa, apregoa também o conteúdo ideológico das organizações formadas pela trajetória de mobilizações das CEBs. A coesão social identificada no grupo que forma as cooperativas é, sem dúvida, uma particularidade que define a dinâmica organizacional. E, como é possível perceber ao retomar a trajetória histórica da agricultura familiar na Zona da Mata, trata-se mesmo de uma processo sociopolítico em que a Igreja Católica teve um papel substantivo.

Associando a religiosidade e a consciência política, e como manifestação destas, verificou-se a importância da mística nos grupos sociais, que é revelada nas reuniões e rituais comunitários, observados durante a pesquisa. A mística, denominação dada pelos próprios sujeitos da pesquisa, neste contexto expressava a reflexão a partir da representação simbólica da realidade e do sentido de união, sempre com um componente religioso característico. Antes de iniciar as reuniões e planejamentos nas cooperativas Ecosol, por exemplo, são realizadas orações e místicas que envolvem reflexões sobre algum aspecto da realidade. Objetos característicos da região e da agricultura familiar; gestos que simbolizavam a cooperação, a partilha de bens e o respeito ao meio ambiente; músicas sobre a terra, a luta política e a autonomia da agricultura familiar; e gritos de ordem eram manifestações simbólicas produzidas nesses espaços de místicas. A passagem a seguir foi extraída do caderno de campo durante a observação em uma oficina de capacitação de cooperados do PAC Ecosol em Espera Feliz e elucida a análise da mística.

Antes de iniciar a reunião foi feita uma mística. Todos se levantaram e, após rezar, estenderam suas mãos, unidas umas sobre as outras, para que a energia fluísse. Todas as reuniões praticamente começam com a mística. As místicas geralmente são feitas com orações. É forte a religião, expressada no cotidiano das práticas das organizações. Percebe-se que as místicas, com embasamento lúdico-político-religioso, possuem forte referência nas orientações das CEBs (Caderno de campo da pesquisa).

As místicas são momentos subjetivos e introspectivos que precedem as discussões e as decisões que compõem a pauta formal das reuniões das organizações locais de agricultura familiar, inclusive as cooperativas de crédito. Algumas místicas chegam a recordar a atuação das CEBs como proponente de uma nova forma de pensar a agricultura e os trabalhadores rurais. São manifestações que fazem parte da cultura destes grupos sociais, comportamentos introjetados no cotidiano dos indivíduos, comunidades e organizações.

Ela [CEBs] nos levou a um conhecimento de base, que é a mística, entendeu? Foi uma formação muito grande. [...] A igreja foi o primeiro passo, depois veio as organizações (sic). Agora, as CEBs, com o trabalho de formação de base, mostram que a mística é o que impulsiona... (Entrevistado 5T, proprietário, sócio-fundador da Ecosol Tombos e ex-presidente do STR de Tombos).

Os agentes eclesiásticos ou agentes pastorais, lideranças que coordenavam os trabalhos comunitários das CEBs e difundiam a mística religiosa, podem ser considerados os tecelões das redes sociais sob as quais emergiram várias outras organizações, como os sindicatos. As CEBs, ao constituírem espaços de interação, propiciavam o estabelecimento de contatos pessoais entre os agricultores que, para além de um momento restrito à prática da fé religiosa, se estendiam às várias dimensões da vida cotidiana (inclusive a econômica), fortalecendo os vínculos sociais.

As redes sociais, como apontado por Granovetter (1985), constituem padrões de relações sociais que possuem força e conteúdo e que permitem a circulação de informações entre os atores. As relações de vizinhança e parentesco são reforçadas pelas interações cotidianas e formam os laços fortes, caracterizados por Granovetter (1983) como de maior intensidade e proximidade entre os atores. No entanto, o movimento das CEBs mantinha uma dinâmica de contato entre as comunidades, no diálogo e reflexão em âmbito municipal e até regional, que se estendeu com a criação dos STRs. Os elos entre as comunidades, estabelecidos por meio de laços fracos (de menor intensidade e frequência nos contatos), foram essenciais para transpor uma ação política restrita à comunidade local, para uma intervenção ampliada e conjunta dos atores sociais envolvidos no movimento.

Segundo Petrini (1984) "[...] o caráter de maior originalidade das CEBs parece consistir justamente na agilidade com a qual se estabelecem os nexos que ligam as pessoas entre si" (p. 142). Essa constatação remete à formação das redes socais, aos contatos estabelecidos por meio dos espaços de sociabilidade criados nas comunidades e destas entre si. Os vínculos sociais constituídos se expandem também para a dimensão simbólica que liga cada pessoa ao contexto social e às problemáticas em comum, de modo que o "pessoal" e o "político" não emergem como contraditórios ou excludentes, nem apenas complementares, mas estritamente ligados.

A expansão das redes sociais e dos trabalhos das CEBs na Zona da Mata Mineira foi potencializada com o surgimento, em meados da década de 1970, do Movimento da Boa Nova (Mobon), que deu nova dinâmica ao trabalho pastoral e político. O Mobon reunia diferentes CEBs em encontros regionais de reflexão, nos quais participavam representantes de cada CEB. Cada representante, ao retornar às suas comunidades, possuíam "missões" a cumprir: levar o que aprenderam para outras CEBs (CINTRÃO, 1996). O Mobon, a partir destas missões e desta dinâmica de trabalho, foi se expandindo, envolvendo paróquias progressistas e CEBs isoladas, aumentando gradativamente a capilaridade da mobilização dos trabalhadores no meio rural. Para Gomes e Andrade (2011), o Mobon reforçou o protagonismo dos leigos, fortaleceu as raízes de uma nova evangelização, de uma nova cultura e de promoção humana a partir de uma visão reinocêntrica. Para estes autores, o importante no movimento era que as pessoas se encontravam e começavam experiências de comunidade, por meio dos relacionamentos pessoais. A dinâmica desses encontros favoreceu o despertar de lideranças.

De acordo com Cintrão (1996),

Extremamente afinado com a "doutrina" das CEBs, o Mobon pregava que 'a fé sem obras é morta', e chamava as pessoas a intervirem na realidade e a se organizarem para diminuir a exploração. Os encontros também serviram para os agricultores descobrirem que havia muitos problemas comuns. Em 1983, o Mobon estava bastante forte, e mais ou menos nesse período começou-se a discutir sobre os diferentes "instrumentos" para intervir na realidade, como as associações e, principalmente, os sindicatos e os partidos políticos (p. 61).

Foi nos encontros do Mobon, com apoio de várias CEBs de municípios da Zona da Mata, que os instrumentos de intervenção na realidade foram se desdobrando das mobilizações sociopolíticas como alternativas da agricultura familiar. Esse movimento ampliou os laços que iriam levar, posteriormente, à organização sindical e a novas formas organizacionais para suprirem as demandas emergentes.

Assim, o movimento pastoral redundou na organização dos agricultores familiares na Zona da Mata, o que promoveu a formação dos STRs em meados da década de 1980. Como organizações de representação política dos trabalhadores rurais, os sindicatos nascem, neste contexto, como demanda do próprio segmento e incorporam os elementos religiosos e místicos. Segundo Silva (2010), na década de 1980 chegaram a ser criados cerca de 15 sindicatos na microrregião de Muriaé (Zona da Mata Mineira), os quais formavam um Polo Sindical e eram marcados por terem lideranças vindas das CEBs6 6 Em um determinado momento da história, o Polo Sindical se dividiu com o afastamento de uma parte dos sindicatos que seguiam uma linha mais "combativa", os quais se retiraram da Federação dos Trabalhadores da Agricultura do Estado de Minas Gerais (Fetaemg) e passaram a integrar a Federação dos Trabalhadores na Agricultura Familiar (Fetraf), que é ligada à Central Única dos Trabalhadores. Silva (2010), ao analisar a trajetória do STR de Espera Feliz, constata esse "racha" no sindicalismo da Zona da Mata Mineira. O STR de Espera Feliz e outros STRs descontentes com a representação da Fetaemg decidiram disputar a direção da entidade, mas o fracasso dessa empreitada levou tais sindicatos, em 2001, a romperem com a Fetaemg e se vincularem a Fetraf. Destacam-se aqui os STRs ligados à Fetraf por serem a maioria do antigo Polo Sindical e por serem os sindicatos que protagonizaram a criação do sistema Ecosol em Minas Gerais. . Nas entrevistas isso também foi relatado: "o Sindicato nasceu nas CEBs. Os primeiros diretores do sindicato faziam parte das CEBs" (Entrevistado 1S, parceiro, coordenador do PAC Ecosol Simonésia, 2010).

Pode-se constatar, portanto, que a atuação basilar da Igreja Católica na Zona da Mata Mineira contribuiu para construir uma racionalidade substantiva que passou a orientar um movimento social e político de autonomização da agricultura familiar como categoria social. Mas os desdobramentos desses processos se expandem para além de uma dimensão política. O surgimento de demandas econômicas atreladas às estratégias de reprodução das famílias implicou na constituição de novas formas organizacionais para suprir formalmente as necessidades da agricultura familiar. À medida que as CEBs vão perdendo sua referência organizacional, novas organizações se edificam sobre esta base sociopolítica, se apropriando dela, resignificando pressupostos e reorientando o movimento político da agricultura familiar na região. A seguir, é analisado o surgimento destas novas organizações e, especificamente para as demandas de acesso a serviços financeiros, a formação do mercado de microfinanças rurais, buscando sublinhar o caráter socialmente construído destas experiências.

4.2. A construção social do mercado de microfinanças rurais e as novas formas organizacionais da agricultura familiar

Resgatando este contexto para a análise das relações econômicas na agricultura familiar da Zona da Mata Mineira, é perceptível a interferência das CEBs na construção social dos mercados, especialmente nos mercados microfinanceiros rurais, em que atuam as cooperativas do sistema Ecosol. Essa perspectiva construtivista busca ressaltar o caráter processual e relacional da formação do mercado de microfinanças, como produto da ação prática dos indivíduos e suas interações sociais no cotidiano das comunidades rurais.

Parafraseando Magalhães e Abramovay (2007) sobre a atuação das CEBs na Bahia, algo inédito foi introduzido pelo trabalho pastoral na vida destas comunidades, a saber, a formação de um novo ethos que se expressa em formas singulares de organização econômica. Esse novo ethos de que tratam os autores é incorporado também por organizações como os STRs para o caso aqui analisado, que surgem como mediadores sociais. Sua presença no meio rural constrói novas referências de representação de classe e reordena as relações de poder.

Magalhães (2005), ao estudar a formação do mercado de microfinanças no sertão da Bahia, se depara com um contexto sócio-histórico similar ao da Zona da Mata Mineira, especificamente com a atuação das CEBs no meio rural e na organização camponesa. O autor constata que o trabalho religioso promoveu a emergência de um modo de ver e de se relacionar que possibilitou a formação de uma racionalidade econômica específica. Essa afirmação não quer dizer que as ações e decisões tomadas no âmbito dos estabelecimentos familiares ou organizações de agricultores familiares sejam sempre guiadas por compromissos religiosos. O referido trabalho conduz à constatação de que existe, sim, uma predisposição psicossocial que vincula os indivíduos a compromissos sociais na vida econômica, os quais encontram fundamento no trabalho religioso.

Estas questões revelam, tanto no trabalho de Magalhães quanto no presente estudo, que a política e a religiosidade são elementos basilares na formação das organizações econômicas da agricultura familiar das regiões estudadas. Isso adiciona ao mesmo tempo a dimensão histórica dos conflitos, inerente aos processos sociais de luta por direitos e de conscientização das classes populares sobre sua exploração. Tais questões fazem parte das regras que orientam também os mercados no meio rural e sublinham, como afirmou Fligstein (2003), a existência de uma pluralidade de relações sociais que estruturam os mercados e as organizações.

Os mercados são entendidos, neste trabalho, como fatos históricos, localizados geograficamente e compostos por entidades vivas, como as instituições (ABRAMOVAY, 2004a). Concorda-se, assim, que os mercados são mediados pelas relações sociais, moldados pela cultura sociopolítica das comunidades e pelas condições ambientais dos espaços em que se manifestam; mercados são produtos da interação social.

Se os mercados são constituídos por atores sociais que estabelecem interações específicas e concretas (ABRAMOVAY, 2004a), as redes sociais, as posições dos indivíduos nas redes e as relações de proximidade os personalizam e moldam as organizações que o constituem. É preciso sinalizar, portanto, o aspecto cultural que marca a construção social dos mercados e das organizações da agricultura familiar (FLIGSTEIN, 2003), evidenciando, no caso aqui analisado, que um conjunto de relações sociais particulares contribuiu para a emergência de estruturas sociais e para delinear as formas organizacionais no meio rural da Zona da Mata Mineira.

As proposições políticas das CEBs e das organizações que lhe são posteriores interferiram no comportamento econômico dos agricultores e em suas intervenções nos mercados e podem ter lhes alterado a própria dinâmica. A formação das organizações locais derivadas das CEBs e dos STRs são elementos importantes nesta análise. Como também observou Silva (2010) para o caso de Espera Feliz, aqueles municípios que mantinham uma forte atuação das CEBs e dos STRs formaram uma série de organizações posteriores para suprir as demandas da agricultura familiar que não cabiam mais aos sindicatos. Estas demandas eram, muitas vezes, de acesso a determinadas políticas públicas, supridas com a criação de associações e, em seguida, de cooperativas. As organizações locais derivadas de um movimento dinâmico de preenchimento de lacunas funcionais [econômicas] dos STRs são a convergência de densas redes sociais. A formação social e econômica que emerge, influenciada pelas CEBs, vai construindo novos arranjos organizacionais e modelando instituições preexistentes para dar conta das novas expressões da agricultura familiar na região.

Esta dinâmica é sublinhada nas entrevistas e é confirmada também por Cintrão (1996) e Silva (2010). Os STRs, por exemplo, interferiram na regulação do mercado de trabalho no meio rural, reorientando as relação de trabalho e a representação política da categoria. As cooperativas de crédito, por sua vez, condicionaram os mercados locais de microfinanças rurais, interferindo na mediação entre os atores e nas relações de dependência financeira.

O primeiro passo para as cooperativas foram as CEBs. Depois das CEBs foram criados os STRs e depois as organizações. Foram as CEBs que incentivaram as pessoas a buscarem alternativas sustentáveis. A partir daí que foi criando a consciência de que era necessário organizar a documentação [trabalhista], aí então era necessário o STR. Depois, que era necessário se organizar a produção [agrícola], então criou as associações (sic). Então depois a necessidade de ter acesso ao crédito, aí criou a Ecosol... então é uma cadeia... É uma engenhoca (Entrevistado 4T, meeiro, sócio-fundador da Ecosol Tombos, coordenador financeiro da Ecosol ZM e Leste de Minas e dirigente da Base de Serviços Ecosol/MG).

A metáfora da "engenhoca" de que trata o entrevistado remete à noção de proatividade e transitividade das redes sociais e sua interferência nos mercados locais. A formação das organizações locais para suprir condições de intervenção nos mercados surge pelos contatos estabelecidos e pelas informações transmitidas por meio das redes sociais. Estes elementos condicionaram historicamente as regras do jogo econômico, as próprias instituições estabelecidas. Como afirma Granovetter (1991), as atividades edificadas sobre redes sociais e por elas condicionadas podem resultar em instituições estáveis e contribuir para a modelagem de instituições preestabelecidas.

Os mercados de microfinanças entre os agricultores familiares na Zona da Mata Mineira foram historicamente marcados pela dominação e o clientelismo, permeados pelas relações de exploração entre patrões e trabalhadores rurais. Nesse contexto de "dominação", a predominância da cultura do café na região, com frequência operada em regime de parceria, configurava o modo de funcionamento dos mercados de microfinanças e as instituições que o regulavam. O acesso a empréstimos formais pelos trabalhadores rurais ou pequenos proprietários era restrito, tanto por parte de bancos como das políticas públicas. As fontes de financiamento e as condições para o acesso eram determinadas pelo patrão, proprietário das terras, que submetia os agricultores a condições de exploração através do crédito.

O regime de parceria exige do parceiro ou meeiro que arque com as despesas da lavoura, que é de um fazendeiro/patrão, até a colheita do café. A manutenção da lavoura e a colheita necessitam de investimentos, como por exemplo, adubos e mão de obra. Porém, a falta de liquidez dos trabalhadores os tornavam vulneráveis nos mercados de microfinanças, dependendo de alternativas como empréstimos com agiotas e com os proprietários da terra ou de "vender o café no pé", que significa receber um adiantamento monetário pela comercialização futura de uma determinada lavoura. Para esta situação o dinheiro do adiantamento é menor que o valor que o produtor receberia pela produção da lavoura se ela pudesse ser vendida na época correta. Estas estratégias de acesso ao crédito são denominadas por Abramovay (2004a) de "mecanismos informais de financiamento" e compõem os sistemas microfinanceiros locais que dinamizam práticas de reprodução social das famílias rurais de baixa renda.

Esta dinâmica histórica dos mercados de microfinanças rurais entre os agricultores familiares na Zona da Mata Mineira é ilustrada pela passagem a seguir, extraída das entrevistas realizadas na pesquisa.

A gente negociava era com os compradores de café, o explorador! Não era comprador, era explorador! Ele comprava o café no pé por baixo preço e adiantava o dinheiro. Se você precisava de dinheiro eles não te arrumavam o dinheiro, só se você vendesse seu café. Já fazia de sacanagem, era um jogo que eles faziam. Você queria o dinheiro, mas eu não empresto, eu compro é café. Se você quiser o dinheiro me vende o seu café. Eles pagavam pouco, mas a gente precisava, então era obrigado a vender mesmo (Entrevistado 3EF, proprietário, sócio-fundador do STR e do PAC Ecosol em Espera Feliz).

Sob essa perspectiva, parte-se da constatação dos mercados como construções sociais, cuja configuração é condicionada pelas instituições, que orientam as formas de interação econômica, as regras de transação e os atores dominantes. A "compra do café no pé" e os agiotas mencionados nas entrevistas acima são parte das instituições que regulavam os mercados de microfinanças rurais da Zona da Mata Mineira. Estas instituições sinalizam a composição de uma estrutura social particular, ancorada em relações de poder e conflitos. As demandas financeiras, que acompanham o ciclo produtivo do café, são supridas pela oferta dos compradores e agiotas, principais atores de regulação do mercado, já que eram os principais fornecedores de crédito. Os mercados de microfinanças rurais operavam, portanto, sobre essas condições de dominação, regulados pelas regras impostas pelos atores dominantes.

É válido considerar que as finanças não devem ser concebidas como instrumentos neutros nessas economias locais, movidas simplesmente por uma lógica econômica e instrumental. Ao contrário, a moeda, ou seja, os vínculos, os direitos e as obrigações contidos nela, exprimem a própria maneira pela qual os agricultores familiares e suas famílias tecem suas relações recíprocas de dependência, solidariedade, ajuda, clientela, igualdade e submissão (ABRAMOVAY, 2004a).

Neste contexto, as mobilizações políticas dos agricultores, protagonizadas pela atuação dos STRs, organizam iniciativas de superação das condições de exploração social e econômica. A busca de iniciativas, como já mencionado, se operacionalizou com a formação de organizações com capacidade de interferência nos mercados locais. No entanto, para se falar das alternativas econômicas que vieram a desembocar na constituição de cooperativas de crédito e em mudanças dos mercados locais, é preciso mencionar o processo de constituição do Partido dos Trabalhadores (PT) e do Centro de Tecnologias Alternativas da Zona da Mata (CTA), atores que interferiram diretamente no modus operandi do movimento político da agricultura familiar na Zona da Mata Mineira.

Praticamente concomitante à formação dos STRs, deu-se a fundação de diretórios do PT por lideranças que estiveram ligadas às CEBs. Antes mesmo de fundar o PT, lideranças das CEBs já estavam engajadas no movimento político partidário nos municípios da Zona da Mata Mineira, conforme relatou Cintrão (1996).

Antes de fundar o PT as lideranças das CEBs já haviam participado nas eleições municipais apoiando os candidatos da oposição, quase todos do PMDB (ali na região [da Zona da Mata Mineira] o PFL - antiga Arena - tradicionalmente domina a política local). Nas eleições constituintes de 1988 eles lançam e apóiam candidatos ligados ao Partido dos Trabalhadores. Com a fundação, nesses municípios, de partidos políticos que se colocariam em oposição ao poder local constituído, o rompimento com os fazendeiros se aprofundaria (CINTRÃO, 1996, p. 64).

Complementando o argumento, a autora expõe que, "na linguagem das CEBs, 'direito' se opõe a 'favor', e a entrada das lideranças das CEBs/sindicais na 'política' iria significar não só um questionamento do circuito dos 'favores', mas uma disputa de adesões, uma quebra nas lealdades políticas" (CINTRÃO, 1996, p. 65). Nesta direção, a sequência de lutas reivindicativas dos movimentos sociais mescladas com as iniciativas de auto-organização torna o horizonte da ação política por parte das lideranças da agricultura familiar próximo e factível.

A emergência e a consolidação dos partidos políticos, principalmente do PT, e o engajamento contínuo de lideranças sindicais oriundas das CEBs nas disputas eleitorais expressam uma herança concreta para as outras organizações locais. As discussões político-partidárias e as disputas eleitorais alavancaram o protagonismo dos movimentos sociais no campo e a força política da agricultura familiar. A política tornou-se, assim, uma via de intervenção para a mudança da realidade rural da Zona da Mata Mineira. É evidente essa dimensão política do movimento da agricultura familiar na região e nas cooperativas de crédito do sistema Ecosol. As lideranças cooperativistas são também ligadas aos partidos políticos (principalmente ao PT) e participaram ativamente de mobilizações partidárias e de disputas eleitorais.

Outro elemento importante deste contexto histórico da agricultura familiar na Zona da Mata Mineira, que surge paralelamente à formação dos STRs e do PT, é a constituição, ainda na década de 1980, do CTA, uma Organização Não Governamental (ONG) que atua diretamente com os STRs, formada por técnicos que prestam assessoria às organizações de agricultura familiar. Sua proposta de trabalho parte inicialmente de uma crítica à modernização da agricultura, guiada por um modelo de desenvolvimento industrial excludente. O CTA se insere no movimento político da agricultura familiar construindo uma proposta de desenvolvimento alternativo, baseado em intervenções a partir de tecnologias alternativas. A emergência do CTA insere o componente ambiental na pauta de discussões e atividades dos STRs e das organizações locais. De acordo com Cintrão (1996), "[...] os técnicos [do CTA] estão inseridos e referenciados no que chamamos de movimento ambientalista, e têm como interesse central consolidar a atuação da ONG e construir a questão ambiental enquanto problemática para agricultores e STRs" (p. 9). O perfil dos técnicos se reflete nas intervenções, as quais propõem uma agricultura sustentável, sem o uso de produtos químicos e que valorize o ser humano e o meio ambiente.

A trajetória do CTA pode ser analisada como a consolidação de um espaço institucional de diálogo e atuação dos atores políticos da agricultura familiar, inseridos em diferentes redes de relacionamento. O CTA, assim como o movimento sindical através de sua organização estadual e nacional, expandiu os contatos dos sindicatos da Zona da Mata Mineira para além dos limites regionais. A participação de lideranças em intercâmbios e eventos permitiu a ampliação das redes sociais, que confere inovação aos processos técnicos e tecnológicos da agricultura familiar.

A agroecologia, como referência a essas inovações, passou a ser a orientação de um projeto comum de agricultura e desenvolvimento sustentável para o polo sindical da Zona da Mata e para as organizações locais a ele vinculadas. Para Altieri (1999), a agroecologia pode ser entendida como uma ciência, um conjunto de conceitos, princípios e métodos que permitem estudar, manejar e avaliar um ecossistema agrícola, oferecendo diretrizes para uma agricultura sustentável, ambientalmente sadia, socialmente justa e economicamente viável. Percebe-se uma perspectiva conservacionista da agricultura, caracterizada pela utilização de tecnologias que busquem o respeito à natureza, de forma a manter ou pouco alterar as condições de equilíbrio dos sistemas produtivos, bem como do ambiente em gera7 7 É importante considerar que certas controvérsias margeiam a discussão da agroecologia. Uma delas, que precisa se destacar neste trabalho, uma vez que faz parte do discurso dos informantes, é que a agroecologia não deve ser confundida com agricultura orgânica. A agroecologia não ressalta apenas os princípios agronômicos ou ecológicos da produção, como é comumente caracterizada a agricultura orgânica, mas integra também princípios socioeconômicos e culturais, buscando novas práticas agrícolas sedimentadas nas tradições e processos sociais das comunidades camponesas. .

Partindo da concepção da agroecologia, a associação entre os técnicos do CTA e as lideranças sindicais nesse novo espaço institucional fez emergir, além de um novo modelo de desenvolvimento, um novo estilo de vida. Esse estilo de vida orientado pela agroecologia valoriza as relações no interior dos agroecossistemas e reforça também o conteúdo político das ações socioambientais e econômicas. A busca deste novo estilo de vida e de novas técnicas de manejo dos agroecossistemas, que permitam um relacionamento mais íntimo e horizontal com o ambiente, se tornou parte do comportamento e dos discursos dos agricultores e das organizações. O modus operandi do processo de desenvolvimento passa a ser pautado por uma proposta de valorização da vida e do espaço; a interação entre os atores sociais se firma como elemento crucial ao avanço do processo.

Neste projeto alternativo, forjado pela atuação dos STRs e do CTA, surgem alternativas econômicas para os agricultores familiares. Pautando as alternativas de acesso ao crédito frente à dinâmica de dominação nos mercados de microfinanças rurais, é importante destacar a atuação do CTA em parceria com alguns sindicatos na constituição de Fundos de Crédito Rotativo (FCRs), já na década de 19908 8 Vale ressaltar que, nessa época, surgiu o Programa Nacional de Fortalecimento da Agricultura Familiar (Pronaf), precisamente em 1996, o qual também nasceu como fonte alternativa de acesso ao crédito para agricultores familiares. Porém, os bancos de varejo (seus operantes iniciais) possuíam inúmeras limitações para operacionalizar o programa e atenderem este público, o que reduzia sua capilaridade (ver BITTENCOURT, 2003). . Estes fundos surgiram com recursos de uma financiadora internacional e eram gerenciados principalmente pelo CTA e pela Cáritas (ONG vinculada à Igreja Católica). Tratava-se de recursos não reembolsáveis (a "fundo perdido") que eram repassados para serem investidos por agricultores e organizações vinculadas à Associação Regional dos Trabalhadores Rurais da Zona da Mata, que reunia uma série de STRs dessa região.

Os FCRs podem ser identificados como um mecanismo de fornecimento de modalidades de microcrédito para agricultores familiares e surgem como uma alternativa aos canais estabelecidos de acesso ao crédito. Os fundos se inseriram nas pautas da Associação Regional e tornaram-se uma estratégia desta organização para o fortalecimento da agricultura familiar na região. É importante salientar que os FCRs foram coordenados pelos próprios agricultores e suas organizações, com o apoio dos técnicos do CTA.

A intervenção dos fundos no mercado de microfinanças rurais da região incorporou os pressupostos político-ideológicos do contexto. Foi encontrada, nos documentos analisados, uma cartilha de divulgação dos Fundos (não datada), que contribui para a análise da influência do contexto sociopolítico sobre as organizações econômicas, a qual é enfática acerca da orientação dos projetos que deveriam ser financiados pelo FCR:

AGROTÓXICO NÃO!

A proposta deve apresentar a sustentabilidade da atividade, nos aspectos sociais, ambientais e de gênero. Sendo assim, o FCR não financiará projetos em propriedades onde se utiliza agrotóxicos.

Esta orientação reflete nitidamente a incorporação da dimensão ambiental a partir dos trabalhos com agroecologia realizados pelo CTA. O movimento da agricultura familiar apoiado pelo CTA, por meio das experiências dos FCRs, deu origem às cooperativas de crédito do sistema Ecosol. Atualmente, as cooperativas de crédito ainda mantêm forte orientação para as restrições ao uso de agrotóxicos, porém, esta restrição inicialmente inibiu a ampliação do quadro social e, por isso, não existe mais uma determinação estatutária que limite o acesso ao crédito exclusivamente para a produção agrícola sem agrotóxicos. Mas vale ressaltar que em todas as reuniões observadas, os diretores e técnicos sempre orientaram os cooperados a não usarem agrotóxicos e a buscarem a agroecologia como base para suas atividades. Complementarmente, o técnico agrícola que presta serviço para o sistema Ecosol, acompanhando os investimentos do crédito cooperativo, orientava os cooperados a adotarem práticas agroecológicas, legitimando essa orientação como uma política da cooperativa e do movimento da agricultura familiar da região.

As cooperativas foram organizadas pelas lideranças do movimento sindical, as quais foram formadas pelas CEBs. Neste sentido, suas estratégias de gestão e seus focos de atuação incorporaram a lógica de organização e os ideais dos movimentos comunitários. Existe, assim, uma dimensão política e ideológica que busca ser sustentada como princípio nestas organizações diante dos normativos e regulações oficiais que condicionam suas operações.

A atuação das cooperativas de crédito, que abarcam principalmente em seu quadro social agricultores vinculados aos STRs, contribui também para reduzir as fontes de dependência dos patrões e até mesmo as práticas de "compra de café no pé" por meio de financiamentos.

Agora, com a cooperativa, ele [agricultor] pega empréstimo, faz a colheita dele tranquilo, vende o café no tempo certo, quando tiver preço bom, e não precisa ficar dependendo de vender antes e barato (Entrevistado 6T, proprietário, sócio-fundador da Ecosol Tombos).

Hoje, nossos agricultores já seguram o café, esperando um preço melhor. Pegam o crédito na cooperativa e esperam o café ter um preço melhor pra vender (Entrevistado 8T, proprietário, coordenador-geral da Ecosol ZM e Leste de Minas e dirigente da Base de Serviços Ecosol/MG).

O surgimento das cooperativas como um novo arranjo organizacional para o acesso ao crédito provoca mudanças nos mercados de microfinanças rurais, acompanhando uma mudança na estrutura social, especialmente com a autonomia da agricultura familiar e o enfraquecimento das relações de dominação. Com base em Fligstein (2003), podemos argumentar que este contexto expressa o modo como as estruturas sociais são moldadas com o propósito de organizar os mercados, que são condicionados pelas culturas locais.

Assim, o surgimento das cooperativas pode ser analisado como uma "inovação institucional" nos mercados de microfinanças rurais da região, como também assinalaram Bittencourt e Abramovay (2003) ao analisarem as cooperativas do sistema Cresol no Sul do Brasil. As inovações trazidas pelas cooperativas assumem a forma de estruturas de governança, concepções de controle ou normas de transação financeira, que permitem aos atores envolvidos nestes mercados organizarem-se e construírem novos padrões de relacionamento econômico, preservando sua autonomia e seus princípios. Os mercados de microfinanças rurais nos quais se inserem as cooperativas de crédito, portanto, são moldados pelas estruturas sociais e condicionados pelo arcabouço político-ideológico construído a partir dos movimentos pastorais de base.

5. Considerações finais

Este trabalho expressa um esforço analítico de interpretação das bases sociopolíticas de sustentação das cooperativas de crédito do sistema Ecosol na Zona da Mata Mineira e as instituições que vão modelando sua trajetória. A origem das cooperativas remete à histórica atuação de movimentos sociais no meio rural, especialmente de cunho político-religioso. A ideologia concebida nesta trajetória tornou-se um patrimônio lentamente acumulado e ao mesmo tempo reformulado na medida em que novas demandas e desafios exigiram novas práticas e formas organizacionais.

As categorias analíticas mobilizadas para este trabalho e discutidas de forma interconectada no texto (a atuação da Igreja Católica, o mercado de microfinanças rurais, as formas organizacionais da agricultura familiar) permitiram desvelar os principais atores e três fatores essenciais que sustentaram o movimento político da agricultura familiar na Zona da Mata Mineira e, consequentemente, tornaram-se os alicerces sociopolíticos do cooperativismo de crédito rural solidário nesta região: i) a mística e a religiosidade, despertadas principalmente a partir do movimento das CEBs, que interferiu diretamente nas representações sociais e nas manifestações simbólicas que orientaram as intervenções para a mudança da realidade; ii) a política, marcada pelo movimento sindical atuante e pela criação do PT na região, que significaram às relações econômicas uma dimensão política, possibilitando a ampliação das pautas reivindicativas e do protagonismo da agricultura familiar; iii) e a técnica e estilo de vida, consolidados principalmente a partir da inserção de um projeto de agricultura sustentável e de desenvolvimento alternativo e associados à atuação do CTA, configurando novas formas de relacionamento entre os agricultores e destes com seus agroecossistemas.

As práticas sociais e religiosas advindas das CEBs geraram um grau de mobilização popular e proporcionaram um processo cumulativo de amadurecimento político e organizativo no meio rural que adensou o tecido social. Percebe-se, então, um inegável significado pedagógico dos movimentos sociais rurais, expresso em suas práticas cotidianas e nas interações sociais promovidas ao nível comunitário e municipal. A pedagogia comunitária possibilitou ensaiar e institucionalizar novas formas organizacionais, condutas morais, participação democrática e consciência política. Constituiu-se, assim, uma estrutura social que conduziu a mobilização e a atuação do movimento político da agricultura familiar e de suas organizações.

Esse movimento da agricultura familiar na Zona da Mata Mineira, derivado das CEBs, se edifica sobre densas redes sociais interconectadas, que possibilitaram a conexão entre diversos atores sociais e entre comunidades rurais e municípios. As redes sociais, neste caso, funcionaram como um distinto mecanismo de governança, um "cimento social" (social glue) (GRANOVETTER, 1991) que tornou coeso este movimento social e fortaleceu suas práticas.

É desse substrato social que emergem as cooperativas de crédito do sistema Ecosol em MG. A singularidade histórica que marca estas cooperativas lhes imprime características igualmente singulares na operacionalização dos serviços financeiros que as permitem se reproduzir no contexto de populações rurais de baixa renda. Portanto, estas organizações não são replicáveis em qualquer contexto ou lugar, mas necessitam de certo grau de mobilização e coesão social para sua sustentação. O substrato que nutre o desenvolvimento das cooperativas particulariza tais organizações, não apenas pelos postulados valorativos que carregam, mas pela complexidade da trama social que as sustenta.

Do ponto de vista da gestão, isso permite maior congruência entre as estruturas operacionais da organização e os espaços de interação do quadro social, especialmente porque credores e devedores integram os mesmos circuitos sociais. Consequentemente, esta implicação é estratégica, pois viabiliza leituras concretas de realidades específicas para propor e operar produtos e serviços mais adequados. A racionalidade substantiva formada pela dimensão sociopolítica que constitui estas cooperativas condiciona a gestão da instituição financeira, pois suas estratégias são também orientadas por imperativos sociais, como a inclusão financeira de agricultores de baixa renda, e não apenas competitivos de mercado, que determinariam ganhos progressivos sobre as operações financeiras.

Entretanto, atender a seus pressupostos sociopolíticos e ideológicos e, ao mesmo tempo, corresponder aos estímulos do Sistema Financeiro Nacional e dos órgãos fiscalizadores é um grande desafio. Mas, essas organizações, ao assumirem o formato cooperativo, optaram por se tornar uma organização financeira enquadrada nos padrões formais institucionalizados, assim, submetendo-se às regulações do setor, como as organizações bancárias. O dilema formado por estas racionalidades distintas pode resultar em inflexões no comportamento das organizações e, por isso, estudos mais aprofundados sobre essas dinâmicas e o desenvolvimento dessas organizações se tornam relevantes.

Apesar da limitação deste trabalho como um estudo de caso, por isso de abrangência restrita, espera-se que ele tenha ressaltado a importância de se compreender a heterogeneidade social que configura o meio rural, demonstrando os limites de concepções generalizantes que homogeneízam as realidades sociais e territoriais e ocultam as relações sociais na análise de processos socioeconômicos. O título definido para este artigo é sugestivo neste sentido, buscando emergir "os alicerces", aquilo que é a base e que geralmente está submerso, que fica escondido. Porém, os alicerces dão sustentação e condicionam o futuro de um empreendimento. Reforça-se, com esta metáfora, a necessidade de que as organizações no meio rural não sejam percebidas deslocadas de um contexto social e de uma trajetória histórica que lhe são peculiares. Contudo, não se trata apenas de situar social e historicamente um grupo ou organização, mas de perceber como esses "alicerces" também resignificam e condicionam as relações e práticas dos diversos sujeitos implicados nos processos organizativos.

Sugere-se repensar as políticas públicas para o meio rural a partir destas lições. As propostas de apoio à ação coletiva no meio rural não podem ser concebidas com base em um modelo geral pré-concebido e de caráter prescritivo, desconsiderando as particularidades dos atores e dos territórios. Por esta via, a necessidade de organizações formais como contrapartida para o acesso a políticas públicas pode desconsiderar a existência prévia de capital social e/ou instrumentalizar os vínculos sociais existentes. O reconhecimento da heterogeneidade social e dos "alicerces" que sustentam as organizações no meio rural é fundamental para que as políticas públicas não sejam desvinculadas da gramática social dos territórios rurais.

6. Referências bibliográficas

  • ABRAMOVAY, R. (Org.). Laços financeiros na luta contra a pobreza São Paulo: Ed. FAPESP/Annablume, 2004a.
  • ______. Entre Deus e o Diabo: mercados e interações humanas nas ciências sociais.Tempo Social, Revista de sociologia da USP, v. 16, n. 2, p. 35-64, 2004b.
  • ALTIERI. M. A. Agroecologia: bases científicas para una agricultura sustentable. Montevideo: Nordan- Comunidad, 1999.
  • AZEVEDO, D. A Igreja Católica e seu papel político no Brasil. Estudos avançados, v. 18, n. 52, p. 109-120, 2004.
  • BABBIE, E. The practice of social research 6. ed. Belmont, CA: Wadsworth, 1992.
  • BARDIN, L. Análise de conteúdo Lisboa: Edições Setenta, 2011.
  • BERGER, P. L. e LUCKMANN, T. A construção social da realidade 13. ed. Tradução: Floriano de Souza Fernandes. Petrópolis: Vozes, 1996.
  • BITTENCOURT, G. A. Abrindo a caixa preta: o financiamento da agricultura familiar no Brasil. Campinas: UNICAMP, 2003. 213f. Dissertação (Mestrado em Desenvolvimento Econômico, Espaço e Meio Ambiente). Universidade Estadual de Campinas, Campinas, 2003.
  • BITTENCOURT, G. A. e ABRAMOVAY, R. Inovações institucionais no financiamento à agricultura familiar: o Sistema Cresol. Revista Economia Ensaios, v. 16, n. 1, p. 179-207, 2003.
  • BURDICK, J. Procurando Deus no Brasil Petrópolis: Vozes, 1996.
  • BÚRIGO, F. L. Cooperativa de crédito rural: agente de desenvolvimento local ou banco comercial de pequeno porte? Chapecó: Argos, 2007.
  • ______. Finanças e solidariedade: uma análise do cooperativismo de crédito rural solidário no Brasil. Florianópolis: UFSC, 2006. 374f. Tese (Doutorado em Sociologia Política). Centro de Filosofia e Ciências Humanas, Universidade Federal de Santa Catarina, Florianópolis, 2006.
  • CASTILLA, E. J. et al. Social Networks in Silicon Valley. In: LEE, C. M., MILLER, W. F., HANCOCK, M. G., HENRY S. e ROWEN, H. S. (Orgs.). The Silicon Valley Edge. Stanford: Stanford University Press, 2000. p. 218-247. Disponível em: <http://www.stanford.edu/dept/soc/people/mgranovetter/documents/gransocnetsilvalley>. Acesso: 06 set. 2010.
  • CAZELLA, A. A. e BÚRIGO, F. L. Inclusão financeira e desenvolvimento rural: a importância das organizações territoriais. Política e Sociedade, Florianópolis, v. 14, p. 301-331, 2009.
  • CINTRÃO, R. P. ONGs, Tecnologias alternativas e representação política do campesinato: uma análise da relação entre o Centro de Tecnologias Alternativas e os Sindicatos dos Trabalhadores Rurais na Zona da Mata Mineira. Rio de Janeiro: UFRRJ, 1996.
  • FRANÇA FILHO, G. C. e LAVILLE, J. L. Economia solidária: uma abordagem internacional. Porto Alegre: Editora da UFGRS, 2004.
  • FERRARY, M. Trust and social capital in the regulation of lending activities. Journal of Socio-economics, n. 31, p. 673-699, 2003.
  • FLIGSTEIN, N. Mercado enquanto política: uma abordagem político-cultural às instituições de mercado. In: MARQUES, R. e PEIXOTO, J. (Orgs.). A nova sociologia econômica. Oeiras, Portugal: Celta Editora, 2003, p. 195-227.
  • FUKUYAMA, F. Confiança: as virtudes sociais e a criação da prosperidade. Tradução de Alberto Lopes. Rio de Janeiro: Rocco, 1996.
  • GAMBETTA, D. (Ed.). Trust: making and breaking cooperative relations. Oxford: Basil Blackwell, 1988.
  • GOMES, W. L. e ANDRADE, D, A. Mobon: missão e fé libertadora. Belo Horizonte: O Lutador, 2011.
  • GRANOVETTER, M. Economic Institutions as Social Constructions: a Framework for Analysis. Paper prepared for the CREA conference on 'The Economics of Conventions'. Paris, 1991.
  • ______. Economic Action and Social Structure: The Problem of Embeddedness. American Journal of Sociology, v. 91, n. 3, p. 481-510, 1985.
  • ______. The strength of weak ties: a network theory revisited. Sociological Theory, v. 1, p. 201-233, 1983.
  • ______. The strength of weak ties. American Journal of Sociology, v. 78, n. 6, p. 1360-1380, 1973.
  • LEMIEUX, V. e OUIMET, M. Análise estrutural das redes sociais Tradução: Sérgio Pereira. Lisboa: Instituto Piaget, 2008.
  • LOCKE, R. M. Construindo confiança. Econômica, v. 3, n. 2, p. 253-281, 2001.
  • MAGALHÃES, R. Economia, Natureza e Cultura: Uma visão histórica e interdisciplinar dos sertanejos, dos mercados e das organizações no sertão da Bahia. São Paulo: USP, 2005. 150f. Dissertação (Mestrado em Ciência Ambiental). Universidade de São Paulo, São Paulo, 2005.
  • MAGALHÃES, R. S. e ABRAMOVAY, R. A formação de um mercado de microfinanças no sertão da Bahia. Revista Brasileira de Ciências Sociais, v. 22, n. 63, p. 107-162, 2007.
  • MARQUES, E. C. L. Os mecanismos relacionais. Revista brasileira de ciências sociais/ANPOCS, v. 22, n. 64, p. 156-161, 2007.
  • MERTON, R. K., FISKE, M. e KENDALL, P. L. Propósitos y critérios de la entrevista focalizada. Empiria - Revista de metodologia de ciências sociales, n. 1, p. 215-271, 1998.
  • PETRINI, J. C. CEBs: um novo sujeito popular. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1984.
  • POLANYI, K. A Grande Transformação: as origens de nossa época. 2. ed. Rio de Janeiro: Elsevier, 2000.
  • RAUD-MATTEDI, C. Análise crítica da Sociologia Econômica de Mark Granovetter: os limites de uma leitura do mercado em termos de redes e imbricação. Política & Sociedade, v. 4, n. 6. p. 59-82, 2005.
  • SCOTT, W. Institutions and Organizations London: Sage Publication, 1995.
  • SILVA, M. G. Políticas públicas de desenvolvimento rural e organizações de agricultura familiar em Espera Feliz - MG. Viçosa: UFV, 127f. Dissertação (Mestrado em Extensão Rural). Universidade Federal de Viçosa, Viçosa, 2010.
  • SINGER, P. Economia solidária: um modo de produção e distribuição. In: SINGER, P. e SOUZA, A. (Orgs.). A Economia solidária no Brasil: a autogestão como resposta ao desemprego. São Paulo: Contexto, 2003.
  • STEINER, P. A sociologia econômica São Paulo: Editora Atlas, 2006.
  • SWEDBERG, R. Sociologia econômica: hoje e amanhã. Tempo Social - revista de sociologia da USP, v. 16, n. 2. p. 7-34, 2004.
  • VERGARA, S. C. Projetos e Relatórios de Pesquisa em Administração São Paulo: Atlas, 1998.
  • 1
    Quando mencionado "movimento das CEBs", referencia-se seu caráter dinâmico e processual, sempre se (re)construindo a partir das mobilizações sociais, envolvendo atores, práticas e processos ao longo de sua atuação. Essa caracterização é feita também para contrapor uma visão estática das CEBs como entidade, que acaba por limitar seu potencial de mudança e homogeneizar os atores que lhe constituem.
  • 2
    Alguns autores consideram a confiança como um capital social (FUKUYAMA, 1996). Entretanto, não será aprofundada aqui a discussão da noção de capital social, apesar de sua importância teórica. Tendo em vista a complexidade de se delimitar um conceito de capital social, devido à amplitude e diversidade de abordagens, optou-se por não aprofundar, e sim tratar paralelamente dois conceitos que, com frequência, aparecem como atributos do capital social: redes sociais e a confiança.
  • 3
    A confiança, no entanto, não elimina comportamentos oportunistas ou o rompimento das expectativas positivas dos atores, pois confiar pressupõe a exposição dos mesmos e esta vulnerabilidade pode resultar em consequências danosas a alguma das partes.
  • 4
    A Base de serviços Ecosol/MG possui formato legal de associação e tem a função de dar suporte técnico às cooperativas, desde assessoria contábil à articulação política.
  • 5
    Os informantes foram nominados por meio de um código representado pelo número ordinal de sua entrevista e a primeira letra do município a que pertencem (por exemplo, o primeiro entrevistado de Tombos foi codificado como 1T). Após o código, foram acrescentadas algumas informações que caracterizam o informante.
  • 6
    Em um determinado momento da história, o Polo Sindical se dividiu com o afastamento de uma parte dos sindicatos que seguiam uma linha mais "combativa", os quais se retiraram da Federação dos Trabalhadores da Agricultura do Estado de Minas Gerais (Fetaemg) e passaram a integrar a Federação dos Trabalhadores na Agricultura Familiar (Fetraf), que é ligada à Central Única dos Trabalhadores. Silva (2010), ao analisar a trajetória do STR de Espera Feliz, constata esse "racha" no sindicalismo da Zona da Mata Mineira. O STR de Espera Feliz e outros STRs descontentes com a representação da Fetaemg decidiram disputar a direção da entidade, mas o fracasso dessa empreitada levou tais sindicatos, em 2001, a romperem com a Fetaemg e se vincularem a Fetraf. Destacam-se aqui os STRs ligados à Fetraf por serem a maioria do antigo Polo Sindical e por serem os sindicatos que protagonizaram a criação do sistema Ecosol em Minas Gerais.
  • 7
    É importante considerar que certas controvérsias margeiam a discussão da agroecologia. Uma delas, que precisa se destacar neste trabalho, uma vez que faz parte do discurso dos informantes, é que a agroecologia não deve ser confundida com agricultura orgânica. A agroecologia não ressalta apenas os princípios agronômicos ou ecológicos da produção, como é comumente caracterizada a agricultura orgânica, mas integra também princípios socioeconômicos e culturais, buscando novas práticas agrícolas sedimentadas nas tradições e processos sociais das comunidades camponesas.
  • 8
    Vale ressaltar que, nessa época, surgiu o Programa Nacional de Fortalecimento da Agricultura Familiar (Pronaf), precisamente em 1996, o qual também nasceu como fonte alternativa de acesso ao crédito para agricultores familiares. Porém, os bancos de varejo (seus operantes iniciais) possuíam inúmeras limitações para operacionalizar o programa e atenderem este público, o que reduzia sua capilaridade (ver BITTENCOURT, 2003).
  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      06 Nov 2013
    • Data do Fascículo
      Set 2013
    Sociedade Brasileira de Economia e Sociologia Rural Av. W/3 Norte, Quadra 702 Ed. Brasília Rádio Center Salas 1049-1050, 70719 900 Brasília DF Brasil, - Brasília - DF - Brazil
    E-mail: sober@sober.org.br