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Novo estudo sobre terapêutica hormonal da menopausa: novas evidências?

GINECOLOGIA

Novo estudo sobre terapêutica hormonal da menopausa: novas evidências?

Cláudia Maria Santos Aldrighi; José Mendes Aldrighi

A revista Lancet publicou, em agosto de 2003, um estudo observacional de coorte, realizado no Reino Unido, denominado Million Women Study (MWS)1, envolvendo 1.084.110 mulheres de 50 a 64 anos e cujo objetivo foi o de investigar o efeito do estrogênio isolado, da associação estrogênio com progestógeno e da tibolona sobre a incidência e mortalidade por câncer de mama. O estudo se baseou em informações obtidas de questionários preenchidos por mulheres que participavam de um programa de "screening" mamográfico. Após 2,6 anos, o risco relativo (RR) para câncer de mama nas não-usuárias foi de 1.00 (Intervalo de confiança, IC 95% = 0.96/1.04); nas usuárias de estrogênio foi de 1.30 (1.22/1.38); da associação estrogênio/progestógeno foi de 2,00 (1.91/2.09) e da tibolona foi de 1.45 (1.25/1.67). Após quatro anos, constatou-se aumento marginal da mortalidade nas usuárias de hormônios (RR=1.22; 1.00 — 1.48).

Comentário

Inicialmente é importante considerar que estudos observacionais, como o MWS, são adequados para testar hipóteses; no entanto, para avaliar adequadamente essas hipóteses são necessários estudos prospectivos randomizados com placebo controlado.

O MWS não trouxe nenhuma informação diferente dos estudos prévios2,3 quanto ao risco do câncer de mama nas usuárias da terapêutica hormonal da menopausa (THM); entretanto, ao se comparar os resultados do MWS constatam-se discordâncias com os do Womens Health Initiative (WHI), que não evidenciou até o presente momento qualquer aumento do risco de câncer de mama no braço das usuárias do estrogênio isolado e que após sete anos de estudo, ainda continua em andamento

Causou-nos surpresa os resultados obtidos com a tibolona, pois contraria todas as investigações prévias; assim, em modelos animais a tibolona exerce efeito protetor mamário no mesmo grau que o tamoxífeno4; em humanos atua beneficamente sobre a densidade mamária, não aumentando-a. Essas respostas favoráveis provavelmente decorrem de efeitos inibitórios da tibolona sobre enzimas envolvidas na produção de estrogênio local4, bem como do aumento da apoptose local4.

Outro dado revelado no MWS, e que deve ser considerado, é o diagnóstico do câncer de mama com apenas 2 ½ anos; esses cânceres detectados nesse período, quase certamente já existiam no início do período observacional, reforçando os resultados de estudos que mostram que a THM atua mais como promotora do crescimento do câncer de mama, do que como iniciadora de um novo câncer de mama. De fato, o que suporta esta assertiva é a impressionante concordância entre todos os estudos que não constataram maior risco nas ex-usuárias e aqueles que mostraram o diagnóstico precoce de câncer de mama, após pouco tempo de uso da terapêutica hormonal5.

Por isso, é importante e fundamental que tenhamos critérios e críticas na avaliação de estudos.

Nem sempre um novo estudo significa nova evidência.

Referências

1. Colditz GA.; Hankinson SE; Hunter DJ, Willett WC, Manson JE, Stampfer MJ, et al. The use of estrogens and progestins and the risk of breast cancer in postmenopausal women. N Engl J Med 1995; 332:1589-93.

2. Collaborative Group on Hormonal Factors in Breast Cancer. Breast cancer and hormone replacement therapy: colaborative reanalysis of data from 51 epidemiological studies of 52705 women without breast cancer and 108411 women with breast cancer. Lancet 1997; 350:1047-59.

3. Nanda K. Bastian LA, Schulz K. Hormone replacement therapy and the risk of death from breast cancer: a systematic review. Am J Obstet Gynecol 2002; 186:325-34.

4. Bosman A, Kenemans P. Breast cancer and post-menopausal hormone therapy. Best Pract Res Clin Endocrinol Metab. 2003; 17:123-37.

5. The million women study and breast cancer. [editorial]. Maturitas 2003, 46:1-6.

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    04 Fev 2004
  • Data do Fascículo
    2003
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