DEBATE
Sobre a residência multiprofissional em saúde
About the multiprofessional residence in health
A propósito de la residência multiprofesional en salud
Ana Estela Haddad
Graduada em Odontologia. Secretaria de Gestão do Trabalho e da Educação na Saúde, Ministério da Saúde. Esplanada dos Ministérios, Bloco G, 7º andar, sala 717. Brasília, DF, Brasil. 70.058-900. ana.haddad@saude.gov.br
O artigo "No olho do furacão, na ilha da fantasia: a invenção da Residência Multiprofissional em Saúde" (RMS) tem o mérito de discutir aspectos importantes de uma política pública de grande alcance como a Residência Multiprofissional em Saúde. Como resultado de uma dissertação acadêmica, tem de ser compreendido dentro dos limites das perspectivas de análise baseadas na escolha metodológica e no tempo empreendido e delimitado para estabelecer considerações. Como bem reconhecem as autoras, não há "a pretensão de acabar em si, mas sim de suscitar o debate". Embora reflitam essa preocupação, algumas análises precisam ser revisitadas e relativizadas. Considerar, por exemplo, que houve mudança no rumo da política e do discurso, demanda uma reflexão mais aprofundada. Esses acontecimentos têm força suficiente para modificar o tabuleiro dos saberes?
Para melhor inserir a análise em seu contexto é preciso considerar a dinâmica dos fatos que permearam a RMS de sua criação até hoje. Desde a promulgação da Lei n. 11.129/2005 até a instalação da Comissão Nacional de Residência Multiprofissional, dois anos depois, o Ministério da Saúde patrocinou um amplo processo de debate e articulação política, envolvendo os diversos atores, representados em dois seminários nacionais sobre o tema, o segundo precedido de cinco regionais. Após o II Seminário Nacional, um Grupo de Trabalho sistematizou os documentos produzidos. O resultado foi a publicação da Portaria Interministerial MEC/MS n. 45/2007, que dispõe sobre os princípios e diretrizes dessa modalidade de formação e institui, no âmbito do Ministério da Educação, a Comissão Nacional de Residência Multiprofissional em Saúde (CNRMS). Foi institucionalizada, assim, esta modalidade de formação.
Ao longo de seus dois primeiros anos de funcionamento, a CNRMS estabeleceu seu Regimento Interno de funcionamento, abriu cadastramento para os programas existentes, selecionou e iniciou a capacitação de um banco de avaliadores de programas, estabeleceu critérios para dar início ao credenciamento provisório dos programas já existentes. Estabeleceu um importante canal de comunicação com os Conselhos Profissionais das 14 profissões da saúde, com os quais pactuou uma nova conformação de Câmaras Técnicas, não mais por profissão, mas por linha de cuidado, sinalizando mais um passo importante para a construção da integralidade do cuidado na formação em saúde.
Vale ressaltar a vinculação da CNRMS ao Departamento de Hospitais e Residências (DHR) da Secretaria de Educação Superior (SESu), mesmo departamento ao qual se vincula a Comissão Nacional de Residência Médica (CNRM). O DHR, recentemente criado, decorre do aprofundamento do espaço interinstitucional criado na atual gestão, de interface entre os Ministérios da Educação e da Saúde, como base para a consolidação da política nacional de educação na saúde, conduzida pelo Ministério da Saúde.
Tendo a educação permanente (Portaria n. 1996/2007) como eixo estruturante, há um consistente movimento no âmbito dos estados, tendo como referência as comissões de Integração Ensino Serviço (CIES), vinculadas aos Colegiados de Gestão Regional (CGR), pela integração das ações de educação na saúde, e isso envolve a RMS.
Esta tem sido pautada em múltiplos espaços para sua consolidação.
Ainda para contribuir para o debate, como incluir como elemento da análise, por exemplo, a franca opção expressa na ampliação dos recursos destinados ao financiamento dos programas? Se considerarmos o início do Programa, os dados falam a favor da afirmação. Do orçamento da Secretaria de Gestão do Trabalho e da Educação na Saúde (SGTES)referente à unidade programática "Formação superior", 11,84% foram destinados ao financiamento de Residências em 2005, passando para 30% em 2006 e 34% em 2007. A ampliação ocorre mesmo face ao necessário fracionamento interno nas diferentes frentes de ação do Ministério da Saúde na área: Pró-Saúde, PET Saúde, Telessaúde Brasil, UNA-SUS, Educação Permanente. No orçamento de 2008, os investimentos nas Residências equiparam-se aos do Pró-Saúde, programa estruturante prioritário, destinado a apoiar as mudanças nos cursos de graduação da área da saúde. Até 2006, a SGTES apoiava programas de Residência Multiprofissional em 11 estados. A ampliação do apoio em 2008 permitiu a expansão para 24 dos 27 estados brasileiros. Entre 2006 e 2008, o Ministério da Saúde financiou a formação de 1487 profissionais pela RMS.
Como trazer à ponderação a riqueza das discussões sobre o trabalho em equipe, a importância da formação para o trabalho no SUS e entender que estas se multiplicam nos espaços onde os quase mil e quinhentos residentes atuam? É possível transcender a análise por entender que há, por excelência, a participação comunitária e o controle social, com imprescindível contribuição para o debate, nos municípios que abrigam as residências? Como trazer à tona a efervescência dos saberes que se produzem sem ter, como bem explicitam as autoras, a clareza de que não é possível ter uma análise que "acaba em si", mas sim uma que pretende contribuir e dialoga?
O tema RMS tem sido objeto de muitas avaliações, reflexões, dissertações, teses e reuniões de trabalho. Sem sombra de dúvida, um assunto que está longe de ser esgotado no ambiente acadêmico, nos serviços de saúde e na comunidade. Em síntese, há um ponto de convergência coletiva neste debate. Todos os envolvidos, dentro de suas competências e trazendo suas diferentes perspectivas de análise, contribuem para o aprimoramento do Sistema Único de Saúde do Brasil.
Recebido em 25/02/09.
Aprovado em 02/03/09.
Datas de Publicação
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Publicação nesta coleção
14 Abr 2009 -
Data do Fascículo
Mar 2009