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Escolhas linguísticas, custos políticos e gerenciamento da imagem corporativa: o caso da Aracruz Celulose S.A.

Linguistic choices, political costs and corporate image management: the case of Aracruz Celulose S.A.

Resumos

Discussão sobre o processo de construção de sentido nos relatórios anuais corporativos com base na relação entre as escolhas linguísticas realizadas e os custos políticos a que uma empresa está submetida. As proposições teóricas desenvolvidas mediante a adoção da perspectiva teórico-metodológica da gramática funcional foram confrontadas com dados empíricos. Foram analisados as Mensagens da Administração e os Sumários Executivos contidos nas seções narrativas dos relatórios anuais, de 1998 a 2007, da Aracruz Celulose. O foco da análise foi a interpretação das funções sintático-semânticas como meio para a construção de sentido desses documentos. A escolha da empresa foi motivada pelo seu histórico de lucros elevados e adoção de políticas voluntárias de divulgação financeira, além de custos políticos elevados relacionados a assuntos ambientais e conflitos de demarcação de terras indígenas. Os resultados indicam a tentativa da empresa em priorizar e enfatizar sua identidade institucional ao intensificar, circunstanciar e reforçar suas atitudes, em vez de informar de maneira neutra suas realizações ou planos. No eixo temático relacionado aos conflitos com as comunidades indígenas, foi notória a intenção de expor o seu ponto de vista institucional, impondo ao leitor seu modo particular de perceber os fatos, sem observar a neutralidade desejável no compromisso informacional dos relatórios anuais.

Qualidade do disclosure; Custos políticos; Análise textual; Gramática funcional


In this work we analyze the process of sensemaking put in work in corporate annual reports by means of the relationship between linguistic choices made and the political costs that a specific company incurs. The theoretical propositions advanced with support from the functional grammar framework were confronted with empirical data. Our sample included the President Letters and Executive Summaries presented in the annual reports of Aracruz Celulose S.A., from 1998 to 2007. The analysis was centered on the interpretation of both syntactic and semantic functions that were used to favor particular ways of sense making when one is reading the annual reports. Aracruz Celulose was chosen due to a combination of enduring high performance and assumed high levels of political costs resulting both from environmental issues and from conflicts with native communities. The results suggest that the company predominantly attempts to give emphasis to its institutional identity by means of intensification, circumstantiation and reinforcements of its realizations, rather than present its results and goals in a neutral way. We also observed a clear intention of favor its institutional perspective, since themes related to conflicts with native communities were presented in a way that imposes to the reader the company's particular way of appraise the facts. This behavior is not congruent with a neutral presentation of information in annual reports.

Disclosure quality; Political costs; Textual analysis; Functional grammar


Marcelo Sanches PagliarussiI; Jusmeire Fieni RibeiroII; Alfredo Rodrigues Leite da SilvaIII; Annor da Silva JúniorIV

IDoutor em Ciência e Engenharia de Materiais pela Universidade Federal de São Carlos; Professor Associado da Fucape Business School. Endereço: Av. Fernando Ferrari, nº 1358, CEP 29075-010, Boa Vista, Vitória - ES, Brasil. E-mail: marcelo@fucape.br

IIMestre em Ciências Contábeis pela Fucape Business School; Pesquisadora da Fucape Business School. Endereço: Av. Fernando Ferrari, nº 1358, CEP 29075-010, Boa Vista, Vitória - ES, Brasil. E-mail: jusmeire@oi.com.br

IIIDoutor em Administração pela Universidade Federal de Minas Gerais; Professor Adjunto da Universidade Federal do Espírito Santo - Departamento de Administração. Endereço Av. Fernando Ferrari, 514, CEP 29075-910, Goiabeiras, Vitoria - ES, Brasil. E-mail: alfredoufes@gmail.com

IVDoutor em Administração pela Universidade Federal de Minas Gerais; Professor Adjunto da Universidade Federal do Espírito Santo - Departamento de Contabilidade. Endereço Av. Fernando Ferrari, 514, CEP 29075-910, Goiabeiras, Vitoria - ES, Brasil. E-mail: annorsj@gmail.com

RESUMO

Discussão sobre o processo de construção de sentido nos relatórios anuais corporativos com base na relação entre as escolhas linguísticas realizadas e os custos políticos a que uma empresa está submetida. As proposições teóricas desenvolvidas mediante a adoção da perspectiva teórico-metodológica da gramática funcional foram confrontadas com dados empíricos. Foram analisados as Mensagens da Administração e os Sumários Executivos contidos nas seções narrativas dos relatórios anuais, de 1998 a 2007, da Aracruz Celulose. O foco da análise foi a interpretação das funções sintático-semânticas como meio para a construção de sentido desses documentos. A escolha da empresa foi motivada pelo seu histórico de lucros elevados e adoção de políticas voluntárias de divulgação financeira, além de custos políticos elevados relacionados a assuntos ambientais e conflitos de demarcação de terras indígenas. Os resultados indicam a tentativa da empresa em priorizar e enfatizar sua identidade institucional ao intensificar, circunstanciar e reforçar suas atitudes, em vez de informar de maneira neutra suas realizações ou planos. No eixo temático relacionado aos conflitos com as comunidades indígenas, foi notória a intenção de expor o seu ponto de vista institucional, impondo ao leitor seu modo particular de perceber os fatos, sem observar a neutralidade desejável no compromisso informacional dos relatórios anuais.

Palavras-chave: Qualidade do disclosure. Custos políticos. Análise textual. Gramática funcional.

ABSTRACT

In this work we analyze the process of sensemaking put in work in corporate annual reports by means of the relationship between linguistic choices made and the political costs that a specific company incurs. The theoretical propositions advanced with support from the functional grammar framework were confronted with empirical data. Our sample included the President Letters and Executive Summaries presented in the annual reports of Aracruz Celulose S.A., from 1998 to 2007. The analysis was centered on the interpretation of both syntactic and semantic functions that were used to favor particular ways of sense making when one is reading the annual reports. Aracruz Celulose was chosen due to a combination of enduring high performance and assumed high levels of political costs resulting both from environmental issues and from conflicts with native communities. The results suggest that the company predominantly attempts to give emphasis to its institutional identity by means of intensification, circumstantiation and reinforcements of its realizations, rather than present its results and goals in a neutral way. We also observed a clear intention of favor its institutional perspective, since themes related to conflicts with native communities were presented in a way that imposes to the reader the company's particular way of appraise the facts. This behavior is not congruent with a neutral presentation of information in annual reports.

Keywords: Disclosure quality. Political costs. Textual analysis. Functional grammar.

Introdução

As empresas brasileiras listadas na Bolsa de Valores de São Paulo publicam anualmente suas Demonstrações Financeiras Padronizadas (DFP). Tais relatórios financeiros padrão contêm duas seções distintas. Uma é a seção obrigatória, na qual são apresentadas as demonstrações financeiras. A outra, cuja publicação é fortemente recomendada pela Comissão de Valores Mobiliários - CVM - tem uma natureza narrativa e textual. É nesta última que se encontra o Relatório da Administração.

As seções narrativas apresentadas e que compõem o Relatório da Administração incluem os seguintes itens: (i) mensagem da administração; (ii) sumário executivo, que inclui os tópicos "criação de valor", "satisfação do cliente"; "processos internos" e "aprendizado e desenvolvimento"; (iii) relatório social e ambiental; e (iv) informações financeiras.

Por envolver elementos textuais e narrativos em relação aos quais a CVM não estabelece uma regulação específica, as seções narrativas dos Relatórios da Administração oferecem oportunidades interessantes para o estudo de um aspecto específico do comportamento organizacional: a construção de sentido nas comunicações corporativas.

Thomas (1997), Hyland (1998) e Jameson (2000) destacaram, documentaram e analisaram o processo de construção de sentido nos relatórios anuais corporativos. Em linhas gerais, os três trabalhos articulam a relação teórica entre o desempenho negativo e o processo de construção de sentido colocado em prática nos referidos relatórios. Com base na teoria linguística, os autores demonstraram, em diferentes contextos, como as empresas constroem seu discurso utilizando os aspectos que compõem o caráter pragmático da linguagem para favorecer determinadas linhas de construção de sentido. As contribuições de Thomas (1997), Hyland (1998) e Jameson (2000) demonstram o potencial da análise dos elementos linguísticos para entender o processo de construção de sentido nas comunicações corporativas.

A deficiência de desempenho, ao impactar negativamente a legitimidade da atuação da alta administração das empresas, seria o elemento motivador do processo de construção de sentido nos relatórios anuais corporativos. No entanto, em torno da ideia de deficiência de desempenho existem outros aspectos a serem aprofundados e confrontados com a qualidade do disclosure por meio da análise linguística.

Neste ponto está a relevância deste estudo: propor uma conexão entre as estruturas linguísticas apresentadas nas seções narrativas dos relatórios anuais corporativos e os custos políticos a que determinadas empresas estão submetidas. Em relação aos trabalhos de Thomas (1997), Hyland (1998) e Jameson (2000), o presente estudo contribui para a literatura com a proposição de que a escolha de determinada linha de construção de sentido nas seções narrativas dos relatórios de uma empresa é realizada como resposta aos custos políticos.

Tais custos políticos seriam o resultado do nível de monitoramento imposto à empresa pelos órgãos públicos reguladores, pelos meios de comunicação, e por outras entidades civis pertinentes, como associações de classe e organizações não governamentais (WATTS e ZIMMERMAN, 1978). Partiu-se do pressuposto de que uma combinação de elevados níveis de desempenho e de custos políticos levaria a empresa a adotar procedimentos que atenuassem os danos à sua imagem, o que incluiria as escolhas linguísticas em suas seções narrativas.

Adotou-se no presente estudo a perspectiva teórico-metodológica da gramática funcional de Halliday e Matthiessen (2004) com o objetivo de confrontar empiricamente os pressupostos oriundos da articulação teórica em torno da discussão sobre custos políticos e gerenciamento da imagem corporativa.

A proposta foi aplicada na análise das mensagens da administração e dos sumários executivos apresentados nos relatórios anuais da Aracruz Celulose, de 1998 a 2007. A escolha da empresa foi motivada pelo seu histórico de ganhos elevados no período e pela adoção de políticas voluntárias de divulgação financeira, além de seus custos políticos potencialmente elevados devido a assuntos ambientais e a conflitos de demarcação de terras indígenas

Referencial Teórico

As escolhas linguísticas e a gramática funcional

A gramática funcional assenta seus construtos numa base sistêmica e paradigmática na qual o enunciado faz parte de escolhas conscientes do autor do texto. Cada escolha realizada tem uma função discursiva, ou seja, o locutor tem uma intenção comunicativa que o motiva a construir determinado significado, escolhendo uma estrutura gramatical específica em uma lista de opções possíveis (HALLIDAY e MATTHIESSEN, 2004).

O eixo de análise da gramática funcional envolve os itens multifuncionais do texto que podem ser utilizados na construção de sentido. Assim, cada elemento do texto é interpretado de acordo com a função que desempenha em relação ao todo. A linguagem é organizada mediante três metafunções: ideacional, interpessoal e textual, configuradas em um sistema de transitividade. Neste sistema constituído por processos, participantes e circunstâncias, as ações e atividades humanas são retratadas dentro de uma realidade situacional, e sua expressão se dá por meio do discurso (HALLIDAY e MATTHIESSEN, 2004).

A metafunção ideacional constitui o componente principal do significado do sistema de transitividade, pois permite interpretar a realidade retratada por meio das escolhas dos interlocutores. Tais escolhas envolvem o tipo de processo, a seleção dos participantes e a seleção das circunstâncias. Os participantes são os substantivos e pronomes pessoais. Os processos são os verbos, que podem ser classificados em materiais, relacionais, mentais, verbais, existenciais e comportamentais (HALLIDAY e MATTHIESSEN, 2004).

Os processos materiais realizam o fazer quando expressam as atividades ou eventos do mundo físico, no qual algum participante desempenha alguma ação. Segundo Hallyday e Matthiessen (2004) os dois participantes principais são o ator e a meta. O ator é o participante que realiza a ação; e a meta é a quem o processo é dirigido. O ator é expresso por entidade humana, inanimada ou abstrata, e pode se situar de forma intencional ou involuntária. A voz passiva coloca o ator como involuntário e aparentemente afetado pela meta. Já na voz ativa, o ator situa-se como intencional e ocupa o papel de sujeito.

Com relação aos outros processos, o relacional efetua o processo do ser mediante verbos de ligação, que estabelecem uma relação de atribuição e de identificação entre os participantes. O processo mental refere-se ao sentir, no qual os verbos expressam sentimentos, conhecimento e percepção (HALLIDAY e MATTHIESSEN, 2004, grifo nosso). Em sequência, o processo comportamental é o que realiza o comportar-se; o existencial é o processo do existir, no qual alguma coisa existe ou acontece e o verbal é o processo do dizer (HALLIDAY e MATTHIESSEN, 2004, grifo nosso).

A função interpessoal, por sua vez, identifica o papel comunicativo que o locutor assume no evento da fala e se realiza por meio dos sistemas de modo e modalidade. O modo permite a configuração da oração em termos de polaridade ou escolha entre o positivo e o negativo, além de referenciar o tempo da fala e o julgamento do falante. O sistema de modo é constituído pelo indicativo, subjuntivo, imperativo e por estruturas interrogativas (HALLIDAY e MATTHIESSEN, 2004).

Na modalidade, são analisados os aspectos modais dos verbos, dos adjetivos e de determinados advérbios, que contribuem para expressar o julgamento do falante, sem tornar explícita a primeira pessoa, eu, temperando ou mascarando o seu comprometimento no evento discursivo (HALLIDAY e MATTHIESSEN, 2004, grifo nosso).

Já a função textual, ou modo do discurso, está ligada à organização do texto por meio do sistema temático e de mecanismos de coesão. A coesão é uma relação semântica que se dá por meio de conectivos que entrelaçam um item como dependente de outro no mesmo texto. Os conectivos, no geral, são constituídos por preposições, conjunções e pronomes relativos (HALLIDAY e MATTHIESSEN, 2004, grifo nosso).

O tema é normalmente o primeiro elemento na oração e ponto de partida da mensagem, por meio dele se organiza a oração. A segunda parte da oração é o rema, ou onde o tema é desenvolvido. O tema de uma oração pode ser um participante, um processo ou uma circunstância, contanto que esteja em primeira posição na oração (HALLIDAY e MATTHIESSEN, 2004).

O conjunto dessas contribuições permite desvelar as articulações textuais por intermédio dos elementos linguísticos destacados, o que contribui para a análise das relações que envolvem os autores dos textos e sua inserção em determinado contexto.

Tal possibilidade permite confrontar as articulações em torno da qualidade do disclosure nas seções narrativas dos relatórios anuais corporativos. Isso ocorre na medida em que se expõem os elementos textuais que envolvem o disclosure e são reveladas as articulações linguísticas em torno deles.

A análise textual do disclosure nas seções narrativas dos relatórios anuais corporativos

Os relatórios anuais corporativos podem ser compostos por centenas de páginas contendo, além dos números contábeis, a discussão de aspectos como a estratégia da empresa, responsabilidade social e outros exemplos de ações passadas e planejadas para o futuro. Os números refletem formalmente o desempenho passado da firma, e devem respeitar os princípios contábeis estabelecidos. A narrativa deveria contextualizar, explicar, justificar o passado e projetar o futuro, dentro dos limites que esses números permitem.

Beattie, McInnes e Fearnley (2004) classificaram as pesquisas sobre a qualidade do disclosure em relatórios anuais corporativos em duas abordagens: (1) o uso de escores de qualidade de disclosure subjetivamente definidos pelos analistas de investimento ou (2) o emprego de abordagens semiobjetivas por meio da análise textual. A abordagem semiobjetiva adotada no presente trabalho enquadra-se na categoria análise linguística definida por Beattie, McInnes e Fearnley (2004). Os estudos de Thomas (1997), Hyland (1998) e Jameson (2000) antecedem o presente estudo.

Thomas (1997) utilizou os relatórios anuais de uma única empresa, num período de seis anos que se iniciou com a empresa em uma situação de prosperidade e se encerrou com a empresa apresentando perdas significativas. A autora fundamentou-se na gramática funcional de Halliday (1976, 1978, 1985a, 1985b) para analisar a relação entre o desempenho e as características do discurso apresentado no relatório anual da empresa selecionada. A autora concluiu que, conforme as notícias apresentadas se tornavam mais negativas, as escolhas linguísticas sugeriam uma situação factual objetiva, causada por circunstâncias não atribuíveis a qualquer pessoa que pudesse ser considerada responsável pelo desempenho. O uso frequente de construções verbais na voz passiva indicava essa tentativa, por parte da empresa, de relacionar a queda dos lucros a fatores externos circunstanciais (THOMAS, 1997).

Em uma abordagem semelhante, Hyland (1998) focou os elementos de metadiscurso para explorar as construções linguísticas utilizadas nas mensagens dos presidentes que constam dos relatórios anuais corporativos de 137 empresas. Os elementos de metadiscurso constituem aspectos explicitamente relacionados à organização do discurso ou à atitude do escritor em relação ao texto ou ao leitor (HYLAND, 1998). Essa abordagem permitiu cumprir o objetivo do estudo: determinar como os escritores, neste caso os presidentes, projetavam a si mesmos no texto de modo a apresentar uma imagem corporativa efetiva.

A análise da presença de elementos de metadiscurso nos documentos corporativos segue a distinção adotada por Halliday (1976, 1978, 1985a, 1985b) entre o conteúdo proposicional e o significado textual e expressivo do texto. Os elementos de metadiscurso ajudam a organizar a prosa em um texto coerente, que transmite a personalidade do escritor. Os resultados de Hyland (1998) indicam que a carta do presidente apresenta uma natureza essencialmente retórica. O autor mostra que o uso de elementos de metadiscurso permite que os executivos principais das empresas controlem as informações apresentadas, por meio do uso de expressões que organizam e avaliam as informações de modo a direcionar a interpretação que os leitores irão construir ao ler o texto.

Jameson (2000), por sua vez, aprofunda-se nesse processo, o que permite compreender aspectos que esclarecem como ele se configura. Para o autor, a estrutura hipertextual e multivocal do texto possibilita usar o envolvimento emocional do leitor para contrapor a dificuldade em concluir a argumentação racional. É por meio do envolvimento emocional que o leitor desenvolve um relacionamento imaginário com os autores implicados com o texto e constrói uma história favorável à empresa. Dessa maneira, a estrutura da carta do presidente compõe uma hiperestrutura que engaja os leitores no processo de construção da história (JAMESON, 2000).

Para chegar a essa conclusão, Jameson (2000) baseia-se na teoria da narrativa, combinada com abordagens fenomenológicas para análise do discurso, aplicadas ao processo de comunicação de negócios. O autor selecionou dois conjuntos de relatórios anuais de fundos de investimento. O primeiro conjunto era formado pelos fundos ranqueados como os de melhor desempenho. O segundo conjunto foi formado por fundos com bom desempenho, medido pelo retorno proporcionado aos investidores, em termos absolutos e históricos, porém com desempenho fraco em comparação aos fundos do primeiro grupo e outros benchmarks.

Jameson (2000) argumenta que, como os fundos da segunda amostra não podiam justificar de maneira totalmente racional e lógica o seu desempenho, estruturas hipertextuais foram adotadas nos relatórios. Tais estruturas, acompanhadas do uso de gêneros variados, como biografias, ensaios, opiniões, complementadas por múltilplos narradores, permitem ao leitor acessar o conteúdo por vários pontos e, por meio destes, participar ativamente da construção do sentido da história (JAMESON, 2000).

A hipótese dos custos políticos

Watts e Zimmerman (1978) discutem os custos políticos com o intuito de explicar o que determina o posicionamento das diferentes partes interessadas em relação à adoção de uma dada norma contábil. Os autores propõem que os gestores são mais incentivados a promover a adoção de normas e princípios contábeis que resultem na divulgação de lucros mais baixos devido a aspectos tributários, políticos e regulatórios, do que apoiar a implantação de normas contábeis que resultem na divulgação de lucros maiores, o que consequentemente aumentaria a sua remuneração variável.

Tal proposição é condicionada ao fato de a firma estar sujeita a regulações e pressões políticas. Em empresas menores ou sujeitas a regulação de menor intensidade, espera-se que os gestores tenham incentivos a apoiar a adoção de normas contábeis que evidenciem níveis mais elevados de lucros (WATTS e ZIMMERMAN, 1978). Outros autores procuraram estender esses argumentos à tentativa de explicar as escolhas contábeis realizadas pelos gestores no momento da divulgação dos resultados financeiros (MILNE, 2002).

Essa linha de pesquisa subsequente apoiou-se nas proposições de Watts e Zimmerman (1978) de que as empresas empregam uma variedade de procedimentos, como campanhas de responsabilidade social, lobbies junto a grupos políticos, e a seleção de procedimentos contábeis que reduzam os lucros divulgados nas demonstrações contábeis.

Segundo Watts e Zimmerman (1978) o público em geral associa lucros muito elevados a ganhos advindos de monopólios e afirmam que a magnitude dos custos políticos é altamente dependente do tamanho da firma.

Milne (2002) ressalta a ênfase na relação entre os custos políticos e a divulgação dos números contábeis, mas critica a ausência de menção a outros tipos de disclosure no relatório anual corporativo que poderiam estar relacionados aos custos políticos. Aspectos como degradação ambiental, esgotamento de recursos e exploração de trabalhadores, entre outros, não são mencionados nas proposições de Watts e Zimmerman em seus trabalhos de 1978, 1986 e 1990.

Propõe-se neste estudo a ampliação da discussão teórica e empírica dos custos políticos por meio da incorporação dos aspectos relativos a impactos ambientais e exploração de trabalhadores, entre outros. Estes aspectos podem ter um impacto negativo considerável na imagem pública de uma empresa, principalmente se forem potencializados por um contexto de lucros muito elevados.

Aspectos Metodológicos

O estudo foi realizado por meio de uma pesquisa documental nos relatórios anuais da empresa Aracruz Celulose no período de 1998 a 2007. Com relação à técnica empregada na análise dos textos, utilizou-se a análise de discurso apoiada na gramática sistêmico-funcional. A análise de discurso fundamenta-se num estudo do sistema da língua, ou seja, naquilo que as pessoas dizem e escrevem, ouvem ou leem (HALLIDAY e MATTHIESSEN, 2004).

As seções narrativas apresentadas nos relatórios anuais corporativos incluem os seguintes itens: (i) mensagem da administração; (ii) sumário executivo, que inclui os tópicos "criação de valor", "satisfação do cliente"; "processos internos" e "aprendizado e desenvolvimento"; (iii) relatório social e ambiental; e (iv) informações financeiras.

O foco da análise foi centrado na interpretação das funções sintático-semânticas dos sumários executivos e das mensagens da administração. A escolha da empresa e seleção do período foi motivada pelos seguintes aspectos: (1) histórico de ganhos elevados; (2) adoção de políticas voluntárias de divulgação financeira; (3) custos políticos potencialmente altos relacionados a assuntos ambientais e a conflitos de demarcação de terras indígenas.

A primeira etapa de análise envolveu a caracterização dos custos políticos a que a empresa esteve submetida durante o período analisado. Tal caracterização foi feita por meio da análise dos relatórios anuais corporativos, bem como da análise de jornais e revistas locais e de veiculação nacional.

As análises linguísticas foram feitas conforme as etapas a seguir:

I. Cópia dos sumários e das mensagens da administração individualmente e por ano para o programa Word.

II. Divisão dos textos em frases, por pontuação, para efeitos de depreensão das unidades de análise.

III. Frases separadas em orações, assim consideradas como qualquer estrutura provida de verbo, mesmo que só esse elemento aparecesse. Essas orações foram tomadas como ponto de partida para as análises, feitas por meio de observação, leitura detalhada e inspeção manual.

IV. Tendo como base as orações, foram contados e tabulados todos os verbos, pronomes, advérbios, adjetivos, conjunções e preposições e identificados os seguintes itens, antes da análise das metafunções propriamente ditas:

a. Participantes: substantivos, adjetivos e pronomes pessoais;

b. Processos e relações: verbos, advérbios, adjetivos;

c. Circunstantes: conectivos, conjunções;

d. Tema - contexto situacional.

V. Análise do sistema de transitividade e das metafunções. Apenas por motivo metodológico, cada metafunção é apresentada individualmente: (a) função ideacional, na qual foi analisado o sistema de transitividade verbal - processos e participantes; (b) função interpessoal, envolvendo a análise do sistema de modos, dos tempos verbais e seus elementos modalizantes; e (c) a função textual, que envolveu a análise da semântica vocabular, da sintaxe e da coesão.

Vale reiterar que as três metafunções ocorrem ao mesmo tempo, por isso não podem ser analisadas individualmente. As análises foram feitas no todo, ou seja, no corpo inteiro de cada texto. E, apesar dos textos terem sido fragmentados em orações, as análises foram funcionais e consideraram todo o corpo textual e os contextos situacionais (HALLIDAY e MATTHIESEN, 2004).

Resultados e Discussão

Breve histórico da Aracruz Celulose

A Aracruz Celulose detém a liderança mundial na produção de celulose de fibra curta de mercado, respondendo por 24% da oferta global do produto que são destinados à fabricação de papéis de imprimir e escrever, papéis sanitários e papéis especiais de alto valor agregado.

Em 1999, com a sua aquisição pelo Grupo Votorantim Celulose e Papel S.A., a Aracruz dá lugar à criação da maior empresa de celulose do mundo. Com esta fusão o bloco de controle acionário da companhia passa a ser exercido pelo Grupo Votorantim e pelo Banco Nacional do Desenvolvimento (BNDES) ; (ARACRUZ, 2009).

As ações preferenciais da empresa são negociadas nas bolsas de valores de São Paulo, Nova Iorque e Madri. A empresa é orientada para exportação: 98% da sua produção destinam-se ao mercado externo. Suas operações florestais alcançam os estados de Espírito Santo, Bahia, Minas Gerais e Rio Grande do Sul, com mais de 286 mil hectares de plantio de eucalipto, intercalados com cerca de 170 mil hectares de reservas nativas distribuídas pelas Unidades: Barra do Riacho, ES; Guaíba, RS; e Veracel, BA (ARACRUZ, 2009).

A Aracruz e os seus custos políticos

O setor de papel e celulose brasileiro, em que a empresa atua, está sujeito a normas ambientais rigorosas, de abrangência nacional, estadual e local, e também ao monitoramento da sociedade quanto à adequação de suas atividades ou produtos.

Embora o modelo de ocupação de áreas seja adotado pela maioria das empresas do setor florestal, no caso da Aracruz Celulose sobrepõe-se um agravante: os conflitos socioambientais com as comunidades indígenas tupiniquins e guaranis. Tais conflitos ganharam maior visibilidade nos meios de comunicação e exercem forte impacto na reputação da empresa (ARACRUZ, 2003).

Como resultado de acordos firmados entre a Aracruz e as comunidades, mais as iniciativas voluntárias e as atividades comerciais, a companhia repassou, entre 1998 e 2005, mais de R$ 26 milhões às comunidades indígenas. Segundo a empresa, além da geração de renda, as atividades originadas desses recursos resultaram na criação de mais de 300 empregos (ARACRUZ, 2007).

No ano de 2003, observa-se ainda o surgimento de um grupo de trabalho da comissão de direitos humanos da Assembleia Legislativa do Estado do Espírito Santo criado para investigar supostas violações a direitos econômicos, sociais, culturais e ambientais nas plantações de eucalipto da empresa no Espírito Santo. Entre outros assuntos, algumas denúncias contra a Aracruz foram investigadas e os representantes da empresa convocados a uma audiência pública para se defender (ARACRUZ, 2004).

Em 2005, os índios invadem mais uma vez as terras da Aracruz, pleiteando uma nova ampliação da reserva em 11 mil hectares. O recrudescimento dos conflitos relacionados a demarcação de terras indígenas constituiu-se em um elemento de negatividade na visibilidade pública da empresa. Neste sentido, entende-se que a empresa passa a arcar com elevados custos políticos, apesar de estes elementos não serem formalmente mencionados nas proposições de Watts e Zimmerman (1978, 1986, 1990).

Conforme interpretação de Ball e Foster (1982), as pressões políticas exercidas por autoridades governamentais do estado do Espírito Santo também evidenciam o aumento dos custos políticos para a Aracruz Celulose, os quais se referem a ações a que a empresa está sujeita no domínio político. Assim, para exemplificar tal evidência, tem-se a criação de uma Comissão Parlamentar de Inquérito pela Assembleia Legislativa do Estado do Espírito Santo, em 2002, para investigar a legalidade das licenças e do processo de aquisição das propriedades da empresa desde o início de suas operações (ARACRUZ, 2007).

Percebe-se, assim, que o período de 1998 a 2007 é marcado pela ocorrência de eventos que apresentavam potencial severo de negatividade em relação à imagem pública da Aracruz Celulose. A combinação de ações do Poder Legislativo Estadual e da existência de conflitos socioambientais com comunidades indígenas representa um contexto que permite a análise dos custos políticos nos quais a empresa incorreu e seus possíveis reflexos nas seções narrativas dos relatórios anuais corporativos (ARACRUZ, 2007).

A disputa de terras entre a Aracruz Celulose e as comunidades indígenas no Espírito Santo chegou ao fim em 2007. Um processo de negociação estabelecido pelo governo federal previu a transferência de aproximadamente 11 mil hectares de terras da empresa para as comunidades indígenas (ARACRUZ, 2007).

É neste contexto de disputas com os nativos indígenas e de pressões do poder público municipal, estadual e federal que serão analisadas as estruturas linguísticas dos relatórios anuais corporativos da Aracruz Celulose S.A.

Análise das metafunções linguísticas

Na análise linguística, os processos materiais foram observados com maior frequência e realizados, em sua maioria, na voz ativa. De acordo com Halliday e Matthiessen (2004), processos materiais são aqueles por meio dos quais uma entidade faz algo; são os processos do fazer, ou seja, que constituem ações de mudanças externas, físicas e perceptíveis. Esse tipo de construção foi usado para dar maior clareza aos textos, e para pôr em destaque a empresa como principal participante.

Ainda sobre os processos materiais, pode-se inferir que sua escolha favoreceu a transmissão da ideia de ação e acontecimento ou o fazer e o agir da empresa. Com o uso destes processos a empresa enfatizou suas realizações bem como as ações que empreende em favor da comunidade local. Os excertos de textos dos relatórios anuais da empresa são trazidos para ilustrar a análise:

"A Aracruz vem desenvolvendo, nos últimos meses, estudos de viabilidade e engenharia para implantar uma terceira linha de produção, com capacidade para 700.000 toneladas anuais, no seu complexo industrial no Espírito Santo, [...]" (Mensagem da Administração, 1999, grifo nosso).

"Com isso a empresa promove o desenvolvimento sócio-econômico capixaba, colabora para o aprimoramento tecnológico das empresas locais e evita os efeitos indesejáveis da atração temporária de mão-de-obra de outras regiões, [...]" (Mensagem da Administração, 2001, grifo nosso).

"A Aracruz desenvolve operações diretas e indiretas em quase 150 municípios de 4 estados brasileiros, tem ações negociadas em bolsas de valores e exporta sua produção para clientes em quase 30 países, estando assim presente na vida de milhões de pessoas, [...]" (Sumário Executivo, 2004, p. 9, grifo nosso).

"A Aracruz privilegia a contratação de empregados da própria região onde atua, como uma forma de estimular o desenvolvimento econômico das comunidades nas quais está inserida" (Sumário Executivo, 2006, p. 27, grifo nosso).

"Como parte desse compromisso, a Aracruz cresce e faz crescer as comunidades com as quais desenvolve seu negócio, buscando aperfeiçoar continuamente seu relacionamento com ONGs, institutos, lideranças e comunidades" (Sumário Executivo, 2007, p. 1, grifo nosso).

Além dos processos materiais, os relacionais e mentais também foram observados, porém em menor frequência. Contudo, nos textos que abordavam a relação da empresa com as comunidades indígenas, verificou-se uma ocorrência mais significativa dos processos relacionais. Estes podem denotar intensidade, quando uma qualidade é atribuída a uma entidade ou ainda estabelecer relações de posse ou circunstanciar suas ações no tempo (HALLIDAY e MATTHIESSEN, 2004).

Nos textos analisados, a empresa expôs seus eventos e ações enquadrando os fatos do seu ponto de vista institucional, sugerindo ao leitor do texto a sua percepção particular dos fatos, ao mesmo tempo em que rechaça possíveis contra-argumentos, conforme sugerem os excertos a seguir:

"[...] Em 1998 o setor de celulose continuou a enfrentar dificuldades, e o mercado permaneceu desaquecido, uma vez que a demanda mundial diminuiu em comparação ao ano anterior" (Sumário Executivo, 1998, p.1, grifo nosso).

"[...] Para a Aracruz, os eventos de 1999 foram positivos. No começo do ano, os preços internacionais da celulose de mercado estavam extremamente pressionados e as previsões para o segmento eram ainda pouco animadoras" (Mensagem da Administração, 1999, grifo nosso).

"[...] A sucessão de eventos desencadeados durante 2001, entretanto, demonstrou como é difícil fazer previsões num mundo dominado por forças políticas e econômicas de impacto global" (Mensagem da Administração, 2001, grifo nosso).

"[...] A Aracruz recebeu oito autuações de órgãos ambientais em 2003, relacionadas a operações florestais, portuárias e destinação de resíduos. Todas as autuações foram contestadas pela empresa e aguardam decisão administrativa de primeira instância" (Sumário Executivo, 2003, p. 31, grifo nosso).

"[...] Essas ocupações foram parte de uma onda de pressões para acelerar a reforma agrária no país. Em 2004, ocorreram centenas de ocupações de propriedades, das quais 10 pertencentes a empresas do setor florestal" (Sumário Executivo, 2004, p. 11, grifo nosso).

"[...] Esta questão é de suma importância para a Aracruz, uma vez que seu negócio é intrinsecamente dependente de recursos naturais como água, solo e biodiversidade" (Sumário Executivo, 2005, p. 72, grifo nosso).

"[...] O diálogo com Organizações não Governamentais (ONG's) do Rio Grande do Sul foi interrompido após a invasão e destruição, ocorridas em março no Horto Florestal Barba Negra, que atingiram o laboratório e o viveiro de mudas da Aracruz" (Sumário Executivo, 2006, p, 79, grifo nosso).

"[...] Bem de Raiz é um patrimônio, um legado para as gerações futuras, e um nome que reforça as raízes genuinamente brasileiras da Aracruz" (Sumário Executivo, 2007, p. 33, grifo nosso).

Os processos mentais foram observados em alguns textos nos quais a empresa expõe suas crenças e valores. Tais processos lidam com a apreciação humana do mundo e revelam as crenças e vontades dos participantes envolvidos, ou seja, características estritamente humanas. (HALLIDAY e MATTHIESSEN, 2004).

Os excertos a seguir mostram como a escolha da empresa por este processo pôde revelar sua intencionalidade em se caracterizar como um ser com crenças e valores humanos:

"[...] Para 1999, apesar de acreditarmos na persistência da conjuntura de estoques elevados, mantemo-nos confiantes na capacidade da Companhia de consolidar e ampliar sua base de clientes" (Sumário Executivo, 1998, p. 9, grifo nosso).

"[...] Uma decisão equivocada ou a falta de resolução deixa as empresas sem alternativas estratégicas, ameaçando seu futuro. Em 2000, a Aracruz viveu um desses momentos" (Sumário Executivo, 2000, p. 9, grifo nosso).

"[...] Essa avaliação positiva, ao mesmo tempo em que nos encheu de orgulho, motivou-nos a buscar aprimorar ainda mais a publicação do relatório anual" (Mensagem da Administração, 2002, grifo nosso).

"[...] Acreditamos que a qualidade do relacionamento do setor produtivo com os demais atores da sociedade, nas próximas décadas, e conseqüentemente a sustentabilidade das organizações, dependerá de sua capacidade em ouvir o que delas se espera e responder de forma efetiva, antecipando-se tanto quanto possível" (Mensagem da Administração, 2003, grifo nosso).

"[...] Temos consciência da percepção, de parcela da comunidade, de que os plantios de eucalipto possuem pouca diversidade" (Sumário Executivo, 2005, p. 73, grifo nosso).

"Em 2006, a Aracruz soube aproveitar as condições favoráveis da economia mundial e do mercado de celulose para prosseguir em seu crescimento sustentável" (Mensagem da Administração, 2006, grifo nosso).

"[...] Apesar do excelente nível de satisfação quanto a esses aspectos, a Aracruz compreende que outros podem ser melhorados e serão foco de planos de ação específicos" (Sumário Executivo, 2007, p. 32, grifo nosso).

Com relação à polaridade nos textos, isto é, a escolha entre o positivo e o negativo nas orações, o polo positivo foi o mais observado nos documentos. O tom positivo foi configurado sob a forma de orações declarativas afirmativas. O locutor, nessas orações, posiciona-se no papel daquele que dá alguma coisa, atribuindo, ao mesmo tempo, ao seu leitor uma função de receptor (HALLIDAY e MATTHIESSEN, 2004). Assim, o uso desse tipo de construção enfatizou o caráter informativo dos relatórios anuais, uma vez que a escolha por esse tipo de oração é coerente com esse tipo de texto. Os excertos a seguir demonstram essa observação:

"[...] A Aracruz continuou a investir no desenvolvimento de seus funcionários durante 1998, de modo a aumentar a produtividade e a multifuncionalidade de sua equipe" (Sumário Executivo, 1998, p. 9, grifo nosso).

"[...] O Conselho registra sua satisfação com as inúmeras iniciativas da Administração para fortalecer nossa posição como um dos produtores de mais baixo custo no mundo, fornecendo produtos de alta qualidade com responsabilidade social e ambiental" (Mensagem da Administração, 1999, grifo nosso).

"[...] A estratégia comercial da empresa é concentrar as vendas em grandes clientes que utilizam a celulose para fabricar produtos de consumo - principalmente papéis sanitários -, papéis especiais e papéis revestidos de imprimir e escrever de alta qualidade" (Sumário Executivo, 2000, p. 9, grifo nosso).

"[...] Ao longo do ano foi dada atenção especial às atividades de licenciamento dos novos plantios de eucalipto e dos terminais de barcaças" (Sumário Executivo, 2001, p. 9, grifo nosso).

"[...] A Aracruz é auto-suficiente na produção de energia elétrica, e só adquire energia externa para atividades extraordinárias de manutenção" (Sumário Executivo, 2002, p. 19, grifo nosso).

"[...] O governo brasileiro tem exercido e continua a exercer influência substancial sobre diversos aspectos do setor privado" (Sumário Executivo, 2003, p. 9, grifo nosso).

"[...] O compromisso da Aracruz com o desenvolvimento sustentável se reflete nas práticas de manejo dos plantios de eucalipto e na preservação dos ecossistemas naturais. As práticas ambientais adotadas nas fábricas são também objeto de contínuos processos de aprimoramento" (Sumário Executivo, 2004, p. 3, grifo nosso).

"[...] O enfrentamento desse conflito reforçou internamente a necessidade de intensificarmos o relacionamento com as partes interessadas e aumentarmos a transparência no nosso processo de comunicação" (Sumário Executivo, 2006, p. 4).

"[...] Planejar de modo adequado e sustentável nosso crescimento é imprescindível em face dos desafios a serem enfrentados pela Empresa nos próximos anos, tendo em vista concretizar seu objetivo de suprir 25% da demanda mundial de celulose de fibra curta de mercado em 2015" (Mensagem da Administração, 2007, grifo nosso).

"[...] Para atingir esse objetivo, concluímos os investimentos no aumento de nossa capacidade de produção, com destaque para a entrada em operação da Veracel, na Bahia, que acrescenta 450 mil toneladas anuais ao volume já produzido pela Aracruz. Também a Unidade Guaíba (RS) teve sua capacidade nominal ampliada e, ao final do ano, iniciamos um projeto de expansão do terminal especializado Portocel, localizado ao lado da Unidade Barra do Riacho (ES), para aumentar sua capacidade de movimentação para 6 milhões de toneladas no decorrer dos próximos dois anos [...]" (Mensagem da Administração, 2005, grifo nosso).

Já a polaridade negativa foi observada com menor frequência, porém com forte caráter argumentativo, explicitando assim a intencionalidade da empresa em escolher tal construção enunciativa.

"[...] O setor de produtos florestais já é um dos principais exportadores do país, e pode tornar-se uma das mais importantes indústrias do Brasil se as vantagens que possuímos não forem desperdiçadas para concorrentes de outros países" (Sumário Executivo, 2000, p. 9, grifo nosso).

"[...] Tendo adequado nossos próprios estoques, voltamos a produzir no limite da capacidade da fábrica, atingindo um volume total de 1.271.600 toneladas e um volume recorde de vendas de 1.301.300 toneladas, num novo atestado de que, a preços de mercado, a Aracruz nunca enfrenta problemas para colocar o volume produzido" (Sumário Executivo, 2001, p. 9, grifo nosso).

"[...] A sustentabilidade econômica, ambiental e social não é uma visão ou estratégia à parte na Aracruz, mas está na essência do próprio empreendimento" (Sumário Executivo, 2002, p. 33, grifo nosso).

"[...] Não podemos assegurar que o governo brasileiro não tomará medidas similares no futuro" (Sumário Executivo, 2003, p. 9, grifo nosso).

"[...] A partir de 1994, estudos mais detalhados demonstraram que não há evidências consistentes de que a descarga de efluentes da Aracruz venha causando danos cumulativos ou alterações significativas no ecossistema marinho, mesmo considerando o aumento de produção na fábrica" (Sumário Executivo, 2004, p. 44, grifo nosso).

"[...] A Aracruz não busca resultados diretos advindos de sua participação no processo político e condena todas as formas de corrupção, não apoiando candidatos que tenham sido condenados por este ou qualquer outro crime" (Sumário Executivo, 2006, p. 50, grifo nosso).

"[...] A Aracruz não ocupa e nunca ocupou terras indígenas, nunca tirou índios de suas terras e adquiriu suas propriedades de forma legal" (Sumário Executivo, 2006, p. 10, grifo nosso).

O tempo verbal mais frequente foi o presente, utilizado geralmente no sentido de validar as informações como verdades irrefutáveis num tempo presente, construindo assim uma imagem de engajamento e comprometimento, expressa categoricamente pelo modo indicativo.

O leitor, nesse tipo de construção gramatical, é levado a considerar a proposição como válida no presente, isto é, situa o domínio argumentativo do discurso no tempo atual, no aqui e agora do locutor, mas também dele próprio (HALLIDAY e MATTHIESSEN, 2004). Segundo os autores, a escolha pelo tempo presente permite juntar num mesmo tempo discursivo pessoas fisicamente afastadas.

A construção desses significados pode ser observada em:

"A desvalorização do Real deve contribuir para o aumento da lucratividade da Companhia, pois a maior parte das vendas é faturada em dólar ou euro e grande parte dos custos operacionais é incorrida em Reais" (Mensagem da Administração, 1998, grifo nosso).

"[...] Tendo em vista as características vantajosas da produção de celulose no hemisfério sul em comparação com o hemisfério norte (onde as árvores crescem muito mais devagar), assim como a situação favorável do Brasil, país com uma democracia estável, economia em expansão e excelente clima, esperamos anos de grandes oportunidades para a Aracruz" (Mensagem da Administração, 1999, grifo nosso).

"[...] A globalização está transformando essa indústria, antes altamente fragmentada em um grande número de produtores, em um setor muito mais concentrado, dominado por corporações de grande porte. Hoje, por exemplo, os cinco maiores produtores mundiais de papéis de imprimir e escrever detêm 33% de participação no mercado, ao passo que apenas 10 anos atrás esse percentual era de 17%" (Mensagem da Administração, 2000, grifo nosso).

"[...] A empresa está aberta a questionamentos e ao debate, desde que com base em fatos objetivos e no diálogo" (Sumário Executivo, 2003, p. 12, grifo nosso).

"[...] A sustentabilidade é um fator que facilita o acesso ao capital, permite reduzir custos e maximizar retornos de longo prazo do investimento, previne e reduz riscos" (Mensagem da Administração, 2004, grifo nosso).

"[...] Uma vez que falharam as tentativas de resolver o conflito por meio do diálogo, a Empresa acredita que os instrumentos legais são o único caminho legítimo para que uma solução justa seja alcançada" (Sumário Executivo, 2006, p. 15, grifo nosso).

"[...] A Aracruz tira seu sustento da terra e daí nasce seu compromisso com o desenvolvimento sustentável, que orienta as práticas de manejo dos plantios renováveis de eucalipto e toda a sua atividade" (Sumário Executivo, 2007, p. 1, grifo nosso).

A representação da empresa pela primeira pessoa do plural sugere ao leitor a idéia de que muitas pessoas compartilham de sua mesma opinião, o que aumenta a força de persuasão dos argumentos. O uso inclusivo do pronome "nós", além de compreender um coletivo de pessoas - a sociedade - inclui ainda o locutor e o leitor, isto é, aquele que escreve e aquele que lê.

"Merecem reconhecimento especial nossos leais e diligentes funcionários" (Mensagem da Administração, 1998, grifo nosso).

"Ao nos aproximarmos de um novo milênio, a Aracruz está bem-posicionada para proporcionar o máximo valor a seus acionistas a partir do ciclo favorável recém-iniciado" (Mensagem da Administração, 1999, grifo nosso).

"[...] Agradecemos aos nossos acionistas e investidores, pela reiterada confiança no futuro da companhia; aos nossos clientes, pela preferência por nossos produtos e serviços; aos nossos fornecedores, pelo suporte e presença constantes; e às comunidades onde a empresa exerce suas atividades florestais e industriais, por seu encorajamento e apoio" (Mensagem da Administração, 2000, grifo nosso).

"[...] Intensificamos nosso esforço de informação e envolvimento da comunidade com relação à nossa matéria-prima, o eucalipto, em particular no Espírito Santo e Bahia, reforçando nossa presença em eventos e desenvolvendo campanhas institucionais nos principais veículos de comunicação" (Sumário Executivo, 2001, p. 9, grifo nosso).

"[...] A partir desta edição do nosso Relatório Anual, passamos a reportar nosso desempenho no exercício sob as quatro perspectivas-chave que refletem a estratégia de crescimento e produtividade da Aracruz. CRIAÇÃO DE VALOR - o que fizemos para aumentar o valor da empresa e torná-la um investimento ainda mais compensador para nossos acionistas, em bases sustentáveis" (Sumário Executivo, 2002, p. 6, grifo nosso).

"[...] Realizamos progressos significativos em nossa estratégia de crescimento, tendo em vista ampliar nossa participação no mercado internacional e agregar valor ao cliente por meio de maior integração à sua cadeia de suprimento, perenizando o negócio e assegurando retornos ainda melhores aos acionistas" (Sumário Executivo, 2003, p. 11, grifo nosso).

"[...] Poderemos ser adversamente afetados pela imposição e execução de regulamentos ambientais mais severos, podendo exigir que realizemos despesas adicionais" (Sumário Executivo, 2004, p. 13, grifo nosso).

"[...] Entendemos que o relacionamento transparente com as comunidades, aliado ao rigor no trato das questões ambientais, é parte de nossa "licença social" para operar e, portanto, tão importante quanto a confiança de nossos empregados, acionistas, clientes e fornecedores" (Sumário Executivo, 2006, p. 05, grifo nosso).

"[...] Avançamos na estratégia de fortalecer relacionamentos de longo prazo com os clientes e aumentar nossa participação de mercado" (Mensagem da Administração, 2005, grifo nosso).

"[...] Todos esses investimentos estão em linha com nossa estratégia de negócios, que prioriza o crescimento orgânico da Companhia e a aquisição de ativos como forma de, por sua vez, dar suporte ao crescimento de nossos parceiros comerciais e demais partes interessadas" (Mensagem da Administração, 2007, grifo nosso).

Observou-se, na análise dos textos como um todo, que a voz ativa se sobressaiu à passiva. No entanto, foram observadas variações em relação à voz verbal, no contexto temático referente a conflitos socioambientais e a cenários macroeconômicos adversos. A voz passiva e o uso de adjetivos subjetivos se fizeram presentes nestes contextos. A alternância entre voz ativa e passiva equivale a mudar o foco da narrativa, do sujeito e agente principal dos fatos, para o objeto paciente e alvo dos processos materiais realizados por esses conflitos e adversidades (HALLIDAY e MATTHIESSEN, 2004).

"[...] Em 1998 o setor de celulose continuou a enfrentar dificuldades, e o mercado permaneceu desaquecido, uma vez que a demanda mundial diminuiu em comparação ao ano anterior" (Sumário Executivo, 1998, p.1, grifo nosso).

"[...] Para a Aracruz, os eventos de 1999 foram positivos. A combinação de preços mais altos, baixos custos operacionais e volume recorde de vendas proporcionou melhoria substancial na rentabilidade da Companhia em relação ao ano anterior" (Sumário Executivo, 1999, p. 9, grifo nosso).

"[...] Os principais fatores responsáveis pelo excelente ano da Aracruz foram o crescimento dos preços médios líquidos da celulose ao longo do ano, de US$ 575/tonelada em dezembro 99 (CIF Europa) para US$ 690/tonelada em dezembro de 2000, e a manutenção de baixos custos operacionais e rigoroso controle das despesas" (Sumário Executivo, 2000, p. 9, grifo nosso).

"[...] É de se lamentar que, mais uma vez, o setor mostrou-se incapaz de proativamente tomar as ações corretivas em tempo de evitar a queda dos preços" (Mensagem da Administração, 2001, grifo nosso).

"[...] Ao longo de 2002, dialogou-se com diversos atores envolvidos na questão de certificação florestal, em busca de uma aliança capaz de criar o mecanismo" (Sumário Executivo, 2002, p. 45, grifo nosso).

"[...] A Aracruz recebeu oito autuações de órgão ambientais em 2003, relacionadas a operações florestais, portuárias e destinação de resíduos" (Sumário Executivo, 2003, p. 31, grifo nosso).

"[...] Questões ambientais, como poluição do ar, da água do mar e odor, responderam pelas percepções negativas da imagem da empresa" (Sumário Executivo, 2004, p. 14, grifo nosso).

"[...] No Brasil, o ambiente foi marcado pela crise política e por um crescimento do PIB aquém das expectativas, da ordem de 2,5%, muito inferior aos 5% registrados em 2004" (Mensagem da Administração, 2005, grifo nosso).

"[...] Infelizmente, a disputa de terras com as comunidades indígenas do Espírito Santo, que reivindicam ampliação de sua reserva em mais 11 mil hectares, quase que totalmente em áreas florestais da Empresa, agravou-se em 2006, com invasões de propriedades da Aracruz e a destruição de mais de 170 hectares de plantios de eucalipto" (Sumário Executivo, 2006, p. 4, grifo nosso).

"[...] Para dar coesão e propiciar uma melhor percepção da Empresa em relação ao seu compromisso com a responsabilidade socioambiental, reforçando a marca Aracruz como um ativo que corresponda à real contribuição da Companhia na geração de valor para a sociedade, foram desenvolvidos o conceito e a identidade visual Bem de Raiz" (Sumário Executivo, 2007, p. 33, grifo nosso).

E nos excertos a seguir, além de um notório juízo de valor realizado pelas palavras "intensificação" e "radicalização", o sujeito causativo da ação sobre a Aracruz é "a questão entre a Aracruz e as comunidades indígenas e quilombolas":

"[...] Deparamo-nos com questões delicadas, com destaque para a invasão de terras por membros das comunidades indígenas tupiniquins e guarani, que ocuparam 11 mil hectares de propriedade da Companhia, além de promover a invasão de um dos prédios administrativos da fábrica da Unidade Barra do Riacho (ES)" (Mensagem da Administração, 2005, grifo nosso).

"[...] O aumento da visibilidade decorreu, por um lado, da decisão estratégica de comunicar de forma mais transparente e proativa as questões sensíveis envolvidas nas operações, com destaque para as pressões por parte de movimentos que demandam terras e têm na Aracruz um de seus alvos principais" (Sumário Executivo, 2006, p. 36, grifo nosso).

"[...] A complexidade de algumas dessas questões, associada ao contexto político do país, requer de todas as partes envolvidas um grande esforço para a sua solução" (Sumário Executivo, 2006, p. 81, grifo nosso).

"[...] A intensificação e a radicalização dos conflitos promovidos por esses movimentos também contribuíram para a maior exposição da Empresa na mídia, notadamente as invasões de áreas e instalações da Companhia por índios, no Espírito Santo, e ações de vandalismo no viveiro e laboratório de pesquisa da Empresa, no Rio Grande do Sul" (Sumário Executivo, 2006, p. 36, grifo nosso).

"[...] Outra questão que também se insere no contexto geral de conflitos agrários no País e que também afeta a Aracruz diz respeito às Comunidades descendentes de quilombolas" (Sumário Executivo, 2007, p. 84, grifo nosso).

"[...] Esta questão, que é a mais crítica enfrentada atualmente pela Aracruz, agravou-se em 2006, em paralelo ao acirramento das disputas envolvendo a propriedade de terras no Brasil. Diversas empresas tiveram áreas invadidas ou atividades paralisadas, por conta de ações promovidas por comunidades indígenas, descendentes de quilombolas e movimentos de trabalhadores a favor da reforma agrária" (Sumário Executivo, 2007, p. 81, grifo nosso).

"[...] As reivindicações de movimentos pela demarcação de terras para comunidades de descendentes de quilombolas são uma questão nova, que tem importância nacional e ocorre em 24 estados brasileiros, afetando desde proprietários privados urbanos e rurais até grandes empresas, entre elas a Aracruz" (Sumário Executivo, 2007, p. 81, grifo nosso).

Percebe-se que a empresa alterna o uso de voz ativa e voz passiva justamente nas transições de situações que envolvem contextos positivos para contextos negativos à sua imagem.

Eis alguns excertos que reforçam tal observação:

"[...] A Aracruz, evidentemente, não ficou imune a este cenário. No início do ano já se percebia um desbalanceamento entre oferta e demanda de celulose no mercado global, mas esperava-se que este fosse um problema superável se houvesse disciplina na oferta por parte dos produtores" (Sumário Executivo, 2001, p. 1, grifo nosso).

"[...] Foram incendiados mais de 170 hectares, com prejuízos da ordem de R$ 2,5 milhões. No mesmo mês, uma manifestação em favor da Empresa reuniu mais de cinco mil pessoas no município de Aracruz (ES), em repúdio aos atos de violência promovidos por membros das comunidades indígenas" (Sumário Executivo, 2006, p. 14, grifo nosso).

"Ao longo do ano, a Aracruz enfrentou turbulências decorrentes do quadro institucional do Espírito Santo, o qual foi objeto de ampla cobertura pela imprensa brasileira e internacional. Entre as conseqüências para a Aracruz, podem-se citar a instalação de uma Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) pela Assembléia Legislativa local para apurar alegadas irregularidades no licenciamento da empresa - a qual encerrou seus trabalhos sem um relatório conclusivo; uma lei que proibia o plantio de eucalipto para produção de celulose, declarada inconstitucional pelo Supremo Tribunal Federal em decisão liminar; e um projeto de lei que proibia o plantio de espécies florestais exóticas, vetado pelo governador do Estado" (Sumário Executivo, 2002, p. 23, grifo nosso).

"[...] Conflitos - Dando continuidade a um processo iniciado em 1998, as comunidades indígenas tupiniquim e guarani demandaram a ampliação de sua reserva em 11 mil hectares, e, com esse objetivo, invadiram as terras da Companhia, em maio, e a fábrica em Barra do Riacho, em outubro. Após a obtenção de liminar de reintegração de posse, a fábrica foi desocupada sem nenhum transtorno adicional. Um Grupo de Trabalho da Funai foi constituído para examinar a ampliação da reserva" (Sumário Executivo, 2005, p. 36, grifo nosso).

"[...] Empresas de papel e celulose, como a Aracruz, que têm plantios próprios para o suprimento de matéria-prima, vêm enfrentando problemas com essas carvoarias ilegais. [...] A questão vem se agravando nos últimos tempos, em especial no sul da Bahia e no norte do Espírito Santo, com impactos diretos sobre a Aracruz e outras empresas que operam nestas regiões, por conta de atos como furto de resíduos e de madeira e incêndios florestais" (Sumário Executivo, 2006, p. 82, grifo nosso).

A maior frequência dos advérbios de intensidade, de tempo e de modo e do uso de construções verbais modalizadoras, circunstanciou e intensificou suas atitudes. Há um distanciamento de uma posição de neutralidade, na qual o sujeito não informa apenas suas realizações ou planos, mas reforça suas opiniões pessoais. Os excertos abaixo foram escolhidos como ilustração:

"[...] Apesar do cenário adverso, a Aracruz conseguiu aumentar em 6% seu volume de vendas e manter sua posição de liderança nos principais mercados consumidores" (Sumário Executivo, 1998, p.1, grifo nosso).

"[...] Os plantios florestais também têm contribuído para reduzir a destruição das florestas nativas tropicais e, conseqüentemente, aumentado o prestígio e o potencial do Brasil como uma das regiões mais importantes do mundo para o suprimento de produtos florestais" (Mensagem da Administração, 2000, grifo nosso).

"[...] A queda na demanda por papel e conseqüentemente por celulose, no entanto, foi muito maior que a esperada e os preços mergulharam numa espiral de baixa acentuada, estancada quando atingiram níveis inferiores ao custo operacional dos produtores de maior custo" (Sumário Executivo, 2001, p. 9, grifo nosso).

"Apesar de a performance econômica ter superado as expectativas, restam preocupações quanto a algumas questões, sobretudo os índices de inflação, o alto nível da dívida pública interna, a elevada e persistente taxa de desemprego, as dificuldades do Governo em obter consenso para a implementação de reformas vitais, e os resultados inferiores aos previstos na balança comercial" (Mensagem da Administração, 1999, grifo nosso).

"[...] Ainda na área social, cabe destacar a revisão do acordo com as comunidades indígenas tupiniquim e guarani do Espírito Santo. Além de elevar substancialmente os recursos destinados a projetos de geração de renda, a Aracruz comprometeu-se a custear bolsas de estudo de universitários indígenas, desenvolver um plano de empregabilidade para a comunidade, apoiar estudos e obras de recuperação de rios, assim como um plano de reflorestamento com essências nativas" (Sumário Executivo, 2002, p. 21, grifo nosso).

"[...] A Aracruz tomou as medidas legais cabíveis com as instituições responsáveis, e adotou outras ações para esclarecer suas posições. Entre elas, merece destaque um esforço redobrado de comunicação com os empregados e com outros públicos estratégicos da Empresa, no Brasil e no exterior" (Sumário Executivo, 2005, p. 36, grifo nosso).

"[...] A partir de setembro de 2006, com o objetivo de pressionar a decisão do Ministério da Justiça, os Índios e os representantes de movimentos sociais (tais como o Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra) causaram uma série de invasões e incêndios intencionais nas nossas terras, tendo destruído cerca de 200 hectares de plantios, interrompendo estradas e ameaçando empregados da Companhia" (Sumário Executivo, 2006, p. 76, grifo nosso).

"[...] A presença da Aracruz na mídia voltou em 2007 ao nível histórico dos últimos anos. O Índice de Visibilidade positiva caiu cerca de um terço em relação a 2006, ano em que a exposição crescera quase 50% por conta de episódios relacionados a demandas e conflitos por terras de propriedade da Empresa e, também, da estratégia corporativa de tornar público, de forma proativa, seu posicionamento sobre estas questões. Em 2007, a Companhia teve a menor visibilidade negativa desde que este levantamento é realizado (1998)" (Sumário Executivo, 2007, p. 35, grifo nosso).

Os adjetivos subjetivos e suas locuções, por sua vez, deram tom emotivo ao discurso da instituição, dramatizando o falante, neste caso a empresa, com sentimentos e opiniões pessoais.

"[...] Temos um sólido balanço patrimonial, custos extremamente baixos, produtos de alta qualidade, contratos de longo prazo com grandes clientes globais, um sólido relacionamento entre os acionistas controladores e, ainda mais importante, um quadro gerencial e técnico de alta capacidade, que conduziu a empresa com sucesso pelo período difícil que acaba de se encerrar e preparou-a para aproveitar plenamente o cenário favorável que agora esperamos encontrar" (Mensagem da Administração, 1999, grifo nosso).

"[...] A sucessão de eventos desencadeados durante 2001, entretanto, demonstrou como é difícil fazer previsões num mundo dominado por forças políticas e econômicas de impacto global" (Mensagem da Administração, 2001, grifo nosso).

"[...] Apesar de mantermos boas relações com a maioria das comunidades em que estamos presentes, há questões sensíveis que estamos tentando solucionar em benefício de todas as partes. A complexidade de algumas dessas questões, associada ao contexto político do País, requer de todas as partes envolvidas um grande esforço para sua solução" (Sumário Executivo, 2006, p. 81, grifo nosso).

"[...] O ambiente externo extremamente difícil ao longo de 2001 representou um constante desafio para o contínuo desenvolvimento das atividades da Aracruz" (Sumário Executivo, 2001, p. 1, grifo nosso).

"[...] Por maiores que sejam a ação empreendedora e a visão social de uma empresa, individualmente, sua ação não pode substituir a do Estado e superar todos os problemas" (Sumário Executivo, 2004, p. 24, grifo nosso).

"[...] Paradoxalmente, nos deparamos também com um dos conflitos mais sérios já vividos com comunidades vizinhas e movimentos sociais" (Mensagem da Administração, 2005, grifo nosso).

"[...] Apesar do excelente nível de satisfação quanto a esses aspectos, a Aracruz compreende que outros podem ser melhorados e serão foco de planos de ação específicos" (Sumário Executivo, 2007, p. 33 grifo nosso).

Os elementos coesivos mais evidentes foram observados no uso frequente de conjunções, preposições e locuções adverbiais e adjetivas. As conjunções são parte integrante de estratégias feitas pelo enunciador para a elaboração do sentido que se pretende (HALLIDAY e MATTHIESSEN, 2004).

Com relação a esses conectivos, observou-se que algumas orações poderiam ter sido formuladas sem eles, mas a sua presença adequada veiculou o sentido do texto de maneira mais clara.

Os excertos a seguir corroboram tal observação:

"[...] A Aracruz atua de maneira responsável e cumpre integralmente a legislação societária brasileira" (Sumário Executivo, 2003, p. 4, grifo nosso).

"[...] Uma vez que falharam as tentativas de resolver o conflito por meio do diálogo, a Empresa acredita que os instrumentos legais são o único caminho legítimo para que uma solução justa seja alcançada" (Sumário Executivo, 2006, p. 81, grifo nosso).

"[...] Em contraposição ao ambiente externo positivo, dois fatores foram determinantes para o fraco desempenho doméstico: a política monetária e a crise política. No primeiro caso, as taxas de juros mantiveram-se elevadas para conter a aceleração da inflação que se desenhava no terceiro trimestre de 2004. A crise política afetou a confiança de consumidores e empresários diante do risco de mudanças na política econômica, principalmente no tocante à austeridade fiscal. Seu efeito mais negativo, contudo, foi a paralisação no Congresso, das discussões em torno de reformas fundamentais para viabilizar novos investimentos e permitir a retomada sustentada do crescimento" (Sumário Executivo, 2005, p. 10, grifo nosso).

"[...] Apesar da continuidade das invasões de propriedades produtivas pelos movimentos que disputam terras -, os conflitos ocuparam menor espaço nos veículos de comunicação, em parte pela sua recorrência. [...] Em contrapartida, vale mencionar a redução das tensões devido às negociações realizadas com as comunidades indígenas, que resultaram no acordo firmado no final do ano" (Sumário Executivo, 2007, p. 34, grifo nosso).

"[...] A atenção da sociedade está crescentemente voltada para os impactos que as atividades empresariais podem ter na vida das pessoas e do planeta, e essas questões vêm sendo incorporadas aos relatórios anuais e de sustentabilidade das organizações. Entretanto, por conta do volume e complexidade de temas, torna-se fundamental identificar quais são considerados mais significativos - e, assim, mais tangíveis, ou materiais - para os diversos públicos com os quais as empresas interagem" (Sumário Executivo, 2007, p. 5, grifo nosso).

A análise geral dos resultados apresentou indícios de que a Aracruz Celulose S.A. escolhe conscientemente os elementos linguísticos dos textos apresentados no Sumário Executivo e na Mensagem da Administração, constituintes do seu relatório anual.

Os elementos linguísticos observados revelaram uma intenção comunicativa clara, motivada pelo contexto dos elevados custos políticos a que a empresa está sujeita. A alternância do uso de voz ativa e voz passiva, de acordo com o tema que está sendo discutido, é uma das evidências apresentadas e que pode ser associada ao gerenciamento da imagem corporativa.

De modo semelhante, a utilização de processos materiais para relatar ações da empresa, de processos relacionais para discutir os temas ligados aos conflitos com comunidades indígenas e de processos mentais para expor suas crenças e valores por intermédio de emoções humanas também evidencia uma tentativa de gerenciamento da imagem.

Conclusão

O objetivo neste estudo foi analisar a conexão entre as estruturas linguísticas apresentadas nas seções narrativas dos relatórios anuais corporativos e os custos políticos a que uma empresa específica estava submetida, a Aracruz Celulose S.A., no período de 1998 a 2007.

A discussão teórica legitimou a proposição de uma abordagem baseada na articulação entre a análise do discurso por meio da gramática funcional e as contribuições teóricas acerca dos custos políticos. Mediante essa proposição foi possível observar os resultados da aplicação da abordagem em questão na investigação dos relatórios da Aracruz Celulose S.A. Os resultados indicaram que, no lugar de apenas informar as suas realizações ou seus planos, a empresa tende a priorizar e a enfatizar sua identidade institucional ao intensificar, circunstanciar e reforçar suas atitudes. Esta proposição encontra respaldo na observação da associação entre o uso de determinados elementos linguísticos e o tema tratado no texto, conforme se discutiu na análise dos resultados. Percebeu-se que a mudança do eixo temático da discussão era associada à mudança nas estruturas linguísticas. Os temas mais sensíveis à imagem da empresa, como os conflitos com comunidades indígenas e quilombolas, foram apresentados por meio de estruturas linguísticas marcadamente diferentes das utilizadas para enfatizar as ações e realizações da empresa.

A despeito do gerenciamento da imagem da empresa, no eixo temático das mensagens relacionadas aos conflitos com as comunidades indígenas, foi notória a intenção de expor o ponto de vista institucional, impondo ao leitor, seu modo particular de perceber os fatos. Deste modo, fica explícito o desvio da neutralidade na apresentação de informações que podem afetar sensivelmente a imagem da empresa, de modo positivo ou negativo. O presente estudo evidenciou também que o nível de custos políticos a que a empresa está submetida influenciou a forma de apresentação das informações textuais nos seus relatórios anuais.

O método utilizado nesta pesquisa apresenta algumas limitações: a) as funções linguísticas identificadas não constituem todas as possibilidades; b) dado que a investigação foi realizada com apenas uma empresa, os resultados obtidos são específicos da firma estudada, ou seja, não podem servir de inferência para todas as empresas do setor; c) uma amostra de textos mais abrangente, decompondo todo o relatório anual, implicaria conclusões mais robustas, uma vez que as análises podem se alterar de um ano para o outro.

Com foco nessas limitações e na contribuição em torno do objetivo aqui abordado, cabe propor que estudos posteriores busquem identificar outras funções linguísticas nas narrativas, em períodos superiores aos adotados neste estudo. Tais alternativas permitiriam que estudos futuros oferecessem contribuições adicionais a respeito da relação entre o uso de recursos linguísticos nos relatórios anuais e os custos políticos.

Artigo submetido em 11 de julho de 2010

Aceito para publicação em 25 de março de 2011.

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  • Escolhas linguísticas, custos políticos e gerenciamento da imagem corporativa: o caso da Aracruz Celulose S.A.

    Linguistic choices, political costs and corporate image management: the case of Aracruz Celulose S.A.
  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      24 Jan 2012
    • Data do Fascículo
      Dez 2011

    Histórico

    • Recebido
      11 Jun 2010
    • Aceito
      25 Mar 2011
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