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EXPERIÊNCIA DA MATERNIDADE DIANTE DA INTERNAÇÃO DO BEBÊ EM UTI: UMA MONTANHA RUSSA DE SENTIMENTOS

LA EXPERIENCIA DE LA MATERNIDAD FRENTE LA HOSPITALIZACIÓN DEL BEBÉ EN LA UCI: UNA MONTAÑA RUSA DE SENTIMIENTOS

RESUMO

Nesta pesquisa buscou-se conhecer a experiência de mães que tiveram seus bebês hospitalizados em uma Unidade de Terapia Intensiva Neonatal ou Pediátrica. O estudo se caracterizou como qualitativo, de caráter exploratório-descritivo. Participaram nove mães de bebês internados em seis diferentes Unidades de Terapia Intensiva Neonatal ou Pediátrica, localizadas em cinco cidades do Estado do Rio Grande do Sul. Para a apreensão do material empírico foi utilizado um questionário sociodemográfico e uma entrevista semiestruturada. As entrevistas foram transcritas e submetidas à análise de conteúdo. Desta análise emergiram três categorias. Os resultados revelam que é difícil para as mães não poder levar seus bebês para casa após o nascimento. Elas revelaram sentimentos como medo, insegurança, temor da morte do bebê, impotência e culpa. As mães vivenciaram a sensação de perda de controle da situação, preocupação com os outros filhos e a necessidade de apoio da mãe e do marido. Foi possível elucidar que a equipe de saúde pode minimizar o sofrimento das mães por meio de iniciativas simples com vistas a um maior acolhimento às mães e aos familiares.

Palavras-chave:
Maternidade; unidade de terapia intensiva; recém-nascido

RESUMEN

En esta investigación se buscó conocer la experiencia de las madres que tuvieron a sus bebés hospitalizados en una Unidad de Cuidados Intensivos Neonatal y Pediátrica. El estudio se caracteriza por ser de carácter cualitativo, exploratorio y descriptivo. Participaron nueve madres de niños hospitalizados en seis distintas Unidades de Cuidados Intensivos Neonatales o Pediátricos ubicadas en cinco ciudades del estado de Rio Grande do Sul. Para la aprehensión del material empírico se utilizó un cuestionario sociodemográfico y una entrevista semiestructurada. Las entrevistas fueron transcritas y se sometieron a análisis de contenido. De este análisis surgieron tres categorías. Los resultados apuntan que es difícil para las madres no ser capaz de llevar a sus bebés a casa después del nacimiento. Revelaron sentimientos como el miedo, la inseguridad, el miedo a la muerte del bebé, la impotencia y la culpa. Las madres experimentaron la sensación de pérdida de control de la situación, la preocupación por los demás niños y la necesidad de apoyo de la madre y el marido. Fue posible dilucidar que el equipo de salud puede reducir al mínimo el sufrimiento de las madres por intermedio de iniciativas sencillas con mirada a una mayor atención a las madres y familiares.

Palabras clave:
Maternidad; unidad de terapia intensiva; recién nacido

ABSTRACT

In this study, we sought to know the experience of mothers of babies hospitalized in a Neonatal or Pediatric Intensive Care Unit. This was a qualitative, exploratory-descriptive study. Nine mothers of infants admitted to six different Neonatal or Pediatric Intensive Care Units, located in five cities in the State of Rio Grande do Sul, participated in the study. A sociodemographic questionnaire and a semi-structured interview were applied to collect the empirical material. The interviews were transcribed and subjected to content analysis. Three categories emerged from this analysis. The results reveal that it is difficult for mothers not being able to take their babies home after birth. They revealed feelings such as fear, insecurity, fear of the baby's death, impotence and guilt. The mothers experienced a sense of loss of control, concern for other children and the need for support from the mother and husband. The health team can alleviate the suffering of mothers by means of simple initiatives with a view to a better reception to mothers and family.

Keywords:
Maternity; intensive care unit; new born

Introdução

A experiência da hospitalização de um bebê em Unidade de Terapia Intensiva (UTI) para as mães e suas famílias é um momento difícil, o qual pode resultar em uma crise, pois coloca o cuidador do bebê, geralmente a mãe, diante de limitações, impedimentos e situações que mudam a relação com o trabalho, com seus familiares, amigos e parceiros. Esta situação, muitas vezes, provoca na família a necessidade de reorganização para atender a nova rotina. (Viera, Mello, Oliveira, & Furtado, 2012Viera, C. S., Mello, D. F., Oliveira, B. R. G., & Furtado, M. C. C. (2012). Rede e apoio social familiar no seguimento do recém-nascido pré-termo e baixo peso ao nascer. Revista Eletrônica de Enfermagem, 12(1),119.).

Alguns estudos atuais apresentaram contribuições em relação ao cenário deste episódio (Hagen, Iversen, & Svindseth, 2016Hagen, I. H., Iversen, V. C., & Svindseth, M. F. (2016). Differences and similarities between mothers and fathers of premature children: a qualitative study of parents’ coping experiences in a neonatal intensive care unit. BMC Pediatrics, 16, 92.; Lara & Kind, 2014Lara, K. L., & Kind, L. (2014). Processos de subjetivação vivenciados por mães em uma unidade de neonatologia. Psicologia em Estudo, 19(4), 575-585.; Vivian et al., 2013Vivian, A. G., Rocha, C. C., Agra, K. P., Krummenauer, C., Benvenutti, D. K., Timm, J. S., & Souza, F. P. (2013). Conversando com os pais: relato de experiência de intervenção em grupo em UTI pediátrica. Aletheia, 40, 174-184,). No entanto, este estudo avança no sentido de apresentar e discutir experiências de mães moradoras de cidades pequenas do interior do Rio Grande do Sul, que passaram pela hospitalização dos seus bebês em UTI.

Considera-se que o entendimento dos profissionais da saúde sobre a experiência materna, durante a internação de seus bebês em UTIs, favorece a proposta de estratégias com vistas a minimizar as dificuldades diante do sofrimento gerado pela hospitalização. Desta forma, este estudo teve como objetivo conhecer a experiência das mães durante a hospitalização de seus bebês em alguma Unidade de Terapia Intensiva do interior do Rio Grande do Sul.

Método

Delineamento

Trata-se de um estudo qualitativo, de caráter exploratório-descritivo, que possibilita maior aproximação com o cotidiano e as experiências vividas pelos próprios sujeitos (Minayo, 2011Minayo, M. C. (2011). Pesquisa social: teoria, método e criatividade (30a ed.). Petrópolis, RJ: Vozes.).

Participantes

A pesquisa foi realizada com nove mães que vivenciaram a internação do seu bebê em alguma Unidade de Terapia Intensiva Pediátrica ou Neonatal. Para identificação das participantes foi utilizada a técnica metodológica snowball, também denominada como snowball sampling (‘Bola de Neve’). Nesta técnica os participantes iniciais de um estudo indicam novos participantes que por sua vez indicam novos participantes e assim sucessivamente, até que seja alcançado o objetivo proposto (Biernarcki & Waldorf, 1981Biernarcki, P., & Waldorf, D. (1981). Snowball sampling-problems and techniques of chain referral sampling. Sociological Methods and Research, 10(2), 141-163.). Para a determinação do número das participantes utilizou-se o critério de saturação dos dados, ou seja, o ‘ponto de saturação’ é atingido quando os novos entrevistados passam a repetir os conteúdos já obtidos em entrevistas anteriores, sem acrescentar novas informações relevantes à pesquisa (Fontanella et al., 2011Fontanella, B. J. B., Luchesi, B. M., Saidel, M. G. B., Ricas, J., Turato, E. R., & Melo, D. G. (2011). Amostragem em pesquisas qualitativas: proposta de procedimentos para constatar saturação teórica. Cadernos de Saúde Pública, 27(2), 388-394.).

Para a escolha das participantes foram considerados os seguintes critérios de inclusão: ter tido um bebê com até 24 meses de internação em UTI Pediátrica ou Neonatal; ter acompanhado a internação do filho; ter idade igual ou superior a 18 anos. As nove mães entrevistadas tinham idades entre 23 e 40 anos. As características podem ser acompanhadas na Tabela 1.

As mães foram referidas pela letra M seguida de um número de 1 a 9, de forma aleatória, como consta na Tabela 1. A pesquisa foi realizada no local que a mãe preferiu, mas todos os locais tiveram condições adequadas, como silêncio e privacidade.

Tabela 1
Caracterização das entrevistadas

As hospitalizações aconteceram em seis diferentes UTIs, Pediátricas e Neonatais, localizadas em cinco cidades do Estado do Rio Grande do Sul. As idades dos bebês variaram entre 0 a 38 dias, e os bebês foram referidos pelos números, de 1 a 9, de acordo com o número que corresponde à sua mãe. As características dos bebês e das hospitalizações são citadas na Tabela 2.

Tabela 2
Caracterização dos bebês e das hospitalizações

Coleta de dados

A coleta de dados aconteceu no período de junho a setembro de 2016, após a emissão favorável pelo Comitê de Ética na Pesquisa do Centro Universitário Franciscano, através do parecer de número 1.559.142, de maio de 2016.

Foi feito um primeiro contato por telefone com cada mãe, no qual foi apresentada a proposta da pesquisa e realizado o convite para ela participar. Após o aceite foi combinado data e local. No dia da coleta de dados, a pesquisadora esclareceu dúvidas e obteve a assinatura do Termo de Consentimento Livre e Esclarecido (TCLE). Na sequência, para a apreensão do material empírico foi utilizado um questionário sociodemográfico e uma entrevista semiestruturada, a qual foi gravada em áudio para posterior transcrição. O questionário serviu para a caracterização das participantes, contendo informações como idade, estado civil, escolaridade, cidade, ocupação, número de filhos, tempo de internação do bebê na UTI, entre outras.

Já a entrevista, apresentou um roteiro semiestruturado, composto por perguntas abertas e fechadas referentes à experiência da hospitalização do bebê, ao vínculo mãe-bebê e aos sentimentos vivenciados. A elaboração da entrevista foi fundamentada em Minayo (2011Minayo, M. C. (2011). Pesquisa social: teoria, método e criatividade (30a ed.). Petrópolis, RJ: Vozes.).

Análise dos dados

Todas as entrevistas foram transcritas e impressas para facilitar as leituras flutuantes. Primeiramente, foi realizada a construção do corpus de análise, composto pelas transcrições das entrevistas. Para a análise dos dados foi escolhida a análise de conteúdo, por ser uma técnica que permite a inferência de conhecimentos relativos às condições de produção das mensagens e à consequente interpretação inferencial (Bardin, 2011Bardin, L. (2011). Análise de Conteúdo. Lisboa, PT: Edições 70.; Minayo, 1993Minayo, M. C. (1993). O desafio do conhecimento: pesquisa qualitativa em saúde. Rio de Janeiro, RJ: Hucitec., 2011Minayo, M. C. (2011). Pesquisa social: teoria, método e criatividade (30a ed.). Petrópolis, RJ: Vozes.).

Resultados e discussão

A mãe diante da necessidade de internação do bebê na UTI

Durante a gestação, as mães constroem a imagem do filho ideal, por meio de fantasias inconscientes. Após o nascimento, elas precisam se adaptar à imagem do bebê real, porém, quando o bebê nasce com alguma intercorrência na saúde e necessita de hospitalização essa adaptação emocional torna-se ainda mais difícil. O nascimento é o momento em que a família idealiza a criança que está por vir, sendo, quase sempre, motivo de alegria e satisfação. No entanto, para as mães participantes deste estudo a realidade apresentou-se diferente da planejada, elas tiveram interrompido o plano de ir para casa com o seu bebê. A frustração diante dessa realidade é expressa nas suas falas:

Eu queria ir pra casa com ela, como eu tinha sonhado, não queria ficar lá, meu plano era ganhar tudo direitinho e ir pra casa no outro dia com ela (M2); Eu sentia uma dor muito grande, queria levar ela pra casa, não queria acreditar que aquilo tava acontecendo com ela (M6); Tive que dar alta sem ele, era pra eu ter ficado dois dias, mas eu pedi pra ficar três, porque tinha esperança que ele saísse junto comigo, mas não deu, ele teve que ir para a UTI. Quando chegamos em casa, ai sim, ai nós dois desabamos, porque não era aquilo que a gente tinha planejado, a gente estava muito triste (M3).

O estudo de Lara e Kind (2014Lara, K. L., & Kind, L. (2014). Processos de subjetivação vivenciados por mães em uma unidade de neonatologia. Psicologia em Estudo, 19(4), 575-585.) revelou que a alta materna não associada à alta do bebê provoca na mãe medo e dor, pois a vontade da mãe de levar o filho para casa, para seu ambiente acolhedor e conhecido, está presente desde a gestação, acompanhando sonhos e fantasias. Assim, as mães, em geral, sentem-se inseguras e preocupadas, mesmo compreendendo a necessidade clínica da hospitalização.

A hospitalização da mulher, para a chegada de um novo membro no sistema familiar, altera a dinâmica da família. Quando soma-se à notícia de que o bebê necessitará de uma Unidade de Terapia Intensiva o impacto é ainda maior, conforme evidenciaram as participantes do estudo:

Foi a pior dor que eu já senti na vida, porque quando a médica disse que ele ia pra UTI, eu fiquei em choque, sabe quando tu não sabe pra onde ir, me senti perdida (M8); Foi um choque pra mim saber que ela ia ter que ir pra UTI, nunca que eu ia esperar isso acontecer, eu tava tão bem, aí, de repente ela nasce e dá tudo aquilo (M6); Foi muito angustiante, a gente não estava esperando que ele precisasse de UTI, porque já estava no final da gestação, talvez por eu ser da área da saúde, já sabia tudo o que podia acontecer (M3).

Ainda que a Mãe 9 tenha sido avisada previamente da possibilidade do seu filho após o nascimento necessitar de internação na UTI, ela também revela ter sofrido um intenso impacto: “Eles já tinham me dito que quando ele nascesse ele ia ter que ir pra UTI, tentei ir me preparando, mas, quando eu vi ele com todos aqueles tubos, eu entrei em desespero, foi horrível”.

A dificuldade de se preparar pode estar relacionada à baixa escolaridade e renda familiar, o pouco acesso a informações de qualidade por meio da internet e mídia impressa. Além disso, de acordo com Maldonado (1997Maldonado, M. T. (1997). Psicologia da gravidez. Vozes, RJ: Rio de Janeiro.), durante a gestação diversas reações emocionais são acionadas pela mulher, e ao pensar que o bebê pode nascer com problemas de saúde, estratégias de defesas são acionadas para minimizar o sofrimento.

Uma das estratégias de defesa que pode ser acionada pela mulher durante a gestação é a negação, nega-se a realidade para não aceitar a perda do ideal, conforme ilustra a fala da Mãe 2:

Até eu tinha lido um livro sobre gestação, e tinha uma parte que era sobre prematuro e UTI, eu pulei, pensava que ela não ia ser prematura e muito menos que iria para uma UTI, me arrependi de não ter lido, se tivesse lido não teria sido tão chocante.

As Unidades de Terapia Intensiva Pediátricas e Neonatais foram criadas com o objetivo de salvar a vida de bebês e crianças, e com o avanço da tecnologia isso tem acontecido com sucesso, porém, ainda existe a associação entre UTI e a proximidade de morte, conforme foi referido por elas:

Eu pensava que o paciente que ia pra UTI, estava entre a vida e a morte, não foi nada agradável (M7); Eu nem imaginava o que era UTI, só sabia que era uma coisa ruim, que as pessoas iam quando estavam morrendo (M8); Eu pensava que ia pra UTI quando tava morrendo, que ir pra UTI era morte. A médica podia ter dito, explicado, porque eu não conhecia, tu vai conhecer só na hora (M2).

O ambiente da UTI é formado por um cenário de tecnologias, muitos aparelhos, movimentação intensa dos profissionais, com uma organização dinâmica e lógica diferente da rotina da mãe. Em concordância com os resultados do estudo de Favaro, Peres e Santos (2012Favaro, M. S. F., Peres, R. S., & Santos, M. A. (2012). Avaliação do impacto da prematuridade na saúde mental de puérperas. Psico-USF, Bragança Paulista, 17 (3), 457-465.) foi possível verificar desse estudo que a primeira visita materna a esse ambiente hostil produz sofrimentos. Elas descreveram que foi uma experiência difícil.

A primeira vez que eu entrei na UTI eu passei mal lá dentro, aquele lugar é horrível (M9); Até eu ir lá ver ela, eu tava tranquila, não chorava, dormia bem, descansava. Aí a primeira sensação quando entrei, foi um choque, ela tava no respirador, com sonda pra se alimentar, horrível de ver (M2);Chegando lá foi horrível, porque tu entra, tu não espera ver o teu filho daquele jeito, ele estava entubado, com sonda pra xixi, sonda pra se alimentar, todo picado era horrível (M5).

No entanto, a mãe 1 mencionou que no primeiro momento que chegou na UTI sentiu-se segura por visualizar a possibilidade de elucidar o diagnóstico de seu bebê: “Chegando na UTI, até fiquei mais calma, pensei: bom, agora pelo menos, vamos descobrir o que está acontecendo com ele”. Importante destacar que essa mãe foi a única que já tinha levado seu bebê para casa, e apenas no 38º dia de vida ele apresentou os sintomas necessitando de hospitalização. Todos os outros bebês deste estudo permaneceram hospitalizados após o nascimento.

A troca do embalo do ninar por uma montanha russa de emoções

Muitos sentimentos são vivenciados pelas mães no período da internação do filho na UTI. No estudo de Vivian et al. (2013Vivian, A. G., Rocha, C. C., Agra, K. P., Krummenauer, C., Benvenutti, D. K., Timm, J. S., & Souza, F. P. (2013). Conversando com os pais: relato de experiência de intervenção em grupo em UTI pediátrica. Aletheia, 40, 174-184,), o sentimento mais citado foi o medo. Da mesma forma, no presente estudo, ao serem perguntadas sobre seus sentimentos, as mães afirmaram ter tido muito sofrimento, preocupação e medo. Oito das mães referiram medo do desconhecido, medo do que poderia acontecer e, principalmente, medo de perder o filho, conforme expressado nas falas.

Uma mistura de sentimentos, o pior era o medo, medo de acontecer algo, medo de não saber o que tava acontecendo, não tinha diagnóstico, medo de como ia lidar, medo da perda, pensava que ele ia morrer (M1); Passava tudo na minha cabeça, medo de perder depois de ter, medo que ele morresse (M5); Eu via ela cheia de aparelho, cheia de coisa, tinha medo de perder ela (M6); Tinha medo de perder ele, desde a gravidez, eu sempre tive muito sangramento, e lá eu tinha medo que ele morresse (M9).

Ainda sobre as emoções vivenciadas no período da internação, é possível perceber através das falas das mães que foi um período de muito sofrimento, além do medo de perder o filho, elas vivenciaram emoções negativas como angústia e tristeza, como evidenciam as falas.

Uma mistura de sentimentos, tristeza de ver ele lá, um desespero muito grande (M1); Angústia é o primeiro sentimento que me vem na cabeça, tristeza de ter que deixar ele lá sozinho (M3); Eu sentia uma dor muito grande, um vazio, uma tristeza (M6).

De acordo com Guidolin e Célia (2011Guidolin, B. L., & Célia, S. A. H. (2011). Sintomas depressivos e de ansiedade em mães durante internação pediátrica em um hospital universitário. Revista de psiquiatria do Rio Grande do Sul, 33(2), 80-86.), o aparecimento de sentimentos ambivalentes de alegria/tristeza, esperança/desesperança, separação/apego, se dá pelas diversas dúvidas que surgem quanto ao bebê, enquanto mãe. Neste estudo, algumas mães também relataram emoções ambivalentes como tristeza e felicidade, conforme se percebe nas falas:

Foi uma mistura de sentimento, angústia, sensação ruim, tristeza por ela não estar comigo, mas, sentia felicidade por ela ter nascido (M2); Tristeza, angústia, medo, ficava muito triste por não poder pegar ele, mas, o primeiro colo foi só felicidade (M9).

O tempo de internação dos bebês variou de três a 84 dias, e durante este período as mães estavam focadas nos bebês, tudo girava em torno da hospitalização, estavam emocionalmente afastadas da vida real.

Aquilo era uma vida paralela, o que tava aqui fora não me interessava, não sabia se tinha sol, meu telefone nem olhava, só queria saber dela (M2); Eu ficava sempre numa expectativa, em alerta, cada dia que passava queria que ele reagisse (M4).

Segundo Winnicott (1988Winnicott, D. W. (1988). Os bebes e suas mães. São Paulo, SP: Martins Fontes.), na etapa de puerpério há uma alteração emocional, essencial e provisória, a qual permite às mães ligarem-se intensamente ao recém-nascido, adaptando-se a ele e buscando atender todas as suas necessidades básicas. O que em outro período seria patológico, no puerpério é considerado natural, o fato de a mãe não dar importância para o autocuidado e dedicar toda sua atenção para o bebê. Porém, diante da necessidade de permanência do filho na UTI, é possível observar que o autocuidado das mães participantes ficou ainda mais prejudicado, e o bebê passou a ser o centro das atenções maternas de forma ainda mais intensa.

Se tu não comer, não dormir, tanto faz, só pensava nele, queria cuidar dele, curar, tratar ele da melhor forma (M1); Não comia direito, não dormia direito, tirava cochilos, me acordava parecia um pesadelo, eu não tive recaída e depressão não sei como (M5); Eu emagreci naquela época, não comia, não dormia, vinha em casa, mas, já queria voltar, sempre naquela espera (M6).

A entrega incondicional da mãe para os cuidados com o bebê justifica-se, também, pela impossibilidade de revezamento com o pai, pois a legislação brasileira concede apenas cinco dias de licença paternidade, o que no caso de hospitalização de recém-nascido não permite que o pai consiga acompanhar a internação em tempo integral. Ainda que a lei nº 8069, de 1990, implantou o Estatuto da Criança e do Adolescente, o qual estabelece no seu artigo 12º que os hospitais devem proporcionar condições para a permanência em tempo integral de um dos pais, ou responsável, nos casos de internação de criança (Brasil, 1990Brasil. Ministério da Ação Social. Centro Brasileiro para a Infância e Adolescência. (1990). Estatuto da Criança e do Adolescente. Brasília, DF.).

No entanto, o pai, muitas vezes, fica impedido de permanecer na UTI em função da legislação do trabalho, conforme exemplificado na fala da Mãe 7: “Meu marido tinha que trabalhar, quando ele podia ele ia ficava lá um pouco e depois voltava para o trabalho”. Isso faz com que a permanência da mãe junto ao bebê hospitalizado ocorra com maior frequência do que em relação ao pai, no caso das participantes do estudo a maioria era a cuidadora principal durante a hospitalização do filho. “Senti falta do meu esposo estar mais tempo lá comigo, não era que ele não queria, mas ele tinha que trabalhar” (M9).

Esses resultados vão ao encontro dos achados de Hayakawa, Marcon e Higarashi (2009Hayakawa, L.Y., Marcon, S. S & Higarashi, I. H. (2009). Alterações familiares decorrentes da internação de um filho em uma unidade de terapia intensiva pediátrica. Revista Gaúcha de Enfermagem, 30 (2), 175-182.). Os autores destacaram em seu estudo que dificilmente os pais das crianças hospitalizadas conseguem acompanhar de perto a evolução de seus filhos, o que gera nos mesmos sentimentos de tristeza e impotência, alternados com períodos de resignação. Já o estudo de Deeney, Lohan, Spence e Parkes (2012Deeney, K., Lohan, M., Spence, D., & Parkes, J. (2012). Experiences of fathering a baby admitted to neonatal intensive care: A critical gender analysis. Social Science & Medicine,75, 1106 -1113.) evidenciou que os pais com classe socioeconômica mais alta mostraram maior liberdade para estarem presentes no hospital, por causa de sua segurança financeira e suas oportunidades de negociar horários de trabalho mais flexíveis do que os pais com classe econômica mais baixa.

Em relação ao papel do pai neste cenário, percebe-se pelo relato das participantes deste estudo que, muitas vezes, quando presentes, os pais exerceram um escudo protetor frente à mãe, assumindo a função de tranquilizá-las.

Quem me apoiou muito, foi o esposo, ele dizia que a gente ia conseguir, que íamos vencer, íamos tentar fazer tudo. Ele me deu um apoio fundamental (M1); Mas, o mais importante foi meu marido, sempre, porque a gente sentia junto, a gente tinha planejado tudo junto, ele me deu tudo o que eu precisava (M3).

Destaca-se que nestes dois casos, os pais exerciam suas funções profissionais com flexibilidade na organização do trabalho.

Observa-se, a partir da fala da Mãe 2, que, nos momentos em que o esposo tinha que se ausentar, ela sentia-se insegura.

O dia que ele teve que viajar, naquele dia me senti insegura, fiquei sozinha lá, naquele dia, nenhuma vez ela mamou, não sei se eu não passei a insegurança pra ela. Quando ele tava comigo eu me sentia mais forte, não sei se é uma dependência do marido, pensava que se acontecesse algo, ele tava lá, e ia resolver.

Corroborando aos achados deste estudo, na pesquisa de Deeney et al. (2012Deeney, K., Lohan, M., Spence, D., & Parkes, J. (2012). Experiences of fathering a baby admitted to neonatal intensive care: A critical gender analysis. Social Science & Medicine,75, 1106 -1113.), os pais referiram a necessidade de ser forte, de ser o protetor, o pai envolvido, o sustentáculo da família. O papel do pai é necessário, segundo Winnicott (1988Winnicott, D. W. (1988). Os bebes e suas mães. São Paulo, SP: Martins Fontes.), em função das mães se encontrarem em desamparo devido a seu estado de preocupação materna primária. Neste estudo, as mães que não tiveram a participação e a presença do companheiro sentiram-se sozinhas, sobrecarregadas, desamparadas conforme se evidencia na fala da Mãe 6.

Senti falta do apoio do meu marido, era tão difícil escutar tudo aquilo dos médicos sozinha, eu ouvia e ficava chorando sozinha lá, e ele dizia que não ia porque não gostava de ver ela daquele jeito, eu me sentia arrasada, queria o apoio dele, e ele não me apoiou.

No entanto, a Mãe 8 foi a única participante deste estudo que, mesmo com a presença do esposo, sentiu-se sozinha, pois o esposo não proporcionou a ela um espaço no qual ela pudesse falar dos seus sentimentos, não permitiu que ela pudesse expressar suas emoções, o que fez com que ela não se sentisse acolhida.

Me sentia muito sozinha, mesmo meu marido do meu lado, me senti muito sozinha, chorava toda hora, mas não podia chorar no lado do meu marido, quando queria conversar ele só dizia que eu tinha que ficar forte, ai tinha que engolir o choro, fui engolindo, engolindo[...].

Segundo Hagen et al. (2016Hagen, I. H., Iversen, V. C., & Svindseth, M. F. (2016). Differences and similarities between mothers and fathers of premature children: a qualitative study of parents’ coping experiences in a neonatal intensive care unit. BMC Pediatrics, 16, 92.), as mães que não são acompanhadas pelos pais do bebê podem ter mais dificuldades de enfrentamento em comparação com aquelas que são acompanhadas. Além disso, apresentaram mais estresse ao acompanhar o filho sem a participação paterna. Além da valorização da presença do companheiro, a presença das suas mães, avós dos bebês, também foi de extrema importância para as participantes, conforme se evidencia na fala da Mãe 2.

A pessoa que eu queria era a minha mãe, não queria sogra, cunhada nada, porque era a mãe que me confortava, ela não perguntava nada, sabia só de me olhar. Muitas das tardes a mãe nem falava comigo, era só de ficar do meu lado, me fazer companhia, respeitar meu silêncio.

Considera-se o fato de que as avós são, de um modo geral, as principais cuidadoras da mãe do bebê, ou seja elas cuidam daquela que cuida. E como as mães do estudo se encontravam em um momento de muita fragilidade, angústia e medo, a presença das avós dos bebês funcionou como um importante suporte para que as participantes conseguissem enfrentar a situação. Na ausência da mãe, avó do bebê, percebe-se a falta que ela fez, pois existia a necessidade de sentir-se acolhida e protegida pela mãe. No caso da Mãe 1, sua irmã acabou suprindo a ausência da mãe.

Acho que se tivesse a minha mãe presente lá, teria sido mais fácil, eu não pude contar com ela nunca, isso sempre me machucou. Graças a Deus naquele momento a mana substituiu a mãe, a mana que substituiu ela, porque a mãe falta muito (choro).

Porém, a Mãe 8, que já tem sua mãe falecida não pode contar com o apoio da irmã:

Queria muito uma mãe, um pai, uma coisa que eu nunca tive, nunca tive eles do meu lado. Minha mãe morreu, meu pai eu não conheci, quem me criou foi meu avô. Queria ter tido minha irmã perto, que ela não tivesse me abandonado, porque era o único exemplo de mulher que eu tinha.

Destaca-se que a visita dos avós aos bebês internados em UTIN já é uma prática recomendada pelo Ministério da Saúde, no que se refere à humanização em UTIN, e tem se mostrado um importante instrumento de fortalecimento da rede de apoio para a mãe e para a inclusão do bebê na família (Brasil, 2011Brasil. Ministério da Saúde. Secretaria de Atenção à Saúde. Departamento de Ações Programáticas Estratégicas. (2011). Atenção humanizada ao recém-nascido de baixo peso: Método Canguru (2a ed.). Brasília, DF.).

O sofrimento das mães não é só pela internação do filho, mas, também é decorrente de todas as mudanças no seu cotidiano. Segundo Costa, Mombelli e Marcon (2009Costa, J. B., Mombelli, M. A., & Marcon, S. S. (2009). Avaliação do sofrimento psíquico da mãe acompanhante em alojamento conjunto pediátrico. Estudos de Psicologia, 26(3), 317-325.), a realidade vivenciada pelas mães é caracterizada por constante luta entre a saúde e a doença do filho, condições em que as mães possuem outros filhos em casa, emprego, marido, dificuldades financeiras, sendo que, muitas vezes, a internação se dá em outra cidade. Neste estudo, cinco das mães participantes tiveram seu bebê hospitalizado em outra cidade, o que dificultou ainda mais a presença do esposo e dos outros familiares, conforme se evidencia na fala das Mães 5 e 7.

Marido, mãe, meus irmãos, não podiam estar lá, porque era longe (M5); Eu não tinha chão, vontade de nem sei o que fazer. Teve um dia que eu não conseguia falar com meu marido, ele estava pra fora trabalhando, meus pais estavam longe (M7).

Quando a mãe possui outros filhos, e ela necessita permanecer no hospital cuidando do filho hospitalizado, surgem preocupações com os filhos que estão em casa, conforme exemplifica-se na fala da Mãe 7. “Me preocupava dele ter ficado sozinho, tinha receio, mas, sabia que a vó dele tava cuidando, que qualquer coisa ele ligava para os tios, mas, eu me preocupava igual”. Já a Mãe 5 citou que uma das coisas mais difíceis foi ficar longe do outro filho: “Sentia muita falta dele, quando falava com ele era muito difícil, sofria dele estar longe, ele ficou com minha funcionária que é como vó”.

Percebe-se que o fato de não conseguir dar assistência para o filho que está em casa pode desencadear sentimento de culpa, como se estivesse trocando um filho pelo outro.

Já com o segundo filho, a gente se sente como se estivesse traindo o primeiro, sentimento de que tu tava fazendo uma coisa errada, quando na verdade não é, mas era difícil pra ele entender o porquê que o maninho não foi pra casa e a mãe tinha que ficar lá com o mano (M3).

Corroborando, Santos et al. (2013Santos, L. M., Oliveira, V. M., Santana, R. C., Fonseca, M. C., Neves, E. S., & Santos, M. C. (2013). Vivências maternas na unidade de terapia intensiva pediátrica. Revista de Pesquisa: Cuidado é Fundamental Online, 5(1), 3432-3442.) destacaram, em seu estudo, que as mães que tinham outros filhos desencadearam a sensação de impotência, pois elas encontravam-se entre a necessidade de acompanhar seu filho hospitalizado e o fato de não poder cuidar dos filhos que estavam em casa.

O que pode atenuar as fortes emoções da montanha russa? A importância do apoio

Percebe-se que este cenário repercute e altera toda a rotina familiar, gerando na mãe a sensação de perda de controle no funcionamento da família, das inseguranças quanto à capacidade de retomar o equilíbrio e das dúvidas relacionadas à situação vivenciada. Desse modo, as mães necessitam de apoio, orientação e cuidados permanentes (Hayakawa, Marcon, Higarashi, & Waidman, 2010Hayakawa, L.Y, Marcon, S. S., Higarashi, I. H., & Waidman, M. A. P. (2010). Rede social de apoio à família de crianças internadas em uma unidade de terapia intensiva pediátrica. Revista Brasileira de Enfermagem, 63(3), 440-445.).

É possível observar que diante do sofrimento, das incertezas e mudanças no cotidiano da mãe, além do apoio do companheiro e da mãe, o apoio de outros membros da família também foi de suma importância. “Meu pai ia nas horas de visita, minha irmã ficava lá pra eu poder ir pra casa, me ajudaram e me apoiaram muito” (M6); “Meu tio e a minha cunhada ficaram sempre lá me ajudando” (M7).

Além do apoio de familiares próximos, algumas das mães participantes, também receberam apoio de familiares não tão próximos, que se mobilizaram e se aproximaram oferecendo ajuda, o que resultou na criação de laços e fortalecimento de vínculos, como se observa no relato da Mãe 5. “Eu tive apoio de um primo meu que até então era distante, mas, ele mora em Porto Alegre com a esposa, e nós criamos um vínculo enorme, tanto é que eles são padrinhos dele, foi um apoio fora de série”.

Embora o apoio presencial seja fundamental, os resultados deste estudo revelaram que as redes sociais digitais também exerceram a função de apoio. Como exemplo, as mães conectadas via Facebook conseguiram expressar, compartilharam sua dor com outras pessoas, sentiram-se acolhidas pelas manifestações de carinho e mensagens de familiares, de amigos e, até mesmo, de pessoas desconhecidas. Salienta-se que o apoio recebido não foi só o emocional, mas, também o material, conforme se verifica nas falas a seguir.

No Face eu compartilhava, postava muitas fotos dele, porque era muita gente querendo saber dele, e tive apoio até de pessoas que eu não conhecia, faziam correntes de oração, me mandavam mensagens de apoio (M5); Colocamos na rede social, e bastante gente ajudou, todos que ajudaram eram pessoas humildes, depositaram dinheiro (M8); Pelo Face muitos ficaram sabendo também. Eu tive ajuda de muitas pessoas, ganhamos uma ovelha e um ferro de uma loja, pra fazer rifa, porque precisamos de dinheiro pro deslocamento das pessoas (M9).

Bousso, Ramos, Frizzo, Santos e Bousso (2014Bousso, R. S., Ramos, D., Frizzo, H.C.F., Santos, M. R., & Bousso, F. (2014). Facebook: um novo locus para a manifestação de uma perda significativa. Psico USP, 25(2), 172-179.), em concordância com este pensamento, afirmaram que as redes sociais propiciam um espaço importante na construção de redes de apoio, visto que impulsionam a manifestação de sentimentos e a rapidez na qual os comentários fluem, resulta em um acolhimento quase que imediato, propiciando um contexto de enfrentamento àqueles que vivenciam um momento de adoecimento ou luto.

Além do uso das redes sociais, como uma forma de enfrentamento, algumas mães faziam uso da comparação, pois quando observavam o estado de saúde dos seus bebês em relação aos demais pacientes internados na UTI, percebiam que tinham casos mais graves, e sentiam-se fortalecidas.

Me dava força quando comparava, via que meu problema era tão pequeno, uns já tinham feito até cirurgia no coração, e a minha só tinha que mamar, daqui uns dias já ia embora (M2); Aí, lá eu vi casos horríveis, que faz pensar que o do teu filho não é nada, parece egoísmo, mas, eu escutava e pensava que o caso do meu não era nada, me sentia mais forte (M8).

De acordo com os achados de Hayakawa et al. (2009Hayakawa, L.Y., Marcon, S. S & Higarashi, I. H. (2009). Alterações familiares decorrentes da internação de um filho em uma unidade de terapia intensiva pediátrica. Revista Gaúcha de Enfermagem, 30 (2), 175-182.), na hospitalização do filho, a mãe procura respostas para suas inseguranças e o mecanismo dessa busca, geralmente, é a comparação com o estado das outras crianças internadas, por meio do qual ela elucida suas dúvidas e renova suas forças para continuar.

A presença da mãe na UTI para o bebê é fundamental, não somente a presença física, mas, o envolvimento emocional, pois, entre a relação da mãe com o seu bebê há um estilo próprio de interação. Porém, a hospitalização do bebê na UTI pode introduzir cortes nesta relação e a mãe pode ser impedida de proporcionar e viver sensações para as quais se preparou. Algumas mães relataram não ter recebido incentivo da equipe em relação ao vínculo e cuidados com o seu bebê, conforme exemplifica-se no relato da M3.

Quando eu chegava elas já tinham trocado a fralda, faziam tudo, a equipe nunca estimulou o cuidado, eu queria que tivessem deixado eu ter pegado ele mais, ter tido mais contato físico com ele. Ali nada acontece, queria ter sido mais mãe e menos expectadora, eu ia só pra olhar.

No entanto, as mães 5 e 7 relataram que a equipe estimulava o contato delas com o bebê, cabe salientar que os bebês delas ficaram internados na mesma UTI: “Eu pedia pra pegar e eles deixavam, estavam sempre me dizendo pra pegar e tocar nele”. “Sempre diziam que eu podia pegar ela no colo quando quisesse”. Segundo Scochi, Gavia, Melo e Mello (2000Scochi, C. G. S., Gavia, M. A. M., Melo, L., & Mello, D. F. (2000). Assistência aos pais de recém-nascidos pré-termo em unidades neonatais. Revista Brasileira de Enfermagem, 52(4),495-503.), a falta de oportunidade da mãe de se relacionar com seu filho hospitalizado pode levar a um prejuízo na formação e efetivação do apego. Esse prejuízo pode influenciar no prognóstico do bebê internado e na atitude da mãe diante da hospitalização.

A mãe deve ser percebida pela equipe em suas características e necessidades particulares. Isto favorece a adaptação das mães, uma vez que nesse momento elas se encontram ansiosas, fragilizadas, com sentimento de perda e sem controle da situação. Porém, no presente estudo, algumas participantes apontaram que não se sentiram cuidadas e que suas necessidades, na maioria das vezes, não foram atendidas pela equipe, como se percebe nos depoimentos a seguir.

Parece que ninguém da equipe tava se importando com o que eu sentia (M2); Ninguém da equipe nunca perguntou como eu tava, se tava mal ou não, pra eles não fazia diferença (M3); Mas, ninguém da equipe se importou muito comigo lá (M6).

Nessa perspectiva, é importante que a equipe estabeleça com as mães dos bebês internados um relacionamento empático e intersubjetivo, facilitando sua participação no cuidado com o filho. Assim, os profissionais da saúde podem contribuir para que a mãe busque estratégias de enfrentamento, com vistas a reduzir o seu sofrimento e o estresse emocional, em uma perspectiva de cuidado à família como meio de cuidar do bebê (Freitas, Menezes, & Mussi, 2012Freitas, K. S., Menezes, I. G., & Mussi, F. C. (2012). Conforto na perspectiva de familiares de pessoas internadas em Unidade de Terapia Intensiva. Texto & Contexto-Enfermagem, 221(4), 896-904.).

Considerações finais

Conhecer a experiência de mães que tiveram seus bebês hospitalizados em uma Unidade de Terapia Intensiva Neonatal ou Pediátrica permite refletir sobre as mudanças e dificuldades enfrentadas por elas. Percebe-se a necessidade desse tema passar a ser abordado pelos profissionais de saúde durante o pré-natal, para que seja desmistificada a relação UTI-morte. Além disso, seria interessante que o profissional que recebe o bebê tenha a possibilidade de explicar para a mãe sobre o funcionamento da UTI e tirar dúvidas sobre o ambiente.

Em relação à participação paterna, destaca-se que a presença do companheiro gera segurança e conforto para as mães. No entanto, em algumas situações, o envolvimento paterno é restrito em decorrência da necessidade de retorno ao trabalho. Entre os resultados, ressalta-se que o pai tem poucos dias de licença paternidade, o que sobrecarrega física e emocionalmente a mãe.

Quando as mães recebem o apoio e o cuidado da família, principalmente por meio da presença de sua mãe e do pai do bebê, conseguem enfrentar a situação com mais segurança, confiança e tranquilidade. Sendo assim, há necessidade de uma maior aceitação e acolhimento das famílias dentro das UTIs, não como resultado da imposição de leis, mas sim, como uma necessidade sentida e interpretada pela equipe de saúde.

Precisa-se melhorar o ambiente físico, oferecendo mais conforto para as mães, para que as mesmas possam dormir melhor, se alimentar, realizar a higiene pessoal, além de momentos de descontração, que poderiam ser ofertados através de espaços como sala de estar, com disponibilidade de materiais para leitura, desenhos, trabalhos manuais, filmes. Além disso, é imprescindível que todos os hospitais, sejam eles públicos ou privados, disponibilizem às mães e suas famílias o serviço de psicologia hospitalar. Entre as participantes deste estudo, apenas três mães puderam contar com esse atendimento especializado.

Constatou-se que o apoio às mães também acontece à distância, por meio das redes sociais, por isso sugere-se que as Unidades de Terapia Intensivas possam disponibilizar Wifi grátis para as mães e familiares acompanhantes, colaborando para a aproximação delas com pessoas que não são autorizadas a entrar na UTI, como amigos e parentes. A rede social pode possibilitar mais comunicação delas com pessoas que funcionam como referências afetivas e que não moram na mesma cidade, proporcionando a possibilidade de acompanharem o estado de saúde do bebê e confortarem a mãe durante o período de internação do bebê.

Assim torna-se imprescindível uma equipe de saúde comprometida, sensível e preparada, que esteja sempre disposta a refletir sobre sua prática e consiga não apenas direcionar o seu cuidado ao bebê, mas, também às mães e suas famílias.

Diante do exposto, é possível constatar que o próprio hospital enquanto instituição de saúde e a equipe podem fazer uso de ferramentas e dispositivos com vistas a atenuar o sofrimento da experiência materna durante a internação do bebê em UTI. Por isso,dentro desta temática sugerem-se novos estudos que envolvam a participação da gestão hospitalar, equipe de saúde e familiares, especialmente, aqueles que promovam a escuta do pai e da avó, pois foram personagens que apareceram com destaque neste estudo.

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    15 Jul 2019
  • Data do Fascículo
    2019

Histórico

  • Recebido
    13 Jul 2017
  • Aceito
    04 Fev 2019
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