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Sistema computadorizado para deslocamento de amostra com motor de passo utilizando o L298: aplicação na técnica de varredura-Z

Computerized system for sample displacement with stepper motor using the L298: application in the Z-scan technique

Resumo

Neste trabalho vamos abordar uma nova tecnologia, de baixo custo, de controle de motor de passo via computador, a qual pode ser utilizada para movimentação de amostras. Mais especificamente, desenvolvemos um sistema de controle usando o módulo eletrônico comercial L298, que evita o uso de um circuito eletrônico tradicional complexo de múltiplos componentes discretos. Ademais, utilizamos um motor de passo acoplado em um estágio de translação para um experimento de óptica não linear de varredura-Z (Z-scan) em que se faz necessário o deslocamento preciso de amostras. Tanto para o controle de motor de passo quanto aquisição de dados, foi utilizado o dispositivo myDAQ, fabricado pela empresa National Instruments, que é um dispositivo de multifunções versátil e de custo não tão elevado que pode ser conectado ao computador via porta de comunicação USB. Neste trabalho estamos utilizando a linguagem de programação visual LabVIEW e estamos disponibilizando para download os programas necessários para a movimentação do motor de passo. Os circuitos descritos são de simples e fácil montagem, podendo ser úteis para estudantes, alunos de iniciação científica, técnicos de laboratório e até mesmo para pesquisadores formados.

Palavras-chave:
Labview; L298; Motor de Passo; myDAQ; Varredura-Z; Espectroscopia

Abstract

In this work, we show up a new technology of low-cost stepper motor control via computer, that can be used for moving samples. More specifically, we developed a control system using the commercial electronic module L298, which avoids the use of a complex traditional electronic circuit of multiple discrete components. In addition, we used a stepper motor coupled in a translation stage for a nonlinear optics experiment, Z-scan, in which the precise displacement of samples is required. For both the stepper motor control and data acquisition we used the myDAQ device, which is manufactured by National Instruments and, it is a versatile multifunction and not-so-high cost device that can be connected to the computer via USB communication port. In this work we are using the visual programming language LabVIEW and we are making available for download the necessary programs for the movement of the stepper motor. The circuits described are simple and easy to assemble and may be useful for students, undergrad researchers, laboratory technicians and even for trained researchers.

Keywords:
Labview; L298; Stepper Motor; myDAQ; Z-scan; Spectroscopy

1. Introdução

Em um grande número de experimentos na área de física, se faz o uso de dispositivos eletromecânicos para movimentação de amostras e módulos de multifunções para aquisição de dados. Neste sentido, para se manter um laboratório de pesquisa moderno, sua constante atualização com novas tecnologias é essencial. Para isso o domínio e entendimento do funcionamento dos dispositivos de aquisição de dados e módulos de controle de motores de passo são muito importantes. Atualmente, o desenvolvimento tecnológico tem permitido um melhor interfaceamento de módulos de multifunções e novos programas de computador mais amigáveis e intuitivos que podem ser constantemente atualizados e modernizados.

Para este trabalho, apresentamos uma nova tecnologia de baixo custo para interfaceamento de experimentos assistidos por computador utilizando o módulo de multifunções myDAQ [1][1] National Instruments, myDAQ - Dispositivo de aquisição de dados para estudantes, disponível em http://www.ni.com/en-us/shop/select/mydaq-student-data-acquisition-device?modelId=134166, acessado em 20/10/2018.
http://www.ni.com/en-us/shop/select/myda...
, da empresa National Instruments, que está disponível no Brasil para compra online e com desconto para professores e alunos universitários [2][2] http://brasil.ni.com/academia/mydaq, acessado em 20/10/2018.
http://brasil.ni.com/academia/mydaq...
. Este é um dispositivo de multifunções que possui diversas funcionalidades e tem LabVIEW como linguagem base de programação. Com uma linguagem visual de programação poderosa e intuitiva, diferente das outras linguagens textuais, LabVIEW utiliza ícones gráficos que são conectados utilizando fios em um diagrama, que faz com que os dados sejam transmitidos e analisados seguindo um fluxo. Não diferente de outras linguagens, LabVIEW possui vários tipos de dados, laços de controle (loop), construção de sub-rotinas (Sub VIs), programação por tratamento de eventos e uma vasta gama de funções matemáticas e de controle de fluxo. Esta é uma linguagem de programação de alto nível, tendo assim uma maior facilidade na programação de tarefas repetitivas. Ela é utilizada amplamente pelas universidades nos laboratórios de pesquisa e nas indústrias na área de automação e controle de processos.

O uso de motores de passo para movimentação de amostra nos proporciona o controle preciso de sua posição e velocidade. Por isso, utilizaremos um motor de passo bipolar, que possibilita uma resolução de 1,8 graus por passo. Trata-se de um motor de baixo custo que pode ser adquirido online por um preço médio de US$ 15,00. Para o controle de corrente desse motor, utilizamos um módulo comercial de controle de alta corrente L298 [3][3] http://www.dx.com/p/lson-l298n-stepper-motor-driver-module-red-5-35v-312595#.VGs7GvTF, acessado em 11/01/2019.
http://www.dx.com/p/lson-l298n-stepper-m...
, que também pode ser adquirido online, e seu preço médio é de US$ 5,00.

2. Detalhes sobre motores de passo

Motores de passo são atuadores eletromecânicos que convertem um sinal digital pulsado em um movimento mecânico discreto (incremental), são amplamente utilizados em aplicações de controle industrial, robótica e instrumentação eletrônica. São motores DC, mas com a possibilidade de se controlar sua velocidade, direção e ângulo com extrema precisão. Com a tecnologia atual, podemos subdividir os passos de um motor em micro passos (microstepping), conferindo assim maior precisão no movimento [4][4] Wikipedia, Stepper motor, disponível em https://en.wikipedia.org/wiki/Stepper_motor, acessado em 20/10/2018.
https://en.wikipedia.org/wiki/Stepper_mo...
. Porém, para utilizar esta tecnologia, temos que utilizar um circuito integrado mais sofisticado e vários outros componentes discretos montados em uma placa de circuito, deixando o projeto mais complexo para a montagem e também aumentando seu custo. Neste trabalho não vamos nos aprofundar na construção dos motores de passo, e seus diversos tipos, já que estes estão bem documentados [5][5] A3967 Microstepping driver with translator, disponível em https://www.sparkfun.com/datasheets/Robotics/A3967.pdf.
https://www.sparkfun.com/datasheets/Robo...
. O que vamos abordar neste artigo são conceitos necessários para se entender o funcionamento eletrônico dos motores e informações de métodos de acionamento das bobinas para que se obtenha o adequado funcionamento.

Os motores de passo são encontrados em dois tipos: unipolar e bipolar[6][6] Desenvolvimento de um Controle para Motores de Passo, disponível em http://www.fotonica.ifsc.usp.br/pdfs/2010/Motor%20Passo.pdf.
http://www.fotonica.ifsc.usp.br/pdfs/201...
.

- motor unipolar: Este tipo de motor possui 5 fios (Fig. 1-A), sendo dois conjuntos de bobinas com uma derivação central (tap) em cada bobina. Este tipo apresenta como característica o fato de ter um torque menor, devido à energização da metade de cada bobina por vez.

- motor bipolar: possui quatro fios, sendo dois conjuntos de bobinas (Fig. 1-B). Esse tipo tem maior torque, justamente por energizar cada bobina por inteiro. Contudo, para este tipo de motor há a necessidade de se inverter o sentido da corrente de cada bobina em um determinado instante. Sendo assim necessário o uso de um circuito mais sofisticado para a inversão da corrente.

Figura 1
Esquema de ligação das bobinas dos motores de passo. A) Motor Unipolar, possui 5 fios; B) Motor Bipolar, possui 4 fios.

Neste trabalho vamos utilizar motores do tipo bipolar (4 fios). Os motores unipolares (5 ou 6 fios) também podem ser utilizados como bipolares, bastando para isso apenas isolar os dois taps centrais de cada bobina.

As configurações mais comuns são motores de passo que dão um giro de uma volta completa (360°) em 200 passos, com uma resolução de 1,8 graus por passo, e existem ainda aqueles com menor precisão que utilizam 48 passos por volta, resultando em uma resolução de 7,5 graus por passo.

Para o movimento contínuo do motor de passo, temos que energizar as bobinas seguindo uma sequência apropriada. Na Fig. 1, temos o esquema das bobinas dos motores, e seus terminais de ligação elétrica. Na Fig. 2 podemos observar as tabelas com a sequência de acionamento das bobinas. São apresentadas duas tabelas, sendo uma para movimentar o motor no modo de passo inteiro (full-step), o qual tem que andar 200 passos para poder percorrer uma volta completa do eixo, e outra tabela correspondendo ao modo de meio passo (half-step), que proporciona uma resolução maior do motor, que, neste caso, tem que andar 400 passos para percorrer uma volta completa.

Figura 2
Tabela com a sequência de acionamento das bobinas para o caso do motor bipolar. Na parte superior temos a tabela para passo completo (full-step) e na parte inferior temos a tabela para meio passo (half-step).

Podemos observar na tabela que existem dois fluxos no sentido da corrente. Essa inversão na corrente só é possível utilizando um circuito de controle mais sofisticado - neste trabalho utilizamos o drive de corrente L298, um circuito versátil que possui essa capacidade de inversão de corrente.

O que temos na tabela são as sequências de acionamento das bobinas dos motores. Observamos então que nos terminais 1a,1b da bobina 1, hora fica com o fluxo da corrente positivo (TF) e outra hora fica com o fluxo da corrente negativo (FT), fazendo assim a inversão da corrente.

3. Instruções de Montagem

Apresentamos aqui a montagem do controle de motor de passo. Para a montagem deste projeto (Fig. 3) temos apenas duas pequenas placas de circuitos dispostas em uma caixa plástica (46 x 87 x 98 mm). Uma das placas é o módulo de corrente L298, e a outra uma pequena fonte de tensão do tipo chaveada bi-volt, a qual fornece uma tensão de saída de 12 volts e corrente de até 1 ampere.

Figura 3
Fotografia da montagem, na esquerda temos a fonte de tensão de 12 volts e a direita o módulo de corrente L298.

Para a conexão entre o modulo de corrente e o módulo de aquisição de dados (myDAQ), usamos conectores do tipo DB9 (Fig. 4), que é um padrão adotado em nosso laboratório para conexão dos módulos. Outro conector DB9 é utilizado para o motor de passo. Na parte traseira temos um interruptor para ligar a fonte de alimentação. Outros tipos de conectores podem ser utilizados respeitando a necessidade do uso de até 5 fios ativos para o caso de motores unipolares.

Figura 4
Fotografia da caixa finalizada com um conector DB-9 para o motor de passo e outro para o módulo de aquisição de dados (myDAQ).

É importante lembrar que a ligação entre o módulo de corrente e o módulo de aquisição de dados (myDAQ) se faz com baixa tensão, usando padrão TTL (5 volts), que é o padrão dos sistemas digitais. Por outro lado, a ligação do controle do motor de passo ao motor, se faz usando uma tensão de 12 volts de alta corrente, com isso temos um isolamento da parte de alta corrente do motor de passo com o computador.

4. Conexão entre os módulos

Para a conexão entre os módulos, conectamos os terminais IN1 ao IN4 do módulo L298 aos pinos 0 à 3 do módulo myDAQ, juntamente com o terra (GND) entre os módulos, Fig. 5, de forma que apenas quatro linhas digitais do módulo de aquisição são utilizadas. Para a fonte de alimentação de 12 volts, utilizamos um eliminador de pilha de 1 ampere, para poder suprir a corrente necessária para acionamento do motor de passo.

Figura 5
Diagrama de conexão entre o módulo de aquisição e o módulo de corrente.

Podemos observar no diagrama esquemático (Fig. 5) as ligações elétricas entre os módulos. Utiliza-se poucos fios, o que torna a montagem e compreensão deste circuito bastante simples.

5. Módulo de corrente (L298)

Este módulo consiste de uma placa de circuito de aproximadamente 4,5 cm x 4,5 cm (Fig. 6), com a parte de potência em um único circuito integrado, possui terminais de conexão, os quais facilitam muito a ligação com outros módulos. Internamente possui dois circuitos em ponte H, possibilitando a ligação de cargas de até 35 volts e correntes de até 4 amperes. Circuitos em ponte H são muito utilizados para controle de motores, devido à sua característica de inverter o sentido da corrente que passa pelas bobinas dos motores de passo, podendo assim executar a sequência correta de acionamento das bobinas do motor de passo. O chip possui um dissipador de calor, evitando sobreaquecimento. Estes módulos possuem um baixo custo (US$ 5,00) e são de fácil aquisição [3][3] http://www.dx.com/p/lson-l298n-stepper-motor-driver-module-red-5-35v-312595#.VGs7GvTF, acessado em 11/01/2019.
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.

Figura 6
Módulo de corrente L298 para controle de motores de passo.

6. Detalhes sobre ponte H

O circuito denominado ponte H é amplamente utilizado em projetos de robótica, mecatrônica e automação. Este circuito é utilizado quando há a necessidade de controlar o sentido de rotação em um motor de corrente continua (DC). O sentido de rotação de um motor DC se dá justamente pelo sentido da circulação da corrente que passa através de seu enrolamento, ao inverter o sentido da corrente, também invertemos o sentido de rotação do motor. No projeto aqui abordado, a utilização da ponte H é adequada, pois, para movimentar o motor de passo, temos a necessidade de inverter o sentido da corrente nas bobinas num determinado instante, como foi visto na tabela da Fig. 2, o fluxo da corrente muda entre positivo e negativo ao longo da tabela, o que resulta em um movimento contínuo e uniforme do motor de passo.

Para demonstrar o funcionamento da ponte H, temos na Fig.7 a representação esquemática de apenas uma das duas utilizadas em nosso sistema, onde podemos observar quatro transistores bipolares e também, na parte central, uma das duas bobinas do motor de passo. O nome ponte H vem justamente da semelhança da letra H com disposição dos quatro transistores e na parte central uma bobina conectando os dois lados.

Figura 7
Quando nenhum transistor está acionado, a bobina está sem fluxo de corrente. Quando os transistores Q1 e Q4 estão acionados, o fluxo de corrente está no sentido indicado pela seta na cor azul (seta cheia). Quando os transistores Q2 e Q3 estão acionados, o fluxo de corrente flui no sentido contrário, indicado pela seta na cor verde (seta tracejada).

O funcionamento de uma ponte H é bem simples, temos que entender que os transistores bipolares funcionam como chaves que ligam e desligam o circuito. Ao dizer para o controle lógico que devemos ligar os transistores (chaves) Q1 e Q4, estamos fechando o circuito no qual o fluxo de corrente está sendo demonstrada com a seta na cor azul (seta cheia), no diagrama esquemático esta seta está no sentido da esquerda para a direita. Para a inversão do sentido da corrente, temos que desligar os transistores Q1 e Q4 e então ligar os outros dois transistores, Q2 e Q3. O sentido da corrente passa pela bobina do motor de passo em outro sentido, indicado pela seta na cor verde (seta tracejada), no diagrama esquemático esta seta está no sentido da direita para a esquerda. Para esta representação esquemática do fluxo da corrente nos transistores estamos utilizando o modelo de corrente convencional, o qual a corrente flui no sentido do terminal positivo (VCC) da alimentação até o terminal negativo (terra).

O diagrama interno do circuito de corrente L298 é mostrado na Fig. 8. Podemos observar nos detalhes [7][7] L298 Dual full-bridge driver, disponível em https://www.sparkfun.com/datasheets/Components/General/L298N.pdf
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que temos duas pontes H, ambas com a parte central conectada aos pinos de saída do circuito integrado. Uma, ponte H (A), com a parte central conectada aos pinos 2 e 3 e a outra, ponte H (B), aos pinos 13 e 14. Os circuitos que vemos no diagrama de bloco são circuitos lógicos de controle, estas portas lógicas protegem o circuito impedindo que os pares de transistores Q1;Q4 e Q2;Q3 sejam acionados simultaneamente. Se isso acontecer, estaríamos ligando a alimentação (VCC) diretamente ao terra, ocasionando um curto circuito.

Figura 8
Diagrama interno do circuito de controle de corrente L298. Nos detalhes temos a as duas pontes H, onde podemos observar que na parte central da ponte estão ligados os pinos 2 e 3 para a ponte A e os pinos 13 e 14 para a ponte B. Fonte: Adaptado de [7][7] L298 Dual full-bridge driver, disponível em https://www.sparkfun.com/datasheets/Components/General/L298N.pdf
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.

7. Dispositivo de aquisição (myDAQ)

Este dispositivo de aquisição e controle nos permite realizar interfaceamento de vários experimentos ao computador através da porta de comunicação USB, Fig. 9, proporcionando aquisição de sinais analógicos (A/D) com resolução de 16 bits e taxa amostral de 200 kS/s, também possui 8 linhas de entrada e saída digitais (I/O) no padrão TTL, sendo estas as que vamos utilizar para conexão ao módulo de corrente L298. O dispositivo é um módulo versátil que também possui duas saídas analógicas (D/A), às quais nos possibilitam sintetizar sinais analógicos tais como ondas senoidais, triangulares, dente de serra, entre outros, podendo assim ser utilizado também como um gerador de funções.

Figura 9
Módulo de aquisição myDAQ da empresa National Instruments, conectado ao computador via USB. Possui conector lateral com várias saídas digitais e entradas analógicas.

Este módulo de multifunções possui muitas outras funcionalidades [1][1] National Instruments, myDAQ - Dispositivo de aquisição de dados para estudantes, disponível em http://www.ni.com/en-us/shop/select/mydaq-student-data-acquisition-device?modelId=134166, acessado em 20/10/2018.
http://www.ni.com/en-us/shop/select/myda...
, permitindo sua utilização em diversas atividades na área de instrumentação e automação eletrônica como também em experimentos e pesquisas de física.

8. Programa para controle dos motores

O programa de controle do sistema foi desenvolvido utilizando a linguagem gráfica de programação LabVIEW, da empresa National Instruments, devido à sua simplicidade e programação intuitiva. É uma linguagem de alto nível, que utiliza como conceito principal o fluxo de dados. LabVIEW permite o desenvolvimento de algoritmos de forma simples, utilizando apenas ícones e elementos gráficos para representação de comunicação entre o computador e a interface de aquisição. O programa que apresentamos contém as tabelas com a sequência de acionamento das bobinas do motor de passo, a qual faz o motor girar de forma contínua e controlada. Como podemos observar na Fig. 10, temos duas tabelas, uma tabela de passo inteiro (full step), e outra de meio passo (half step).

Figura 10
Tela do subprograma para controle do motor de passo (Motor-L298.vi), temos as tabelas com a sequência de acionamento das bobinas do motor de passo.

O intuito de fazer essa parte do controle de acionamento do motor, dentro da programação em LabVIEW, é de justamente deixar o circuito o mais simples possível, não havendo a necessidade de componentes adicionais, como um microcontrolador contendo toda esta lógica de tabelas e controle de acionamento das bobinas do motor de passo. O fato de não utilizar um microcontrolador no projeto, permite diminuir os custos e também deixar o projeto muito mais simples. Todos os arquivos e programas desenvolvidos neste artigo estão disponíveis no repositório Github https://github.com/andretec/Stepper-motor-L298-myDAQ).

Sendo LabVIEW uma linguagem modular, o que fazemos é utilizar o programa da Fig. 10 (Motor-L298) como um subprograma (sub VI) dentro do programa principal. Na Fig. 11 temos o painel frontal (Front Panel), sendo esta a interface do usuário, onde o usuário entra com as informações como número de passos, tempo entre passos e sentido de rotação do motor. O painel frontal nos permite colocar componentes visuais de entrada de valores, tais como botões e componentes de entrada de números, além de também poder colocar indicadores que se assemelham à luzes (LEDs). Com um visual claro e intuitivo através deste painel faz-se a interação com o usuário.

Figura 11
Tela do painel frontal do programa do motor de passo (Motor-L298.vi)

Na Fig. 12 apresentamos a tela do diagrama de blocos (Block Diagram) do programa teste (test – Motor.vi). Nesta parte do programa é onde fazemos a ligação dos blocos e componentes. O programa é bem simples, possui um laço infinito no qual a tarefa executada termina somente com a intervenção do usuário clicando no botão “stop”. O programa de controle está ao centro deste laço (ícone Motor L298) e nele estão definidos uma constante de 200 passos, que está ligada ao terminal “number of steps”, e um terminal de controle que está ligado ao “time between steps”, que define o intervalo de tempo entre os passos. Estão ligados ainda o terminal onde definimos os pinos de saída da placa de aquisição e também o terminal de sentido de rotação do motor de passo. Observe que existe uma constante ligada fora do laço, está definida inicialmente como “false” (F) e ao longo do programa esta variável muda seu valor para “true” (T), isto se dá através do componente de inversão digital conectado logo em seguida na linha verde.

Figura 12
Diagrama do programa de teste do controle do motor de passo (test – Motor.vi)

Essa linha verde indica um sinal do tipo booleano (true/false), ela está conectada ao terminal de sentido de rotação do motor de passo. O programa então funciona girando o motor de passo por uma volta completa em um sentido e depois fazendo o mesmo em outra direção, e faz isso indefinidamente.

9. Aplicação

São várias as aplicações deste sistema para controle de motores de passo. Essas aplicações vão desde sistemas de microfabricação até técnicas de caracterização óptica não linear ou qualquer outro experimento que envolva um deslocamento controlado de uma amostra, espelho, monocromador, etc. Aqui apresentamos como aplicação uma medida de varredura-Z, onde a movimentação da amostra foi realizada com o sistema que desenvolvemos. Escolhemos a técnica de varredura-Z por ser simples e amplamente utilizada na área de óptica não linear.

10. Técnica de varredura-Z

A técnica de varredura-Z (Z-scan tecnique[8][8] M. Sheik-Bahae, A.A. Said, T. Wei, D. Hagan e E.W. van Stryland, IEEE J. Quantum Electronics 26, 760 (1990).) é uma técnica bastante utilizada para medir-se propriedades ópticas não lineares de amostras sólidas e líquidas. Um trabalho didático que contém mais informações a respeito pode ser encontrado na referência [9][9] C.R. Mendonça, L. Misoguti, F.F. Dall' Agnol e S.C. Zilio, Revista Brasileira de Ensino de Física, 21, 272 (1999).. Nesta técnica a amostra desloca-se ao longo do eixo de propagação (considerado como sendo o eixo Z, daí o nome varredura-Z) de um feixe laser focalizado, passando pelo ponto focal, veja Fig. 13. Se a intensidade do laser for suficientemente alta, nas proximidades do ponto focal, vemos que a amostra passa a comportar-se como uma lente e este efeito de lente induzida é um efeito óptico não linear. Basicamente, um meio óptico não linear trans parente apresenta a seguinte expressão para o índice de refração:

n = n 0 + n 2 I

em que n0 é o índice de refração linear, n2 o índice de refração não linear e I a irradiância. Sendo assim, para situações em que I é relativamente pequeno, o termo n2I é desprezível e o índice de refração do material pode ser tido como sendo igual ao índice de refração linear, n0. Porém, para valores suficientemente altos de I, o efeito não linear torna-se significativo e pode-se observar então o efeito de lente induzida. Isso ocorre porque se considerarmos o perfil transversal de irradiância do feixe laser como sendo Gaussiano, podemos dizer que o termo n2I também comporta-se como uma Gaussiana, apresentando valor máximo no centro do feixe e diminuindo para as bordas. Isso leva a uma variação no índice de refração efetivo n, veja equação (1). Esta variação no índice de refração faz com que o material se comporte como uma lente convergente (caso n2 seja positivo) ou divergente (caso n2 seja negativo).

Figura 13
Aparato experimental da técnica de varredura-Z.

No experimento mede-se, com um fotodetector, a potência transmitida por uma íris (abertura) posicionada após a amostra, como indicado na Fig. 13. Para o caso em que n2 é positivo, ao movermos a amostra em direção ao foco (z =0), ela passa a se comportar como uma lente convergente. Assim, quando a amostra está na região pré-foco (z<0), ela causa um aumento na divergência do feixe na posição da íris, diminuindo a magnitude do sinal coletado pelo fotodetector, Fig. 14 (a). Por outro lado, quando a amostra está na região pós-foco (z>0), ela diminui a divergência do feixe na posição da íris, aumentando assim o sinal coletado pelo fotodetector, Fig. 14 (b).

Figura 14
Caso n2>0. a) amostra antes do foco. b) amostra depois do foco. A linha contínua indica o traçado do feixe no caso em que não há efeito não linear. A linha tracejada indica a mudança na divergência do feixe causada pelo efeito não linear que ocorre devido à interação do laser com a amostra.

Em uma curva típica de varredura-Z, a potência transmitida pela íris para cada posição z de varredura da amostra, P(z), é dividida pela potência transmitida quando a amostra está distante do foco, P(z), onde os efeitos não lineares não estão presentes, de forma que a contribuição dos efeitos lineares é eliminada. Assim, obtemos uma quantidade T(z)=P(z)/P(z) que é denominada de transmitância normalizada.

A curva apresentada na Fig. 15 com um vale na região pré-foco seguido de um pico na região pós-foco é um típico sinal de varredura-Z para o caso de uma não linearidade refrativa positiva, n2>0. Uma curva inversa é obtida para o caso em que n2<0, ou seja, um pico pré-foco seguido de um vale pós-foco. Os extremos da transmitância normalizada, ou seja, os valores de vale e pico dependem do valor de n2. Essencialmente, n2 é proporcional à diferença entre a transmitância normalizada no pico e no vale, ΔTpv.

Figura 15
T(z) em função da posição da amostra, n2>0.

11. Medida experimental utilizando o novo sistema

Para o nosso teste, preparamos uma solução de DR13 (Disperse Red 13) em que usamos metanol como solvente. Como fonte de luz foi utilizado um feixe de laser contínuo em λ = 532 nm de um laser de Nd:YVO4 bombeado por diodos, dobrado em frequência. A focalização do feixe foi feita com uma lente convergente com distância focal de 5 cm (Fig. 17) e a transmitância foi coletada em um detector de silício (PIN). Realizamos o deslocamento da amostra com o controle de motor de passo desenvolvido neste projeto. Podemos observar na Fig. 17 que o estágio de translação está acoplado ao motor de passo através de uma correia dentada. A configuração mecânica do sistema de translação desloca 0,26 mm com 80 passos na configuração passo-completo (full step) ou 0,13 mm na configuração meio-passo (half step). Aqui realizamos o experimento no sistema de passo-completo. O resultado obtido é apresentado na Fig. 16, em que nota-se claramente uma curva característica de uma não linearidade negativa (pico na região pré-foco seguido de um vale na região pós-foco). Este sinal negativo da não linearidade está associado à origem térmica do efeito não linear medido em nosso experimento e, neste caso, o material comporta-se como uma lente divergente.

Figura 16
T(z) para uma amostra de DR13. O deslocamento em Z foi realizado com o controle de motor de passo desenvolvido com módulo L298.
Figura 17
Foto do estágio de translação com o suporte de amostra na montagem do experimento de varredura-Z.

Com os dados da curva experimental e as expressões teóricas da técnica de varredura-Z, ver referência [9][9] C.R. Mendonça, L. Misoguti, F.F. Dall' Agnol e S.C. Zilio, Revista Brasileira de Ensino de Física, 21, 272 (1999)., é possível obter parâmetros do feixe como cintura, comprimento Rayleigh e também irradiância (desde que se saiba o valor da potência do feixe na amostra), além do valor do índice de refração não linear, n2, do material. Não apresentamos estes cálculos, pois foge da proposta deste trabalho. Nosso objetivo principal aqui foi mostrar a parte eletrônica de controle de motor de passo utilizando o L298 e sua interligação com um computador.

12. Conclusão

Em resumo, o intuito deste trabalho foi mostrar que é possível simplificar a construção de um controle de motores de passo com o uso do L298. O uso deste componente eletrônico único evita a construção de circuitos eletrônicos mais complicados e complexos com microcontroladores e vários transistores de potência montados em uma placa de circuitos. Ademais, mostramos também o uso de um módulo de aquisição de dados mais simples (myDAQ) e linguagem LabVIEW com interfaces amigáveis para um experimento de varredura-Z, em que se utiliza um motor de passo para translação de amostras.

Agradecimentos

Gostaríamos de agradecer ao Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq), à Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (FAPESP) pelo suporte financeiro, ao Instituto de Física de São Carlos e ao Grupo de Fotônica pela infraestrutura necessária para o desenvolvimento deste projeto.

Referências

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    18 Abr 2019
  • Data do Fascículo
    2019

Histórico

  • Recebido
    26 Jan 2019
  • Aceito
    28 Fev 2019
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