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Lucros Inesperados, Retorno das Ações e Risco no Mercado de Capitais Brasileiro* * * Trabalho apresentado no 37o EAA Annual Congress, Tallinn, Estônia, maio de 2014, e na 21a Annual Conference of the Multinational Finance Society, Praga, República Checa, junho de 2014. ** ** Agradecimentos: O autor agradece Zhaoyang Gu (debatedor da MFC), Kim Peterson (CBS), participantes da Multinational Finance Conference (MFC, 2014), da European Accounting Association Conference (EAA Conference, 2014) e do Copenhagen Business School Research Seminar (2014), bem como revisores anônimos, pelos úteis comentários sobre as versões iniciais deste texto. Qualquer erro remanescente é de minha exclusiva responsabilidade. À Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (Fapesp) também dedico meus agradecimentos, pela concessão de financiamento ao Projeto de Pesquisa 12436-8/2013.

RESUMO

Este artigo analisa o papel do risco no coeficiente de resposta ao lucro (ERC) no mercado de capitais brasileiro. Como "risco" pode ser mensurado de diversas formas e variar sistematicamente de acordo com as condições analisadas, estudos empíricos têm relatado evidências conflitantes sobre o papel do risco no ERC. Este estudo empírico é baseado em dados anuais de uma amostra de 212 empresas listadas na Bolsa de Valores, Mercadorias e Futuros de São Paulo (BM&FBOVESPA), no período de 1995 a 2013. A análise considera dados longitudinais e diferentes mensurações de lucros inesperados, risco e diversas variáveis de controle. Os resultados sugerem que a relação lucro-retorno é afetada negativamente pelo risco total e por efeitos não lineares dos lucros inesperados e é afetada positivamente pela persistência dos lucros. A análise não indicou qualquer associação significativa entre o ERC e o risco sistemático e não encontrou evidências de que a adoção completa das International Financial Reporting Standards (IFRS), em 2010, afetou a forma como o mercado reage às surpresas na divulgação dos lucros contábeis. Para fins de análise da relação lucro-retorno, a classificação das empresas pelo ranking do risco total mostrou melhores resultados para discriminar empresas de maior e menor risco. Este artigo contribui com a literatura contábil em mercados emergentes ao relatar que o controle da relação lucro-retorno por meio do risco total, dos efeitos não lineares e da persistência dos lucros pode aperfeiçoar a análise financeira e o processo de avaliação das empresas.

Palavras-chave:
mercados emergentes; coeficiente de resposta ao lucro; lucros contábeis; risco

ABSTRACT

This article analyzes the role of risk in the earnings response coefficient (ERC) in the Brazilian capital market. Since 'risk' may be measured in various ways and it can vary systematically according to the conditions under analysis, empirical studies have reported conflicting evidence with regard to the role of risk in the ERC. The empirical study is based on annual data from a sample of 212 companies listed on the Brazilian Securities, Commodities, and Futures Exchange (BM&FBOVESPA), within the period from 1995 to 2013. The analysis takes into account longitudinal data and various measurements of unexpected earnings, risk, and several control variables. The results suggest that the earnings-return relationship is negatively affected by total risk and nonlinear effects of unexpected earnings and it is positively affected by earnings persistence. The analysis failed to indicate any significant association between the ERC and systematic risk and it failed to provide evidence that the full adoption of the International Financial Reporting Standards (IFRS), in 2010, affected the way how the market reacts to surprises in the disclosure of accounting earnings. In order to analyze the earnings-return relationship, classifying companies by the total risk ranking showed better results in terms of distinguishing high and low-risk companies. This article contributes to the accounting literature in emerging markets by reporting that controlling the earnings-return relationship through total risk, nonlinear effects, and earnings persistence may optimize financial analysis and the companies' assessment process.

Keywords:
emerging markets; earnings response coefficient; accounting earnings; risk

1 INTRODUÇÃO

Vários estudos analisaram a dinâmica lucro-retorno segundo diversas metodologias, períodos e condições econômicas. Com frequência, as análises de longo prazo da dinâmica lucro-retorno são baseadas na importância e magnitude do coeficiente de resposta ao lucro (ERC). Especificamente, um grande número de estudos mostra que o ERC funciona como proxy para a utilidade da informação na tomada de decisão ao avaliar a percepção de mercado sobre a relevância das diversas mensurações e critérios de reconhecimento contábeis (Dechow, Ge, & Schrand, 2010Dechow, P. M., Ge, W., & Schrand, C. (2010). Understanding earnings quality: a review of the proxies, their determinants and their consequences. Journal of Accounting and Economics 50(1-2), 344-401.).

Embora haja um extenso corpo de pesquisa que enfoca a relação lucro-retorno, Basu (2005Basu, S. (2005). Discussion: the effect of risk on price responses to unexpected earnings. Journal of Accounting, Auditing and Finance20(4), 483-494. ) e Chambers, Freeman e Koch (2005Chambers, D. J., Freeman, R. N., & Koch, A. S. (2005). The effect of risk on price responses to unexpected earnings. Journal of Accounting, Auditing & Finance20(4), 461-482.) indicam que as evidências empíricas sobre a sensibilidade do ERC ao risco sistemático é controversa. Enquanto Ariff, Fah e Ni (2013Ariff, M., Fah, C. F., & Ni, S. W. (2013). Earnings response coefficient of OECD banks: tests extended to include bank risk factors. Advances in Accounting29(1), 97-107.) e Collins e Kothari (1989Collins, D. W., & Kothari, S. P. (1989). An analysis of intertemporal and cross-sectional determinants of earnings response coefficients. Journal of Accounting and Economics 11(2), 143-181.) relatam coeficientes negativos entre o ERC e o risco sistemático, Ball, Kothari e Watts (1993Ball, R., Kothari, S. P., & Watts, R. (1993). Economic determinants of the relation between earnings changes and stock returns. The Accounting Review68(3), 622-638.) e Cready, Hurtt e Seida (2000Cready, W., Hurtt, D., & Seida, J. (2000). Applying reverse regression techniques in earnings-returns analyses. Journal of Accounting and Economics 30(2), 227-240.) relatam uma relação significativamente positiva. Por outro lado,Easton e Zmijewski (1989Easton, P. D., & Zmijewski, M. E. (1989). Cross-sectional variation in the stock market response to accounting earnings announcements. Journal of Accounting and Economics 11(2-3), 117-141.), Ghosh, Gu e Jain (2005Ghosh, A., Gu, Z., & Jain, P. C. (2005). Sustained earnings and revenue growth, earnings quality, and earnings response coefficients. Review of Accounting Studies10(1), 33-57.) e Warfield, Wild e Wild (1995Warfield, T. D. , Wild , J. J., , Wild & K. L. , (1995). Managerial ownership, accounting choices, and informativeness of earnings. Journal of Accounting and Economics 20(1), 61-91.) não observam uma relação consistente e significativa entre o ERC e o risco sistemático.

Com base em evidências conflitantes internacionais e tendo em vista o fato de que o risco é suscetível a variar de modo sistemático dentro dos cenários examinados, este artigo tem por objetivo lançar luz sobre essa questão analisando o papel desempenhado pelo risco nas respostas dos preços aos lucros no Brasil. Este estudo considera que algumas características específicas do mercado brasileiro - tais como (i) alta concentração do índice de ações em um número pequeno de grandes firmas, (ii) baixo nível de liquidez das ações para a maioria das firmas e (iii) alta volatilidade devido aos movimentos do capital especulativo - tornam o beta do modelo de mercado uma proxy distorcida para o risco em estudos sobre a relação lucro-retorno.

A abordagem deste artigo também é motivada pelos resultados relatados por Amorim, Lima and Murcia (2012Amorim, A. L. G. C., Lima, I. S., & Murcia, F. D. R. (2012). Analysis of the relationship between accounting information and systematic risk in the Brazilian market. Revista Contabilidade & Finanças23(60), 199-211. , p. 199), que indicam que os betas contábeis e de mercado têm uma "relação insignificante ou mesmo inexistente", assim como os de Simon, Zani, Morais e Costa (2014Simon, D. S., Zani, J., Morais, I. C. A., & Costa, A. B. (2014). Low-beta stocks in the Brazilian market (working paper). Recuperado de http://www.mfsociety.org/modules/modDashboard/uploadFiles/conferences/MC21~377~p18e9s0n0619vv18ol1n4i1lvl7fc4.pdf
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) e Costa Jr., Menezes e Lemgruber (1993Costa Jr., N. C. A., Menezes, E. A., & Lemgruber, E. F. (1993). Estimação do beta de ações através do método dos coeficientes agregados. Revista Brasileira de Economia 47(4), 605-621.), que relatam anomalia do beta de mercado e má especificação do beta no mercado brasileiro. Especificamente para efeitos de lucro-retorno, uma mensuração simples da posição na classificação do risco idiossincrático (ou não sistemático) é mais consistente quanto à hipótese de uma relação negativa em modelos de avaliação. Além disso, o papel desempenhado pelo risco idiossincrático também é intrigante: enquanto Mendonça, Klotzle, Pinto e Montezano (2012Mendonça, F. P. D., Klotzle, M. C., Pinto, A. C. F., & Montezano, R. M. D. S. (2012). The relationship between idiosyncratic risk and returns in the Brazilian stock market. Revista Contabilidade & Finanças 23(60), 246-257. , p. 256) relatam que o risco idiossincrático é um "excelente fator explicativo para o retorno", Galdi e Securato (2007Galdi, F. C., & Securato, J. R. (2007). O risco idiossincrático é relevante no mercado brasileiro? Revista Brasileira de Finanças(1), 41-58.) não observam evidência de uma relação significativa entre risco idiossincrático e retorno de carteira no mercado de capitais brasileiro.

Este estudo empírico é baseado em dados anuais de uma amostra com 212 firmas listadas na Bolsa de Valores, Mercadorias e Futuros de São Paulo (BM&FBOVESPA), de 1995 a 2013. Os principais resultados sugerem que, para os estudos que tratam da relação lucro-retorno, a posição (ranking) na classificação do risco total é uma melhor estimativa de risco de mercado do que o beta do modelo de mercado (risco sistemático). Essas evidências têm implicações relevantes para a literatura empírica no Brasil, uma vez que o uso do beta do modelo de mercado como uma mensuração do risco pode produzir resultados enviesados, especialmente quando as informações dos dados contábeis são consideradas. Especificamente, os resultados são consistentes com Bernard e Thomas (1990Bernard, V. L., & Thomas, J. K. (1990). Evidence that stock prices do not fully reflect the implications of current earnings for future earnings. Journal of Accounting and Economics 13(4), 305-340. ), que discutem que a escala das variáveis dependentes (entre zero e um) produz melhores comparações do retorno anormal ao longo de diversas variáveis.

Os resultados também indicam que o ERC está positivamente relacionado à persistência dos lucros e negativamente relacionado ao efeito não linear dos lucros inesperados. Apesar de ambas as associações serem de suma importância para a literatura contábil baseada no mercado (market-based accounting research) no Brasil, são poucos os estudos que abordam diferenças na persistência transversal dos lucros e nenhum aborda efeitos não lineares. Além disso, este artigo relata um aumento significativo do ERC após a adopção das International Financial Reporting Standards (IFRS), em 2010, embora uma relação causal ainda não tenha sido demonstrada. No geral, este artigo mostra que o controle da relação lucro-retorno por meio de (i) posição na classificação do risco total, (ii) efeitos não lineares de lucros inesperados e (iii) persistência dos lucros pode otimizar análises da natureza e da magnitude dos lucros na análise financeira e no processo de avaliação.

Este artigo está estruturado da seguinte forma: a seção 2 apresenta a literatura e a fundamentação teórica; a seção 3 apresenta o desenho e as variáveis de pesquisa; a seção 4 descreve os dados e esboça uma análise preliminar; a seção 5 apresenta e discute os resultados empíricos; e a seção 6 resume os achados e apresenta as considerações finais.

2 COEFICIENTE DE RESPOSTA AO LUCRO E RISCO

A relação entre lucros e retorno das ações, geralmente mensurada pelo ERC, é relevante para elaborar modelos mais robustos de avaliação e testes de contratação mais eficazes, bem como testar hipóteses de custo político (Kothari, 2001Kothari, S. P. (2001). Capital markets research in accounting., Journal of Accounting and Economics 31(1), 105-231.). Normalmente, os estudos sobre o ERC demonstram que os preços das ações são uma função de todas as variáveis informacionais que preveem dividendos, ou seja, componentes transitórios, taxas de desconto da firma, expectativas de crescimento econômico e risco (risco sistemático e risco específico da firma). Estudos que relacionam o ERC às variáveis econômicas utilizam algum modelo padrão de avaliação por fluxos de caixa descontado para gerar o ERC teórico (Kothari, 2001Kothari, S. P. (2001). Capital markets research in accounting., Journal of Accounting and Economics 31(1), 105-231.).

Considerando que (i) a expectativa do dividendo é uma função dos lucros divulgados de uma firma (X) em um período t - 1 (Feltham & Ohlson, 1995Feltham, G. A., & Ohlson, J. A. (1995). Valuation and clean surplus accounting for operating and financial activities. Contemporary Accounting Research11(2), 689-731.) e que (ii) há um coeficiente (λit+k) que relaciona a expectativa dos dividendos aos lucros divulgados, Collins e Kothari (1989Collins, D. W., & Kothari, S. P. (1989). An analysis of intertemporal and cross-sectional determinants of earnings response coefficients. Journal of Accounting and Economics 11(2), 143-181.) demonstram que o retorno inesperado (UR) associado aos lucros inesperados (UX) pode ser expresso como:

E(Rit+τ) = índice de expectativa de retorno do título do final de t+τ-1 ao final de t+τ.

Pit-1 = o preço das ações no início do período.

λit= o coeficiente relativo à revisão do preço das ações devido a novas informações nos lucros divulgados.

Especificamente, a variável lucros inesperados é definida comoUXit=Xit ‒ E(Xit|It-1), onde It-1 representa o conjunto de informações disponíveis em t-1. Assim, a equação relaciona os lucros inesperados ao retorno inesperado, e o coeficiente é o ERC (o termo entre colchetes).

Em consonância com o Modelo de Precificação de Ativos Financeiros (CAPM),E(Rit+τ) aumenta de acordo com o risco sistemático. Consequentemente, riscos (sistemáticos) elevados devem estar relacionados com baixos ERCs, sugerindo uma relação negativa entre esses parâmetros. A lógica por trás da relação negativa é que quanto mais arriscados forem os retornos futuros esperados pela firma, menor será o valor dessa firma para um investidor avesso ao risco. Esse efeito de alto risco afetará os preços das ações (e o retorno das ações) por meio da taxa de desconto no modelo de avaliação. Por isso, "uma vez que os investidores veem os lucros atuais como um indicador do desempenho futuro da firma e do retorno das ações, quanto mais arriscado for esse retorno futuro, menor será a reação do investidor a determinado montante de lucros inesperados" (Scott, 2012Scott, W. R. (2012). Financial accounting theory (6a. ed.). Toronto: Prentice Hall., p. 163). Assim, o risco sistemático tem um efeito de "denominador negativo" sobre a associação lucro-retorno.

No entanto, Chambers et al. (2005Chambers, D. J., Freeman, R. N., & Koch, A. S. (2005). The effect of risk on price responses to unexpected earnings. Journal of Accounting, Auditing & Finance20(4), 461-482.) advertem que essa relação negativa é baseada na hipótese de beta do CAPM estável. Especificamente, a derivação pressupõe que o risco sistemático não muda (ou não deve mudar) do tempo t-1 ao longo do tempo t. Assim, diferentemente da ideia apresentada acima, Chambers et al. (2005) discutem (e apresentam evidências de) que se os lucros atuais são informativos em matéria de dividendos futuros, as inovações dos lucros são suscetíveis a causar uma revisão mais ampla dos dividendos futuros esperados em uma empresa com alto risco do que em uma empresa com baixo risco. Especificamente, no modelo proposto pelos autores, o impacto de um anúncio de lucros é determinado por revisões nas expectativas anteriores dos investidores acerca do dividendo final esperado. Esse efeito da incerteza nos dividendos futuros cria base teórica para uma relação positiva causada por revisões dos dividendos futuros, que os autores denominam um efeito de "numerador positivo". Esse conflito teórico também é reafirmado por Basu (2005Basu, S. (2005). Discussion: the effect of risk on price responses to unexpected earnings. Journal of Accounting, Auditing and Finance20(4), 483-494. ).

Embora a taxa de desconto seja um ponto controverso na literatura sobre avaliação, outro ponto é consensualmente aceito: a taxa de desconto deve refletir o risco envolvido no ativo a ser avaliado. Nesse sentido, um dos principais temas de estudo em finanças é mensurar o risco e o erro de mensuração e é possível acreditar que os julgamentos e as hipóteses quanto à mensuração do risco são as principais razões para as conflitantes e controversas evidências empíricas demonstradas pela literatura prévia.

Especificamente, enquanto Ariff et al. (2013Ariff, M., Fah, C. F., & Ni, S. W. (2013). Earnings response coefficient of OECD banks: tests extended to include bank risk factors. Advances in Accounting29(1), 97-107.) eCollins e Kothari (1989Collins, D. W., & Kothari, S. P. (1989). An analysis of intertemporal and cross-sectional determinants of earnings response coefficients. Journal of Accounting and Economics 11(2), 143-181.) relatam coeficientes negativos entre o ERC e o risco sistemático, Cready et al. (2001) relatam uma relação significativamente positiva. Por outro lado, Easton e Zmijewski (1989Easton, P. D., & Zmijewski, M. E. (1989). Cross-sectional variation in the stock market response to accounting earnings announcements. Journal of Accounting and Economics 11(2-3), 117-141.), Ghosh et al. (2005Ghosh, A., Gu, Z., & Jain, P. C. (2005). Sustained earnings and revenue growth, earnings quality, and earnings response coefficients. Review of Accounting Studies10(1), 33-57.) e Warfield et al. (1995Warfield, T. D. , Wild , J. J., , Wild & K. L. , (1995). Managerial ownership, accounting choices, and informativeness of earnings. Journal of Accounting and Economics 20(1), 61-91.) não observam uma relação consistente e significativo entre os ERC e o risco sistemático. Esses conflitos teóricos e empíricos motivam este artigo.

Tipicamente, a literatura empírica considera, para fins de simplificação, que a taxa de desconto apropriado (e o beta) é constante ao longo do tempo. Assim, o modelo de mercado é aplicado para captar a variação transversal no retorno esperado como uma função de risco sistemática deste modo:

Rit = αi + βiRmt+eit, onde2

Rit= índice de retorno composto contínuo sobre as ações comuns do títuloj para o período t,

Rmt= índice de retorno composto contínuo sobre a taxa do mercado de ações para o período t,

βi= coeficiente de declive (e estimativa de risco sistemático) para a firmaj, e

eit= termo de perturbação distribuído normalmente.

As metodologias do CAPM e do modelo de mercado baseiam-se no pressuposto de que os agentes do mercado assimilam novas informações de modo eficiente, além de ter expectativas homogêneas. Entretanto, esses pressupostos não estão fortemente apoiados no mercado brasileiro (Simon et al., 2014Simon, D. S., Zani, J., Morais, I. C. A., & Costa, A. B. (2014). Low-beta stocks in the Brazilian market (working paper). Recuperado de http://www.mfsociety.org/modules/modDashboard/uploadFiles/conferences/MC21~377~p18e9s0n0619vv18ol1n4i1lvl7fc4.pdf
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; Costa Jr. et al., 1993Costa Jr., N. C. A., Menezes, E. A., & Lemgruber, E. F. (1993). Estimação do beta de ações através do método dos coeficientes agregados. Revista Brasileira de Economia 47(4), 605-621.). Pelo menos três variáveis afetam significativamente o mercado de ações como um todo: concentração de mercado, altas taxas de juros e alta volatilidade de mercado.

Em primeiro lugar, o índice de ações do Brasil (Ibovespa) é altamente concentrado em um pequeno número de grandes firmas, que são responsáveis pela maior parte da liquidez do mercado. Assim, a maioria das (pequenas e médias) empresas não tem liquidez suficiente de suas ações. Machado e Medeiros (2012Machado, M. A. V., & Medeiros, O. R. D. (2012). Does the liquidity effect exist in the Brazilian stock market? Brazilian Business Review9(4), 28-51.) relatam que a (i)liquidez do mercado brasileiro gera dois problemas distintos: um prêmio significativo de liquidez e uma incapacidade do CAPM e do modelo de três fatores proposto por Fama e French (1993Fama, E. F., & French, K. R. (1993). Common risk factors in the returns on stocks and bonds. Journal of Financial Economics 33(1), 3-56.) para explicar o retorno das ações e o efeito da liquidez. Uma ideia complementar da concentração de mercado está relacionada ao controle acionário da firma. O mercado de ações brasileiro apresenta uma separação significativa entre voto e direitos de fluxo de caixa devido às ações de duas classes e à concentração de propriedade e do controle. Uma consequência importante desse ambiente institucional é que os acionistas controladores concentram decisões discricionárias, levando, assim, a menor free-float e menor negociação das ações (Silva & Subrahmanyam, 2007Silva, A. C., & Subrahmanyam, A. (2007). Dual-class premium, corporate governance, and the mandatory bid rule: evidence from the Brazilian stock market. Journal of Corporate Finance13(1), 1-24.).

Em segundo lugar, as elevadas taxas de juros brasileiras, que estão entre as taxas de juros reais mais altas do mundo, apresentam uma anomalia que gera elevado (e significativo) prêmio negativo de risco do patrimônio líquido (Gonçalves Junior, Rochman, Eid Junior, & Chalela, 2011Gonçalves Junior, W., Rochman, R. R., Eid Junior, W., & Chalela, L. R (2011). Estimando o prêmio de mercado brasileiro. Revista de Administração Contemporânea15(5), 931-954.). As elevadas taxas de juros têm afetado também as decisões de alocação de carteira, no caso de investimentos em ativos de baixo risco e ativos com juros de alto rendimento. Adicionalmente, altas taxas de juros podem afetar a orientação temporal dos agentes de mercado nas tomadas de decisão (Krusell, Kuruşçu, & Smith, 2002Krusell, P., Kuruşçu, B., & Smith Jr., A. A. (2002). Time orientation and asset prices. Journal of Monetary Economics49(1), 107-135.).

Por fim, assim como outros mercados emergentes, o mercado brasileiro é caracterizado por ter uma elevada volatilidade nos preços das ações, devido aos movimentos de capital especulativo e aos períodos de aversão ao risco (Aggarwal, Inclan, & Leal, 1999Aggarwal, R., Inclan, C., & Leal, R. (1999). Volatility in emerging stock markets. Journal of Financial and Quantitative Analysis34(1), 33-55.). Especificamente, o desempenho dos mercados emergentes de ações é altamente dependente da estrutura de fatores de risco globais e das flutuações agregadas macroeconômicas (Mensi, Hammoudeh, Reboredo, & Nguyen, 2014Mensi, W., Hammoudeh, S., Reboredo, J. C., & Nguyen, D. K. (2014). Do global factors impact BRICS stock markets? A quantile regression approach. Emerging Markets Review19, 1-17.).

Além disso, esses três pontos podem tornar o beta do modelo de mercado umaproxy enviesada para o risco em estudos sobre a relação lucro-retorno. Do ponto de vista contábil, esses fatores podem afetar significativamente o modo como os agentes do mercado reagem às novidades introduzidas pela informação contábil. Além disso, Amorim et al. (2012Amorim, A. L. G. C., Lima, I. S., & Murcia, F. D. R. (2012). Analysis of the relationship between accounting information and systematic risk in the Brazilian market. Revista Contabilidade & Finanças23(60), 199-211. ) relatam uma incompatibilidade entre a contabilidade e o beta do modelo de mercado, algo intrigante no sentido de que ambos devem representar uma mensuração do risco específico da firma e distinguir as firmas de alto e baixo risco. No entanto, eles mostram um baixo poder explicativo prospectivo a partir de dados contábeis para os betas de mercado. Embora isso esteja em consonância com a eficiência de mercado na forma semiforte, essa relação foi demonstrada apenas "em um número restrito de empresas da amostra" (Amorim et al., 2012Amorim, A. L. G. C., Lima, I. S., & Murcia, F. D. R. (2012). Analysis of the relationship between accounting information and systematic risk in the Brazilian market. Revista Contabilidade & Finanças23(60), 199-211. , p. 209).

O ambiente de mercado descrito acima pode diminuir potencialmente a percepção da relevância dos lucros pelos agentes de mercado. Apesar da relevância dos lucros potencialmente baixa, a literatura sobre o mercado brasileiro tem demonstrado que o retorno das ações encontra-se significativamente relacionado à informação dos lucros. Especificamente, há relações significativas de curto prazo (Sarlo Neto, Galdi, & Dalmácio, 2009Sarlo Neto, A., Galdi, F. C., & Dalmácio, F. Z. (2009). Uma pesquisa sobre o perfil das ações brasileiras que reagem à publicação dos resultados contábeis. Revista de Contabilidade e Organizações(6), 22-40.; Paulo, Sarlo Neto & Santos, 2012Paulo, E., Sarlo Neto, A., & Santos, M. A. C. (2012). Reação do preço das ações e intempestividade informacional do lucro contábil trimestral no Brasil. Advances in Scientific and Applied Accounting5(1), 54-79.) e de longo prazo (Galdi & Lopes, 2008Galdi, F. C., & Lopes, A. B. (2008). Relação de longo prazo e causalidade entre o lucro contábil e o preço das ações: evidências do mercado latino-americano. Revista de Administração da USP43(2), 186-201.; Pimentel & Lima, 2010Pimentel, R. C., & Lima, I. S. (2010a). Is the annual earnings response coefficient statistically significant in Brazil? Latin American Business Review11(3), 267-291.a, 2010Pimentel, R. C., & Lima, I. S. (2010b). Time-series properties of earnings and their relationship with stock prices in Brazil. Business and Economics Research Journal1(4), 43-65.b; Santos, Mol, Anjos, & Santiago, 2013Santos, M. A. C. D., Mol, A. L. R., Anjos, L. C. M. D., & Santiago, J. S. (2013). Prices lead earnings in Brazil?. Revista Contabilidade & Finanças 24(63), 243-256.). Nesse sentido, este artigo lança luz sobre a associação lucro-retorno ao assumir que o risco, os efeitos não lineares de lucros inesperados, a persistência dos lucros e a adoção das IFRS podem ter implicações sobre a relevância transversal do ERC.

3 DESENHO E VARIÁVEIS DE PESQUISA

A teoria baseada em modelos de avaliação sugere que o ERC está negativamente correlacionado ao risco sistemático (gerando um fator denominador). No entanto,Chambers et al. (2005Chambers, D. J., Freeman, R. N., & Koch, A. S. (2005). The effect of risk on price responses to unexpected earnings. Journal of Accounting, Auditing & Finance20(4), 461-482.) sugerem um "fator numerador" baseado no fato de que as revisões do retorno esperado são uma função crescente do risco total.

Como discutido acima, essa abordagem parece ser adequada para o mercado brasileiro, pois o principal índice geral do mercado de ações local (Ibovespa) reflete a variação apenas nas ações mais negociadas na BM&FBOVESPA, assim, está concentrada em um pequeno número de empresas. Por isso, o risco sistemático usado com frequência, mensurado pelo beta do CAPM de Sharpe-Lintner ou pelo beta do modelo de mercado de Sharpe, é suscetível a conduzir a um erro de mensuração quando aplicado a empresas não incluídas no índice de ações - a hipótese de subdiversificação discutida por Levy (1978Levy, H. (1978). Equilibrium in an imperfect market: a constraint on the number of securities in the portfolio. The American Economic Review68(4), 643-658.). Portanto, este artigo aplica testes empíricos que consideram tanto a mensuração do risco total (inclusive o risco idiossincrático, representado pela variação total do preço das ações de determinada firma) e uma mensuração do risco sistemático (mensurado pelo beta do modelo de Mercado de Sharpe).

3.1 O Modelo Empírico Básico

O primeiro passo deste estudo foi estimar o modelo de regressão longitudinal básico (análise de dados em painel) proposto por Chambers et al. (2005Chambers, D. J., Freeman, R. N., & Koch, A. S. (2005). The effect of risk on price responses to unexpected earnings. Journal of Accounting, Auditing & Finance20(4), 461-482.), que relaciona o ERC e as duas mensurações de risco:

URit = a + b1UXit + b2TRKit * UXit + b3SRKit * UXit + errorit, onde3

URit = retorno inesperado para a firma i acumulado ao longo do ano t,

UXit = lucros inesperados para a firma i acumulados ao longo do ano t,

TRKit = classificação padronizada do risco total (com base na variação do retorno mensal específico da firma),

SRKit = classificação padronizada do risco sistemático (com base no beta do modelo de mercado), e

errorit = termo de erro independente e identicamente distribuído com N(0, σ2e).

3.1.1. Mensuração dos lucros inesperados.

Em consonância com o modelo de avaliação apresentado na Eq. 1, a mensuração dos lucros inesperados (UX) utilizada neste artigo refere-se à medida amplamente aceita e bem documentada na literatura internacional que leva em conta a variação dos lucros escalonada (dividida) pelo valor de mercado da ação no início do período (Collins & Kothari, 1989Collins, D. W., & Kothari, S. P. (1989). An analysis of intertemporal and cross-sectional determinants of earnings response coefficients. Journal of Accounting and Economics 11(2), 143-181.). Especificamente, osUX são calculados pela variação nominal dos lucros por ação (EPS) no ano t (ano fiscal) escalonada pelo preço no início do período, Pt-1. Assim, UXit = (EPSit - EPSi,t-1)/Pi,t-1, onde a hipótese implícita é que os lucros seguem um processo de passeio aleatório (random walk process) que presume que os lucros anuais do período atual proporcionam a melhor expectativa dos lucros do próximo período (Ariff et al., 2013Ariff, M., Fah, C. F., & Ni, S. W. (2013). Earnings response coefficient of OECD banks: tests extended to include bank risk factors. Advances in Accounting29(1), 97-107.). O processo de passeio aleatório consiste em um processo de série temporal no qual o valor atual de uma variável é explicado pelo (consiste no) valor desfasado (valor passado) mais um termo de erro. Em outras palavras, a estimativa dos lucros em determinado ano consiste no lucro do ano passado mais um termo de erro (Kormendi & Lipe, 1987Kormendi, R., & Lipe, R. (1987). Earnings innovations, earnings persistence and stock returns. The Journal of Business(3), 323-345.). Mensurações adicionais de lucros inesperados são descritas nas seções seguintes.

3.1.2. Mensuração do retorno anormal.

A mensuração do retorno anormal acumulado (UR) consiste na mensuração ex post deEt-1(Rit), que está condicionada ao retorno de mercado realizado para o períodot. O retorno mensal é o logaritmo natural da divisão do preço do final do mês pelo preço do início do mês [Rit =ln (Pt / Pt-1], onde Pt é o preço ajustado aos dividendos no período t. O retorno ajustado de determinada firma deve representar o retorno derivado exclusivamente das operações da firma e de seus riscos específicos. Assim, o retorno inesperado para cada firma específica é calculado pela diferença entre o retorno mensal observado e o retorno esperado pela regressão do retorno específico da firma em retorno de mercado (semelhante ao modelo de mercado). Assim, URit = Rit -(λli +λ2Rmt), ondeλ1 e λ2 são os coeficientes da regressão OLS entre o retorno mensal (Rit) e o retorno de mercado (Rmt) ao longo de 48 meses (este estudo impôs a necessidade de, no mínimo, 24 meses quando os 48 meses não estiverem disponíveis). Em consonância com estudos anteriores, o retorno anual é acumulado de abril do ano t a março de t + 1 para captar qualquer reação de retorno associada ao anúncio de lucros para o anot.

3.1.3. Mensuração dos riscos idiossincráticos e sistemáticos.

As duas mensurações de risco usadas neste artigo, o risco total padronizado (TRK) e o risco sistemático padronizado (SRK) baseiam-se na metodologia proposta por Chambers et al. (2005Chambers, D. J., Freeman, R. N., & Koch, A. S. (2005). The effect of risk on price responses to unexpected earnings. Journal of Accounting, Auditing & Finance20(4), 461-482.), ondeTRK é a variação do retorno mensal nos últimos 48 meses (são necessários, no mínimo, 24 meses de retorno). Assim, considerando queVRanq denota a posição da empresa na classificação (ranking) do risco total (ou seja, variação do retorno ao longo de 48 meses) associada a uma observação da amostra no ano t, e queN denota o número de observações naquele ano, a classificação padronizada do risco total é determinada porTRKit(VRanqit-1)/(N-1). Portanto, em determinado ano, TRK é igual a zero para a firma com o menor risco total e é igual a um para a firma com o maior risco total. Se todo o resto for igual, b2, na Eq. 3, é a diferença entre o ERC das observações com os maiores e menores riscos totais em determinado ano (Chambers et al., 2005).

A segunda mensuração do risco é SRK, que é mensurado pelo beta do modelo de mercado de Sharpe estimado para o retorno mensal nos últimos 48 meses (são necessários, no mínimo, 24 meses). A fim de captar a variação transversal dos índices anuais de retorno esperado em função do risco sistemático, os betas das ações foram estimados a partir do retorno mensal como Rit = αi + βiRmt+eit, onde Rit é o retorno mensal contínuo composto, sobre a ação comum do títuloi, Rmt é o retorno mensal contínuo composto sobre o Ibovespa, que representa o retorno de mercado, αi é o coeficiente de intercepção, βi é o coeficiente de declive e eit é o termo de erro distribuído normalmente.

Considerando que BRanq denota a classificação do beta (risco sistemático) associada a uma observação da amostra no ano te que N denota o número de observações naquele ano, a classificação padronizada do risco sistemático é determinada por: SRKit= (BRanqit-1)/(N-1). Em determinado ano,SRKit é igual a zero para a firma com o menor risco total e é igual a um para a firma com o maior risco total. Se todo o resto for igual, b3, na Eq. 3, é a diferença entre o ERC das observações com o maior e menor risco sistemático em determinado trimestre (Chambers et al., 2005Chambers, D. J., Freeman, R. N., & Koch, A. S. (2005). The effect of risk on price responses to unexpected earnings. Journal of Accounting, Auditing & Finance20(4), 461-482.).

3.2 O Modelo Empírico Estendido

Uma vez que este artigo enfoca principalmente os determinantes transversais (cross-section) do ERC (em especial o risco), foram incluídas variáveis adicionais de controle ao modelo básico proposto. Especificamente aquelas relacionadas ao risco e às características relevantes do ambiente brasileiro.

Em primeiro lugar, este artigo usa um controle para a relação não linear entre lucros e retorno inesperados. Freeman and Tse (1992Freeman, R. N., & Tse, S. Y. (1992). A nonlinear model of security price responses to unexpected earnings. Journal of Accounting Research30(2), 185-209.) relatam que valores extremos de lucros inesperados transitórios são menos persistentes e não afetam os preços das ações na mesma proporção. Essa é uma variável importante no mercado brasileiro, pois em períodos de turbulência dos mercados, tais como os das crises internacionais de 2002 e 2008, a variação cambial pode causar enormes prejuízos (com altas magnitudes) às firmas expostas às moedas internacionais. Entretanto, a expectativa é que essas variações sejam transitórias, assim, afetam o ERC em menor proporção. Portanto, corroborando Chambers et al. (2005Chambers, D. J., Freeman, R. N., & Koch, A. S. (2005). The effect of risk on price responses to unexpected earnings. Journal of Accounting, Auditing & Finance20(4), 461-482.), uma variável de controle dos efeitos não lineares,NLEF, foi incluída, definida como:NLEFit = (|UX|Ranqit-1)/(N-1), onde |UE|Ranqit é a classificação do valor absoluto de UX da firma ino ano t, e N é o número de observações em determinado ano. A expectativa é que NLEF tenha um efeito negativo e significativo no ERC no mercado brasileiro. Por isso, um valor absoluto de UX mais elevado diminui a magnitude do ERC.

Em segundo lugar, a literatura empírica relatou que o tamanho da empresa é um determinante da qualidade dos lucros (Dechow et al., 2010Dechow, P. M., Ge, W., & Schrand, C. (2010). Understanding earnings quality: a review of the proxies, their determinants and their consequences. Journal of Accounting and Economics 50(1-2), 344-401.). Neste artigo, a variável tamanho (SIZE) consiste na classificação (ranqueamento) dos ativos totais, ondeSIZEit = (TAssetsit-1)/(N-1);TAssetsit é o logaritmo natural do total de ativos de uma firmai no ano t; e Nrepresenta o número de observações naquele ano. Embora o porte possa ser correlacionado a outras variáveis econômicas, tais como o risco (relação negativa), a liquidez das ações (relação negativa) e o ambiente de informação (relação positiva), espera-se um efeito positivo do tamanho da empresa no ERC.

Em terceiro lugar, a reação do mercado à inovação dos lucros está fortemente relacionada à persistência dos lucros (Kormendi & Lipe, 1987Kormendi, R., & Lipe, R. (1987). Earnings innovations, earnings persistence and stock returns. The Journal of Business(3), 323-345.). A fim de controlar os efeitos transversais da persistência dos lucros (PER), este artigo diz respeito à classificação padronizada do coeficiente autorregressivo de primeira ordem da firma específica, AR(1), como mensuração do proxy da persistência dos lucros. Assim, PERi = ([AR(1)]-1)/(N-1).

Por fim, o período inteiro (1995-2013) inclui uma mudança significativa das normas contábeis, após a adopção obrigatória da versão integral das IFRS, em 2010. Assim, uma variável dummy, IFRS, foi incluída no modelo empírico, a fim de controlar a mudança das práticas contábeis ao assumir 1 para os anos das IFRS (2010 a 2013) e 0 em caso contrário. Por isso, o modelo estendido é:

URit = a + b1UXit + b2TRKit * UXit + b3SRKit * UXit + b4NLEFit * UXit + b5SIZEit * UXit + b6PERi * UXit + b7IFRSt* UXit + errorit , onde

4

URit = retorno inesperado para a firma i acumulado ao longo do ano t,

UEit = lucros inesperados para a firma i no anot,

TRKit= classificação padronizada do risco total (com base na variação do retorno mensal específico da firma),

SRKit = classificação padronizada do risco sistemático (com base no beta do modelo de mercado),

NLEFit = classificação padronizada do valor absoluto da inovação dos lucros, para a firma i no ano t,

SIZEit = classificação padronizada dos ativos totais, para a firmai no ano t,

PERi = persistência dos lucros da firma i (com base no parâmetro AR(1) de lucros anuais),

IFRSt = variável dummy que assume 1 para os anos das IFRS (2010 a 2012) e 0 em caso contrário,

errorit = termo de erro distribuído de forma idêntica e independente com N(0, σ2e).

Durante os anos de 2008 e 2009, também houve mudanças nas normas contábeis. Este artigo também considera a variável dummy igual a 1 para esses anos, porém, como este artigo discute na seção sobre os resultados empíricos, as diferenças contábeis parecem ser compensadas pelo efeito não linear (ou, pelo menos, mais relevantes e persistentes do que as mudanças contábeis).

3.3 Mensurações Adicionais dos Lucros Inesperados

A literatura empírica mostra que erros de mensuração dos lucros inesperados,UXit, podem enviesar a relação lucro-retorno e produzir resultados conflitantes. Assim, a fim de mitigar esse problema e proporcionar resultados mais robustos, este artigo leva em conta três proxies diferentes de lucros inesperados. A segunda mensuração dos lucros inesperados segue Ball et al. (1993Ball, R., Kothari, S. P., & Watts, R. (1993). Economic determinants of the relation between earnings changes and stock returns. The Accounting Review68(3), 622-638.), ao ajustar a mudança escalonada dos lucros (UX) ao retorno de mercado:

UXt = γ0t + γ0t (RMRRF) + ηit , e 5a

UXtORT = γ0t + ηit 5b

onde RM é o retorno anual acumulado do Ibovespa (índice do mercado de ações brasileiro) e RRF é a taxa de juros dos certificados de depósito interbancário (CDI), considerada uma medida para a taxa livre de risco de crédito no mercado brasileiro. Segundo Ball et al. (1993Ball, R., Kothari, S. P., & Watts, R. (1993). Economic determinants of the relation between earnings changes and stock returns. The Accounting Review68(3), 622-638., p. 626), essa mensuração "evita qualquer correlação entre o retorno de mercado e a atribuição de ações à carteira que poderia induzir uma associação espúria entre as mudanças do risco e as mudanças dos lucros".

A terceira mensuração de retorno inesperado baseia-se em Kormendi e Lipe (1987Kormendi, R., & Lipe, R. (1987). Earnings innovations, earnings persistence and stock returns. The Journal of Business(3), 323-345.), que estimam o retorno inesperado para uma firma i em um ano t como o resto de um modelo de lucros autorregressivos de uma firma específica:

onde tanto UXtAR = é o resto de um modelo autorregressivo, o que representa lucros inesperados pela parcela de lucros que não pode ser explicada pela equação com lucros anteriores (Xt). Assim, essa mensuração leva em conta a série temporal autorregressiva do processo de lucros (ou seja, o parâmetro de persistência, θi) na estimativa dos lucros e, em consequência, o resto é a parte inesperada dos lucros. Dada a reduzida extensão dos dados, estima-se UXAR por um modelo AR(1), onde τ =1 na Eq. 9.

Assim, as seguintes equações empíricas estendidas também são estimadas:

onde tanto UXtORT como UXtAR são mensurações de lucros inesperados, sendo lucros inesperados ortogonalizados e autorregressivos, respectivamente. As variáveis restantes são as mesmas definidas anteriormente.

4 DESCRIÇÃO DA AMOSTRA E ANÁLISE PRELIMINAR

A análise baseia-se em todas as firmas listadas na BM&FBOVESPA, de 1995 a 2013. A extensão dessa série e o número de firmas foram ditados pela disponibilidade de dados. Os dados foram coletados na base da Economatica e compreendem todo o período de relativa estabilidade monetária - que começou em 1995, após a implementação do "Plano Real" brasileiro, em 27 de fevereiro de 1994. Para reduzir os efeitos de viés de sobrevivência, todas as firmas com um mínimo de seis observações anuais consecutivas foram incluídas na análise. Além disso, a fim de proporcionar um nível mínimo de liquidez, todas as firmas que apresentaram um índice de liquidez das ações igual a zero ou inferior a 0,001 nos últimos dez anos analisadas na coleta de dados foram excluídas da análise. O índice de liquidez das ações fornecido pela Economatica leva em conta a proporção entre (i) o número de dias em que determinada ação foi negociada, (ii) o número de atividades comerciais em um único dia, e (iii) o montante negociado de determinada ação e os números do mercado total. Uma vez que os lucros inesperados são estimados com base na variação dos lucros, um mínimo de seis observações anuais consecutivas leva a um mínimo de cinco inovações consecutivas dos lucros. Assim, a extensão da série temporal das variáveis para cada firma varia de 5 a 18 observações anuais. Com base nos dados disponíveis, 212 firmas foram incluídas na amostra.

Considerando os períodos e as firmas sem os dados, a análise baseou-se em 2.335 observações do ano da firma. A amostra incluiu firmas de diversos setores econômicos e a capitalização dessas empresas do representou mais de 80% da capitalização total de mercado da BM&FBOVESPA.

Os preços das ações e o índice do mercado de ações foram coletados em uma base mensal e ajustados em relação aos dividendos e desdobramentos subsequentes das ações, formando, assim, o preço padrão. Os preços foram baseados no último dia de negociação do mês e, quando o preço mensal não estava disponível (missing values), os valores faltantes foram, por até três meses consecutivos, estimados usando o índice geral do mercado. Os EPS históricos para cada empresa também foram ajustados para mudanças subsequentes nas estruturas de capital próprio (p. ex., desdobramentos de ações, fusões e aquisições etc.), possibilitando que esse número ajustado torne-se o EPS padrão. O efeito das mudanças dos métodos contábeis foi controlado pela variável IFRS, que assume 1 para os períodos que consideraram a adoção integral das IFRS (de 2010 a 2013).

Segundo esse desenho de pesquisa, as variáveis explicativas transversais (cross-section) do ERC são proporcionalmente ordenadas na classificação. Assim, as correlações significativas da ordem na classificação de Spearman (diagonal inferior) e de Kendall (diagonal superior) são apresentadas naTabela 1.

Tabela 1
Correlação da ordem de classificação agrupada de Spearman e Kendal l

Como esperado, a Tabela 1 apresenta não só correlações positivas significativas entre proxies para lucros inesperados e retorno (anormal) inesperado, mas, também, uma correlação negativa significativa entre retorno inesperado e ambas as mensurações do risco (TRK e SRK). As três proxiespara lucros inesperados são altamente correlacionadas (mais de 0,7), exceto a correlação entre UXOR e UXAR, 0,590 (Spearman). Entretanto, há evidências intrigantes em relação ao porte e risco total (TRK) e risco sistemático (SRK): apesar das grandes firmas tenderem a apresentar menor risco total (ou seja, maior volatilidade das ações), elas apresentam maior risco sistemático (beta). Essa é uma primeira indicação de que a ordem de classificação do risco total é um elemento mais adequado para discriminação do risco entre empresas, uma vez que se pressupõe que as grandes firmas apresentam menores riscos (relação negativa). Assim, dada a forte concentração em um pequeno número de grandes firmas, o risco sistemático pode ser enviesado em direção à volatilidade dessas firmas. Concomitantemente, as firmas de menor porte podem não ser fortemente correlacionadas ao índice da bolsa, resultando em um menor beta do modelo de mercado de Sharpe (em consonância com Costa Jr. et al., 1993Costa Jr., N. C. A., Menezes, E. A., & Lemgruber, E. F. (1993). Estimação do beta de ações através do método dos coeficientes agregados. Revista Brasileira de Economia 47(4), 605-621.). Além disso, as grandes firmas têm, em média, menores lucros inesperados extremos (NLEF), tornando seus lucros menos voláteis do que as firmas de pequeno porte. Isso também se reflete nas duas mensurações do risco, algo consistente com Amorim et al. (2012Amorim, A. L. G. C., Lima, I. S., & Murcia, F. D. R. (2012). Analysis of the relationship between accounting information and systematic risk in the Brazilian market. Revista Contabilidade & Finanças23(60), 199-211. ), uma vez que as informações contábeis (lucros) apresentam uma fraca relação com o beta do modelo de mercado.

Por fim, firmas com maior persistência dos lucros tendem a apresentar menor risco. Essa correlação negativa é consistente com estudos anteriores, que afirmavam que lucros mais persistentes são elementos mais eficazes nos modelos de avaliação do patrimônio líquido por meio de lucros residuais, uma vez que lucros mais persistentes apresentam maior previsibilidade e maior qualidade do que lucros menos persistentes (Dechow et al., 2010Dechow, P. M., Ge, W., & Schrand, C. (2010). Understanding earnings quality: a review of the proxies, their determinants and their consequences. Journal of Accounting and Economics 50(1-2), 344-401.). A correlação negativa e significativa entre PER eNLEF segue a expectativa de que firmas com maiores magnitudes de lucros inesperados apresentam menor persistência dos lucros (Ali & Zarowin, 1992Ali, A., & Zarowin, P. (1992). Permanent versus transitory components of annual earnings and estimation error in earnings response coefficients. Journal of Accounting and Economics15(2), 249-264. ; Freeman & Tse, 1992Freeman, R. N., & Tse, S. Y. (1992). A nonlinear model of security price responses to unexpected earnings. Journal of Accounting Research30(2), 185-209.).

5 RESULTADOS EMPÍRICOS

5.1 Estimativa do Modelo Empírico Básico

Chambers et al. (2005Chambers, D. J., Freeman, R. N., & Koch, A. S. (2005). The effect of risk on price responses to unexpected earnings. Journal of Accounting, Auditing & Finance20(4), 461-482.) discutem que o risco total, TRK e o risco sistemático, SRK, apresentam informações complementares na associação entre lucro e retorno ao introduzir efeitos de numerador e de denominador na avaliação da empresa. Entretanto, este artigo sugere que, tendo em vista o ambiente brasileiro, a posição (ranking) na classificação do risco total é melhorproxy para a variação transversal no ERC do que o risco sistemático mensurado pelo beta do modelo de mercado.

A abordagem econométrica para estimar o modelo básico é fundamentada em um modelo de efeitos aleatórios (random-effects model). Especificamente, o modelo representa a heterogeneidade entre os indivíduos (σ2> 0) e possibilita estimar os efeitos das variáveis que são individualmente invariáveis no tempo (Baltagi, 2005Baltagi, B. (2005). Econometric analysis of panel data (3a. ed.). Hoboken, NJ: John Wiley & Sons.). O efeito aleatório assume que as variações de erro são distribuídas aleatoriamente entre o grupo e/ou o tempo e que os efeitos individuais não são correlacionados aos regressores. A fim de verificar possíveis correlações entre o componente de erro ui e os regressores, foi realizado o teste de Hausman. Usando χ2 = 2,46 (sig. = 0,4828), não foi possível rejeitar a hipótese nula de que os estimadores sob efeito fixo e efeito aleatório são idênticos. O teste de Hausman também foi realizado tendo em vista que as matrizes de covariância são baseadas na mesma alteração da variância estimada por meio de um estimador eficaz e a conclusão foi a mesma (χ2 = 2,60, sig. = 0,4575). Assim, as diferenças dos coeficientes não são sistemáticas, sugerindo que as estimativas dos efeitos aleatórios podem ser consistentes e eficazes (Baltagi, 2005Baltagi, B. (2005). Econometric analysis of panel data (3a. ed.). Hoboken, NJ: John Wiley & Sons.). Um segundo passo foi confirmar se o modelo de efeitos aleatórios é preferível aos dados agrupados. Para testar a hipótese de agrupamento (poolability hypothesis) contra o efeito aleatório foi realizado o teste de Breusch-Pagan (teste multiplicador de Lagrange para efeitos aleatórios), onde χ2 = 3,83 (sig. 0,0252). No nível de 5%, é possível rejeitar a hipótese nula de que os componentes da variação específica são iguais a zero (H0: σ2=0). Assim, há evidências de diferenças significativas entre os indivíduos e o modelo de efeitos aleatórios pode lidar com a heterogeneidade de modo melhor que OLS agrupados. As estimativas consideram as correções da heteroscedasticidade diagonal proposta por White (1980White, H. (1980). A heteroskedasticity-consistent covariance matrix estimator and a direct test for heteroskedasticity. Econometrica48 (4), 817-838.).

A Tabela 2 apresenta os resultados do modelo básico, onde o Painel A inclui todas as firmas e os períodos em análise e os Painéis B e C dividem a estimativa em dois grupos, de acordo com as firmas com alto TRK e as firmas com alto SRK, respectivamente. A estimação considerando toda a amostra no Painel A mostra que o ERC (coeficiente b1 na Eq. 3) é positivo e significativo ao nível de 5%. Somente o coeficiente em TRK é negativo e significativo em níveis usuais, enquanto SRK não é estatisticamente significativo como determinante do ERC.

Tabela 2
Modelo básico para testar o efeito do risco sobre a associação lucro-retorno (Eq. 3 )

O Painel B divide as estimativas em duas equações diferentes por meio da estimação em dois grupos (carteiras) com alto TRK e baixoTRK. É claramente demonstrado que a carteira com firmas comTRK inferiores (menor risco idiossincrático) tem maior ERC (0,228 para baixo TRK contra 0,044 para altoTRK), confirmando a expectativa de que as firmas com baixo risco apresentam maior ERC. Testes de diferença nos coeficientes estimados confirmam a significância estatística da diferença entre coeficientes (χ2 = 5,52; valor p = 0,019). Além disso, a estimativa utilizando empresas de baixo risco mostra poder explicativo superior ao da carteira de alto risco.

Por outro lado, o Painel C mostra que, quando as empresas são segregadas em portfólios de alto e baixo risco por meio da variável SRK(risco sistemático), o ERC das firmas de menor risco é mais baixo do que a carteira de alto risco (0,055 para SRK baixo contra 0,118 paraSRK alto). Contudo, o ERC para as firmas de maior risco perde sua significância estatística. A diferença entre os coeficientes das estimativas não foi estatisticamente significativa (χ2 = 0,51; valorp = 0,475).

No geral, os resultados da Tabela 2mostram que TRK parece ser mais eficaz para distinguir as firmas de alto e baixo risco do que SRK em estudos sobre a associação lucro-retorno e que o ERC é positiva e estatisticamente significativo, diminuindo de acordo com o risco (risco total).

Duas extensões naturais do modelo básico são (1) para adicionar (e controlar) as relações não lineares entre lucros inesperados e retorno anormal e (2) para controlar a estimativa pelo período com os Princípios Contábeis Geralmente Aceitos no Brasil (BR GAAP) e das IFRS. Uma vez que o ERC pode ser uma variante de tempo e transversal e essas variações podem estar diretamente relacionadas a ambientes macroeconômicos e financeiros, em alguns períodos (períodos de estresse, tais como em 2002 e 2008), as firmas tendem a incorrer em maiores magnitudes de lucros transitórios inesperados. Essas altas magnitudes de lucros inesperados podem levar a um efeito não linear dos lucros e do retorno das ações (Freeman & Tse, 1992Freeman, R. N., & Tse, S. Y. (1992). A nonlinear model of security price responses to unexpected earnings. Journal of Accounting Research30(2), 185-209.). Assim,NLEF foi incluída para controlar os efeitos não lineares no modelo básico (Painel A - Tabela 3) e, ademais, interagiu com a variável IFRS (Painel B - Tabela 3).

Tabela 3
Modelo básico: estimativa com controle para efeitos não lineares e as IFR S

O Painel A da Tabela 3 mostra que o efeito não linear é significativo no mercado brasileiro ao produzir um coeficiente altamente negativo, um achado consistente com Freeman e Tse (1992Freeman, R. N., & Tse, S. Y. (1992). A nonlinear model of security price responses to unexpected earnings. Journal of Accounting Research30(2), 185-209.) e Chambers et al. (2005Chambers, D. J., Freeman, R. N., & Koch, A. S. (2005). The effect of risk on price responses to unexpected earnings. Journal of Accounting, Auditing & Finance20(4), 461-482.). Isso sugere que os agentes do mercado não reagem do mesmo modo a diferentes magnitudes de lucros inesperados. Particularmente, os agentes tendem a reagir menos aos lucros inesperados altos, algo consistente com a ideia de um componente transitório dos lucros (Ali & Zarowin, 1992Ali, A., & Zarowin, P. (1992). Permanent versus transitory components of annual earnings and estimation error in earnings response coefficients. Journal of Accounting and Economics15(2), 249-264. ). Entretanto, até onde sabemos, nenhum estudo de contabilidade baseado no mercado realizado no Brasil aborda isso. Esse parece ser um controle-chave para estudos sobre a qualidade dos lucros em ambientes nos quais os lucros extremos estão frequentemente relacionado a períodos específicos. Além disso, O painel C da Tabela 3 mostra que a interação entre NLEF eIFRS é estatisticamente significativa, o que sugere que há uma forte associação entre o período de pré-IFRS e maiores magnitudes de lucros inesperados.

Quando as IFRS interagem somente com os lucros inesperados (Painel B da Tabela 3), não há nenhuma significância estatística para as IFRS, sugerindo que a adoção das IFRS, por si só, não explica as variações do ERC. Ao interagir em conjunto (NLEF eIFRS) no modelo (Painel C da Tabela 3), há uma correção na explicação das IFRS quase na mesma ordem de grandeza (3,872 contra -3,897), sugerindo que existe uma alta sobreposição de informações entre IFRS e NLEF, uma vez que o período pré-IFRS apresenta valores extremos mais altos de lucros inesperados do que o período pós-IFRS. Assim, a interação adicional entreUX, NLEF e IFRS sugere que parte do ERC pode ser explicada pela elevada volatilidade e pelos efeitos não lineares da série. Esse é um resultado relevante porque sugere cautela adicional na interpretação dos resultados empíricos relativos a variáveis contábeis e de mercado antes e depois que as IFRS foram adotadas no Brasil, uma vez que as diferenças podem não estar relacionadas às práticas contábeis em si, mas a efeitos do ambiente macroeconômico nos lucros. Portanto, um controle para a volatilidade deve incluir não apenas as variáveis de mercado, mas a volatilidade (e variação) dos lucros devido a fatores macroeconômicos (ver Clubb & Wu, 2014Clubb, C. & Wu, G. (2014). Earnings volatility and earnings prediction: analysis and UK evidence. Journal of Business Finance & Accounting41(1-2), 53-72. ; Shu, Broadstock, & Xu, 2013Shu, Y., Broadstock, D. C., & Xu, B. (2013). The heterogeneous impact of macroeconomic information on firms' earnings forecasts. The British Accounting Review45(4), 311-325.).

Uma vez que os resultados relatados na Tabela 3 sugerem diferenças temporais do ERC, este artigo também testou os efeitos temporais anuais significativos ao incluir variáveisdummy para tempo. Basicamente, com a inclusão de variáveisdummy, 12 anos (de 18 anos) foram estatisticamente significativos no nível de 5%, com um aumento adicional em R2 de cerca de 14%. Além disso, o teste para o efeito do tempo rejeitou fortemente (χ2 = 166,35 com sig. = 0,000) a hipótese nula de que coeficientes para todos os anos são conjuntamente iguais a zero, o que sugere que o ERC não é fixo no tempo. Assim, controlar as variações temporais pode atenuar possíveis fontes de associação espúria, devido a tendências comuns nas variáveis observadas. Ademais, isso sugere que mais estudos podem se interessar em identificar os determinantes temporais relevantes do ERC em um ambiente inconstante como o dos mercados emergentes.

5.2 Estimativa do Modelo Empírico Estendido

Este artigo estende a análise anterior ao incluir diversos proxies de lucros inesperados com base na inovação dos lucros ortogonalizados (UXOR) proposta por Ball et al. (1993Ball, R., Kothari, S. P., & Watts, R. (1993). Economic determinants of the relation between earnings changes and stock returns. The Accounting Review68(3), 622-638.) e a mensuração autorregressiva (UXAR), com base em Kormendi e Lipe (1987Kormendi, R., & Lipe, R. (1987). Earnings innovations, earnings persistence and stock returns. The Journal of Business(3), 323-345.). Os modelos estendidos não suportam as premissas econométricas dos efeitos aleatórios de que os efeitos individuais não estão correlacionados aos regressores da equação. Os resultados do teste de Hausman rejeitam a hipótese nula de que os estimadores sob efeito fixo e aleatório são idênticos, indicando que as estimativas dos efeitos aleatórios podem ser inconsistentes (ver a parte inferior da Tabela 4 para os resultados do teste). Ademais, o teste (F) de Chow para agrupamento (poolability) rejeitou a hipótese nula de igualdade dos coeficientes aos níveis de significância usuais. Embora o modelo de efeitos fixos controle as diferenças da falta de variação temporal entre os indivíduos (tais como a indústria), Baltagi (2005Baltagi, B. (2005). Econometric analysis of panel data (3a. ed.). Hoboken, NJ: John Wiley & Sons., p. 68) discute que, se os distúrbios são heteroscedásticos e/ou correlacionados em série, o efeito fixo das estimativas OLS não são eficientes e "as fórmulas padrão para a variação assintótica nesses estimadores deixam de ser válidas". Os testes de Wooldridge para a dependência transversal e o teste de Wald para a heteroscedasticidade relacionada ao grupo relatam ambos os problemas (ver a parte inferior da Tabela 4). Observe que somente a primeira equação (UX) não mostra autocorrelação em um nível de significância de 10%. Assim, seguindo Bressan, Braga, Bressan e Resende-Filho (2012Bressan, V. G. F., Braga, M. J., Bressan, A. A., & Resende-Filho, M. D. A. (2012). O seguro depósito induz ao risco moral nas cooperativas de crédito brasileiras? Um estudo com dados em painel. Revista Brasileira de Economia66(2), 167-185.) e Baltagi (2005), os três modelos foram reestimados usando mínimos quadrados generalizados factíveis (FGLS). Este estudo também estimou o efeito fixo da estimativa OLS, porque caso a heteroscedasticidade esteja incorretamente especificada, o estimador FGLS pode ser menos eficaz do que o estimador OLS. Os resultados adicionais estimados por meio dos efeitos fixos são qualitativamente semelhantes e estão disponíveis sob solicitação aos autores. A Tabela 4apresenta os resultados do modelo empírico estendido, considerando os três proxies de lucros inesperados, UX, UXOR e UXAR, como indicado acima.

Tabela 4
Estimativa para os determinantes transversais do ERC (Eq. 4, 7 e 8 )

Os resultados da Tabela 4 indicam que o ERC é estatisticamente significativo nas três estimativas em nível de 1%. No geral, os resultados confirmam que o ERC é uma função decrescente deTRK e NLEF extrema e uma função crescente do PER. Nenhuma relação sistemática foi relatada no beta do modelo de mercado (risco sistemático - SRK), porte e na adoção das IFRS, pois os resultados nas três regressões produzem evidências conflitantes em relação ao proxy de lucros inesperados usado.

O coeficiente significativo e negativo do risco total é parcialmente consistente com as expectativas anteriores. Por um lado, embora os modelos de avaliação dependam do risco sistemático em vez do risco idiossincrático, um coeficiente negativo significativo é consistente com a abordagem da avaliação descontada (Collins & Kothari, 1989Collins, D. W., & Kothari, S. P. (1989). An analysis of intertemporal and cross-sectional determinants of earnings response coefficients. Journal of Accounting and Economics 11(2), 143-181.). Nesse sentido, Basu (2005Basu, S. (2005). Discussion: the effect of risk on price responses to unexpected earnings. Journal of Accounting, Auditing and Finance20(4), 483-494. ) sugere a existência de uma relação positiva entre o risco idiossincrático e o custo de capital, discutindo que poucas teorias tentam explicar essa relação com base em subdiversificação, viés na estimativa do risco e clientela do investidor. Por outro lado, o sinal negativo é inconsistente com a hipótese de um efeito de "numerador" proposto por Chambers et al. (2005Chambers, D. J., Freeman, R. N., & Koch, A. S. (2005). The effect of risk on price responses to unexpected earnings. Journal of Accounting, Auditing & Finance20(4), 461-482.); ou seja, no mercado brasileiro, as revisões dos pagamentos esperados (lucros/dividendos) não são uma função crescente do risco total. Uma possível explicação é que os movimentos de capital especulativo no Brasil (ou algum nível de ineficiência do mercado) desempenham um papel mais importante do que os fundamentos específicos da firma (de um ponto de vista idiossincrático). Isso é consistente com Barry e Brown (1984Barry, C. B., & Brown, S. J. (1984). Differential information and the small firm effect. Journal of Financial Economics13(2), 283-294. ), que argumentam que as mensurações de risco tradicionais não consideram o conteúdo das informações específicas da firma. Assim, Barry e Brown (1984Barry, C. B., & Brown, S. J. (1984). Differential information and the small firm effect. Journal of Financial Economics13(2), 283-294. , p. 284) afirmam que: "se o risco for mensurado empiricamente sem levar em conta a quantidade de informação disponível, então, pode parecer 'anormal' o retorno de títulos com pouca informação".

Associada à discussão acima e de modo consistente com as evidências empíricas relatadas por Easton e Zmijewski (1989Easton, P. D., & Zmijewski, M. E. (1989). Cross-sectional variation in the stock market response to accounting earnings announcements. Journal of Accounting and Economics 11(2-3), 117-141.),Ghosh et al. (2005Ghosh, A., Gu, Z., & Jain, P. C. (2005). Sustained earnings and revenue growth, earnings quality, and earnings response coefficients. Review of Accounting Studies10(1), 33-57.) e Warfield et al. (1995Warfield, T. D. , Wild , J. J., , Wild & K. L. , (1995). Managerial ownership, accounting choices, and informativeness of earnings. Journal of Accounting and Economics 20(1), 61-91.), a Tabela 4 também mostra que o papel desempenhado pelo risco sistemático (SRK) não é significativo para explicar o ERC. Há pelo menos três explicações possíveis para esse fenômeno no Brasil: (i) erro de mensuração do risco sistemático (beta), (ii) alavancagem financeira não controlada e (iii) qual tipo de risco o ERC de fato reflete. Em primeiro lugar, uma vez que o índice de ações reflete um número reduzido das (grandes) empresas que possuem ações mais líquidas e mais negociadas, essa característica pode sugerir subdiversificação da carteira de mercado (Levy, 1978Levy, H. (1978). Equilibrium in an imperfect market: a constraint on the number of securities in the portfolio. The American Economic Review68(4), 643-658.). Em segundo lugar, esse coeficiente não negativo (ao contrário da literatura sobre a avaliação de empresas) deve-se a mudanças não controladas na alavancagem financeira e nos riscos de investimento (Ball et al., 1993Ball, R., Kothari, S. P., & Watts, R. (1993). Economic determinants of the relation between earnings changes and stock returns. The Accounting Review68(3), 622-638.). Por fim, a ERC pode não refletir o risco sistemático, mas sim o risco idiossincrático, capturado por meio do risco total (Basu, 2005Basu, S. (2005). Discussion: the effect of risk on price responses to unexpected earnings. Journal of Accounting, Auditing and Finance20(4), 483-494. ).

Os resultados são relativamente consistentes ao longo dos três diferentesproxies de lucros inesperados, exceto para a relação positiva significativa entre SRK e ERC na regressão UXOR. Como UXOR é uma variável ajustada ao mercado, pode reduzir o viés quanto às variações de mercado notadas por causa da resposta aos lucros da firma específica.

Apesar das fortes evidências anteriores relatadas na literatura internacional, o tamanho das empresas não é considerado um determinante significativo do ERC. Inicialmente, essa evidência poderia mostrar-se intrigante, porém, o controle de tamanho pode ser ter sua relevância superada pelo controle do risco total (TRK) como um controle transversal do ERC. Retomando aTabela 1, a correlação mais alta entre as variáveis explicativas foi entre tamanho e risco total (valor de Spearman negativo e significativo = -0,377). Ademais, o tamanho pode ser umaproxy para diversos constructos em vez do risco. Por exemplo, o tamanho pode ser uma proxy útil para o ambiente de informação, uma vez que as grandes empresas devem ter maior cobertura de analistas. Consequentemente, o tamanho da firma pode desempenhar diferentes papéis nas atividades do mercado de capitais.

Corroborando a literatura prévia, a persistência dos lucros (PER) é observada como uma função crescente na relação lucro-retorno. Essa evidência é fortemente consistente com a literatura empírica prévia (Collins & Kothari, 1989Collins, D. W., & Kothari, S. P. (1989). An analysis of intertemporal and cross-sectional determinants of earnings response coefficients. Journal of Accounting and Economics 11(2), 143-181.;Kothari, 2001Kothari, S. P. (2001). Capital markets research in accounting., Journal of Accounting and Economics 31(1), 105-231.). Note-se que a equação que usa UXAR já considera uma estimativa autorregressiva do processo de séries temporais dos lucros e incorpora o parâmetro de persistência dos lucros na estimativa dos lucros (autorregressivos) inesperados.

Por fim, a adoção das IFRS, em 2010, parece não afetar os ERC com qualquer significância estatística. Embora o período pós-IFRS possa ser muito curto para se chegar a uma conclusão sólida, o efeito de mercado, relacionado a aspectos macroeconômicos, parece desempenhar um papel mais importante do que a mudança contábil. Assim, como discutido anteriormente, as variações do ERC antes e depois da adoção das IFRS podem estar mais relacionadas a "mudanças" macroeconômicas nos padrões do mercado de ações e nos lucros do que às mudanças nas práticas contábeis. Isso também é embasado pela estimativa que considera UXOR, uma vez que a variável IFRS perde sua significância estatística quando ajustada às variações do mercado. Essa conclusão também pode ser suportada por evidências empíricas proporcionadas por Santos e Calixto (2010Santos, E. S., & Calixto, L. (2010). Impactos do início da harmonização contábil internacional (Lei 11.638/07) nos resultados das empresas abertas. RAE-Eletrônica9(1), art. 5.) e Santos (2012)Santos, E. S. (2012). Análise dos impactos dos CPC's da primeira fase de transição para o IFRS no Brasil: um exame dos ajustes aos resultados nas DFPS de 2008. Revista de Contabilidade e Organizações6(15), 23-43., que não demonstram mudanças significativas na qualidade dos lucros após a adopção das IFRS.

5.3 Testes Adicionais da Consistência e das Limitações do Estudo

Como muitos estudos contábeis baseados no mercado, as conclusões deste artigo estão sujeitas a erros de mensuração nas variáveis e a viés em relação à seleção da amostra. A fim de minimizar os efeitos dos erros de mensuração, este estudo usou as três diferentes mensurações de lucros inesperados (esta é a variável mais "não observada" no estudo). Embora esta pesquisa siga a literatura mais relevante nesse assunto, ainda há possibilidades de erros de mensuração nas variáveis restantes. Uma causa adicional de viés na mensuração e na seleção da amostra é a falta de liquidez das ações. Como afirmado anteriormente, o mercado brasileiro apresenta um grande número de ações com baixa liquidez de mercado. Portanto, este artigo buscou reduzir esse viés ao exigir uma liquidez mínima das ações. Entretanto, os resultados podem ser afetados, ainda, pela falta de atividades de negociação suficientes que captem a eficiência do mercado na incorporação de novas informações sobre os lucros. Assim, este artigo também analisa o papel da liquidez das ações (SLIQ).

Normalmente, a liquidez das ações leva à eficácia dos preços e, se os preços são eficientes, maiores lucros devem traduzir-se nos preços atuais (Fang, 2012Fang, J. (2012). Stock liquidity, price informativeness, and accruals-based earnings management (dissertation). Baton Rouge: Louisiana State University.). A falta de liquidez de algumas empresas em nossa amostra pode afetar essa associação, levando a resultados enviesados. Entretanto, não foi observada qualquer relação significativa entreSLIQ e ERC quando as mensurações do risco foram combinadas. Ademais, quando a liquidez das ações está incluída nos modelos empíricos, como apresentado nas seções 5.1 e 5.2, a liquidez das ações e o ERC perdem sua significância estatística (os resultados estão disponíveis sob solicitação).

Especificamente, a liquidez das ações está fortemente correlacionada a outras variáveis explicativas, especialmente o porte da firma (positivo, 0,668) e o risco total (negativo, 0,331). Essas correlações são consistentes com aquelas relatadas por Spiegel e Wang (2005Spiegel, M. I., & Wang, X. (2005). Cross-sectional variation in stock returns: liquidity and idiosyncratic risk (Yale ICF working paper). Recuperado de http://ssrn.com/abstract=709781
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), no mercado dos EUA, e Mendonça et al. (2012Mendonça, F. P. D., Klotzle, M. C., Pinto, A. C. F., & Montezano, R. M. D. S. (2012). The relationship between idiosyncratic risk and returns in the Brazilian stock market. Revista Contabilidade & Finanças 23(60), 246-257. ), no mercado brasileiro. Assim, apesar da atratividade teórica da liquidez das ações, uma primeira explicação possível é embasada por Spiegel e Wang (2005, p. 1), que observam que "o impacto do risco idiossincrático é muito mais forte e, muitas vezes, elimina o poder explicativo da liquidez". Uma segunda explicação é proporcionada por Fang (2012Fang, J. (2012). Stock liquidity, price informativeness, and accruals-based earnings management (dissertation). Baton Rouge: Louisiana State University.), que relata que os preços das ações transmitem informações sobre lucros adicionais apenas quando a liquidez das ações está acima de certo limiar. Portanto, considerando a extrema concentração de liquidez em um pequeno número de firmas, pode-se afirmar que, como apenas as grandes firmas tendem a ter maior liquidez das ações e ser incluídas no índice de ações, apenas um número muito pequeno de firmas atinge esse "limiar de liquidez".

6 CONSIDERAÇÕES FINAIS

Com base nessas evidências conflitantes quanto ao papel desempenhado pelo risco no ERC, este artigo teve por objetivo analisar o papel desempenhado pelo risco na reação dos preços aos lucros contábeis no Brasil, um mercado que se caracteriza por ter alta concentração de ações, taxas de juros elevadas e alta volatilidade de mercado. O estudo foi baseado em uma amostra de 212 empresas listadas na BM&FBOVESPA por meio de dados anuais e diversas mensurações de risco e lucros inesperados foram utilizadas.

Os resultados indicaram coeficientes significativos e negativos do risco total (TRK), que é parcialmente consistente com a expectativa prévia apresentada pelos modelos de avaliação de empresas, e que é inconsistente com a hipótese do "numerador" proposta por Chambers et al. (2005Chambers, D. J., Freeman, R. N., & Koch, A. S. (2005). The effect of risk on price responses to unexpected earnings. Journal of Accounting, Auditing & Finance20(4), 461-482.). Em termos de risco sistemático, os resultados sugerem que o beta do CAPM leva a erro na mensuração de risco, o que é consistente com a subdiversificação do índice do mercado local de ações e é consistente com as evidências empíricas recentes (Amorim et al., 2012Amorim, A. L. G. C., Lima, I. S., & Murcia, F. D. R. (2012). Analysis of the relationship between accounting information and systematic risk in the Brazilian market. Revista Contabilidade & Finanças23(60), 199-211. ; Simon et al., 2014Simon, D. S., Zani, J., Morais, I. C. A., & Costa, A. B. (2014). Low-beta stocks in the Brazilian market (working paper). Recuperado de http://www.mfsociety.org/modules/modDashboard/uploadFiles/conferences/MC21~377~p18e9s0n0619vv18ol1n4i1lvl7fc4.pdf
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). Assim, os resultados aqui relatados sugerem que, para os estudos sobre a associação entre lucro e retorno, a posição na classificação (ranking) do risco total pode ser uma mensuração melhor para discriminar empresas de acordo com seus riscos específicos do que o beta obtido pelo modelo de mercado. Contudo, o papel desempenhado pelo risco idiossincrático na avaliação da firma e no custo de capital é um fenômeno sem pleno consenso na literatura (Mendonça et al., 2012Mendonça, F. P. D., Klotzle, M. C., Pinto, A. C. F., & Montezano, R. M. D. S. (2012). The relationship between idiosyncratic risk and returns in the Brazilian stock market. Revista Contabilidade & Finanças 23(60), 246-257. ; Galdi & Securato, 2007Galdi, F. C., & Securato, J. R. (2007). O risco idiossincrático é relevante no mercado brasileiro? Revista Brasileira de Finanças(1), 41-58.; Spiegel & Wang, 2005Spiegel, M. I., & Wang, X. (2005). Cross-sectional variation in stock returns: liquidity and idiosyncratic risk (Yale ICF working paper). Recuperado de http://ssrn.com/abstract=709781
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; Fang, 2012Fang, J. (2012). Stock liquidity, price informativeness, and accruals-based earnings management (dissertation). Baton Rouge: Louisiana State University.).

Os resultados também demonstram que o efeito não linear nos lucros inesperados é significativo no mercado brasileiro. Isso significa que os agentes do mercado não reagem da mesma maneira a diferentes magnitudes de lucros inesperados. Esse parece ser um controle-chave para estudos sobre qualidade dos lucros em ambientes nos quais os lucros extremos são frequentemente relacionados a períodos específicos. Entretanto, até onde sabemos, nenhum estudo no Brasil aborda tal aspecto.

Ademais, este artigo relata que a persistência dos lucros é um determinante transversal (cross-section) positivo dos ERC e que nem o tamanho da empresa nem a liquidez das ações são determinantes significativos do ERC em combinação com outras variáveis. Pode-se afirmar que essas variáveis estão fortemente correlacionadas ao risco idiossincrático e que o impacto do risco idiossincrático é muito mais relevante e, muitas vezes, elimina o poder explicativo da liquidez e do tamanho (Spiegel & Wang, 2005Spiegel, M. I., & Wang, X. (2005). Cross-sectional variation in stock returns: liquidity and idiosyncratic risk (Yale ICF working paper). Recuperado de http://ssrn.com/abstract=709781
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).

Finalmente, os resultados não conseguiram demonstrar de forma conclusiva que a adoção plena das IFRS, em 2010, afetou de modo significativo a reação do mercado aos lucros inesperados. Até o momento, os resultados sugerem que qualquer alteração no ERC pode decorrer de menores magnitudes de lucros inesperados após a adoção das IFRS. Maior quantidade de observações temporais no período pós-IFRS pode ser necessária a fim de se possibilitar uma conclusão robusta.

No geral, este estudo indica que o controle da relação lucro-retorno por meio de (i) posição na classificação do risco total, (ii) efeitos não lineares de lucros inesperados e (iii) persistência dos lucros pode melhorar os resultados de análises empíricas sobre a natureza e a magnitude dos lucros na análise financeira e no processo de avaliação de empresas.

Novas pesquisas podem analisar as razões que levam o beta do modelo de mercado a não conseguir explicar a variação transversal do ERC e/ou explorar determinantes temporais dos ERC no Brasil ou em outros mercados emergentes.

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  • White, H. (1980). A heteroskedasticity-consistent covariance matrix estimator and a direct test for heteroskedasticity. Econometrica48 (4), 817-838.
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    Trabalho apresentado no 37o EAA Annual Congress, Tallinn, Estônia, maio de 2014, e na 21a Annual Conference of the Multinational Finance Society, Praga, República Checa, junho de 2014.
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    Agradecimentos: O autor agradece Zhaoyang Gu (debatedor da MFC), Kim Peterson (CBS), participantes da Multinational Finance Conference (MFC, 2014), da European Accounting Association Conference (EAA Conference, 2014) e do Copenhagen Business School Research Seminar (2014), bem como revisores anônimos, pelos úteis comentários sobre as versões iniciais deste texto. Qualquer erro remanescente é de minha exclusiva responsabilidade. À Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (Fapesp) também dedico meus agradecimentos, pela concessão de financiamento ao Projeto de Pesquisa 12436-8/2013.

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    Dez 2015

Histórico

  • Recebido
    10 Out 2014
  • Revisado
    09 Jan 2015
  • Aceito
    18 Ago 2015
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