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Cuidado e consanguinidade na atribuição de responsabilidades intergeracionais*** *** ***Este artigo remete a trechos adaptados de minha tese de doutorado (Finamori, 2012), financiada pelo CNPq e pela Fapesp. Agradeço a Heloisa Pontes pela orientação da pesquisa original e pela interlocução preciosa há muitos anos e também a Guita Debert pela parceria mais recente. As escolhas teórico-metodológicas e as posições que expresso no artigo são obviamente de minha inteira responsabilidade.

Care and inbreeding in the allocation of intergenerational responsibilities

Resumo

No Brasil, o teste de DNA tem sido fundamental para a validação legal de paternidade. É também com base nessa validação que o dever de cuidado do pai em relação ao filho pode ser estabelecido, tanto em termos de provimento financeiro quanto de obrigações morais e afetivas. Para além da dimensão legal, contudo, o cuidado, em seus múltiplos sentidos, pode ser um balizador importante para o modo como pais e filhos dimensionam e justificam seus próprios direitos e obrigações. Partindo de casos de investigação de paternidade que tiveram grande percussão na mídia, este artigo objetiva analisar como a consanguinidade e as práticas de cuidado estão mutuamente implicadas e podem ser mobilizadas de diferentes modos na atribuição de responsabilidades e na reivindicação de direitos associados ao parentesco.

Palavras-chave:
parentesco; família; cuidado; teste de DNA

Abstract

In Brazil, DNA testing has been crucial for the legal validation of parenthood. It is also based on that validation that fathers' duty to care for their children can be established, both in terms of financial provision and moral and affective obligations. Beyond the legal dimension, however, care, in its multiple meanings, can be a major reference for how parents and children measure and justify their own rights and obligations. Based on cases of testing that had great impact in the media, the purpose of this article is to analyze how inbreeding and care practices are mutually implicated and can be mobilized in different ways when allocating responsibilities and claiming rights associated with kinship.

Keywords:
kinship; family; care; DNA Testing

Exame de DNA e leis de paternidade

No Brasil, ao longo do século XX, a filiação foi qualificada juridicamente em diferentes categorias, correspondentes, sobretudo, à situação de conjugalidade dos pais1 1 Pelo Código Civil de 1916, a denominação "legítimo" era dada ao filho concebido durante o matrimônio legal entre os pais; "legitimado", por sua vez, se referia à situação em que os pais apenas se casaram legalmente depois do nascimento do filho; "ilegítimo" ou "natural" agrupava os filhos tidos fora de um união legal, estando a designação natural mais frequentemente relacionada a situações em que os pais viviam em união consensual, nominada à época como concubinato. . As graduais mudanças nas leis levaram à desvinculação entre filiação e matrimônio e à equiparação de qualificações e direitos entre filhos concebidos em uma união reconhecida ou não oficialmente. A Constituição de 1988 equiparou direitos e proibiu designações discriminatórias em relação à filiação e o Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA), de 1990, reforçou o que fora escrito na Constituição, situando o tema no âmbito dos direitos da criança. Ainda na década de 1990, foi promulgada a Lei de Paternidade, em 1992, grande marco na legislação sobre a questão, que regulamentou a investigação de paternidade e tornou possível reconhecer um filho por registro de nascimento, escritura pública ou escrito particular, testamento e ainda por declaração direta ao juiz. A partir da década de 1990, contudo, menos do que as leis, é a técnica de verificação de paternidade que se torna a questão mais pungente, com a difusão do teste de DNA e a centralidade que esse adquire nas decisões judiciais.

A popularidade que o teste de DNA adquiriu e mesmo o conhecimento mais amplo sobre as leis relativas à paternidade podem, ao menos em parte, ser atribuídos à constância com que essas questões passam a ser discutidas nas mídias em geral: programas de auditório televisivos, revistas semanais e de celebridades e em todos os tipos de noticiários televisivos, jornais diários ou sites de notícias. Certamente, os numerosos casos de pessoas públicas envolvidas em processos de investigação de paternidade aproximam as pessoas do tema, sem contar as novelas televisivas que agregaram às velhas histórias sobre a busca de um pai ares contemporâneos ao acrescentar o exame de DNA à trama. É certo que o tema permeia o imaginário humano desde sempre, mas ganhou novas roupagens, mudou algumas regras do jogo - ainda que tenha mantido outras - em virtude das leis atuais e mais especialmente do exame de DNA.

Entre a década de 1990 e os anos de 2000, o teste de DNA se difundiu rapidamente até se tornar o padrão nas perícias de paternidade solicitadas pela Justiça. As notícias publicadas sobre o tema no início daquela década incluíam não só histórias de pessoas públicas, mas sobretudo reportagens informativas sobre as possibilidades abertas pelos usos do exame, notícias sobre pessoas comuns que recorriam à Justiça para validar ou negar uma paternidade, havendo também muitos artigos sobre o tema assinados por médicos e biólogos. Gradualmente, no entanto, o tema migra das colunas de ciência para os cadernos de fofoca. A partir do ano 2000, a imensa maioria das notícias publicadas sobre o assunto se refere a pessoas famosas envolvidas em processos de investigação de paternidade. Nelas se explicita, com particular ênfase, as situações em que há desacordo e que, provavelmente, envolverá uma disputa jurídica. Os detalhes dos casos apresentados centram-se, sobretudo, nesses desacordos, na realização de um exame de DNA e nos possíveis valores envolvidos em pensão ou divisão de herança, dependendo do caso. Com frequência, são apresentadas acusações mútuas entre as partes, questões da vida pregressa e das ações contemporâneas dos envolvidos. Não é incomum que nos jornais apareça também uma espécie de "veredicto", expresso em colunas assinadas ou cartas de leitores, em que se assume uma posição sobre a veracidade de uma paternidade alegada, que pode ser fundamentada na semelhança física ou de comportamento entre pai e filho.

Ao longo dos anos, numerosos processos envolvendo atores, cantores, políticos, esportistas foram noticiados à exaustão. Dentre os muitos episódios centrados em pessoas públicas, me concentrarei em dois: no que teve como personagem central o ex-jogador de futebol Pelé e o que se referiu ao ex-Presidente da República Fernando Henrique Cardoso (FHC). O primeiro porque foi extensamente noticiado e adquiriu relevância quase histórica no país, uma vez que foi um dos primeiros casos públicos a acionar o teste de DNA durante um longuíssimo processo judicial. O segundo pela polêmica que promoveu entre os leitores das edições on-line dos principais jornais e revistas do país, por envolver a negativa pelo teste de DNA de uma paternidade fora do casamento, escondida durante anos e reconhecida legalmente apenas pouco tempo antes do resultado negativo do teste. A leitura desses casos está orientada tanto ao conteúdo dessas histórias como também à repercussão apaixonada que promoveu entre seus leitores.

Sobre a pesquisa nos jornais, é fundamental destacar as distintas temporalidades dos casos - o de Pelé foi noticiado com regularidade desde o início do processo, no começo dos anos de 1990, ao passo que a divulgação do caso que envolveu o ex-presidente concentrou-se em poucas notícias, publicadas principalmente depois do ano 2000. Essa diferença promove impactos nos formatos dos comentários dos leitores. Em relação a Pelé, muitos dos comentários de leitores foram publicados nas edições impressas dos jornais, pois no período do processo judicial, embora alguns dos jornais já contassem com edições on-line, as notícias não eram abertas a comentários. Quando o caso de FHC veio à tona, boa parte dos veículos de comunicação já contava com a possibilidade de que os leitores comentassem as notícias on-line. Essa observação é pertinente, uma vez que há diferenças pungentes entre os comentários das edições on-line e as cartas de leitores publicadas nas edições impressas dos jornais. As cartas das edições impressas, mesmo quando resumidas, são, em geral, compostas por textos mais longos, com frases completas e caracterizadas pelo uso da linguagem formal. Nos comentários on-line, por sua vez, embora alguns sigam o padrão das cartas, grande parte deles faz uso de uma linguagem mais despojada, marcada por abreviações de termos, frases curtas e interjeições. Enquanto as cartas passam por seleção e apenas algumas são publicadas, os comentários on-line são numerosos e, ainda que haja a orientação de que os usuários não usem termos ofensivos, não é incomum que alguns tenham conteúdo agressivo, havendo, ainda, com alguma frequência, o debate entre leitores sobre determinado ponto de vista. Há também uma diferença em relação à temporalidade dos comentários, já que os on-line têm por característica a rapidez com que são enviados e publicados.

Contudo, a despeito das características que distinguem esses casos, a repercussão que promoveram traz à tona o modo como as relações de cuidado e consanguinidade podem ser socialmente articuladas quando uma dúvida de paternidade põe em questão a responsabilidade sobre o cuidado de filhos.

É fundamental também destacar que, embora eu recorra a esses casos específicos para analisar a correlação entre cuidado e parentesco, as questões ora expostas foram elaboradas partindo de uma pesquisa muito mais ampla sobre as mudanças nas leis e nas técnicas de investigação de paternidade ao longo do século XX2 2 O levantamento das notícias compreendeu a correlação entre os termos paternidade e teste de DNA desde os anos de 1990, tendo se concentrado, ainda que não ficado restrito, aos jornais O Estado de S. Paulo (OESP) e Folha de S.Paulo (FSP). A pesquisa mais ampla incluiu uma gama de fontes e campos de pesquisa, entre os quais: leis, textos médicos e jurídicos, debates legislativos, processos de investigação de paternidade e narrativas de vida de filhos em busca do reconhecimento de paternidade. .

Cuidado e parentesco

O interessante trânsito entre afetos e economias tem sido, atualmente, objeto de pesquisas sobre temas muito distintos como: cuidado de idosos e crianças, prostituição, direito de família e migração, entre tantos outros3 3 Ver, a esse respeito, a excelente coletânea organizada por Hirata e Guimarães (2012). . Essa discussão também traz à tona o clássico tema da antropologia, que diz respeito às obrigações mútuas. A noção de cuidado aparece com frequência associada ao feminino, mas também está claramente ligada às gerações, à ideia de que tanto as crianças precisam ser cuidadas, como também os mais velhos devem ser cuidados pelos mais novos, numa reciprocidade de obrigações. Nessa direção, o parentesco pode assumir o sentido de um conjunto de obrigações morais e legais tanto quanto de direitos econômicos e políticos para a transmissão simbólica e material (Weber, 2006WEBER, Florence (2006). "Lares de cuidado, linhas de sucessão: algumas indicações etnográficas na França, hoje". Mana, v. 12, n. 2, p. 479-502.).

Se as responsabilidades legais podem ser atribuídas pela consanguinidade (quando, por exemplo, um exame de DNA positivo estabelece judicialmente a paternidade e seus deveres consequentes), há também um sentido moral na atribuição do dever do cuidado, que é baseado tanto nas relações afetivas, cotidianamente construídas, quanto nos sentidos sociais mais amplos atribuídos às vinculações entre amor, obrigação e parentesco.

As discussões sobre o cuidado, ou care em inglês, têm enfatizado a polissemia do termo e a dificuldade em traduzi-lo (Hirata e Guimarães, 2012HIRATA, Helena & GUIMARÃES, Nadya Araújo (orgs.). (2012). Cuidado e cuidadoras: as várias faces do trabalho do care. São Paulo: Atlas.). Em relação ao parentesco, em específico, Michael Lambek (2007)LAMBEK, Michael (2007). "The cares of Alice Alder: recuperating kinship and history in Switzerland", em CARSTEN, J. (org.). Ghosts of memory: essays on remembrance and relatedness. Malden (MA): Blackwell. destaca as múltiplas conotações da palavra care em inglês e suas composições4 4 Tais como: care for, care about, take care of someone, to take care, to be careful, to have cares, to be full of care (Lambek, 2007, p. 220). : cuidar de, preocupar-se com, ser cuidadoso, ter cuidados, estar vulnerável, cuidar do que os outros dizem e fazem - como representativas de uma dimensão, a um só tempo, semântica, experiencial e prática, em que parentesco e memória estão mutuamente implicados. Lambek assinala que uma das coisas mais impressionantes sobre o parentesco humano é a forma como cuidamos e nos preocupamos com os mais velhos, nossos ascendentes ou mesmo com os mortos. Poderíamos acrescentar que o cuidado pode fazer parentesco no sentido de que ele é também um balizador da maior ou menor proximidade das relações, entrelaçando-se a outras noções, como a de consanguinidade, no estabelecimento de direitos e responsabilidades entre as gerações.

A dimensão relacional do parentesco tem sido posta em particular destaque nas últimas décadas nos estudos antropológicos, que tem se focado mais nos processos e nos significados do que nos aspectos formais do parentesco. Estimulados pelas críticas de Schneider (1980 [1968]SCHNEIDER, David (1980 [1968]). American kinship. Chicago: University of Chicago Press. , 1984______ (1984). A critique of the study of kinship. Ann Arbor: University of Michigan Press.) e marcados pelo frutífero diálogo com o campo de estudos de gênero, tais estudos têm proposto uma análise baseada na ideia de relacionalidade. Uma das proposições centrais, nesse sentido, foi a de Janet Carsten (2000)CARSTEN, Janet (2000). "Introduction: cultures of relatedness", em CARSTEN, J. (org.). Cultures of relatedness. new approaches to the study of kinship. Cambridge: Cambridge University Press. ao sugerir o termo relatedness ao lado ou em substituição ao de parentesco. A intenção com o termo é, segundo ela, suspender a definição a priori de parentesco para analisar o que é "ser parente" em diferentes contextos, independentemente de laços biológicos. Essas análises tendem a suspender "biológico" e "social" como termos analíticos ao olhar para cada contexto particular.

A proposta de abordar o "biológico" e o "social" não como termos analíticos, mas considerando suas intersecções em seus usos cotidianos é instigante para esta análise. Se o debate atual em torno do reconhecimento de paternidade coloca no centro da discussão a relação biológica, validada pela técnica, como definidora do (re)conhecimento de paternidade, é importante lembrar que as articulações em torno de cuidado, responsabilidade e parentesco mobilizam elementos que vão muito além da consanguinidade. Em muitas situações, as práticas de cuidado são acionadas para validar as relações de parentesco, independentemente dos laços biológicos; em outras, é o conhecimento sobre o laço biológico que justifica a obrigação do cuidado; e há ainda aquelas em que a ausência do cuidado no passado é usada para argumentar que a confirmação de um laço biológico é insuficiente para obrigar a uma relação de cuidado no futuro. Tendo, então, em vista as intersecções narrativas entre cuidado e consanguinidade na atribuição de responsabilidades associadas ao parentesco, discutirei as repercussões dos casos de investigação de paternidade que tiveram em seu centro o ex-jogador de futebol Pelé e o ex-presidente FHC.

Quando a falta de uma relação no passado justifica a falta de cuidados no futuro

O processo de investigação de paternidade envolvendo o ex-jogador de futebol Pelé foi emblemático no Brasil, pois, além de centrar-se numa figura de extrema notoriedade pública, foi um dos primeiros processos a usar o exame de DNA como prova. Uma série de narrativas se mistura nessa história: a dos jornais, a da filha, Sandra, na autobiografia que publicou, as múltiplas declarações que ela e Pelé deram aos meios de comunicação, as sentenças judiciais e os comentários de leitores publicados nos jornais. A ação teve início em 1991, e no mesmo ano o primeiro resultado do teste de DNA seria divulgado. Em seguida ao resultado positivo, os jornais noticiariam que o advogado de Pelé contestaria o exame e teria declarado que o teste de DNA não era reconhecido em nenhum lugar do mundo (Oliveira, 1991OLIVEIRA, Maurici (1991). "Exame de paternidade de Pelé pode ter erro", Folha de S. Paulo, 29 nov., p. 4-8.). A disputa jurídica se estenderia por mais cinco anos. A repercussão também se estendeu e o caso foi intensamente comentado nos jornais, tanto em colunas assinadas quanto em comentários de leitores. Durante o longo processo, numa das muitas vezes em que o ex-jogador recorreu da decisão da Justiça, que lhe atribuía a paternidade, Barbara Gancia escreveria em sua coluna "Ora, ora, Pelé! Que coisa feia! A moça é a sua cara" (Gancia, 1995GANCIA, Barbara (1995). "Pelé pisa na bola e deixa de marcar gol". Folha de S.Paulo, 3 maio, p. 3-2. Disponível em: <Disponível em: http://www1.folha.uol.com.br/fsp/1995/5/03/cotidiano/6.html >. Acessado em 9 out. 2015.
http://www1.folha.uol.com.br/fsp/1995/5/...
). Em 1995, quando Pelé participou de uma campanha televisiva da Comunidade Solidária falando sobre a violência contra a mulher, os leitores reagiram dizendo que ele não teria moral para falar do assunto. A imoralidade de Pelé era associada explicitamente ao não reconhecimento da filha (FSP, 1995FOLHA DE S. PAULO (1995). "Opinião", 11 set., p. 1-3.). Em 1997, um projeto que propunha dar a Pelé o título honorífico de cidadão de Brasília é também rejeitado e, nas discussões, além de se considerar que o ex-jogador não havia lutado contra o racismo, se enfoca, com particular ênfase, a resistência que ele demonstrara em reconhecer a filha (FSP, 1997______. (1997). "Câmara nega título honorífico a Pelé", 5 mar., p. 3-13.).

Pouco antes de sair a decisão final do processo, em 1996, Pelé tentava ter outro filho por reprodução assistida com a nova esposa e as notícias sobre as duas situações de paternidade pipocavam. Sempre que havia referência à gravidez, também era citado o processo envolvendo Sandra. Numa delas, Pelé declararia à Folha de S.Paulo que não cederia no processo de paternidade. Ainda que Sandra pudesse ser biologicamente sua filha, ele afirmava que, por não conhecê-la, não podia se preocupar sentimentalmente com ela (FSP, 1996a______ (1996a). "Pelé diz que não cede em processo de paternidade", 10 abr., p. 3-10. Disponível em: <http://www1.folha.uol.com.br/fsp/1996/4/10/esporte/18.html>. Acessado em 9 out. 2015.
http://www1.folha.uol.com.br/fsp/1996/4/...
). A contraditória situação em que ele se encontrava pois, a um só tempo, buscava ter um filho biológico, ainda que para isso tivesse de recorrer à reprodução assistida, e a negação de uma paternidade biologicamente confirmada pelo exame de DNA, gerou, mais uma vez, reações de leitores contrários à atitude do ex-jogador, que consideravam que as declarações de amor aos novos filhos só seriam compatíveis com o reconhecimento de paternidade da filha gerada anos antes (FSP, 1996b______ (1996b). "Verdadeira realeza", 8 out. Disponível em: <http://www1.folha.uol.com.br/fsp/opiniao/fz2908200511.htm>. Acessado em 9 out. 2015.
http://www1.folha.uol.com.br/fsp/opiniao...
).

As afirmações de Pelé que desvinculavam o parentesco biológico do afeto em decorrência da falta de convívio não se restringiram a esse episódio. Quando saiu o resultado do primeiro teste de DNA, em 1991, ele já havia declarado que tinha dificuldades em reconhecer Sandra como filha por não conhecê-la (Oliveira, 1991OLIVEIRA, Maurici (1991). "Exame de paternidade de Pelé pode ter erro", Folha de S. Paulo, 29 nov., p. 4-8.). Na autobiografia, A filha que o rei não quis, publicada em 1998, quando já tinha saído a decisão judicial que reconheceu em definitivo a paternidade, Sandra comentaria as muitas declarações que Pelé havia dado aos meios de comunicação nas quais afastava a possibilidade de uma relação parental em virtude da falta de convivência anterior.

É verdade que o pai biológico difere em muito do pai que cria. Vê-se isso com frequência nos casos de adoções. Pelé, embora sendo meu pai biológico, não me viu nascer e crescer porque, quando soube da gravidez de minha mãe, exigiu o seu afastamento da vida dele. Uma posição, evidentemente, bastante cômoda para ele (Nascimento, 1998NASCIMENTO, Sandra Arantes do (1998). A filha que o rei não quis. Redação de Walter Brunelli. São Paulo: Tape Laser Produções., p. 96-7).

Na autobiografia, Sandra dialoga com algumas das numerosas reportagens feitas sobre a história e afirma que o livro representa seu desejo em contar com suas próprias palavras o que os jornalistas retrataram ao longo do processo judicial. Com a palavra rei estampada em letras enormes na capa e o sobrenome paterno amplamente conhecido, Arantes do Nascimento, o livro evoca as duas personas de Pelé: o jogador de futebol - "rei" Pelé - e o cidadão Edson Arantes do Nascimento, que o próprio sempre fez questão de separar. No texto da contracapa, a apresentação da história:

Depois de vencer todas as batalhas judiciais pela comprovação de sua paternidade, Sandra abre o coração para revelar a dor que tem sofrido pelo desprezo aberto de seu pai, uma das personalidades mais famosas e endeusadas no mundo inteiro. Se o homem Edson Arantes do Nascimento só foi obrigado a reconhecê-la como filha por uma decisão judicial irrecorrível, Sandra apela para o mito Pelé. Para um rei que não nasceu príncipe, a majestade conquistada somente irá perdurar através de atos de nobreza (Nascimento, 1998NASCIMENTO, Sandra Arantes do (1998). A filha que o rei não quis. Redação de Walter Brunelli. São Paulo: Tape Laser Produções.).

Durante o processo, as constantes apelações feitas por Pelé, negando a informação que o exame de DNA havia confirmado, foram muito malvistas e Sandra acabou se tornando um símbolo da luta pelo reconhecimento legal de paternidade. A trajetória de Sandra tornou-se referência, pois, além de Pelé ser popular no mundo inteiro, tratava-se de um dos primeiros casos a ter grande cobertura da mídia num momento em que o exame de DNA ainda se consolidava como prova nos tribunais. A publicação da autobiografia acabou tendo também a perspectiva de autoajuda, explicitada por Sandra ao declarar que sua trajetória seria uma mensagem de encorajamento a todos que "vivem o mesmo drama do desprezo paternal".

A história de Pelé e Sandra foi levada a amplo conhecimento público, menos por conta da autobiografia e mais pelos meios de comunicação que acompanharam seu desenrolar desde o início. O caso se entrelaçaria, posteriormente, também ao debate político-legislativo sobre o assunto, já que Sandra teve uma atuação em defesa da gratuidade do exame de DNA, quando era vereadora na cidade de Santos (SP). Em 2001, quando a lei que incluiu a gratuidade do exame na assistência judiciária foi votada, Sandra acompanhou-a no Senado, tendo dado entrevistas falando sobre a importância dessa lei num país em que um terço das crianças não tem o nome do pai (Ulhôa, 2001ULHÔA, Raquel (2001). "Projeto de lei prevê exame de DNA gratuito se solicitado pela Justiça". Folha Online, 21 nov. Disponível em: <Disponível em: http://www1.folha.uol.com.br/folha/brasil/ult96u26881.shtml >. Acessado em 10 set. 2009.
http://www1.folha.uol.com.br/folha/brasi...
) e destacando que a lei poderia acabar com a "paternidade irresponsável" (OESP, 2001OESP (2001). "Lei institui exame de paternidade gratuito", Estadão Online, 20 nov.).

Em 2004, viria ainda à tona a notícia de outra filha não reconhecida de Pelé, quando um ex-sócio dele revelou o segredo à revista IstoÉ Gente (Araújo, 2002ARAÚJO, Luís Edmundo (2002). "O nome dela é Flavia Kurtz". IistoÉ Gente, 15 abr. Disponível em: <Disponível em: http://www.terra.com.br/istoegente/141/reportagens/capa_pele.htm :>. Acessado em 10 set. 2009.
http://www.terra.com.br/istoegente/141/r...
). Entrevistada pelos jornais, ela afirmou que nunca buscou o reconhecimento legal e que havia amizade entre ela e Pelé (OESP, 2002_______. (2002). "Surge mais uma filha de Pelé", Estadão Online, 10 abr. ). Na reportagem da Folha se destacava, ainda, que Pelé tinha uma boa relação com essa filha, ao contrário da que havia entre ele e Sandra (FSP, 2002______. (2002). "Pelé assume filha de 34 anos nascida em Porto Alegre", Folha Online, 11 abr. Disponível em: <http://www1.folha.uol.com.br/folha/esporte/ult92u38035.shtml>. Acessado em 10 set. 2009.
http://www1.folha.uol.com.br/folha/espor...
). Pelé declararia à revista IstoÉ Gente que, como essa filha "não exigiu nada, acabou ganhando tudo o que quis" (Araújo, 2002ARAÚJO, Luís Edmundo (2002). "O nome dela é Flavia Kurtz". IistoÉ Gente, 15 abr. Disponível em: <Disponível em: http://www.terra.com.br/istoegente/141/reportagens/capa_pele.htm :>. Acessado em 10 set. 2009.
http://www.terra.com.br/istoegente/141/r...
), numa clara referência ao processo envolvendo Sandra.

Em 2006, com 42 anos, Sandra morreu em consequência de um câncer de mama e o assunto voltou à baila com abundantes notas sobre o assunto publicadas nos sites dos jornais ao longo de todo aquele dia 17 de outubro, que tinham por tema desde o não comparecimento de Pelé ao velório e a coroa de flores que ele enviara para marcar presença até mesmo a informação de que a mãe de Sandra teria, mais tarde, retirado a coroa de flores (FSP, 2006a______. (2006a). "Pelé envia flores, mas não vai a velório da filha em Santos", Folha Online, 17 out. Disponível em: <http://www1.folha.uol.com.br/folha/cotidiano/ult95u127144.shtml>. Acessado em 10 set. 2009.
http://www1.folha.uol.com.br/folha/cotid...
, 2006b______. (2006b). "Vereadora filha de Pelé morre em Santos", Folha Online, 17 out. Disponível em: <http://www1.folha.uol.com.br/folha/cotidiano/ult95u127137.shtml>. Acessado em 10 set. 2009.
http://www1.folha.uol.com.br/folha/cotid...
, 2006c______. (2006c). "Prefeito de Santos decreta luto pela morte de vereadora filha de Pelé", Folha Online, 17 out. Disponível em: <http://www1.folha.uol.com.br/folha/cotidiano/ult95u127147.shtml>. Acessado em 10 set. 2009.
http://www1.folha.uol.com.br/folha/cotid...
, 2006d______. (2006d). "Mãe manda tirar flores de Pelé de perto do caixão da filha", Folha Online, 17 out. Disponível em: <http://www1.folha.uol.com.br/folha/cotidiano/ult95u127156.shtml>. Acessado em 10 set. 2009.
http://www1.folha.uol.com.br/folha/cotid...
).

O caso jamais foi esquecido e, ao longo dos anos, a atitude de Pelé seria constantemente rememorada em circunstâncias em que outros homens públicos se negaram a reconhecer uma paternidade. Em 2010, os comentários de leitores às notícias de que o então Vice-Presidente José Alencar se recusava a fazer o teste de DNA numa ação de investigação de paternidade, equiparavam a situação dele à de Pelé. Em ambos os casos, a negação em reconhecer a paternidade era vista como algo que apagaria a boa imagem ou os feitos do suposto pai, sendo vista, ainda, como uma falha de caráter (FSP, 2010______. (2010). "Não estou habituado a ceder a chantagem, diz Alencar sobre processo de paternidade", Folha Online, 4 ago. Disponível em: <http://www1.folha.uol.com.br/poder/777438-nao-estou-habituado-a-ceder-a-chantagem-diz-alencar-sobre-processo-de-paternidade.shtml>. Acessado em 9 out. 2015.
http://www1.folha.uol.com.br/poder/77743...
).

Ao longo dos anos em que o caso de Pelé e Sandra esteve sob os holofotes, os comentários dos leitores que acompanharam a história pelos jornais foram unânimes em afirmar que a validação do parentesco biológico trazia também a responsabilidade, não só jurídica, do cuidado, mas também afetiva, da convivência e do amor.

Cuidados, afetos, traições

Diferentemente de Pelé, que passou por um longuíssimo processo judicial e que mesmo após um resultado positivo do teste de DNA recorreria até a última instância jurídica e se recusaria a ter qualquer relação com Sandra, o episódio envolvendo o ex-Presidente FHC causaria também polêmica e acenderia paixões, mas por motivos diversos. Nesse caso, o debate seria ampliado pelo resultado negativo do teste de DNA em uma paternidade tida anteriormente como certa.

Na época em que era senador, FHC teria tido um caso extraconjungal com uma jornalista. Quando ela engravidou, ele teria assumido financeira e afetivamente o filho, ainda que sem o reconhecimento oficial da paternidade. O filho nasceu em 1991 e, em 1993, quando assumiu o Ministério da Fazenda, a informação sobre a paternidade circulou entre jornalistas e políticos. Com a candidatura de FHC à Presidência da República, em 1994, o caso foi, segundo os próprios jornalistas, abafado pelos órgãos de imprensa e tratado como um segredo estratégico (Leite, 2011LEITE, Paulo Moreira (2011). "FHC e o fim de uma história errada", Época, 27 jun. Disponível em: <Disponível em: http://colunas.epoca.globo.com/paulomoreiraleite/2011/06/27/o-fim-de-uma-historia-errada >. Acessado em 20 set. 2011.
http://colunas.epoca.globo.com/paulomore...
). A jornalista mudou-se para a Europa e jamais deu entrevistas sobre o assunto. O silêncio sobre o caso foi rompido com a publicação de uma matéria na revista Caros Amigos, em 2000, centrada na relação do então presidente com a imprensa ao questionar, na capa, "Por que a imprensa esconde o filho de 8 anos de FHC com a jornalista da Globo?". Em 2009, o assunto voltaria à tona com novos desdobramentos com a publicação, pela articulista Mônica Bergamo, da Folha de S.Paulo, de que o ex-presidente, agora viúvo, teria feito o reconhecimento oficial do filho num cartório em Madri. Até então, embora a história tivesse sido mantida em segredo, parecia não envolver dúvidas sobre a veracidade de que FHC seria o pai biológico. No entanto, em 2011, a coluna "Radar" da revista Veja (Jardim, 2011JARDIM, Lauro (2011). "DNA revelador", Veja Online, 25 jun. Disponível em: <Disponível em: http://veja.abril.com.br/blog/radar-on-line/brasil/sabado/ >. Acessado em 17 maio 2009.
http://veja.abril.com.br/blog/radar-on-l...
) noticia que depois do reconhecimento oficial da paternidade, os filhos do casamento de FHC solicitaram a realização de um teste de DNA para comprovar o vínculo. No fim de 2010, o exame feito em São Paulo negaria a paternidade e, em 2011, novo exame, feito em Nova York, repetiria o resultado negativo. Na coluna de Mônica Bergamo (2011)BERGAMO, Mônica (2011). "Filho de repórter da Globo não é de FHC, diz DNA", Folha de S.Paulo, 26 jun. Disponível em: <Disponível em: http://www1.folha.uol.com.br/fsp/poder/po2606201105.htm >. Acessado em 9 out. 2015.
http://www1.folha.uol.com.br/fsp/poder/p...
, na Folha, ela informava que o ex-presidente desejava manter a história restrita aos familiares e que ele considerava que o exame seria uma negativa biológica, não jurídica. FHC falaria pela primeira vez sobre o assunto para a revista Alfa, da qual foi capa na edição de agosto de 2011, e declarou:

Eu nunca falei sobre o Tomás e, se agora fizeram o exame de DNA mostrando que ele não é meu filho, também não vou falar. Vou preservá-lo totalmente. No afeto e nos recursos. Totalmente. É um assunto fora de discussão. E eu gosto muito dele. Isso é que é importante (Viladarga, 2011).

Ao contrário do caso de Pelé, nos quais os comentários de leitores sempre foram categóricos em condenar o não reconhecimento de paternidade, no caso de FHC, as opiniões se dividiram. Os comentários dos leitores à coluna "Radar", da revista Veja5 5 Até novembro de 2011, o site da revista Veja havia publicado 179 comentários de leitores para essa notícia. Na Folha, a notícia posterior, "FHC diz que DNA não muda relação com filho de repórter da Globo", de 9 de agosto, apresentava até novembro do mesmo ano, 1.333 comentários (Disponível em: <http://www1.folha.uol.com.br/poder/956695-fhc-diz-que-dna-nao-muda-relacao-com-filho-de-reporter-da-globo.shtml>. Acessado em 18 nov. 2011. , que primeiro publicou o resultado negativo do exame de DNA, apresentavam todos os tipos de opiniões, centradas nos mais diversos personagens da história (mãe, pai, filho, esposa do pai, filhos do pai com a esposa, órgãos da imprensa que esconderam a notícia na época da gravidez). Alguns comentários ressaltavam a nobreza de caráter, a integridade moral, a honradez e a dignidade de FHC, e vários deles o comparavam com outros casos famosos, como o de Pelé e o de José Alencar, opondo a grandeza de FHC à mesquinhez dos demais. Muitos leitores se regozijavam com a traição subentendida no teste negativo de paternidade, agravada, ainda, por se tratar de uma infidelidade da amante. Na mesma linha, outros viam a situação como uma forma de vingança para a falecida esposa. Alguns leitores focavam-se nos filhos do casamento, caracterizando a atitude deles ao pedir o exame como corajosa ou defendendo que eles não deveriam ser obrigados a dividir a herança com um irmão, sem laço biológico, fruto de uma traição da amante do pai. Outros, contudo, se focariam no filho que teve a paternidade negada pelo exame, afirmando que ele seria o maior prejudicado, que teria se tornado um "filho de ninguém". Ainda nessa direção, alguns apelariam para a empatia, dialogando com os que condenavam mãe e filho, ao advertirem os outros: "poderia ser com você". Grande número de comentários se concentraria na mãe, caracterizando-a com adjetivos de baixo calão e condenando-a moralmente por ter dado um golpe no parceiro e prejudicado o filho. Alguns poucos comentários teceriam reflexões menos focadas nos detalhes específicos do caso, mas preocupadas, ao invés disso, em mostrar a filiação como um fato mais afetivo que biológico. Um leitor compararia a situação a um caso de adoção para destacar que o sangue pode ser irrelevante para o estabelecimento de uma relação entre pais e filhos. Outro leitor invocaria noções de direito para assinalar que não existe ex-filho e que a filiação é um ato socioafetivo.

Enquanto nas declarações públicas o próprio ex-presidente atribuía maior valor ao afeto e ao cuidado como fundantes da relação parental, nos comentários das notícias sobre o caso os leitores ora privilegiavam o cuidado, ora a biologia para definir as atitudes adequadas em termos de direitos e responsabilidades associadas ao parentesco. E, nesse entremeio, um aspecto fundamental sobressai: a dimensão de gênero.

Parentesco, gênero e exames de DNA

Se o teste de DNA pode legitimar relações de parentesco, validando nesse sentido a palavra de uma mulher ao apontar quem é o pai de seu filho, ele pode também revelar traições. Desse modo, embora num primeiro momento o teste de DNA tenha sido visto como algo que favoreceria as mulheres, livrando-as de constrangedoras situações em que sua palavra fosse injustamente posta em questão, na prática as possibilidades do exame não se restringiram às situações que beneficiavam os filhos ou as mulheres, tendo, de todo modo, importantes implicações para as relações de gênero e de parentesco6 6 Nesse sentido, uma das primeiras análises publicadas foi a de Claudia Fonseca (2002). Baseada numa etnografia realizada nos tribunais gaúchos, a autora evocava a imagem de um dos casos mais famosos de dúvida de paternidade da literatura brasileira, sugerindo que, se, de um lado, o exame de DNA validava a palavra das mulheres, representando uma "vingança de Capitu", de outro, poderia também retirar muitos "Dom Casmurros" do armário, que vislumbravam no exame a possibilidade em saber "a verdade" sobre os laços biológicos. Assim, uma das faces mais dramáticas que o uso do exame pode assumir se dá quando um homem recorre depois de anos ao exame para tirar a dúvida sobre a paternidade de um filho que ele até então havia criado como seu. Para uma análise instigante sobre o tema, ver também Fonseca (2014). .

Nas histórias em que o exame de DNA funciona como um legitimador de relações de parentesco, como a de Sandra e Pelé, as opiniões dos leitores dos jornais tendem a ser unânimes em afirmar o direito do filho ao reconhecimento e ao afeto do pai. Nas histórias em que o teste revela traição, como a de FHC, as opiniões se dividem e pelo menos uma parcela dos leitores tende a desconsiderar o direito do filho em favor do direito do homem enganado, de modo que, desse ponto vista, soaria compreensível que um homem traído renegasse um filho.

Nessas circunstâncias, há um pesado julgamento sobre a moral da mulher em questão. O exame de DNA negativo é, contudo, o ingrediente fundamental dessa trama, já que em outras circunstâncias, quando a paternidade é validada pelo exame, ainda que possa haver questionamentos sobre o comportamento sexual da mulher ou sobre suas intenções, raramente se considera aceitável que o homem negue ao filho o direito ao reconhecimento de paternidade. Nas numerosas notícias sobre processos envolvendo homens famosos e endinheirados, é frequente que muitos comentários de leitores qualifiquem a mãe da criança como interesseira e julguem que ela apenas teve o filho para obter vantagens materiais sobre o parceiro. Não é tampouco incomum que o homem seja classificado como um tolo que, por não se preocupar com contracepção, caiu no "golpe da barriga". Todavia, a despeito do julgamento feito sobre as mulheres e os homens envolvidos nesses casos, parece ser ponto pacífico, nas opiniões expressas, que uma vez comprovada a paternidade, pelo exame de DNA, o direito dos filhos ao reconhecimento e suas consequências materiais deve ser garantido.

Ao mesmo tempo, porém, não têm sido infrequentes as reações de leitores contra as declarações de homens que colocam em questão a moral da mulher para negar uma paternidade. Representativos dessa tendência foram os comentários ao caso de investigação de paternidade envolvendo o ex-Vice-Presidente José Alencar. Em 2010, numa entrevista ao "Programa Jô Soares", ele afirmaria: "Como os próprios tribunais dizem, tem de haver indícios. Se não, amanhã, todo mundo que foi à zona um dia pode ser [submetido a exame de DNA]" (FSP, 2010______. (2010). "Não estou habituado a ceder a chantagem, diz Alencar sobre processo de paternidade", Folha Online, 4 ago. Disponível em: <http://www1.folha.uol.com.br/poder/777438-nao-estou-habituado-a-ceder-a-chantagem-diz-alencar-sobre-processo-de-paternidade.shtml>. Acessado em 9 out. 2015.
http://www1.folha.uol.com.br/poder/77743...
). Nos comentários posteriores às notícias sobre o assunto, publicadas na Folha de S. Paulo (FSP, 2010______. (2010). "Não estou habituado a ceder a chantagem, diz Alencar sobre processo de paternidade", Folha Online, 4 ago. Disponível em: <http://www1.folha.uol.com.br/poder/777438-nao-estou-habituado-a-ceder-a-chantagem-diz-alencar-sobre-processo-de-paternidade.shtml>. Acessado em 9 out. 2015.
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), muitos leitores classificariam a posição dele como machista e afirmariam que mesmo que a mãe de sua suposta filha fosse prostituta, ainda assim, se o exame comprovasse a paternidade, ela teria o direito ao reconhecimento. É significativo que os comentários condenando a atitude de José Alencar não tenham se restringido apenas ao calor da hora de suas declarações, mas retomados também num delicado momento, logo após sua morte, quando muitos leitores se manifestariam no fórum da versão on-line do jornal O Estado de S. Paulo para destacar como uma falha de caráter e como algo que teria apagado a boa imagem do ex-vice-presidente a negação dele em fazer o exame de DNA e as declarações que dera. Nesse fórum, entre os muitos comentários que remeteram ao episódio, apenas um o retomaria para afirmar que homens de bem deveriam ter o direito de "frequentar prostíbulos" sem terem de se submeter a testes posteriores de DNA. A imensa maioria, contudo, expressava total desacordo com esse tipo de declaração, demostrando uma tendência à ruptura com uma visão, que perdura desde o início do século XX, de que o direito da mulher ao reconhecimento de seu filho deveria ser condicionado a seu comportamento sexual.

As cartas e mensagens enviadas a jornais e sites de notícias condenando homens públicos que se recusam a reconhecer um filho, mesmo depois de um exame de DNA positivo, mostram que, atualmente, talvez como nunca antes, tem havido maior atribuição de responsabilidade aos homens sobre a reprodução. Se as mulheres sempre foram responsabilizadas pelos filhos, os homens quase nunca estiveram presentes nessa equação. Reportagens sobre casos de abandono de recém-nascidos ou de infanticídio praticados por mulheres costumam provocar grande escândalo, sendo abordados ora como uma anomalia que iria contra o comportamento considerado natural para as mulheres, ora como uma doença (loucura puerperal no início do século XX, depressão pós-parto no início do XXI), o abandono de filhos por homens nunca foi, entretanto, visto sob a mesma chave explicativa. No contexto em que o reconhecimento de paternidade é considerado um direito humano, a condenação moral dos homens que abandonam seus filhos pode estar se tornando mais frequente, ainda que essa avaliação continue assentada na clássica divisão entre maternidade como mais fundada nos "fatos naturais" e paternidade como mais baseada nos "fatos culturais ou sociais". Assim, ao contrário das mulheres, cujo comportamento é visto como um ato antinatural e, portanto, monstruoso, no caso dos homens a questão é tratada como uma falha de caráter ou mesmo como algo que colocaria uma sombra em seus feitos.

Pelé argumentou repetidamente que não poderia ter uma relação pai-filha com Sandra porque não a conhecia e não havia tido uma convivência com ela ao longo da vida. Essas considerações dele jamais foram vistas como um bom argumento para os que acompanharam e comentaram o caso pelos jornais. Ao contrário, o exame de DNA positivo era visto como um validador da relação de parentesco, que poderia adquirir os contornos do afeto e da convivência, se Pelé assim o desejasse. Já a afirmação de FHC de que nada mudaria em relação ao afeto ou aos recursos para o filho, mesmo depois de o teste de DNA negar o parentesco, foi vista de múltiplas maneiras. Embora alguns leitores tenham comentado que a paternidade não é feita apenas de "sangue" e outros enfatizado que o exame de DNA não poderia levar à ruptura de uma relação já construída, esse ponto de vista estava longe de ser consensual. Mesmo os que consideravam que não renegar o filho seria a única ação possível numa circunstância desse tipo, interpretavam essa atitude mais como decência, bom caráter ou respeito à regulação jurídica de que o reconhecimento de um filho é irrevogável do que pelo viés de que as relações parentais podem estar mais fundadas no afeto do que num teste de DNA positivo. Na avaliação que uma parcela dos leitores fez sobre esse caso, diferentemente de uma circunstância na qual um homem adota um filho da parceira sabendo que biologicamente ele não é seu, pesa também a traição da amante. Isto é, se o homem foi enganado pela mulher soa como socialmente mais aceitável que ele revogue o reconhecimento de paternidade e altere a relação que até então havia com o filho, ainda que essa possa ser uma atitude sujeita a controvérsias.

Cuidado, consanguinidade e responsabilidades parentais

A dimensão de gênero é crucial para se compreender as articulações entre consanguinidade, cuidado e responsabilidades parentais, mas outros ingredientes também se misturam a essa trama. Os casos de Pelé e FHC são analiticamente instigantes, pois embora não sejam absolutamente incomuns histórias que estejam em um desses dois extremos - na negação repetida de uma paternidade validada pelo teste de DNA ou na afirmação de que nada mudará em relação ao filho, mesmo depois de um resultado negativo do teste -, o fato de essas histórias serem públicas traz à tona, de modo intenso, a avaliação daqueles que as acompanharam pelos jornais. Nos comentários sobre os casos, muitos elementos são acionados de modo conjunto, como a relação entre o leitor e a figura pública (no caso de FHC, não eram incomuns que filiações partidárias fossem explicitadas), mas há também ponderações mais gerais que julgam a ação de cada um dos envolvidos de acordo com o que se considera socialmente adequado para circunstâncias em que relações de parentesco são validadas ou negadas por um teste de DNA. Por exemplo, a controvérsia em torno da declaração de FHC "Vou preservá-lo totalmente. No afeto e nos recursos" está também em tudo que lhe é subjacente: a traição da amante, a parentalidade fundada no afeto e a informação que nega a paternidade biológica. Na declaração está subentendido que o pai vai preservar, no afeto e nos recursos, um filho reconhecido legalmente apesar de o teste de DNA ter, posteriormente, negado a paternidade biológica.

Os dois casos são, ainda, muito significativos porque dizem respeito a circunstâncias em que a ação subsequente é marcada por um comportamento que, em alguma medida, parece estar em desacordo com a informação atestada pelo exame de DNA. Parte da polêmica presente nas histórias escolhidas para essa análise se deve, contudo, ao fato de suas implicações relacionais não serem as mais óbvias ou as socialmente esperadas. Para compreendermos melhor essa dimensão, é preciso acrescentar à discussão um ponto já indicado por Marilyn Strathern (1999)STRATHERN, Marilyn (1999). Property, substance and effect. London: Athlone Press., de que qualquer que seja a ação subsequente a uma nova informação de parentesco, essa implicará selecionar ou rejeitar aqueles que foram revelados como parentes ou como não parentes, de modo que, sempre soará como uma escolha entre pessoas. Embora pareça uma observação óbvia, é uma demonstração do quanto os laços de parentesco são intrínsecos à constituição social de pessoas (Carsten, 2000CARSTEN, Janet (2000). "Introduction: cultures of relatedness", em CARSTEN, J. (org.). Cultures of relatedness. new approaches to the study of kinship. Cambridge: Cambridge University Press.). É também fundamental para se compreender porque muitas vezes na narrativa dos filhos o sofrimento pessoal relacionado à negação do pai em ter um relacionamento ativo é tão evidente, como exemplificado nas declarações de Sandra.

De modo análogo, contudo, é o mesmo princípio que está presente no julgamento feito pelos leitores ao comentar as posições de pessoas públicas, já que esses comentários estão claramente baseados num apoio ou repulsa ao comportamento de um homem que decide não ter um relacionamento ativo com um filho biológico ou, ao contrário, que decide manter a relação a despeito de ter a paternidade negada pelo exame de DNA.

As declarações de Pelé sobre as duas filhas que conheceu apenas quando adultas são emblemáticas. Sobre Sandra, ele diria: "Para mim, biologicamente, ela pode até ser minha filha. Mas, na parte sentimental, não posso me preocupar com essa pessoa, porque não a conheço" (FSP, 1996a______ (1996a). "Pelé diz que não cede em processo de paternidade", 10 abr., p. 3-10. Disponível em: <http://www1.folha.uol.com.br/fsp/1996/4/10/esporte/18.html>. Acessado em 9 out. 2015.
http://www1.folha.uol.com.br/fsp/1996/4/...
). Posteriormente, quando vem à tona a história de outra filha tida fora do casamento, ele declara: "Quando ela começou a falar, me disse quem era e relatou sua história, eu olhei no seu rosto e pude ver que era da minha família" (OESP, 2002_______. (2002). "Surge mais uma filha de Pelé", Estadão Online, 10 abr. ). A polêmica em torno da postura dúbia do ex-jogador é marcada pelo fato de que, ao se referir a uma das filhas, ele descartava a consanguinidade para ressaltar que só a convivência faria o parentesco. Mas, com a outra filha, eram justamente as semelhanças físicas que eram tomadas como uma confirmação, não apenas de um laço de "sangue", mas de modo mais agudo, que a legitimaria como parte de sua "família". Uma escolha entre fatos pode, portanto, ser uma escolha entre relacionamentos, conforme já havia indicado Strathern (1999)STRATHERN, Marilyn (1999). Property, substance and effect. London: Athlone Press..

As responsabilidades associadas ao parentesco nunca se restringiram unicamente ou a uma questão de "sangue" ou de cuidados e afetos; ao contrário, as relações entre esses termos sempre foram das mais intrincadas e complexas. O sentido socialmente atribuído ao teste de DNA como um validador das relações de parentesco tem ocasionado, no entanto, efeitos importantes no modo como cuidado e consanguinidade se entrelaçam na atribuição de responsabilidades parentais e, desse modo, a dimensão de gênero continua a ser crucial para pensar as relações de parentesco. Para muitos filhos que buscam o reconhecimento de paternidade o resultado positivo do teste de DNA pode ser visto como algo que acarreta não só direitos e deveres do parentesco, mas que também gera a expectativa de uma relação parental. Nem sempre, no entanto, os pais desejam ter um relacionamento ativo com os filhos baseados nessa conexão. Em alguns casos, como mostra a história de Pelé, a ausência de uma relação no passado pode ser usada para justificar a impossibilidade de uma relação futura, ainda que essa possa ser uma postura socialmente malvista. Do mesmo modo, a negativa de um laço biológico não apaga necessariamente um passado de afeto e cuidado nem impossibilita uma relação futura. Em todos os casos, porém, a validação de uma informação de parentesco promove impactos importantes nas relações e na concepção que cada um tem de si e de sua história.

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  • ULHÔA, Raquel (2001). "Projeto de lei prevê exame de DNA gratuito se solicitado pela Justiça". Folha Online, 21 nov. Disponível em: <Disponível em: http://www1.folha.uol.com.br/folha/brasil/ult96u26881.shtml >. Acessado em 10 set. 2009.
    » http://www1.folha.uol.com.br/folha/brasil/ult96u26881.shtml
  • VILARDAGA, Vicente (2011). "Livre pensar é só pensar", Alfa Homem, n. 12, p. 74-79.
  • WEBER, Florence (2006). "Lares de cuidado, linhas de sucessão: algumas indicações etnográficas na França, hoje". Mana, v. 12, n. 2, p. 479-502.
  • **
    **Bolsista Fapesp (Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo) - processo 2012/51741-8.
  • ***
    ***Este artigo remete a trechos adaptados de minha tese de doutorado (Finamori, 2012FINAMORI, Sabrina (2012). Os sentidos da paternidade: dos "pais desconhecidos" ao exame de DNA. Tese (doutorado) em Ciências Sociais. Campinas: IFCH/Unicamp.), financiada pelo CNPq e pela Fapesp. Agradeço a Heloisa Pontes pela orientação da pesquisa original e pela interlocução preciosa há muitos anos e também a Guita Debert pela parceria mais recente. As escolhas teórico-metodológicas e as posições que expresso no artigo são obviamente de minha inteira responsabilidade.
  • 1
    Pelo Código Civil de 1916, a denominação "legítimo" era dada ao filho concebido durante o matrimônio legal entre os pais; "legitimado", por sua vez, se referia à situação em que os pais apenas se casaram legalmente depois do nascimento do filho; "ilegítimo" ou "natural" agrupava os filhos tidos fora de um união legal, estando a designação natural mais frequentemente relacionada a situações em que os pais viviam em união consensual, nominada à época como concubinato.
  • 2
    O levantamento das notícias compreendeu a correlação entre os termos paternidade e teste de DNA desde os anos de 1990, tendo se concentrado, ainda que não ficado restrito, aos jornais O Estado de S. Paulo (OESP) e Folha de S.Paulo (FSP). A pesquisa mais ampla incluiu uma gama de fontes e campos de pesquisa, entre os quais: leis, textos médicos e jurídicos, debates legislativos, processos de investigação de paternidade e narrativas de vida de filhos em busca do reconhecimento de paternidade.
  • 3
    Ver, a esse respeito, a excelente coletânea organizada por Hirata e Guimarães (2012)HIRATA, Helena & GUIMARÃES, Nadya Araújo (orgs.). (2012). Cuidado e cuidadoras: as várias faces do trabalho do care. São Paulo: Atlas..
  • 4
    Tais como: care for, care about, take care of someone, to take care, to be careful, to have cares, to be full of care (Lambek, 2007LAMBEK, Michael (2007). "The cares of Alice Alder: recuperating kinship and history in Switzerland", em CARSTEN, J. (org.). Ghosts of memory: essays on remembrance and relatedness. Malden (MA): Blackwell., p. 220).
  • 5
    Até novembro de 2011, o site da revista Veja havia publicado 179 comentários de leitores para essa notícia. Na Folha, a notícia posterior, "FHC diz que DNA não muda relação com filho de repórter da Globo", de 9 de agosto, apresentava até novembro do mesmo ano, 1.333 comentários (Disponível em: <http://www1.folha.uol.com.br/poder/956695-fhc-diz-que-dna-nao-muda-relacao-com-filho-de-reporter-da-globo.shtml>. Acessado em 18 nov. 2011.
  • 6
    Nesse sentido, uma das primeiras análises publicadas foi a de Claudia Fonseca (2002)FONSECA, Claudia (2002). "A vingança de Capitu: DNA, escolha e destino na família brasileira contemporânea", em BRUSCHINI, C. & UNBEHAUM, S. (orgs.). Gênero, democracia e sociedade brasileira. São Paulo: Editora 34.. Baseada numa etnografia realizada nos tribunais gaúchos, a autora evocava a imagem de um dos casos mais famosos de dúvida de paternidade da literatura brasileira, sugerindo que, se, de um lado, o exame de DNA validava a palavra das mulheres, representando uma "vingança de Capitu", de outro, poderia também retirar muitos "Dom Casmurros" do armário, que vislumbravam no exame a possibilidade em saber "a verdade" sobre os laços biológicos. Assim, uma das faces mais dramáticas que o uso do exame pode assumir se dá quando um homem recorre depois de anos ao exame para tirar a dúvida sobre a paternidade de um filho que ele até então havia criado como seu. Para uma análise instigante sobre o tema, ver também Fonseca (2014)______ (2014). Parentesco, tecnologia e lei na era do DNA. Rio de Janeiro: Eduerj..
  • Errata

    No artigo Cuidado e consanguinidade na atribuição de responsabilidades intergeracionais, de Sabrina Finamori, com número de DOI: 10.1590/0103-335220151809, publicado no periódico Revista Brasileira de Ciência Política, número 18, pp. 243-263, na página 243:
    Onde se lia:
    " Care and inbreeding in the allocation of intergenerational responsibilities "
    leia-se:
    " Care and consanguinity in the allocation of intergenerational responsibilities ".
    Na página 263, onde se lia:
    Abstract
    In Brazil, DNA testing has been crucial for the legal validation of parenthood. It is also based on that validation that fathers' duty to care for their children can be established, both in terms of financial provision and moral and affective obligations. Beyond the legal dimension, however, care, in its multiple meanings, can be a major reference for how parents and children measure and justify their own rights and obligations. Based on cases of testing that had great impact in the media, the purpose of this article is to analyze how inbreeding and care practices are mutually implicated and can be mobilized in different ways when allocating responsibilities and claiming rights associated with kinship.
    leia-se:
    Abstract
    In Brazil, DNA testing has been crucial for the legal validation of parenthood. It is also based on that validation that fathers' duty to care for their children can be established, both in terms of financial provision and moral and affective obligations. Beyond the legal dimension, however, care, in its multiple meanings, can be a major reference for how parents and children measure and justify their own rights and obligations. Based on cases of testing that had great impact in the media, the purpose of this article is to analyze how consanguinity and care practices are mutually implicated and can be mobilized in different ways when allocating responsibilities and claiming rights associated with kinship.

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    Sep-Dec 2015

Histórico

  • Recebido
    01 Jun 2015
  • Aceito
    17 Set 2015
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