Acessibilidade / Reportar erro

Análise das Estratégias Empregadas em um Programa de Intervenção Fonológica para Crianças com Deficiência Auditiva1, 2 2 Agradecemos ao Centro SUVAG pela constante parceria; às fonoaudiólogas Ana Caroline Esther, Carolina Karla de Souza Evangelista, Darling Dayenne Santana Freire Carvalho, Genielly Barbosa Tavares e Taise Ferreira de Lima, pelo envolvimento na elaboração das estratégias lúdicas e durante a coleta de dados; e à fonoaudióloga Ms. Gabriela Rabelo, pelas importantes contribuições nas discussões deste trabalho.

RESUMO:

Programas de intervenção fonológica para crianças com deficiência auditiva têm sido estudados mundialmente, dados os seus comprovados benefícios para o desenvolvimento da leitura. No entanto, no Brasil, não há referência à avaliação desses programas para crianças com deficiência auditiva inseridas em serviços de (re)habilitação auditiva. O objetivo desta pesquisa foi analisar as estratégias empregadas em um programa de intervenção fonológica para crianças com deficiência auditiva. Trata-se de estudo do tipo exploratório, de fonte documental, longitudinal com abordagem qualitativa, realizado a partir da intervenção com 11 crianças com deficiência auditiva e três pedagogas que acompanharam a intervenção em grupo. Foram analisados os 80 planos das sessões e as 80 fichas de observação das pedagogas, além da descrição dos resultados do grupo focal realizado com as pedagogas ao término da intervenção. Observou-se a necessidade de adaptações quanto às instruções, às estratégias e aos materiais utilizados, nessa ordem de frequência, assim como a utilização de estratégias de comunicação e técnicas específicas para otimizar a compreensão e a execução das atividades pelas crianças. Concluiu-se que o programa de intervenção fonológica para crianças com deficiência auditiva necessitou de adaptações e destaca-se a importância da capacitação dos profissionais nos serviços de terapia especializada para essa atuação.

PALAVRAS-CHAVE:
Deficiências da audição; Terapia fonoaudiológica; Aprendizagem da leitura; Formação pedagógica; Modelos de Educação Especial

ABSTRACT:

Phonological intervention programs for hard of hearing children has been studied worldwide, given their proven benefits for literacy development. However, in Brazil, there is no reference to the evaluation of these programs for hearing impaired children inserted in auditory (re)habilitation services. The objective of this research was to analyze the strategies employed in a phonological intervention program for hard of hearing children. This is an exploratory study, from a documentary, longitudinal source with a qualitative approach, carried out from the intervention with 11 hearing impaired children and three educators who followed the group intervention. Eighty session plans and 80 observation sheets of the educators were analyzed, as well as the description of the results of the focus group carried out with the educators at the end of the intervention. It was observed the need for adaptations regarding the instructions, strategies and materials used, in this order of frequency, as well as the use of communication strategies and specific techniques to optimize children’s understanding and execution of the activities. It was concluded that the phonological intervention program for children with hearing impairment needed adaptations and the importance of training professionals in specialized therapy services for this performance is highlighted.

KEYWORDS:
Hearing impairment; Speech therapy; Learning to read; Pedagogical training; Models of Special Education

1 Introdução

Nos últimos 30 anos, avanços tecnológicos e científicos surpreendentes têm proporcionado às crianças com deficiência auditiva o acesso aos sons da fala no momento favorável ao seu desenvolvimento da linguagem (Wake & Carew, 2016Wake, M., & Carew, P. (2016). Science, not philosophy, will help deaf and hard-of-hearing children reach their potential. Pediatrics, 137(1), 1-2. DOI: https://doi.org/10.1542/peds.2015-3443
https://doi.org/10.1542/peds.2015-3443...
; Bornstein, 2018Bornstein, S. (2018). The importance of early identification and intervention for children with hearing loss. Part 1: Human Development. J Health Commun, 3(8). DOI: 10.4172/2472-1654.100119
https://doi.org/10.4172/2472-1654.100119...
). Ainda assim, devido às variáveis intervenientes ao processo de (re)habilitação - tais como: a idade no diagnóstico, causa e grau da deficiência auditiva, o tempo de uso dos dispositivos auxiliares à audição, o envolvimento das famílias no processo terapêutico (Bicas, Guijo, & Delgado-Pinheiro, 2017Bicas R. S., Guijo L. M., & Delgado-Pinheiro E. M. C. (2017). Oral communication and auditory skills of hearing-impaired children and adolescents and the speech therapy rehabilitation process. Rev. CEFAC, 19, 465-474. DOI: http://dx.doi.org/10.1590/1982-0216201719412516
http://dx.doi.org/10.1590/1982-021620171...
; Moret, 2017Moret, A. L. M. (2017). Audiologia Educacional na Infância: contribuições do Campus de Bauru da Universidade de São Paulo. In S. Silva, & L. Digiampietri (Orgs.), Conhecendo a USP - contribuições do ensino, da pesquisa e da extensão no campo das deficiências (pp. 33-48). São Paulo: FEUSP.; Oliveira, Penna, & Lemos, 2015Oliveira, P. S, Penna, L. M., & Lemos, S. M. A. (2015). Language development and hearing impairment: literature review. Rev. CEFAC, 17, 2044-2055. DOI: http://dx.doi.org/10.1590/1982-0216201517611214
http://dx.doi.org/10.1590/1982-021620151...
; Penna, Lemos, & Alves, 2015Penna, L. M., Lemos, S. M. A., & Alves, C. R. L. (2015). Auditory and language skills of children using hearing aids. Braz J Otorhinolaryngol, 81, 148-157. DOI: http://dx.doi.org/10.1016/j.bjorl.2014.05.034
http://dx.doi.org/10.1016/j.bjorl.2014.0...
; Tabaquim et al., 2013Tabaquim, M. de L. M., Nardi, C. G. A., Ferrari, J. B., Moretti, C. N., Yamada, M. O., & Bevilacqua, M. C. (2013). Avaliação do desenvolvimento cognitivo e afetivo-social de crianças com perda auditiva. Revista CEFAC, 15(6), 1475-1481. DOI: http://dx.doi.org/10.1590/S1516-18462013005000051
http://dx.doi.org/10.1590/S1516-18462013...
; Vasconcelos & Pereira, 2015Vasconcelos, K. A. de, & Pereira, M. D. G. A. (2015). Importância da educação formal dos responsáveis e renda familiar no processo de adesão ao uso de próteses auditivas em menores de 12 anos. Revista CEFAC, 17(1), 216-222. DOI: http://dx.doi.org/10.1590/1982-0216201519213
http://dx.doi.org/10.1590/1982-021620151...
), entre outros fatores -, crianças com deficiência auditiva apresentam desvantagem em relação às crianças ouvintes quanto ao processamento fonológico e são, portanto, uma população de risco para a aquisição da leitura (Goldberg & Lederberg, 2015Goldberg, H. R., & Lederberg, A. R. (2015). Acquisition of the alphabetic principle in deaf and hard-of-hearing preschoolers: the role of phonology in letter-sound learning. Reading and Writing, 28(4), 509-525. DOI: https://doi.org/10.1007/s11145-014-9535-y
https://doi.org/10.1007/s11145-014-9535-...
; Lederberg, Schick, & Spencer, 2013Lederberg, A. R., Schick, B., & Spencer, P. E. (2013). Language and literacy development of deaf and hard-of-hearing children: Successes and challenges. Developmental Psychology, 49(1), 15-30. DOI: https://doi.org/10.1037/a0029558
https://doi.org/10.1037/a0029558...
; Naveka von Mentzer et al., 2013; Werfel, Douglas, & Ackal, 2016Werfel, K. L., Douglas, M., & Ackal, L. (2016). Small-Group phonological awareness training for Pre-Kindergarten children with hearing loss who wear Cochlear Implants and/or Hearing Aids. Deafness and Education International, 18(3), 134-140. DOI: https://doi.org/10.1080/14643154.2016.1190117
https://doi.org/10.1080/14643154.2016.11...
).

Destaca-se que, para as crianças com deficiência auditiva, a apreensão do código escrito é especialmente importante pois essa aquisição fortalece o domínio da linguagem oral, além do desenvolvimento apropriado de habilidades cognitivas essenciais para muitas de suas realizações (Gabriel, Morais, & Kolinsky, 2016Gabriel, R., Morais, J., & Kolinsky, R. (2016). A aprendizagem da leitura e suas implicações sobre a memória e a cognição. Ilha do Desterro, 69(1), 61-78. DOI: http://dx.doi.org/10.5007/2175- 8026.2016v69n1p61
http://dx.doi.org/10.5007/2175- 8026.201...
; Lemes & Goldfeld, 2008Lemes, J. P., & Goldfeld, M. (2008). Analysis of orthographic errors of children with cochlear implants. Rev Soc Bras Fonoaudiol., 13(3), 179-189.).

Considera-se que o trabalho de desenvolvimento das habilidades auditivas realizado com essas crianças nos programas de (re)habilitação auditiva, associado ao treino das habilidades metalinguísticas, em especial a consciência fonológica, são os protagonistas para um bom desempenho linguístico (Gamba-Yoshida, 2017Gamba-Yoshida, M. C. C. (2017). Atividades de estimulação da consciência fonológica por meio de um livreto destinado a alunos com deficiência auditiva/surdez (Dissertação de Mestrado). Universidade Estadual Paulista Júlio de Mesquita Filho - Faculdade de Ciências, Bauru, São Paulo, SP, Brasil.; Goldberg & Lederberg, 2015Goldberg, H. R., & Lederberg, A. R. (2015). Acquisition of the alphabetic principle in deaf and hard-of-hearing preschoolers: the role of phonology in letter-sound learning. Reading and Writing, 28(4), 509-525. DOI: https://doi.org/10.1007/s11145-014-9535-y
https://doi.org/10.1007/s11145-014-9535-...
; Spencer, Schuele, Guillot, & Lee, 2008Spencer, E. J., Schuele, C.M., Guillot, K. M. & Lee, M.W. (2008). Phonemic awareness skill of speech-language pathologists and other educators. Language, Speech, and Hearing Services in Schools, 39, 512-520.). De acordo com os referidos autores, a consciência fonológica é a capacidade de analisar e manipular os sons de uma língua.

Quanto às abordagens terapêuticas para as crianças com deficiência auditiva, a Abordagem Aurioral é amplamente utilizada no Brasil, quando as famílias escolhem o caminho do desenvolvimento auditivo para a aquisição da linguagem oral de seus filhos (Bevilacqua & Formigoni, 2012Bevilacqua, M. C., & Formigoni, G. M. P. (2012). Audiologia educacional: uma opção terapêutica para a criança deficiente auditiva. São Paulo: Pró-Fono.). Tal abordagem prioriza a via sensorial auditiva em situações interacionais de linguagem como meta para o desenvolvimento da linguagem oral, respondendo às necessidades psicológicas, sociais e educacionais das crianças com deficiência auditiva e de seus familiares (Moret, 2017Moret, A. L. M. (2017). Audiologia Educacional na Infância: contribuições do Campus de Bauru da Universidade de São Paulo. In S. Silva, & L. Digiampietri (Orgs.), Conhecendo a USP - contribuições do ensino, da pesquisa e da extensão no campo das deficiências (pp. 33-48). São Paulo: FEUSP.).

Para tanto, as crianças (re)habilitadas por meio dessa abordagem frequentam, comumente, terapias fonoaudiológicas individuais, com a participação dos familiares e, habitualmente, os serviços especializados de (re)habilitação oferecem também atendimentos fonoaudiológicos e/ou pedagógicos em enquadre de grupo, considerando os aspectos positivos da motivação do trabalho em pequenos grupos com as crianças, além do custo terapêutico, de modo a otimizar tanto a quantidade de atendimentos prestados quanto a qualidade da estimulação oferecida (Bevilacqua & Formigoni, 2012Bevilacqua, M. C., & Formigoni, G. M. P. (2012). Audiologia educacional: uma opção terapêutica para a criança deficiente auditiva. São Paulo: Pró-Fono.; Moret, 2017Moret, A. L. M. (2017). Audiologia Educacional na Infância: contribuições do Campus de Bauru da Universidade de São Paulo. In S. Silva, & L. Digiampietri (Orgs.), Conhecendo a USP - contribuições do ensino, da pesquisa e da extensão no campo das deficiências (pp. 33-48). São Paulo: FEUSP.).

Nos atendimentos individuais e grupais, uma série de estratégias de comunicação e de técnicas para capitalizar a capacidade auditiva das crianças com os dispositivos eletrônicos utilizados por elas, a saber, em especial, os Aparelhos de Amplificação Sonora Individual (AASI) e/ou Implantes Cocleares (IC), é empregada pelos terapeutas, de modo a favorecer a comunicação da forma mais fluida possível para que a criança perceba-se como um comunicador competente (Granha, Oliveira, & Rumpf, 2008Granha, D. O., Oliveira, A. S., & Rumpf, K. (2008). Estratégias terapêuticas realizadas com crianças deficientes auditivas oralizadas: revisão de literatura. In P. B. Silva, & R. H. F. Dav (Eds.), Cadernos da Fonoaudiálogo. Audiologia (pp. 49-55). São Paulo: Lovise.; Resegue-Coppi, 2008Resegue-Coppi, M. M. (2008). Desenvolvendo as habilidades auditivas em crianças usuárias de implante coclear: estratégias terapêuticas (Dissertação de Mestrado em Fonoaudiologia). Faculdade de Odontologia de Bauru, Universidade de São Paulo, Bauru, São Paulo, Brasil.).

Com base na premissa de que todas as crianças com deficiência auditiva, se bem adaptadas aos recursos auxiliares à audição e envolvidas em um processo terapêutico adequado, deverão acessar o código linguístico apropriadamente, o desenvolvimento da linguagem escrita nesta população fundamenta-se nas habilidades requeridas para as crianças ouvintes (Bergeron, Lederberg, Easterbrooks, Miller, & Connor, 2009Bergeron, J. P., Lederberg, A. R., Easterbrooks, S. R., Miller, E. M., & Connor, C. M. (2009). Building the alphabetic principle in young children who are deaf and hard of hearing. The Volta Review, 109(2-3), 87-119.; Easterbrooks, Lederberg, & Connor, 2010Easterbrooks, S. R., Lederberg, A. R., & Connor, C. M. (2010). Contributions of the emergent literacy environment to literacy outcomes for young children who are deaf. American Annals of the Deaf, 155(4), 467-480. DOI: 10.1353/aad.2010.0024
https://doi.org/10.1353/aad.2010.0024...
; Harris, Terlektsi, & Kyle, 2017Harris, M., Terlektsi, E., & Kyle, F. E. (2017). Concurrent and longitudinal predictors of reading for deaf and hearing children in Primary School. The Journal of Deaf Studies and Deaf Education, 22(2), 233-242. DOI: 10.1093/deafed/enw101
https://doi.org/10.1093/deafed/enw101...
; Lederberg, Miller, Easterbrooks, & Connor, 2014Lederberg, A. M., Miller E. M., Easterbrooks S., & Connor, C. M. (2014). Foundations for literacy: an early literacy intervention for deaf and hard-of-hearing children. Journal of Deaf Studies and Deaf Education, 19(4), 438-455. DOI: https://doi.org/10.1093/deafed/enu022
https://doi.org/10.1093/deafed/enu022...
; Mahapatra, 2015Mahapatra, S. (2015). Improving reading outcomes for students with or at risk for reading disabilities: a synthesis of the contributions from the Institute of Education Sciences Research Centers. Journal of Education and Practice, 6(19), 57-63.).

Easterbrooks, Lederberg e Connor (2010)Easterbrooks, S. R., Lederberg, A. R., & Connor, C. M. (2010). Contributions of the emergent literacy environment to literacy outcomes for young children who are deaf. American Annals of the Deaf, 155(4), 467-480. DOI: 10.1353/aad.2010.0024
https://doi.org/10.1353/aad.2010.0024...
, em um estudo descritivo, observaram salas de ensino infantil e fundamental. Os pesquisadores utilizaram as informações baseadas no protocolo de observação para desenvolver um currículo inicial de alfabetização denominado Foundations for Literacy. A premissa dos referidos autores era a de que é possível alfabetizar crianças com deficiência auditiva utilizar os mesmos construtos da alfabetização para as crianças ouvintes, desde que fossem realizadas adaptações que apoiassem as crianças com deficiência auditiva. O currículo elaborado focalizou-se no ensino de consciência fonológica, fonética, fluência, vocabulário e linguagem com adaptações adequadas. Seus resultados após a aplicação com crianças com deficiência auditiva demonstraram que elas poderiam aprender correspondências fonema-grafema específicas por meio de instrução de habilidades auditivas explícitas com suporte de linguagem e apoio visual.

Em um estudo de abordagem experimental controlada com 37 pré-escolares com deficiência auditiva, Gilliver, Cupples, Ching, Leigh e Gunnourie (2016)Gilliver, M., Cupples, L., Ching, T. Y. C., Leigh, G., & Gunnourie, M. (2016). Developing sound skills for reading: teaching phonological awareness to preschoolers with hearing loss. Journal of Deaf Studies and Deaf Education, 21(3), 268-279. DOI: https://doi.org/10.1093/deafed/enw004
https://doi.org/10.1093/deafed/enw004...
constataram que o treino específico de consciência fonológica foi superior ao treino de vocabulário do grupo controle, e, que este tipo de intervenção é, portanto, altamente benéfico para crianças com deficiência auditiva. Resultados semelhantes confirmam que o treino específico da consciência fonológica é positivo para as crianças com deficiência auditiva em idades pré e escolar, inclusive os treinos computadorizados ou que utilizam recursos da teleprática (Chen, 2014Chen, Y. H. (2014). Effects of phonological awareness training on early chinese reading of children who are deaf and hard of hearing. Volta Review, 114(1), 85-100.; Lee, Hall, & Sancibrian, 2017Lee, S. A. S., Hall, B., & Sancibrian, S. (2017). Feasibility of a supplemental phonological awareness intervention via telepractice for children with hearing loss: a preliminary study. International Journal of Telerehabilitation, 9(1), 23-38. DOI: https://doi.org/10.5195/ijt.2017.6216
https://doi.org/10.5195/ijt.2017.6216...
; Miller, Lederberg, & Easterbrooks, 2013Miller, E. M., Lederberg, A. R., & Easterbrooks, S. R. (2013). Phonological awareness: explicit instruction for young deaf and hard-of-hearing children. Journal of Deaf Studies and Deaf Education, 18(2), 206-227. DOI: https://doi.org/10.1093/deafed/ens067
https://doi.org/https://doi.org/10.1093/...
; Nakeva von Mentzer et al., 2013Nakeva von Mentzer, C., Lyxell, B., Sahlén, B., Wass, M., Lindgren, M., Ors, M., Kallioinen, P., & Uhlén, I. (2013). Computer-assisted training of phoneme-grapheme correspondence for children who are deaf and hard of hearing: Effects on phonological processing skills. International Journal of Pediatric Otorhinolaryngology, 77(12), 2049-2057. DOI: https://doi.org/10.1016/j.ijporl.2013.10.007
https://doi.org/10.1016/j.ijporl.2013.10...
; Rakhshanfadaee & Salehi, 2016Rakhshanfadaee, A., & Salehi, M. (2016). phonological awareness in children with hearing loss. The Hearing Journal, 69(9), 32-35.; Wang, Spychala, Harris, & Oetting, 2013Wang, Y., Spychala, H., Harris, R. S., & Oetting, T. L. (2013). The effectiveness of a phonics-based early intervention for deaf and hard of hearing Preschool children and its possible impact on reading skills in Elementary School: a case study. American Annals of the Deaf, 58(2),107-120.; Werfel, Douglas, & Ackal, 2016Werfel, K. L., Douglas, M., & Ackal, L. (2016). Small-Group phonological awareness training for Pre-Kindergarten children with hearing loss who wear Cochlear Implants and/or Hearing Aids. Deafness and Education International, 18(3), 134-140. DOI: https://doi.org/10.1080/14643154.2016.1190117
https://doi.org/10.1080/14643154.2016.11...
).

Em nosso país, a escassez de estudos sobre a intervenção fonológica com a população de crianças com deficiência auditiva traz à tona a necessidade de se construir ou adaptar programas específicos de instrução dessas habilidades, os quais buscam desenvolver, de modo geral: a relação grafema-fonema, a rima, a aliteração, a manipulação silábica, a manipulação fonêmica, a identificação de palavras em frases (Capellini et al., 2010Capellini, S. A., Sampaio, M. N., Kawata, K. H. S., Padula, N. A M. R., Santos, L. C. A., Lorencetti, M. D., & Smythe, I. (2010). Eficácia terapêutica do programa de remediação fonológica em escolares com dislexia do desenvolvimento. Biofisica, 12(6), 27-39. DOI: http://dx.doi.org/10.1590/S1516-18462009005000060
http://dx.doi.org/10.1590/S1516-18462009...
), a memória de trabalho, incluindo também a leitura e a escrita em etapas posteriores (Salgado, 2010Salgado, C. A. (2010). Programa de remediação fonológica, de leitura e escrita em crianças com dislexia do desenvolvimento (Tese de doutorado). Faculdade de Ciências Médicas da Universidade Estadual de Campinas, São Paulo, São Paulo, Brasil.). É importante, pois, que se investigue a melhor maneira de se trabalhar tais habilidades com as crianças deficiência auditiva, já que, certamente, adaptações são necessárias, conforme referido pela literatura (Easterbrooks, Lederberg, & Connor, 2010Easterbrooks, S. R., Lederberg, A. R., & Connor, C. M. (2010). Contributions of the emergent literacy environment to literacy outcomes for young children who are deaf. American Annals of the Deaf, 155(4), 467-480. DOI: 10.1353/aad.2010.0024
https://doi.org/10.1353/aad.2010.0024...
; Lederberg et al., 2014Lederberg, A. M., Miller E. M., Easterbrooks S., & Connor, C. M. (2014). Foundations for literacy: an early literacy intervention for deaf and hard-of-hearing children. Journal of Deaf Studies and Deaf Education, 19(4), 438-455. DOI: https://doi.org/10.1093/deafed/enu022
https://doi.org/10.1093/deafed/enu022...
; Lee, Hall, & Sancibrian, 2017Lee, S. A. S., Hall, B., & Sancibrian, S. (2017). Feasibility of a supplemental phonological awareness intervention via telepractice for children with hearing loss: a preliminary study. International Journal of Telerehabilitation, 9(1), 23-38. DOI: https://doi.org/10.5195/ijt.2017.6216
https://doi.org/10.5195/ijt.2017.6216...
).

Além disso, a instrução aos professores ou pedagogos para o trabalho de treino específico com a consciência fonológica é fundamental (Capellini et al., 2010Capellini, S. A., Sampaio, M. N., Kawata, K. H. S., Padula, N. A M. R., Santos, L. C. A., Lorencetti, M. D., & Smythe, I. (2010). Eficácia terapêutica do programa de remediação fonológica em escolares com dislexia do desenvolvimento. Biofisica, 12(6), 27-39. DOI: http://dx.doi.org/10.1590/S1516-18462009005000060
http://dx.doi.org/10.1590/S1516-18462009...
; Messier & Jackson, 2014Messier, J., & Jackson, C. W. (2014). A comparison of phonemic and phonological awareness in educators working with children who are deaf or hard of hearing. American Annals of the Deaf, 158(5), 522-538.; Spencer, Schuele, Kathryn, & Marvin, 2008Spencer, E. J., Schuele, C.M., Guillot, K. M. & Lee, M.W. (2008). Phonemic awareness skill of speech-language pathologists and other educators. Language, Speech, and Hearing Services in Schools, 39, 512-520.) e, portanto, nos programas de (re)habilitação auditiva é imprescindível que a equipe de terapeutas possa receber a formação adequada para o trabalho específico de intervenção fonológica. Nesse sentido, o objetivo deste estudo foi analisar as estratégias de um programa de intervenção fonológica aplicado em grupo para crianças com deficiência auditiva, de acordo com a avaliação dos pesquisadores e dos pedagogos, terapeutas dessas crianças.

2 Materiais e métodos

Trata-se de um estudo do tipo exploratório, de fonte documental, longitudinal com abordagem qualitativa, realizado no Centro SUVAG RN, um serviço de saúde auditiva de alta complexidade do Sistema Único de Saúde, de natureza filantrópica. É importante esclarecer que este estudo é parte de uma pesquisa mais ampla que buscou analisar a efetividade do programa de intervenção fonológica elaborado para o trabalho em grupo para crianças com deficiência auditiva, cuja execução foi aprovada pelo Comitê de Ética em Pesquisa (CEP) da Universidade Federal do Rio Grande do Norte (UFRN), sob Parecer de número 1.144.295.

Para a pesquisa da efetividade da intervenção fonológica, as crianças foram divididas, de modo aleatório, em grupos controle (11 crianças) e experimental (11 crianças), sendo constatada a mudança clínica positiva estatisticamente significativa do grupo experimental em relação ao grupo controle, nas avaliações pós-intervenção. Salienta-se que o presente estudo enfatizou a análise qualitativa do programa, com foco nas estratégias empregadas e não na análise estatística pré e pós-intervenção. A amostra foi selecionada por conveniência, sendo composta pelas três pedagogas atuantes no setor de (re)habilitação auditiva e por 11 crianças com deficiência auditiva sensorioneural de graus moderado a profundo, usuárias de AASI, na faixa etária de 8 a 14 anos. Os pedagogos participantes da pesquisa bem como as famílias das crianças com deficiência auditiva foram esclarecidos sobre o estudo e todos aceitaram participar dele e assinaram, assim, o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido (TCLE).

No início de cada sessão, as pesquisadoras entregavam uma ficha de observação às pedagogas responsáveis por cada turma. Nessa ficha, elas fizeram anotações sobre a sessão de acordo com o desempenho de cada criança e o desempenho geral da turma, diante das estratégias realizadas. Essas fichas de observação serão também analisadas nesta pesquisa.

Todas as crianças mencionadas frequentavam terapias fonoaudiológicas e pedagógicas em enquadres individuais e em grupo, tendo como meta a (re)habilitação auditiva. Tais atendimentos eram distribuídos de duas a três vezes por semana, com duração de 50 minutos, em um período do dia - no contraturno, pois as crianças frequentavam escola regular (Ensino Fundamental I).

O trabalho de intervenção ocorreu dentro da rotina de atendimentos das 11 crianças do grupo experimental, sendo, portanto, acompanhado pelas pedagogas do serviço. Seis pesquisadoras participaram do estudo. Uma escala foi organizada, fazendo com que cada duas pesquisadoras fossem responsáveis pela intervenção em um dos grupos: uma dirigia a sessão, e a outra funcionava como apoio, realizava as anotações dos resultados, organizava os materiais, etc. Todas as seis pesquisadoras receberam treinamento para a aplicação das estratégias e todas participaram da elaboração das 200 atividades destinadas ao trabalho de intervenção fonológica. Vale ressaltar que uma habilidade poderia ser trabalhada por meio de mais de uma estratégia, por sessão.

Os grupos das crianças eram divididos de acordo com a sua faixa etária, desenvolvimento das habilidades auditivas e da linguagem oral, da leitura e da escrita, critérios estabelecidos pelo serviço de (re)habilitação auditiva. Tais grupos eram identificados por cores, a saber: roxo, azul, laranja e marrom, os quais estão apresentados na Tabela 1 mais adiante.

Tabela 1
Caracterização das crianças participantes e sua organização nos grupos de atendimento.

A intervenção fonológica foi baseada no modelo de remediação de Capellini et al. (2010)Capellini, S. A., Sampaio, M. N., Kawata, K. H. S., Padula, N. A M. R., Santos, L. C. A., Lorencetti, M. D., & Smythe, I. (2010). Eficácia terapêutica do programa de remediação fonológica em escolares com dislexia do desenvolvimento. Biofisica, 12(6), 27-39. DOI: http://dx.doi.org/10.1590/S1516-18462009005000060
http://dx.doi.org/10.1590/S1516-18462009...
, Salgado (2010)Salgado, C. A. (2010). Programa de remediação fonológica, de leitura e escrita em crianças com dislexia do desenvolvimento (Tese de doutorado). Faculdade de Ciências Médicas da Universidade Estadual de Campinas, São Paulo, São Paulo, Brasil. e na revisão da literatura sobre programas de intervenção fonológica para crianças com deficiência auditiva em outras línguas (Lederberg et al., 2014Lederberg, A. M., Miller E. M., Easterbrooks S., & Connor, C. M. (2014). Foundations for literacy: an early literacy intervention for deaf and hard-of-hearing children. Journal of Deaf Studies and Deaf Education, 19(4), 438-455. DOI: https://doi.org/10.1093/deafed/enu022
https://doi.org/10.1093/deafed/enu022...
; Lee, Hall, & Sancibrian, 2017Lee, S. A. S., Hall, B., & Sancibrian, S. (2017). Feasibility of a supplemental phonological awareness intervention via telepractice for children with hearing loss: a preliminary study. International Journal of Telerehabilitation, 9(1), 23-38. DOI: https://doi.org/10.5195/ijt.2017.6216
https://doi.org/10.5195/ijt.2017.6216...
; Spencer et al., 2008Spencer, E. J., Schuele, C.M., Guillot, K. M. & Lee, M.W. (2008). Phonemic awareness skill of speech-language pathologists and other educators. Language, Speech, and Hearing Services in Schools, 39, 512-520.). Cada sessão contou com uma média de quatro crianças por turma. Foi previamente elaborado um arquivo com a descrição de todas as estratégias, por habilidade, que foram trabalhadas ao decorrer do estudo, totalizando 200 estratégias. Foram elencadas oito habilidades para serem trabalhadas em todas as 20 sessões, sendo estas: 1) Correspondência grafema-fonema; 2) Discriminação de fonemas em sílabas; 3) Rima; 4) Classificação de palavras pares; 5) Adição, subtração e manipulação silábica e fonêmica; 6) Aliteração; 7) Correspondência fonema-grafema; e 8) Memória de Trabalho Fonológica.

Todas as 80 sessões, no total de 20 sessões para cada um dos 4 grupos, foram descritas em plano diário de terapia, os quais serão analisados neste estudo. Desse modo, o material de análise para esta pesquisa constou de 80 planos diários preenchidos com as avaliações das pesquisadoras e de 80 fichas de observação preenchidas pelas pedagogas, totalizando 160 formulários. Além disso, para a análise geral da percepção das pedagogas sobre o programa de intervenção fonológica, foi realizado um grupo focal (Trad, 2009Trad, L. A. B. (2009). Grupos focais: Conceitos, procedimentos e reflexões baseadas em experiências com o uso da técnica em pesquisas de saúde. Physis, 19(3), 777-796. DOI: https://doi.org/10.1590/s0103-73312009000300013
https://doi.org/10.1590/s0103-7331200900...
) após a finalização da intervenção.

3 Resultados

Nesta seção, serão apresentadas as análises descritivas dos 160 formulários, inclusos os planos diários de cada sessão de intervenção, bem como os formulários de observação das pedagogas, além da avaliação delas sobre o programa de intervenção, coletada por meio do grupo focal. Para aproximar a caracterização das crianças participantes do estudo dos resultados mencionados, exibe-se na Tabela 1, a seguir, as características dessas crianças.

Observou-se, na caracterização das crianças participantes do estudo, que se trata de crianças com perdas auditivas sensorioneurais de graus moderado e severo, com média de tempo de privação sensorial de 7 anos e 9 meses e média de idade auditiva de 6 anos. Com exceção da C4, todas as demais crianças apresentavam tempos de privação sensorial auditiva (tempo em que estiveram sem equipamentos auxiliares à audição) superiores aos recomendados e idade auditiva (tempo de uso dos dispositivos desde sua adaptação) que justificam a necessidade de intervenções focalizadas em audição, linguagem oral e habilidades metalinguísticas, mesmo em escolares desta faixa etária (média da amostra - 11 anos).

Das 11 crianças, 10 eram usuárias de aparelhos auditivos bilateralmente, e uma criança utilizava o AASI na orelha direita. A média de uso diário dos aparelhos auditivos era de nove horas, indicando uso regular dos dispositivos, mas ainda aquém do desejável (o tempo ideal deve ser de 14 a 16 horas/dia). Sobre seu desempenho auditivo, excetuando a C6, todas as demais se apresentaram nas categorias de audição 5 ou 6, indicando que eram crianças que identificavam o significado da maior parte do que era dito a elas, sem a necessidade de leitura orofacial ou que compreendiam utilizando apenas a audição, respectivamente. Quanto ao desenvolvimento da linguagem oral, com exceção da C2, avaliada como produzindo frases curtas, as demais crianças apresentaram discurso oral, ainda que não em etapa madura (correspondente à categoria 4 de linguagem).

Figura 1
Quantidade dostipos de adaptações realizadas na intervenção fonológica em grupo.

Legenda: AI: Adaptação durante a instrução da estratégia; AE: Adaptação da estratégia em si; AM: Adaptação de materiais.


As adaptações realizadas em cada uma das sessões foram descritas; assim, observou-se, a partir da análise, que as adaptações de instrução, ocorrentes em menor quantidade (13), referiram-se às dicas para ajudar as crianças a compreender a atividade, ao uso de objetos concretos durante a instrução para facilitar a sua compreensão, à repetição da instrução, ao uso de sinônimos e à diminuição da velocidade de fala, o que também foi observado durante a realização das atividades, por meio da análise dos planos diários de terapia em grupo, quanto ao uso das técnicas e das estratégias de comunicação pelas pesquisadoras.

Quanto às adaptações na execução das estratégias (57), destacaram-se a diminuição do número de itens de treino, em especial a memória de dígitos, ou o número de rodadas de cada habilidade a ser trabalhada, no caso das habilidades de manipulação fonêmica, o uso de destaques acústicos, especialmente na atividade de discriminação de fonemas em sílabas, bem como o uso de leitura orofacial, além da necessidade de apoio visual (palavras ou figuras e objetos) que auxiliasse as crianças a realizar a manipulação silábica e fonêmica.

A adaptações dos materiais (4) foram observadas em menor quantidade e referiram-se ao uso de palavras escritas ou figuras extras para apoiar as atividades. Observou-se, a partir da análise dos planos diários e das fichas de observação, que as habilidades em que as crianças exibiram maior dificuldade foram: a discriminação de fonemas em sílabas, a memória de dígitos e a consciência fonêmica, todas que exigem desempenho auditivo esperado para a faixa etária e escolaridade das crianças envolvidas neste estudo. Contudo, conforme observado na Tabela 1, essa amostra caracteriza-se por crianças mais velhas (8 a 14 anos), que já deveriam apresentar certo domínio das habilidades fonológicas. Como possíveis interferentes em seu desempenho, destacam-se os tempos de privação sensorial longos, o uso moderado ou mínimo dos AASIs por algumas das crianças e o ingresso tardio no programa de (re)habilitação.

Na análise dos planos diários por grupo, observou-se que o grupo marrom (GM) necessitou de adaptação de estratégias em todas as sessões realizadas em, no mínimo, uma habilidade, seguido do grupo azul (GA), grupo laranja (GL) e grupo roxo (GR), consecutivamente.

Sobre as técnicas utilizadas para otimizar a comunicação e a escuta das crianças nas situações da intervenção, a partir da análise geral dos 80 planos diários, as pesquisadoras informaram, em ordem de frequência, que as técnicas mais utilizadas foram: destaques acústicos (consiste em dar ênfase a determinado som ou a determinada palavra dita) com 40% de ocorrência nas 20 sessões, seguida de apoio visual com 15%, que consistiu no uso de objetos ou figuras, uso de repetição ou refraseamento, com 10% e diminuição da velocidade de fala e ênfase nas palavras-chave, ambas as técnicas com 5% de ocorrência. Observou-se, portanto, que o programa de intervenção fonológica delineado necessitou de adaptações de várias naturezas, além do uso de estratégias de comunicação e de técnicas para melhorar a audibilidade para as crianças, de modo a adequar-se ao público-alvo.

Sobre a avaliação geral das pedagogas sobre o programa de intervenção, a Figura 2 apresenta o resultado das falas das 3 pedagogas.

Figura 2
Análise da frequência de palavras a partir do roteiro do grupo focal.

A partir da análise da frequência de palavras pode-se observar que a avaliação das pedagogas sobre o programa de intervenção foi positiva (destacam-se as palavras bom e gente) e que elas se mostraram interessadas em continuar com a proposta (com destaque para a palavra ficar). Conforme notou-se em alguns dos comentários analisados, por sessão, as pedagogas destacaram que as atividades foram enriquecedoras para elas e que algumas foram utilizadas em sua prática clínica em outros grupos do serviço de (re)habilitação.

(S8): "As estratégias para a realização das atividades foram ótimas e bastante diversificadas." (S11): "Gostei das estratégias para cada atividade, o que favoreceu o envolvimento do grupo bem como a melhor compreensão por parte da maioria dos participantes." (S 13): "Boas estratégias em cada atividade, excelente interação da terapeuta com o grupo e bons resultados."

Foi ainda referido que, nas primeiras sessões, as crianças tiveram dificuldades, especialmente quanto à compreensão para participarem das atividades e quanto ao tempo da sessão para o trabalho com várias habilidades.

(S3): "Para a compreensão do grupo, acho as atividades rápidas, o tempo é curto para aplicar todas as atividades." (S4): "As crianças se envolvem bem, ficam atentas às estratégias, mas demonstram dificuldades em entender como fazer a atividade." (S6): "O tempo para cada atividade é pouco e eles precisam de mais tempo para compreender melhor o que é solicitado e treinar mais em cada sessão."

Notou-se, entretanto, que, após a nona sessão, as pedagogas observaram tempos de resposta mais rápidos e melhor compreensão das crianças, mesmo nas atividades em que ainda apresentavam dificuldade em executar.

(S9): "As atividades elaboradas para as crianças foram bastante interessantes. Observei uma evolução de segunda- -feira para hoje no sentido de melhor compreensão e melhores respostas." (S11): "Todos compreenderam as instruções dada a cada atividade, as estratégias foram ótimas, o que facilitou o envolvimento de todos." (S19): "Todos participaram com bastante interação e tiveram boa compreensão do que foi orientado."

Os aspectos destacados pelas pedagogas também puderam ser notados na análise dos planos diários das sessões, em que, a partir da nona sessão, mesmo sem a alteração do tempo da sessão, as crianças passaram a executar com mais facilidade as atividades propostas, de acordo com os resultados descritos pelas pesquisadoras. Além disso, ainda foi observado, na análise dos planos diários, uma diminuição no uso de estratégias de comunicação e técnicas na metade do programa até o final das sessões. Esse fato pode ser atribuído à melhora das crianças na compreensão do trabalho fonológico, bem como ao aprimoramento das pesquisadoras como terapeutas desses grupos, o que envolve a relação pesquisador-criança e até mesmo a familiaridade das crianças com a fala de cada pesquisadora, fato também notado pelas pedagogas.

(S13): "Boas estratégias em cada atividade, excelente interação da terapeuta com o grupo e bons resultados."

Quanto ao último questionamento do grupo focal, sobre as sugestões para a melhoria do programa de intervenção fonológica, as educadoras destacaram: a necessidade do trabalho de intervenção com o vocabulário das crianças, visto que notaram o quanto o déficit apresentado por algumas das crianças teve impacto na compreensão da estratégia e no aproveitamento de todo o grupo no tempo previsto para cada sessão; a ampliação do tempo da sessão ou a diminuição do número de atividades por sessão, para grupos com maior dificuldade; ou, ainda, o aumento do número de sessões.

(S3): "Para a compreensão do grupo, acho as atividades rápidas, o tempo é curto para aplicar todas as atividades. Acredito que seja a dinâmica do trabalho o bombardeio de informações." (S8): "O tempo da atividade é muito pouco." (S15): "Eles apresentam muita dificuldade na compreensão, no vocabulário e na memória, o que dificulta muito o trabalho."

O Quadro 1 a seguir apresenta as observações das pedagogas sobre cada uma das sessões de intervenção.

Quadro 1
Observações das pedagogas participantes sobre cada uma das sessões de intervenção.

4 Discussão

Nesta pesquisa, os resultados obtidos corroboram com os encontrados na literatura, de que há a necessidade de adaptações para a intervenção fonológica para crianças com perda auditiva (Easterbrooks, Lederberg, & Connor, 2010Easterbrooks, S. R., Lederberg, A. R., & Connor, C. M. (2010). Contributions of the emergent literacy environment to literacy outcomes for young children who are deaf. American Annals of the Deaf, 155(4), 467-480. DOI: 10.1353/aad.2010.0024
https://doi.org/10.1353/aad.2010.0024...
; Lederberg et al., 2014Lederberg, A. M., Miller E. M., Easterbrooks S., & Connor, C. M. (2014). Foundations for literacy: an early literacy intervention for deaf and hard-of-hearing children. Journal of Deaf Studies and Deaf Education, 19(4), 438-455. DOI: https://doi.org/10.1093/deafed/enu022
https://doi.org/10.1093/deafed/enu022...
; Lee, Hall, & Sancibrian, 2017Lee, S. A. S., Hall, B., & Sancibrian, S. (2017). Feasibility of a supplemental phonological awareness intervention via telepractice for children with hearing loss: a preliminary study. International Journal of Telerehabilitation, 9(1), 23-38. DOI: https://doi.org/10.5195/ijt.2017.6216
https://doi.org/10.5195/ijt.2017.6216...
).

O programa intervenção fonológica elaborado baseado nos modelos de remediação de Capellini et al. (2010)Capellini, S. A., Sampaio, M. N., Kawata, K. H. S., Padula, N. A M. R., Santos, L. C. A., Lorencetti, M. D., & Smythe, I. (2010). Eficácia terapêutica do programa de remediação fonológica em escolares com dislexia do desenvolvimento. Biofisica, 12(6), 27-39. DOI: http://dx.doi.org/10.1590/S1516-18462009005000060
http://dx.doi.org/10.1590/S1516-18462009...
, Salgado (2010)Salgado, C. A. (2010). Programa de remediação fonológica, de leitura e escrita em crianças com dislexia do desenvolvimento (Tese de doutorado). Faculdade de Ciências Médicas da Universidade Estadual de Campinas, São Paulo, São Paulo, Brasil. e na revisão da literatura sobre programas de intervenção fonológica para crianças com deficiência auditiva, em outras línguas (Lederberg et al., 2014Lederberg, A. M., Miller E. M., Easterbrooks S., & Connor, C. M. (2014). Foundations for literacy: an early literacy intervention for deaf and hard-of-hearing children. Journal of Deaf Studies and Deaf Education, 19(4), 438-455. DOI: https://doi.org/10.1093/deafed/enu022
https://doi.org/10.1093/deafed/enu022...
; Lee, Hall, & Sancibrian, 2017Lee, S. A. S., Hall, B., & Sancibrian, S. (2017). Feasibility of a supplemental phonological awareness intervention via telepractice for children with hearing loss: a preliminary study. International Journal of Telerehabilitation, 9(1), 23-38. DOI: https://doi.org/10.5195/ijt.2017.6216
https://doi.org/10.5195/ijt.2017.6216...
; Spencer et al., 2008Spencer, E. J., Schuele, C.M., Guillot, K. M. & Lee, M.W. (2008). Phonemic awareness skill of speech-language pathologists and other educators. Language, Speech, and Hearing Services in Schools, 39, 512-520.), necessitou de ajustes específicos para a amostra estudada, o que reforça a necessidade da continuidade de pesquisas envolvendo o referido programa, aplicado a diferentes amostras, para a validação de sua aplicabilidade na população de crianças com deficiência auditiva.

Segundo Lederberg et al. (2014)Lederberg, A. M., Miller E. M., Easterbrooks S., & Connor, C. M. (2014). Foundations for literacy: an early literacy intervention for deaf and hard-of-hearing children. Journal of Deaf Studies and Deaf Education, 19(4), 438-455. DOI: https://doi.org/10.1093/deafed/enu022
https://doi.org/10.1093/deafed/enu022...
, crianças com perda auditiva, em níveis pré-escolares, podem desenvolver a habilidade linguística de leitura a partir de instruções e de estratégias especificamente adaptadas às suas necessidades. O mesmo mostrou-se verdadeiro para as crianças em nível escolar mais avançado, participantes desta pesquisa, a partir da análise dos planos diários da intervenção.

Todas as sessões sofreram algum tipo de adaptação, seja de estratégia, instrução ou de material, tendo sido observado mais de um tipo de adaptação por sessão, especialmente nas primeiras sessões. Quanto ao tipo de adaptação, a literatura específica retrata, em especial, o uso de apoio visual (materiais escritos ou concretos), que facilite à criança com deficiência auditiva o acesso à tarefa fonológica (Chen, 2014Chen, Y. H. (2014). Effects of phonological awareness training on early chinese reading of children who are deaf and hard of hearing. Volta Review, 114(1), 85-100.; Easterbrooks, Lederberg, & Connor, 2010Easterbrooks, S. R., Lederberg, A. R., & Connor, C. M. (2010). Contributions of the emergent literacy environment to literacy outcomes for young children who are deaf. American Annals of the Deaf, 155(4), 467-480. DOI: 10.1353/aad.2010.0024
https://doi.org/10.1353/aad.2010.0024...
; Gilliver et al., 2016Gilliver, M., Cupples, L., Ching, T. Y. C., Leigh, G., & Gunnourie, M. (2016). Developing sound skills for reading: teaching phonological awareness to preschoolers with hearing loss. Journal of Deaf Studies and Deaf Education, 21(3), 268-279. DOI: https://doi.org/10.1093/deafed/enw004
https://doi.org/10.1093/deafed/enw004...
; Lee, Hall, & Sancibrian, 2017Lee, S. A. S., Hall, B., & Sancibrian, S. (2017). Feasibility of a supplemental phonological awareness intervention via telepractice for children with hearing loss: a preliminary study. International Journal of Telerehabilitation, 9(1), 23-38. DOI: https://doi.org/10.5195/ijt.2017.6216
https://doi.org/10.5195/ijt.2017.6216...
; Miller, Lederberg, & Easterbrooks, 2013Miller, E. M., Lederberg, A. R., & Easterbrooks, S. R. (2013). Phonological awareness: explicit instruction for young deaf and hard-of-hearing children. Journal of Deaf Studies and Deaf Education, 18(2), 206-227. DOI: https://doi.org/10.1093/deafed/ens067
https://doi.org/https://doi.org/10.1093/...
; Nakeva et al., 2013Nakeva von Mentzer, C., Lyxell, B., Sahlén, B., Wass, M., Lindgren, M., Ors, M., Kallioinen, P., & Uhlén, I. (2013). Computer-assisted training of phoneme-grapheme correspondence for children who are deaf and hard of hearing: Effects on phonological processing skills. International Journal of Pediatric Otorhinolaryngology, 77(12), 2049-2057. DOI: https://doi.org/10.1016/j.ijporl.2013.10.007
https://doi.org/10.1016/j.ijporl.2013.10...
; Rakhshanfadaee & Salehi, 2016Rakhshanfadaee, A., & Salehi, M. (2016). phonological awareness in children with hearing loss. The Hearing Journal, 69(9), 32-35.; Wang et al., 2013Wang, Y., Spychala, H., Harris, R. S., & Oetting, T. L. (2013). The effectiveness of a phonics-based early intervention for deaf and hard of hearing Preschool children and its possible impact on reading skills in Elementary School: a case study. American Annals of the Deaf, 58(2),107-120.; Werfel, Douglas, & Ackal, 2016Werfel, K. L., Douglas, M., & Ackal, L. (2016). Small-Group phonological awareness training for Pre-Kindergarten children with hearing loss who wear Cochlear Implants and/or Hearing Aids. Deafness and Education International, 18(3), 134-140. DOI: https://doi.org/10.1080/14643154.2016.1190117
https://doi.org/10.1080/14643154.2016.11...
), sendo este o segundo tipo de apoio mais observado nesta pesquisa. O apoio mais frequente aos participantes desta pesquisa foi o uso de destaques acústicos. Tais modificações foram realizadas especialmente em virtude da dificuldade observada nas crianças em compreender e executar as atividades no tempo destinado à sessão, bem como ao seu nível de conhecimento prévio das habilidades fonológicas, observação que concorda com a literatura (Spencer et al., 2008Spencer, E. J., Schuele, C.M., Guillot, K. M. & Lee, M.W. (2008). Phonemic awareness skill of speech-language pathologists and other educators. Language, Speech, and Hearing Services in Schools, 39, 512-520.).

A análise dos planos diários das sessões também permitiu elencar as principais estratégias de comunicação e técnicas auditivas utilizadas pelas pesquisadoras durante o trabalho fonológico. Ressalta-se que uma ampla gama de técnicas pode ser empregada de acordo com a necessidade e habilidades a serem trabalhadas, para o favorecimento do desempenho das crianças nesse tipo de treinamento, que extrapola a terapia fonoaudiológica convencional (Granha, Oliveira, & Rumpf, 2008Granha, D. O., Oliveira, A. S., & Rumpf, K. (2008). Estratégias terapêuticas realizadas com crianças deficientes auditivas oralizadas: revisão de literatura. In P. B. Silva, & R. H. F. Dav (Eds.), Cadernos da Fonoaudiálogo. Audiologia (pp. 49-55). São Paulo: Lovise.; Resegue-Coppi, 2008Resegue-Coppi, M. M. (2008). Desenvolvendo as habilidades auditivas em crianças usuárias de implante coclear: estratégias terapêuticas (Dissertação de Mestrado em Fonoaudiologia). Faculdade de Odontologia de Bauru, Universidade de São Paulo, Bauru, São Paulo, Brasil.).

Observou-se que as características das crianças dos grupos de intervenção certamente determinaram as necessidades de adaptações a serem realizadas (Lederberg, Schick, & Spencer, 2013Lederberg, A. R., Schick, B., & Spencer, P. E. (2013). Language and literacy development of deaf and hard-of-hearing children: Successes and challenges. Developmental Psychology, 49(1), 15-30. DOI: https://doi.org/10.1037/a0029558
https://doi.org/10.1037/a0029558...
), com destaque para o tempo de privação sensorial (Bornstein, 2018Bornstein, S. (2018). The importance of early identification and intervention for children with hearing loss. Part 1: Human Development. J Health Commun, 3(8). DOI: 10.4172/2472-1654.100119
https://doi.org/10.4172/2472-1654.100119...
; Wake & Carew, 2016Wake, M., & Carew, P. (2016). Science, not philosophy, will help deaf and hard-of-hearing children reach their potential. Pediatrics, 137(1), 1-2. DOI: https://doi.org/10.1542/peds.2015-3443
https://doi.org/10.1542/peds.2015-3443...
), o uso restrito dos aparelhos auditivos para algumas delas (Penna, Lemos, & Alves, 2015Penna, L. M., Lemos, S. M. A., & Alves, C. R. L. (2015). Auditory and language skills of children using hearing aids. Braz J Otorhinolaryngol, 81, 148-157. DOI: http://dx.doi.org/10.1016/j.bjorl.2014.05.034
http://dx.doi.org/10.1016/j.bjorl.2014.0...
; Vasconcelos & Pereira, 2015Vasconcelos, K. A. de, & Pereira, M. D. G. A. (2015). Importância da educação formal dos responsáveis e renda familiar no processo de adesão ao uso de próteses auditivas em menores de 12 anos. Revista CEFAC, 17(1), 216-222. DOI: http://dx.doi.org/10.1590/1982-0216201519213
http://dx.doi.org/10.1590/1982-021620151...
) e o ingresso tardio no programa de (re)habilitação auditiva (Bicas, Guijo, Delgado-Pinheiro, 2017Bicas R. S., Guijo L. M., & Delgado-Pinheiro E. M. C. (2017). Oral communication and auditory skills of hearing-impaired children and adolescents and the speech therapy rehabilitation process. Rev. CEFAC, 19, 465-474. DOI: http://dx.doi.org/10.1590/1982-0216201719412516
http://dx.doi.org/10.1590/1982-021620171...
; Oliveira, Penna, & Lemos, 2015Oliveira, P. S, Penna, L. M., & Lemos, S. M. A. (2015). Language development and hearing impairment: literature review. Rev. CEFAC, 17, 2044-2055. DOI: http://dx.doi.org/10.1590/1982-0216201517611214
http://dx.doi.org/10.1590/1982-021620151...
; Tabaquim et al., 2013Tabaquim, M. de L. M., Nardi, C. G. A., Ferrari, J. B., Moretti, C. N., Yamada, M. O., & Bevilacqua, M. C. (2013). Avaliação do desenvolvimento cognitivo e afetivo-social de crianças com perda auditiva. Revista CEFAC, 15(6), 1475-1481. DOI: http://dx.doi.org/10.1590/S1516-18462013005000051
http://dx.doi.org/10.1590/S1516-18462013...
), os quais foram fatores verificados na amostra e que devem ser considerados na elaboração das estratégias para o trabalho fonológico.

Ainda assim, todas as crianças deste estudo demonstraram avanços em suas habilidades, o que pôde ser observado na análise dos resultados das sessões, fato que também corrobora as pesquisas sobre a intervenção fonológica para crianças com deficiência auditiva com maior ou menor acesso aos sons (Bergeron et al., 2009Bergeron, J. P., Lederberg, A. R., Easterbrooks, S. R., Miller, E. M., & Connor, C. M. (2009). Building the alphabetic principle in young children who are deaf and hard of hearing. The Volta Review, 109(2-3), 87-119.; Gamba-Yoshida, 2017Gamba-Yoshida, M. C. C. (2017). Atividades de estimulação da consciência fonológica por meio de um livreto destinado a alunos com deficiência auditiva/surdez (Dissertação de Mestrado). Universidade Estadual Paulista Júlio de Mesquita Filho - Faculdade de Ciências, Bauru, São Paulo, SP, Brasil.; Goldberg & Lederberg, 2015Goldberg, H. R., & Lederberg, A. R. (2015). Acquisition of the alphabetic principle in deaf and hard-of-hearing preschoolers: the role of phonology in letter-sound learning. Reading and Writing, 28(4), 509-525. DOI: https://doi.org/10.1007/s11145-014-9535-y
https://doi.org/10.1007/s11145-014-9535-...
; Lederberg, Schick, & Spencer, 2013Lederberg, A. R., Schick, B., & Spencer, P. E. (2013). Language and literacy development of deaf and hard-of-hearing children: Successes and challenges. Developmental Psychology, 49(1), 15-30. DOI: https://doi.org/10.1037/a0029558
https://doi.org/10.1037/a0029558...
), destacando a primazia das habilidades fonológicas para a aquisição do código escrito, tão fundamental para o fortalecimento do desenvolvimento da linguagem e da cognição, entre outras habilidades na criança com deficiência auditiva (Harris, Terlektsi, & Kyle, 2017Harris, M., Terlektsi, E., & Kyle, F. E. (2017). Concurrent and longitudinal predictors of reading for deaf and hearing children in Primary School. The Journal of Deaf Studies and Deaf Education, 22(2), 233-242. DOI: 10.1093/deafed/enw101
https://doi.org/10.1093/deafed/enw101...
; Lemes & Goldfeld, 2008Lemes, J. P., & Goldfeld, M. (2008). Analysis of orthographic errors of children with cochlear implants. Rev Soc Bras Fonoaudiol., 13(3), 179-189.; Mahapatra, 2015Mahapatra, S. (2015). Improving reading outcomes for students with or at risk for reading disabilities: a synthesis of the contributions from the Institute of Education Sciences Research Centers. Journal of Education and Practice, 6(19), 57-63.).

As habilidades que tiveram um índice mínimo de adaptações, desde o início do programa diminuindo com o passar dos dias foram: correspondência grafema-fonema e fonema-grafema, de acordo com as análises dos planos diários e das fichas de observação, resultado comparado ao estudo de Nakeva von Mentzer et al. (2013)Nakeva von Mentzer, C., Lyxell, B., Sahlén, B., Wass, M., Lindgren, M., Ors, M., Kallioinen, P., & Uhlén, I. (2013). Computer-assisted training of phoneme-grapheme correspondence for children who are deaf and hard of hearing: Effects on phonological processing skills. International Journal of Pediatric Otorhinolaryngology, 77(12), 2049-2057. DOI: https://doi.org/10.1016/j.ijporl.2013.10.007
https://doi.org/10.1016/j.ijporl.2013.10...
, no qual a melhora na relação fonema-grafema foi considerada de moderada a forte, bem como ao estudo de Werfel, Douglas, & Ackal (2016)Werfel, K. L., Douglas, M., & Ackal, L. (2016). Small-Group phonological awareness training for Pre-Kindergarten children with hearing loss who wear Cochlear Implants and/or Hearing Aids. Deafness and Education International, 18(3), 134-140. DOI: https://doi.org/10.1080/14643154.2016.1190117
https://doi.org/10.1080/14643154.2016.11...
, que relata o ganho das crianças no início do programa das habilidades de relação grafema-fonema, para posteriormente observar melhora na habilidade de rimar.

Destaca-se ainda que são escassas as pesquisas que relatam a percepção de profissionais da educação em relação ao trabalho de intervenção fonológica para crianças com deficiência auditiva. Notou-se que a percepção das pedagogas participantes deste estudo se deteve nas dificuldades das crianças, sem a utilização dos termos técnicos para a sua definição, o que dirige a atenção para a necessidade de formação específica dos pedagogos envolvidos em programas de (re)habilitação de crianças com deficiência auditiva (Bevilacqua & Formigoni, 2012Bevilacqua, M. C., & Formigoni, G. M. P. (2012). Audiologia educacional: uma opção terapêutica para a criança deficiente auditiva. São Paulo: Pró-Fono.; Moret, 2017Moret, A. L. M. (2017). Audiologia Educacional na Infância: contribuições do Campus de Bauru da Universidade de São Paulo. In S. Silva, & L. Digiampietri (Orgs.), Conhecendo a USP - contribuições do ensino, da pesquisa e da extensão no campo das deficiências (pp. 33-48). São Paulo: FEUSP.) para o trabalho com as habilidades fonológicas, conforme referido por Messier e Jackson (2014)Messier, J., & Jackson, C. W. (2014). A comparison of phonemic and phonological awareness in educators working with children who are deaf or hard of hearing. American Annals of the Deaf, 158(5), 522-538. e Spencer et al. (2008)Spencer, E. J., Schuele, C.M., Guillot, K. M. & Lee, M.W. (2008). Phonemic awareness skill of speech-language pathologists and other educators. Language, Speech, and Hearing Services in Schools, 39, 512-520., que alertam sobre a necessidade da proficiência em consciência fonológica de educadores que trabalham com crianças com deficiência auditiva.

5 Conclusão

Conclui-se que o programa de intervenção fonológica para crianças com deficiência auditiva necessitou de adaptações referentes às instruções oferecidas aos grupos, às estratégias propriamente ditas, bem como aos materiais utilizados, destacando-se a importância dos registros detalhados dos resultados das sessões de programas dessa natureza, dada a importância da análise das estratégias para a elaboração de intervenções cada vez mais efetivas e eficazes para essa população.

A partir das observações realizadas para as crianças desta pesquisa recomenda-se a continuidade dos estudos que se proponham validar programas de intervenção voltados ao desenvolvimento da leitura para crianças com deficiência auditiva e que os serviços de (re)habilitação auditiva considerem, em seu planejamento, a instrução específica com as habilidades fonológicas, dada a sua relevância para a aquisição e o desenvolvimento da leitura e da escrita, agregando à criança o domínio de outras habilidades linguísticas e cognitivas, importantes para sua plena inclusão. Além disso, destaca-se a preocupação em treinar os profissionais que desenvolvem este trabalho com as crianças, especialmente no enquadre de grupo.

As principais limitações deste estudo referiram-se às características da amostra tais como: número de sujeitos, a faixa etária dos grupos trabalhados, bem como a sua aplicação em um único serviço de (re)habilitação auditiva, com necessidade de ampliação do número amostral, da estratificação da análise das estratégias da intervenção fonológica aplicada a crianças de diferentes faixas etárias, bem como a avaliação da implementação dessas intervenções por profissionais da pedagogia especializada em programas de (re)habilitação auditiva.

Destaca-se o ineditismo desse tipo de estudo e identifica-se como potencial da referida pesquisa a construção e a análise pormenorizada do material da intervenção aplicada, com a possibilidade de tornar-se um referencial para o desenvolvimento de programas de treinamento de habilidades fonológicas em enquadre terapêutico grupal, específico para a população de crianças com deficiência auditiva.

  • 2
    Agradecemos ao Centro SUVAG pela constante parceria; às fonoaudiólogas Ana Caroline Esther, Carolina Karla de Souza Evangelista, Darling Dayenne Santana Freire Carvalho, Genielly Barbosa Tavares e Taise Ferreira de Lima, pelo envolvimento na elaboração das estratégias lúdicas e durante a coleta de dados; e à fonoaudióloga Ms. Gabriela Rabelo, pelas importantes contribuições nas discussões deste trabalho.
  • Errata
    No artigo "Análise das Estratégias Empregadas em um Programa de Intervenção Fonológica para Crianças com Deficiência Auditiva"
    "Analysis of Strategies Employed in a Phonological Intervention Program for Hard of Hearing Children "

Referências

  • Bergeron, J. P., Lederberg, A. R., Easterbrooks, S. R., Miller, E. M., & Connor, C. M. (2009). Building the alphabetic principle in young children who are deaf and hard of hearing. The Volta Review, 109(2-3), 87-119.
  • Bevilacqua, M. C., & Formigoni, G. M. P. (2012). Audiologia educacional: uma opção terapêutica para a criança deficiente auditiva São Paulo: Pró-Fono.
  • Bicas R. S., Guijo L. M., & Delgado-Pinheiro E. M. C. (2017). Oral communication and auditory skills of hearing-impaired children and adolescents and the speech therapy rehabilitation process. Rev. CEFAC, 19, 465-474. DOI: http://dx.doi.org/10.1590/1982-0216201719412516
    » http://dx.doi.org/10.1590/1982-0216201719412516
  • Bornstein, S. (2018). The importance of early identification and intervention for children with hearing loss. Part 1: Human Development. J Health Commun, 3(8). DOI: 10.4172/2472-1654.100119
    » https://doi.org/10.4172/2472-1654.100119
  • Capellini, S. A., Sampaio, M. N., Kawata, K. H. S., Padula, N. A M. R., Santos, L. C. A., Lorencetti, M. D., & Smythe, I. (2010). Eficácia terapêutica do programa de remediação fonológica em escolares com dislexia do desenvolvimento. Biofisica, 12(6), 27-39. DOI: http://dx.doi.org/10.1590/S1516-18462009005000060
    » http://dx.doi.org/10.1590/S1516-18462009005000060
  • Chen, Y. H. (2014). Effects of phonological awareness training on early chinese reading of children who are deaf and hard of hearing. Volta Review, 114(1), 85-100.
  • Easterbrooks, S. R., Lederberg, A. R., & Connor, C. M. (2010). Contributions of the emergent literacy environment to literacy outcomes for young children who are deaf. American Annals of the Deaf, 155(4), 467-480. DOI: 10.1353/aad.2010.0024
    » https://doi.org/10.1353/aad.2010.0024
  • Gabriel, R., Morais, J., & Kolinsky, R. (2016). A aprendizagem da leitura e suas implicações sobre a memória e a cognição. Ilha do Desterro, 69(1), 61-78. DOI: http://dx.doi.org/10.5007/2175- 8026.2016v69n1p61
    » http://dx.doi.org/10.5007/2175- 8026.2016v69n1p61
  • Gamba-Yoshida, M. C. C. (2017). Atividades de estimulação da consciência fonológica por meio de um livreto destinado a alunos com deficiência auditiva/surdez (Dissertação de Mestrado). Universidade Estadual Paulista Júlio de Mesquita Filho - Faculdade de Ciências, Bauru, São Paulo, SP, Brasil.
  • Gilliver, M., Cupples, L., Ching, T. Y. C., Leigh, G., & Gunnourie, M. (2016). Developing sound skills for reading: teaching phonological awareness to preschoolers with hearing loss. Journal of Deaf Studies and Deaf Education, 21(3), 268-279. DOI: https://doi.org/10.1093/deafed/enw004
    » https://doi.org/10.1093/deafed/enw004
  • Goldberg, H. R., & Lederberg, A. R. (2015). Acquisition of the alphabetic principle in deaf and hard-of-hearing preschoolers: the role of phonology in letter-sound learning. Reading and Writing, 28(4), 509-525. DOI: https://doi.org/10.1007/s11145-014-9535-y
    » https://doi.org/10.1007/s11145-014-9535-y
  • Granha, D. O., Oliveira, A. S., & Rumpf, K. (2008). Estratégias terapêuticas realizadas com crianças deficientes auditivas oralizadas: revisão de literatura. In P. B. Silva, & R. H. F. Dav (Eds.), Cadernos da Fonoaudiálogo Audiologia (pp. 49-55). São Paulo: Lovise.
  • Harris, M., Terlektsi, E., & Kyle, F. E. (2017). Concurrent and longitudinal predictors of reading for deaf and hearing children in Primary School. The Journal of Deaf Studies and Deaf Education, 22(2), 233-242. DOI: 10.1093/deafed/enw101
    » https://doi.org/10.1093/deafed/enw101
  • Lederberg, A. M., Miller E. M., Easterbrooks S., & Connor, C. M. (2014). Foundations for literacy: an early literacy intervention for deaf and hard-of-hearing children. Journal of Deaf Studies and Deaf Education, 19(4), 438-455. DOI: https://doi.org/10.1093/deafed/enu022
    » https://doi.org/10.1093/deafed/enu022
  • Lederberg, A. R., Schick, B., & Spencer, P. E. (2013). Language and literacy development of deaf and hard-of-hearing children: Successes and challenges. Developmental Psychology, 49(1), 15-30. DOI: https://doi.org/10.1037/a0029558
    » https://doi.org/10.1037/a0029558
  • Lee, S. A. S., Hall, B., & Sancibrian, S. (2017). Feasibility of a supplemental phonological awareness intervention via telepractice for children with hearing loss: a preliminary study. International Journal of Telerehabilitation, 9(1), 23-38. DOI: https://doi.org/10.5195/ijt.2017.6216
    » https://doi.org/10.5195/ijt.2017.6216
  • Lemes, J. P., & Goldfeld, M. (2008). Analysis of orthographic errors of children with cochlear implants. Rev Soc Bras Fonoaudiol, 13(3), 179-189.
  • Mahapatra, S. (2015). Improving reading outcomes for students with or at risk for reading disabilities: a synthesis of the contributions from the Institute of Education Sciences Research Centers. Journal of Education and Practice, 6(19), 57-63.
  • Messier, J., & Jackson, C. W. (2014). A comparison of phonemic and phonological awareness in educators working with children who are deaf or hard of hearing. American Annals of the Deaf, 158(5), 522-538.
  • Miller, E. M., Lederberg, A. R., & Easterbrooks, S. R. (2013). Phonological awareness: explicit instruction for young deaf and hard-of-hearing children. Journal of Deaf Studies and Deaf Education, 18(2), 206-227. DOI: https://doi.org/10.1093/deafed/ens067
    » https://doi.org/https://doi.org/10.1093/deafed/ens067
  • Moret, A. L. M. (2017). Audiologia Educacional na Infância: contribuições do Campus de Bauru da Universidade de São Paulo. In S. Silva, & L. Digiampietri (Orgs.), Conhecendo a USP - contribuições do ensino, da pesquisa e da extensão no campo das deficiências (pp. 33-48). São Paulo: FEUSP.
  • Nakeva von Mentzer, C., Lyxell, B., Sahlén, B., Wass, M., Lindgren, M., Ors, M., Kallioinen, P., & Uhlén, I. (2013). Computer-assisted training of phoneme-grapheme correspondence for children who are deaf and hard of hearing: Effects on phonological processing skills. International Journal of Pediatric Otorhinolaryngology, 77(12), 2049-2057. DOI: https://doi.org/10.1016/j.ijporl.2013.10.007
    » https://doi.org/10.1016/j.ijporl.2013.10.007
  • Oliveira, P. S, Penna, L. M., & Lemos, S. M. A. (2015). Language development and hearing impairment: literature review. Rev. CEFAC, 17, 2044-2055. DOI: http://dx.doi.org/10.1590/1982-0216201517611214
    » http://dx.doi.org/10.1590/1982-0216201517611214
  • Penna, L. M., Lemos, S. M. A., & Alves, C. R. L. (2015). Auditory and language skills of children using hearing aids. Braz J Otorhinolaryngol, 81, 148-157. DOI: http://dx.doi.org/10.1016/j.bjorl.2014.05.034
    » http://dx.doi.org/10.1016/j.bjorl.2014.05.034
  • Rakhshanfadaee, A., & Salehi, M. (2016). phonological awareness in children with hearing loss. The Hearing Journal, 69(9), 32-35.
  • Resegue-Coppi, M. M. (2008). Desenvolvendo as habilidades auditivas em crianças usuárias de implante coclear: estratégias terapêuticas (Dissertação de Mestrado em Fonoaudiologia). Faculdade de Odontologia de Bauru, Universidade de São Paulo, Bauru, São Paulo, Brasil.
  • Salgado, C. A. (2010). Programa de remediação fonológica, de leitura e escrita em crianças com dislexia do desenvolvimento (Tese de doutorado). Faculdade de Ciências Médicas da Universidade Estadual de Campinas, São Paulo, São Paulo, Brasil.
  • Spencer, E. J., Schuele, C.M., Guillot, K. M. & Lee, M.W. (2008). Phonemic awareness skill of speech-language pathologists and other educators. Language, Speech, and Hearing Services in Schools, 39, 512-520.
  • Tabaquim, M. de L. M., Nardi, C. G. A., Ferrari, J. B., Moretti, C. N., Yamada, M. O., & Bevilacqua, M. C. (2013). Avaliação do desenvolvimento cognitivo e afetivo-social de crianças com perda auditiva. Revista CEFAC, 15(6), 1475-1481. DOI: http://dx.doi.org/10.1590/S1516-18462013005000051
    » http://dx.doi.org/10.1590/S1516-18462013005000051
  • Trad, L. A. B. (2009). Grupos focais: Conceitos, procedimentos e reflexões baseadas em experiências com o uso da técnica em pesquisas de saúde. Physis, 19(3), 777-796. DOI: https://doi.org/10.1590/s0103-73312009000300013
    » https://doi.org/10.1590/s0103-73312009000300013
  • Vasconcelos, K. A. de, & Pereira, M. D. G. A. (2015). Importância da educação formal dos responsáveis e renda familiar no processo de adesão ao uso de próteses auditivas em menores de 12 anos. Revista CEFAC, 17(1), 216-222. DOI: http://dx.doi.org/10.1590/1982-0216201519213
    » http://dx.doi.org/10.1590/1982-0216201519213
  • Wake, M., & Carew, P. (2016). Science, not philosophy, will help deaf and hard-of-hearing children reach their potential. Pediatrics, 137(1), 1-2. DOI: https://doi.org/10.1542/peds.2015-3443
    » https://doi.org/10.1542/peds.2015-3443
  • Wang, Y., Spychala, H., Harris, R. S., & Oetting, T. L. (2013). The effectiveness of a phonics-based early intervention for deaf and hard of hearing Preschool children and its possible impact on reading skills in Elementary School: a case study. American Annals of the Deaf, 58(2),107-120.
  • Werfel, K. L., Douglas, M., & Ackal, L. (2016). Small-Group phonological awareness training for Pre-Kindergarten children with hearing loss who wear Cochlear Implants and/or Hearing Aids. Deafness and Education International, 18(3), 134-140. DOI: https://doi.org/10.1080/14643154.2016.1190117
    » https://doi.org/10.1080/14643154.2016.1190117

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    08 Jun 2020
  • Data do Fascículo
    Apr-Jun 2020

Histórico

  • Recebido
    08 Fev 2019
  • Revisado
    13 Nov 2019
  • Aceito
    02 Jan 2020
Associação Brasileira de Pesquisadores em Educação Especial - ABPEE Av. Eng. Luiz Edmundo Carrijo Coube, 14-01 Vargem Limpa, CEP: 17033-360 - Bauru, SP, Tel.: 14 - 3402-1366 - Bauru - SP - Brazil
E-mail: revista.rbee@gmail.com