RESUMO
O modelo de negócio de cooperativa de táxis foi modificado com a proliferação de aplicativos móveis. O objetivo desta pesquisa foi verificar como se deram as mudanças em um modelo de negócio num cenário de inovação, potencializado pelo uso da tecnologia. A Solução Conceitual Pluralista e Multinível foi a lente teórica selecionada para um estudo qualitativo que abrangeu as cidades de São Paulo e Curitiba. Foram entrevistados usuários e gestores de cooperativas e aplicativos, bem como taxistas. A contribuição mais significativa do trabalho é a demonstração de como a tecnologia pode modificar um modelo de negócios estabelecido.
Palavras-chave
Aplicativos de rádio táxis; Cooperativa de táxis; Tecnologia da informação; TIC; Modelo de negócio
ABSTRACT
Proliferation of mobile applications modified the taxi cooperative business model. The objective of this research was to verify how the changes in such business model occurred in a scenario of innovation, enhanced by the use of technology. The Pluralist and Multilevel Conceptual Solution was the theoretical lens selected for a qualitative study that covered the cities of São Paulo and Curitiba. Users and managers of cooperatives and applications were interviewed as well as taxi drivers. The most significant contribution of the work is the demonstration of how technology can modify an established business model.
Keywords
Radio taxi applications; Taxi cooperative; Information technology; ICT; Business model
Introdução
As mudanças que o uso das tecnologias da informação e comunicação têm provocado em modelos de negócios estabelecidos vêm atraído a atenção de pesquisadores ao redor do mundo (Majors, 2010Magretta, J. (2002). Why Business Models Matter, Harvard Business Review, 80(5), pp. 86-92; Mahajan et al., 2015Mäkinen, S., and Seppänen, M. (2007).Assessing business model concepts with taxonomical research criteria: A preliminary study. Management Research News, 30(10), 735-748.; Yan, 2015Wirtz, B. (2010). Business Model Management. Design, Instrumente, Erfolgsfaktoren von Geschäftsmodellen [Design, instruments and success factors of business models], Wiesbaden, Gabler., Stanimirovic & Vintar, 2015Rentmeister, J., and Klein, S. (2003). Geschäftsmodelle - ein Modebegriff auf der Waagschale. In Die Zukunft des Electronic Business (pp. 17-30). Gabler Verlag., Loebbecke & Picot, 2015Loebbecke, C., & Picot, A. (2015). Reflections on societal and business model transformation arising from digitization and big data analytics: A research agenda. The Journal of Strategic Information Systems, 24(3), 149-157. ). Inovação requer a adoção de novos modelos de negócio, que favoreçam o compartilhamento de tecnologia (Chesbrough, 2006Chesbrough, H. (2006). Open business models: How to thrive in the new innovation landscape. Harvard Business Press), e estes surgem como consequência da remodelagem de atividades e capacidades (Gambardella & McGahan, 2010Gambardella, A. and McGahan, A. M. (2010) Business-model innovation: general purpose technologies and their implications for industry structure. Long Range Planning, 43(2), pp. 262-271). A tecnologia é vista como um meio de viabilizar um modelo negocial, mais do que como um componente do modelo em si. Entre os estudos realizados, o uso de tecnologia móvel, e em celulares, é particularmente interessante para o Brasil, dada a sua taxa de adoção. Nos países em desenvolvimento a taxa de adoção é alta, no Brasil especialmente.
No âmbito da tecnologia móvel, os aplicativos de geolocalização vêm ganhando espaço. Entre outras possibilidades, auxiliam os usuários a se deslocarem nas cidades, permitem a localização mais precisa de um endereço, identificam rotas de congestionamento e localizam um táxi disponível próximo ao usuário. Os aplicativos de celulares estão agindo sobre modelos de negócio temporalmente bem estabelecidos, como o das cooperativas de táxis com centrais de rádio, que veem sua forma de atuar se transformar e assistem à migração de seus taxistas e clientes para aplicativos móveis de táxis. As alterações no negócio são sentidas por passageiros e taxistas. Algumas destas alterações são esperadas, como melhoria no tempo de atendimento dos passageiros, mas há mudanças inesperadas. Em São Paulo, as cooperativas reivindicaram uma fiscalização maior de taxistas em relação ao município onde estão atuando, de maneira a assegurar que atendam passageiros apenas na cidade onde possuem alvarás (Gasparin, 2014Gasparin, G. (2014) “Sobe uso de aplicativos para táxi e cooperativas pedem regulamentação”. http://g1.globo.com/economia/noticia/2014/02/sobe-uso-de-aplicativos-para-táxi-e-cooperativas-pedem-regulamentacao.html Ultimo acesso em 27/11/2014
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). Em Curitiba, fiscais da entidade reguladora de transportes da cidade, Urbs - Urbanização de Curitiba S.A., multaram taxistas que usavam os aplicativos por considerarem esta prática incorreta (Al’Hanati, 2014Al’Hanati, Y. (2014) Taxistas são punidos por usar aplicativo. http://www.gazetadopovo.com.br/vida-e-cidadania/taxistas-sao-punidos-por-usar-aplicativo-9fc54dbs1z20p2olz4053w40e Último Acesso em 02/02/2016.
http://www.gazetadopovo.com.br/vida-e-ci...
). O modelo de serviços de cooperativa de táxis com central de rádio é tradicional no país, está em constante transformação e é um contexto rico que favorece a investigação.
O problema de pesquisa foi delineado com o objetivo de verificar como se dão as mudanças em um modelo de negócio num cenário de inovação, potencializado pelo uso da tecnologia. Esta pesquisa estudou cooperativas de táxis nas cidades de Curitiba e São Paulo e analisou as mudanças ocorridas após a proliferação de aplicativos de táxis em celulares. O estudo de caso foi a abordagem de pesquisa utilizada, orientado pelo modelo conceitual de Pozzebon e Diniz (2012Pozzebon, Marlei., Diniz, E. and Jayo, M. (2009) Adapting the Structurationist Viewo f Technology for Studies at the Community/Societal Levels” in Handbook of Research on ContemporaryTheoretical Models in Information Systems, Yogesh K. Dwivedi, Banita Lal, Michael D. Williams, Scott L. Schneberger, and Michael Wade (eds), Hershey/London, Information Science Reference, p. 18-33), que permite avaliar o impacto do uso de tecnologia em diferentes níveis de análise em um mesmo contexto.
Este estudo faz duas contribuições principais. Primeiro, de um ponto de vista substantivo, os resultados mostram como a tecnologia impactou o negócio: a modificação intrínseca de um modelo de negócio estabelecido, as oportunidades de disponibilização do serviço da empresa para outros segmentos, por meio de melhoria da proposta de valor, a oferta de um novo canal de entrega, o estabelecimento de novas relações com os clientes, e a redução e a simplificação da estrutura de custos percebida pelos agentes. O modelo se adequa às novas oportunidades, mas também tenta reforçar suas fontes tradicionais de vantagem competitiva. Do ponto de vista teórico, o estudo ilustra a validade de se utilizar um modelo que combine diferentes níveis de análise - individual, neste caso os passageiros e motoristas, organizacional, as cooperativas, e mesmo societal, ao evidenciar as modificações das agências governamentais/reguladoras sobre um negócio em transformação.
Modelos de Negócio
O conceito de “modelo de negócio” vem sendo desenvolvido no tempo e após o advento da internet, nos anos 90, tornou-se predominante e ganhou força (Zott et al, 2010Zott, C. & Amit, R. (2010) Designing your future business model: An activity system perspective. Long Range Planning, 43, pp. 216-226). Wirtz (2010Weill, P. and Vitale, M. (2001) Place to Space: Migrating to eBusiness Models. Boston: Harvard Business Press) afirma que, nos anos 70, o conceito tinha um foco tecnológico; nos anos 90 o foco do conceito de modelo de negócio migrou para uma abordagem teórica organizacional; nos anos 2000 passou a dar ênfase à estratégia do negócio e, mais recentemente, o conceito de gerenciamento de negócios é visto como uma abordagem integrativa das atividades da organização (Figura 1).
Um dos maiores impactos do uso das TICS (Tecnologias da Informação e Comunicação) é o aumento das opções de modelos de negócio que uma empresa pode adotar, visando a redução de custos transacionais e de gestão, e tendo a internet como um dos principais fatores do aumento de interesse em modelos de negócio (Osterwalder, 2004ONU (2014) World Urbanization Prospects ONU (2014) World Urbanization Prospects http://esa.un.org/unpd/wup/
Ultimo acesso em 25/06/2016
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; Ghaziani & Ventresca, 2005Ghaziani, A., and Ventresca, M. J. (2005, December). Keywords and cultural change: Frame analysis of business model public talk, 1975-2000. In Sociological Forum. 20(4). pp. 523-559 .Kluwer Academic Publishers - Plenum Publishers.; Magretta, 2002Magretta, J. (2002). Why Business Models Matter, Harvard Business Review, 80(5), pp. 86-92). A competitividade pressiona as empresas a buscar o aumento dos lucros, em geral obtido pelo aumento nas vendas ou pela redução de custos. A redução de custos pode ser obtida pelo aumento do uso de tecnologia, seja em processos de integração com o cliente ou de trabalho colaborativo com parceiros. A adoção de tecnologia contribui para que o trabalho colaborativo seja potencializado, para o aumento da proposta de valor e para a utilização de múltiplos canais de interação com o cliente, propiciando, assim, um novo modelo de receitas. Dessa maneira, força as empresas a se reestruturarem, pois existe um aumento da complexidade do negócio e, consequentemente, da quantidade de stakeholders (Osterwalder, 2004Osterwalder, A. (2004) The Business Model Ontology: A Proposition in a Design Science Approach. PhD Dissertation, University of Lausanne, Switzerland). Rentmeistere Klein (2003Rappa, M. (2001). Managing the digital enterprise-Business models on the Web. North Carolina State University, 2002) identificaram a existência de novos métodos de modelagem de negócio, e pesquisadores se dedicaram a estudar modelos de negócio para empresas na era digital (Pateli & Giaglis, 2003Osterwalder, A., Pigneur, Y. & Tucci, C. L. (2005).Clarifying business models: Origins, present, and future of the concept. Communications of the association for Information Systems, 16(1), 1; Applegate, 2001Applegate, L. M. (2001) E-business Models: Making sense of the Internet business landscape in G. Dickson & G. Desanctis (eds.) Information Technology and the Future Enterprise: New Models for Managers, Englewood Cliffs, NJ: Prentice-Hall, pp. 49-101; Afuah & Tucci, 2001Afuah, A. and Tucci, C. L. (2001) Internet business models and strategies: Text and cases. Boston: McGraw-Hill Higher Education; Chesbrough & Rosenbloom, 2002Chesbrough, H. & Rosenbloom, R. S. (2002) The role of the business model in capturing value from innovation: evidence from Xerox Corporation's technology spin‐off companies. Industrial and Corporate Change, 11(3), pp. 529-555).
De maneira simplificada, o termo “modelo negocial” deve representar o racional de como uma organização cria, entrega e captura valores com o objetivo de obter lucro (Osterwalder & Pigneur, 2010Osterwalder, A. (2004) The Business Model Ontology: A Proposition in a Design Science Approach. PhD Dissertation, University of Lausanne, Switzerland). Ainda não existe uma definição única para modelo de negócios e o termo é associado a diversos conceitos. Entre outras definições, é descrito na literatura como uma declaração de como a empresa vai se sustentar no longo prazo, como uma representação gráfica do relacionamento de variáveis de decisão, como um padrão de organização de custos e fontes de receitas, ou mesmo como um relacionamento causal de vários componentes do negócio, tais como clientes, concorrentes, oferta, atividades e organização, fatores de fornecimento e produção, bem como, gestão. A amplitude da utilização deste termo na literatura é evidenciada no Quadro 1.
As definições de modelo de negócio diferem em suas características, componentes e relacionamentos. O lucro e o benefício potencial - ou valor agregado - são as dimensões mais referenciadas, além da vantagem competitiva, estratégia ou como a empresa executa sua estratégia, estrutura da empresa e relacionamentos dos elementos da estrutura.
Dois fatores se destacam na literatura que aborda o conceito de modelo de negócio (Zott et al., 2010Zott, C. & Amit, R. (2010) Designing your future business model: An activity system perspective. Long Range Planning, 43, pp. 216-226). O primeiro mostra a ênfase da estratégia em competição, vantagem competitiva e valor percebido, de maneira que o conceito de modelo de negócio foca mais a cooperação, parceria e criação de valor agregado (Magretta, 2002Magretta, J. (2002). Why Business Models Matter, Harvard Business Review, 80(5), pp. 86-92; Makinen & Seppanen, 2007Mansfield, G. M. & Fourie, L. C. H. (2004) Strategy and Business Models: Strange Bedfellows? A Case for Convergence and its Evolution into Strategic Architecture. South African Journal of Business Management, 35(1), pp. 35-44; Mansfield & Fourie, 2004Majors, I. (2010).ICT and Knowledge Management Models for Promotion of SME's Competitiveness. International Journal of Technology, Knowledge & Society, 6(3).). O segundo demonstra ênfase da proposta de valor e no cliente (Chesbrough & Rosenbloom, 2002Chesbrough, H. & Rosenbloom, R. S. (2002) The role of the business model in capturing value from innovation: evidence from Xerox Corporation's technology spin‐off companies. Industrial and Corporate Change, 11(3), pp. 529-555; Mansfield & Fourie, 2004Mansfield, G. M. & Fourie, L. C. H. (2004) Strategy and Business Models: Strange Bedfellows? A Case for Convergence and its Evolution into Strategic Architecture. South African Journal of Business Management, 35(1), pp. 35-44), pois conecta o potencial técnico com a realização de um valor econômico.
O conceito de modelo de negócio, segundo Osterwalder e Pigneur (2010Osterwalder, A. (2004) The Business Model Ontology: A Proposition in a Design Science Approach. PhD Dissertation, University of Lausanne, Switzerland), é suportado por nove pilares: 1) Cliente - refere-se aos vários grupos de pessoas ou organizações que a empresa visa atingir; 2) Proposta de Valor - refere-se ao pacote de produtos e serviços que são de valor para o cliente da empresa; 3) Canal de Distribuição - refere-se aos meios de contato da empresa com o cliente; 4) Relacionamento com o Cliente - refere-se aos tipos de relações que uma empresa estabelece com segmentos de clientes específicos; 5) Fonte de Receita - representa a receita que a empresa gera a partir de seus clientes; 6) Recursos Chave - refere-se aos ativos mais importantes para o funcionamento do modelo de negócio; 7) Atividades Chave - refere-se às atividades mais importantes que a empresa deve fazer para operar com sucesso; 8) Parcerias Chave - refere-se à rede de fornecedores e parceiros que fazem o negócio funcionar; 9) Estrutura de Custo - representa todos os custos envolvidos para fazer a empresa funcionar.
Tecnologia da Informação e Comunicação e Modelo de Negócios
As mudanças tecnológicas estão entre as importantes ameaças para negócios de sucesso. Parece difícil para empresas maduras enfrentarem uma possível mudança tecnológica, porém, este problema não está associado exclusivamente à inovação tecnológica. Ele está, também, intimamente relacionado à inércia e à inovação dos modelos de negócios (Tongur & Engwall, 2014Timmers, P. (1998) Business Models for Electronic Markets. Electronic Markets, 8(2), pp. 3-8).
O crescimento da Internet criou mais oportunidades para transações comerciais digitalizadas, o que tem sido acompanhado por uma competição intensificada e um ritmo acelerado de mudanças tecnológicas. Em escala global, esses desenvolvimentos afetaram as forças do mercado de maneira inovadora. Tais mudanças pressionam as empresas existentes a adaptar suas lógicas e processos de negócios para manter a competitividade num ambiente em rápida evolução (Veit et al, 2014Tongur, S., & Engwall, M. (2014). The business model dilemma of technology shifts. Technovation, 34(9), 525-535.). Os pesquisadores defendem, ainda, que a indústria de software, onde os fabricantes de aplicativos estão inseridos, se destaca devido às características específicas que a diferenciam de outras indústrias. Seus produtos - os softwares - podem ser reproduzidos com baixos custos marginais e, portanto, os custos variáveis são próximos de zero. Além disso, os produtos podem ser copiados sem perda de qualidade e podem ser facilmente alterados, viabilizando várias estratégias e modelos de negócios que podem derivar dessas características. A natureza multifacetada do conceito de modelo de negócios pode ajudar a explicar como essas características afetam a criação e a captura de valor pelas empresas. Enquanto grande parte das pesquisas se concentra em modelos genéricos de negócios, a perspectiva das empresas de software é de particular interesse para o campo das TICs (Hesset al, 2012Hess, T., Loos, P., Buxmann, P., Erek, K., Frank, U., Gallmann, J., Martin Gersch, Rüdiger Zarnekow & Zencke, P. (2012). ICT providers: a relevant topic for business and information systems engineering?. Business & Information Systems Engineering, 4(6), 367-373.).
Modelo de negócio associado às TICs é regularmente nomeado como modelo de negócio digital (digital business model). A primeira fase da literatura sobre modelos de negócios digitais foi estabelecida nos anos 90 (Veit et al, 2014Tongur, S., & Engwall, M. (2014). The business model dilemma of technology shifts. Technovation, 34(9), 525-535.). Focava no impacto de novas tecnologias em relação à divisão de trabalho entre empresas, um aspecto importante da perspectiva externa em um modelo de negócio. Modelos de negócios de intermediários também foram discutidos na época. Outra fase, na construção da literatura, analisou a criação de valor e a captura de valor possibilitada por modelos de negócios digitais. Amit e Zott (2001Amit, R., & Zott, C. (2001).Value creation in e‐business. Strategic management journal, 22(6-7), 493-520.), por exemplo, examinaram 59 modelos de e-business para explorar os fundamentos teóricos da criação de valor. Uma terceira fase da literatura analisa o papel das TICs como o condutor de uma nova onda de industrialização (Baruaet al., 2004Barua, A., Konana, P., Whinston, A. B., & Yin, F. (2004).An empirical investigation of net-enabled business value. MIS quarterly, 28(4), 585-620.). Uma quarta fase se concentra em mudanças ativadas por TIC em modelos de produtos e serviços, especialmente no varejo e na indústria de mídia. Por fim, uma quinta fase lida com o surgimento de modelos de negócios inteiramente inovador (Steininger et al., 2013Stanimirovic, D., & Vintar, M. (2015). The role of information and communication technology in the transformation of the healthcare business model: a case study of Slovenia. Health Information Management Journal, 44(2), 20.).
Modelo Conceitual de Análise
Para entender como se dá a inovação em plataformas móveis é preciso analisar diversos níveis, pontos de vista e as interações entre eles (Fontana & Sorensen, 2005Fontana, E. R., and Sorensen, C. (2005). From idea to BLAH! understanding mobile services development as interactive innovation. JISTEM-Journal of Information Systems and Technology Management, 2(2), 101-120.). Em 2009, Pozzebon, Diniz e Jayo propuseram um modelo de análise conceitual multinível, expandindo a visão estruturacionista, com o objetivo de atender interações complexas, e de diferentes níveis entre pessoas, grupos sociais, organizações e redes, a um patamar de comunidade e sociedade no estudo da tecnologia como prática. Esse modelo conceitual foi aprimorado por meio de doze diferentes estudos, culminando em uma solução apresentada por Pozzebon e Diniz (2012Pozzebon, M. and Diniz, E. H. (2012) Theorizing ICT and Society in the Brazilian Context: A Multilevel, Pluralistic and Remixable Framework. Brazilian Administration Review, 9(3), pp. 287-307), a qual permite analisar as ações de uso da tecnologia conforme grupos, percepções dos atores e contexto onde estão inseridos. O modelo combina quatro conceitos centrais: tecnologia na prática, mecanismos de negociação, grupos sociais e esquemas interpretativos, os quais são interligados por meio de três diferentes dimensões: contexto, processo e conteúdo. A dimensão contexto refere-se ao ambiente social onde a tecnologia está sendo implementada e usada. Inclui a identificação de grupos sociais distintos e relevantes. Também inclui a identificação do significado de tecnologia para cada grupo social, permitindo o reconhecimento de percepções, expectativas e interesses comuns e conflitantes, o qual é chamado de esquemas interpretativos. Permite a identificação de benefícios, forças, problemas e barreiras do uso da tecnologia. A dimensão processo refere-se ao entendimento, e permite a análise, de como grupos sociais exercem e sofrem influência no processo de negociação de implementação e uso de uma nova tecnologia. Diferentes interesses, perspectivas e condições em que grupos sociais interagem com a tecnologia influenciam o processo e os resultados. A dimensão conteúdo demonstra a tecnologia na prática resultante do processo de negociação, ou seja, características da tecnologia e as consequências intencionais e não intencionais (Figura 02).
O conceito de grupo social refere-se a um grupo de pessoas que compartilham um conjunto de suposições sobre determinado assunto de interesse. O conceito de esquema interpretativo refere-se a interesses, suposições e expectativas que as pessoas possuem sobre uma tecnologia, incluindo não somente a natureza e função da tecnologia em si, mas condições, usos e consequências do uso daquela tecnologia. O conceito de mecanismo de negociação refere-se ao entendimento de como grupos sociais exercem influência no processo de negociação para a implementação e uso da tecnologia. Por fim, o conceito de tecnologia como prática refere-se à tecnologia como resposta às consequências e características intencionais e não intencionais geradas pela negociação. Pode surgir da maneira como as pessoas redefinem o significado, propriedades e aplicações de uma determinada tecnologia.
O modelo possui contribuições de três teorias. As dimensões “contexto” e “processo” são suportadas pela formação social da tecnologia (Mackenzie & Wajcman, 1985). A dimensão “conteúdo” é suportada pela teoria da estruturação (Giddens, 1989) e pela visão estruturacionista da tecnologia (Orlikowski, 2000).
Procedimentos Metodológicos
Para compreender a transformação do modelo de negócio que ocorreu nas cooperativas de táxi no Brasil, o estudo adotou uma estratégia de pesquisa qualitativa. O método de pesquisa foi selecionado alinhado à questão da pesquisa, já que uma abordagem qualitativa é mais adequada à análise de um contexto em que o processo de transformação ainda não está concluído. Entrevistas semiestruturadas complementadas por uma revisão de literatura e análise documental foram utilizadas na coleta de dados.
As cidades de São Paulo e Curitiba foram selecionadas para análise do fenômeno pela importância dessas cidades para o país e para o negócio de radio táxis. Curitiba teve o primeiro serviço de radio táxis no Brasil em 1976. De acordo com a Urbs - Urbanização de Curitiba S.A., em dezembro de 2014 havia na cidade 2.999 táxis. São Paulo foi escolhida por ser a maior cidade do país e por estar listada entre as 10 áreas urbanas mais populosas do mundo (ONU, 2014ONU (2014) World Urbanization Prospects ONU (2014) World Urbanization Prospects http://esa.un.org/unpd/wup/
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). O DTP - Departamento de Transporte Público-informa que existem aproximadamente 33 mil táxis na cidade.
A seleção das categorias de entrevistados foi baseada na análise dos grupos sociais relevantes para o fenômeno em estudo. Um total de 31 entrevistas foi realizado, sendo 16 em São Paulo e 15 em Curitiba, abrangendo os diferentes grupos sociais: cooperativas de táxi (3), motoristas de táxi (11), passageiros (16) e gestor municipal (1). Também foram utilizadas gravações de um programa de televisão e gravações de uma conferência, ambas de fundadores de empresas de aplicativos online de serviços de táxis.
Patton (2002Pateli, A. & Giaglis, M. (2003).A framework for Understandingand Analysing eBusiness Models. In Proceedings of the 16th Blede Commerce Conference, Bled, Slovenia, June 2003, pp. 302-314) apresenta quatro variações na instrumentalização de entrevistas, na qual os autores optaram pela opção de guia de entrevista, em que tópicos e pontos a serem cobertos são previamente definidos, porém a sequência e palavras escolhidas para abordar o assunto são decididas pelo entrevistador no momento da pesquisa. Essa opção de implementação de entrevistas permite uma maior compreensão das informações uma vez que a sequência e a lógica de raciocínio respeitam características de cada entrevistado. Para garantir uma abordagem sistêmica, os tópicos da entrevista consideraram o modelo de análise, as diferentes definições de modelo de negócios e os nove pilares da definição de Osterwalder e Pigneur (2010Osterwalder, A. (2004) The Business Model Ontology: A Proposition in a Design Science Approach. PhD Dissertation, University of Lausanne, Switzerland). Essa abordagem está de acordo com Glesne (1999Glesne, C. (1999).Becoming Qualitative Researchers. New York: Longman.) que considera a teoria utilizada em cada investigação como uma das fontes mais importantes na definição do conteúdo das questões da entrevista. Miles, Huberman e Saldaña (2014Mahajan, K. B., Patil, A. S., Gupta, R. H., & Pawar, B. V. (2015). A New ICT based Business Model for Tourism Industry for the Maharashtra and Goa States of India. International Journal of Hospitality & Tourism Systems, 8(1).) argumentam que entrevista é uma fonte rica de informações, mas que requer um tratamento - transcrição - antes que as informações possam ser utilizadas em um processo de análise. Todas as respostas foram gravadas, transcritas e carregadas no Atlas.ti® - ferramenta utilizada para análise.
O processo de análise foi inspirado em estudos de Miles, Huberman e Saldaña (2014Mahajan, K. B., Patil, A. S., Gupta, R. H., & Pawar, B. V. (2015). A New ICT based Business Model for Tourism Industry for the Maharashtra and Goa States of India. International Journal of Hospitality & Tourism Systems, 8(1).). Segundo os autores, o processo de análise possui três etapas: a condensação dos dados, a exibição e, por fim, as conclusões. O processo de condensação é definido como “o processo de transformar centenas de páginas de transcrições de entrevistas e notas de campo em uma matriz de uma página ou exibição de rede” (Miles, Huberman & Saldaña, 2014Mahajan, K. B., Patil, A. S., Gupta, R. H., & Pawar, B. V. (2015). A New ICT based Business Model for Tourism Industry for the Maharashtra and Goa States of India. International Journal of Hospitality & Tourism Systems, 8(1)., p. 245).As entrevistas foram analisadas de acordo com as dimensões propostas no modelo conceitual. Diversas análises dos dados coletados foram necessárias para obter-se o correto entendimento das informações prestadas pelos entrevistados. O processo foi iniciado com uma leitura total de todas as transcrições, seguida pelas técnicas de análise de conteúdo no Atlas.ti®, possibilitando o agrupamento das diversas citações em grupos de igual conteúdo. As dimensões originais foram aquelas propostas pelo modelo teórico multinível, seguida pela identificação das dimensões de modelo de negócios suportadas pela revisão de literatura. Nesse estágio de análise, diferentes grupos de conteúdo foram reagrupados e, novo resultado foi gerado. Após essa fase, o resultado foi enriquecido com a análise de documentação acadêmica, mídia de comunicação e resultados de pesquisa na internet, com o objetivo de assegurar triangulação dos dados e confirmação dos resultados encontrados. Por fim, uma revisão da categorização dos dados se fez necessária para garantir que eles representassem, de forma acurada, as percepções das citações de cada grupo gerado. A fase de exibição das informações tem como objetivo subsidiar uma melhor compreensão e organização das informações (Miles, Huberman & Saldaña, 2014Mahajan, K. B., Patil, A. S., Gupta, R. H., & Pawar, B. V. (2015). A New ICT based Business Model for Tourism Industry for the Maharashtra and Goa States of India. International Journal of Hospitality & Tourism Systems, 8(1).). Nesta fase, redes foram criadas no Atlas.ti® para auxiliar a análise das citações e o agrupamento em subcategorias. A análise foi concluída com 535 citações, agrupadas em 153 subcategorias.
Apresentação e Discussão de Resultados
Neste capítulo, o modelo de negócios original das cooperativas é apresentado por meio de seus componentes - e somente aqueles que apareceram como resultado empírico deste trabalho. Na sequência, encontra-se o modelo de negócios das operadoras de aplicativos móveis de táxi. Uma análise dos impactos resultou no modelo de negócios das cooperativas após a chegada por aplicativos móveis. Na discussão que segue o modelo, são abordadas as principais mudanças no modelo de negócio.
Modelo de Negócios Original das Cooperativas/Associações
No modelo de negócios original de serviços de rádio táxi, em vigor desde 1976, as atividades administrativas estão concentradas nas cooperativas. Os taxistas associam-se a somente uma cooperativa. Para os clientes, o serviço é quase uma commodity, sem diferenciação entre as cooperativas. Os passageiros solicitam o serviço por telefone à cooperativa e um grupo de atendentes dialoga com eles. Então, os taxistas são alocados para o atendimento, O custo integral da cooperativa é rateado mensalmente entre os taxistas associados, independentemente da quantidade de corridas realizadas por cada um, procedimento que eles consideram pouco claro. Há que remarcar a proposta de valor, baseada em rastreabilidade e segurança, e o atendimento ao cliente, em que são valorizados os aspectos de confiança, segurança, fidelidade e atendimento pessoal. O Quadro 2 sintetiza o modelo de negócio e sua última coluna contém exemplos de fragmentos de entrevistas que ilustram a categorização realizada sobre os dados.
Modelo de Negócios de Operadoras de Aplicativos Móveis de Táxi
No modelo de negócios das empresas de aplicativos móveis de táxi, as atividades administrativas são compartilhadas entre taxistas e um sistema automatizado. Os taxistas podem se associar a diversas empresas e fazer uso de diversos aplicativos. Os clientes solicitam o serviço por meio de aplicativo móvel. Os clientes interagem com um aplicativo que repassa a corrida para taxistas próximos do ponto de partida. Cabe ao taxista aceitar a corrida e, o primeiro que o fizer, será designado para atendimento ao cliente. O modelo de negócios dessas empresas é apresentado no Quadro 3. É possível identificar diferenças significativas em relação ao modelo de negócio original das cooperativas de rádio táxis.
Modelo de Negócio das Cooperativas/Associações após a chegada dos Aplicativos Móveis
A chegada dos aplicativos móveis, a partir do ponto de vista da cooperativa, foi inicialmente percebida como modismo passageiro e ignorada por cerca de seis meses. Porém, os aplicativos começaram a conceder descontos significativos aos clientes e não cobrar o motorista de táxi por chamada. É neste momento que as cooperativas percebem a adesão dos taxistas ao uso de aplicativos. Em Curitiba, fiscais da prefeitura da cidade foram pressionados pelas cooperativas e alguns multaram taxistas que faziam uso dos aplicativos. Com grande cobertura da imprensa e sem apoio legal, a Urbs recuou e mudou a orientação aos fiscais.
A disseminação dos aplicativos de táxi foi semelhante em Curitiba e em São Paulo. Iniciado em 2012, a proliferação de aplicativos online de táxi mudou o modelo de negócio das cooperativas atendendo a necessidade dos passageiros. Duas das queixas mais frequentes eram a dificuldade de chamar um táxi em horário de pico e a imprecisão do tempo estimado para chegada do carro. Um dos entrevistados - motorista I31 - relatou que passageiros chegavam a esperar quatro vezes a previsão fornecida.
O que era uma novidade, o uso de aplicativos, foi gradativamente sendo incorporado ao mercado. Para que se mantivessem rentáveis, as cooperativas tornaram-se mais agressivas em sua resposta ao desafio do ambiente. Os motoristas de táxi passaram a ser informados dos benefícios que as cooperativas proporcionavam aos seus cooperados. Em seguida, as cooperativas lançaram seus próprios aplicativos. Ainda que tenha melhorado a relação entre cooperativas e taxistas, os clientes continuavam a reclamar pela demora na chegada dos táxis. Então, as cooperativas uniram-se para o desenvolvimento de uma solução colaborativa. Com o novo aplicativo, se a cooperativa contatada pelo cliente não é capaz de atendê-lo em um tempo razoável - o táxi mais próximo não deveria estar a mais de três quilômetros de distância do cliente - a chamada é compartilhada com outras cooperativas. Esta solução colaborativa foi implementada nas centrais de atendimento telefônico e um aplicativo foi desenvolvido em conjunto por algumas cooperativas. O objetivo foi atender melhor o cliente e evitar a sua migração para os aplicativos de táxis.
Os motoristas de táxi tomaram conhecimento dos aplicativos principalmente pela mídia e por informações de colegas taxistas. Além disso, representantes de aplicativos conversaram com os motoristas nos pontos de táxi para fazê-los conhecer o serviço e ainda houve distribuição de informativos. O uso do aplicativo significava uma renda maior para os taxistas, pela ampliação do número de corridas, e começaram a circular, entre eles, comentários sobre a experiência positiva de seu uso. Nesse momento, não se identificou resistência por parte das cooperativas quanto ao uso de aplicativos pelos seus taxistas.
Do ponto de vista do cliente, o movimento foi ainda mais simples. Os aplicativos se tornaram conhecidos por meio da mídia e de amigos, e o uso dos aplicativos se mostrou uma alternativa que resolvia as queixas em relação à qualidade do atendimento.
O resultado desse movimento foi a reavaliação de valores, proposições, relacionamento e outros componentes do modelo de negócio. As cooperativas de táxis se apresentaram de maneira diferente (Quadro 4), com propostas diferenciadas de entrega de valor para os clientes.Com a maturidade dos serviços, os taxistas atendem clientes tanto das cooperativas quanto das empresas de aplicativos móveis.
Discussão dos Resultados
Os principais conceitos utilizados no estudo são evidenciados na identificação dos grupos sociais envolvidos, seus interesses, suposições e expectativas sobre a tecnologia, a influência no processo de negociação para a implementação, bem como o uso da tecnologia e as consequências de seu uso. Por meio da lente teórica selecionada, na dimensão “contexto”, é possível analisar o significado da tecnologia para cada grupo social envolvido e suas percepções em relação à tecnologia. A influência que cada grupo social sofre e exerce com o uso da tecnologia é mapeado na dimensão “processo”. Por fim, as consequências intencionais e não intencionais do uso da tecnologia são tratadas pela dimensão “conteúdo”.
A proliferação dos aplicativos online de táxi transformou a maneira como cooperativas e associações de táxi prestavam o serviço. Há mudança do modelo de negócio, considerado a partir das definições descritas, como por exemplo, representação, arquitetura ou modelo estrutural (ver Quadro 1).
Os resultados demonstram que o valor agregado aos clientes e a revisão da estrutura de custos parece ser o foco principal da mudança. Essa abordagem complementa estudos de Amit e Zott (2001Amit, R., & Zott, C. (2001).Value creation in e‐business. Strategic management journal, 22(6-7), 493-520.) enfatizando o uso de tecnologia para geração de valor. No entanto, o movimento de adequação do negócio tradicional ao novo contexto não é uma cópia do serviço prestado pelos entrantes. É verdade que, ao se adequar, as cooperativas e associações se apropriam de aspectos da nova forma de funcionamento. Nos casos estudados, na proposta de valor e nas atividades chave, as cooperativas passam a oferecer maior precisão na estimativa de tempo, redução no tempo de espera do carro, ou distribuição de corridas por proximidade do carro com o passageiro. O uso da tecnologia, não alterou fundamentalmente os elementos da estrutura, sendo que a alteração se deu na forma como se organizaram para gerar valor e responder às necessidades de seus clientes (Applegate & Collura, 2000Applegate, L. M., & Collura, M. (2000). Emerging e-Business Models: Lessons from the Field. Harvard Business School, Boston, MA.; Amit & Zott, 2001Amit, R., & Zott, C. (2001).Value creation in e‐business. Strategic management journal, 22(6-7), 493-520.). No entanto, a adequação do modelo de negócio reforça, também, as características distintivas do modelo original em relação ao relacionamento com o cliente e o estreitamento do relacionamento da cooperativa com os seus cooperados. O novo arranjo foi articulado de forma a explorar a vantagem competitiva histórica, buscando manter e reforçara fidelidade conquistada pelo hábito de uso. A definição de modelo de negócios como arquitetura enfatiza a descrição dos benefícios potenciais para os vários atores negociais (Timmers, 1998Seelos, C. & Mair, J. (2007) Profitable business models and market creation in the context of deep poverty: a strategic view. The Academy of Management Perspectives, 21(4), pp. 49-63) com destaque às alterações percebidas. Foram identificados ganhos percebidos pelos passageiros, que identificaram a oportunidade de ter suas necessidades atendidas ou, em outras palavras, um aumento do valor percebido pelos clientes (Afuah & Tucci, 2001Afuah, A. and Tucci, C. L. (2001) Internet business models and strategies: Text and cases. Boston: McGraw-Hill Higher Education). Também foram modificadas as formas de distribuição de informação aos cooperados. Os motoristas de táxi, sem entender a lógica de distribuição de custos adotada pelas cooperativas, reconheceram neste movimento a oportunidade de entender a composição dos custos cobrados. O modelo de negócios passou a incorporar o relacionamento com outras cooperativas, uma solução encontrada para operação no novo contexto tecnológico. A tecnologia foi utilizada na estratégia de competição para desenvolvimento de cooperação, parceria e criação de valor agregado com os, inicialmente, competidores.
O modelo de negócio implementado pelas operadoras de aplicativos móveis de táxi alinha-se com estudo de Steininger et al. (2013Stanimirovic, D., & Vintar, M. (2015). The role of information and communication technology in the transformation of the healthcare business model: a case study of Slovenia. Health Information Management Journal, 44(2), 20.),onde a tecnologia propicia o surgimento de modelos de negócio inovadores. É possível identificar mudanças nos nove pilares do modelo de negócio proposto por Osterwalder e Pigneur (2010Osterwalder, A. (2004) The Business Model Ontology: A Proposition in a Design Science Approach. PhD Dissertation, University of Lausanne, Switzerland). Com a adoção de aplicativos móveis de táxi pelos clientes e motoristas de táxi, as cooperativas e associações tradicionais tiveram que rever seu modelo de negócios. Isto foi particularmente relevante para o negócio, que pode explorar oportunidades de melhora.
Foram identificadas fases do comportamento das cooperativas e associações de táxi ao perceberem entrantes usando uma nova tecnologia. Três fases foram caracterizadas nesta pesquisa. A primeira fase é nominada de descrença, e representa o período no qual a nova tecnologia é vista pelos operadores do modelo de negócio já estabelecido como um modismo, uma prática passageira. A segunda fase é o período de proteção. Após aceitar que a nova tecnologia afeta o negócio, o agente do modelo de negócio historicamente estabelecido realiza esforços políticos e legais para tentar retardar o avanço da nova tecnologia. Finalmente, na terceira fase, denominada adequação, as cooperativas e associações de táxis que já tinham um modelo de negócio estabelecido, passam a reestruturar seu modelo de negócio para competir com a nova tecnologia.
Na análise realizada, é possível identificar as dimensões e conceitos principais do modelo conceitual adotado pelo estudo. Quanto à dimensão contexto, que envolve os grupos sociais formados pelas cooperativas de táxi, empresas de aplicativos de táxi, agentes públicos, taxistas e usuários, é possível identificar o significado da tecnologia para cada um deles, que, dependendo do grupo, é percebida como ameaça ou solução. Na dimensão “processo”, é possível identificar como os grupos sociais exercem e sofrem influência no processo de negociação de implementação e uso de uma nova tecnologia. A influência dos usuários de aplicativos de táxi força o poder público a rever sua atuação quanto à autuação dos taxistas que utilizavam os aplicativos. As cooperativas de táxi, mesmo ameaçadas pelos aplicativos, não impediram sua utilização pelos taxistas, que viram sua demanda por corridas se elevar. Estas relações influenciam o processo e os resultados do uso da tecnologia. A dimensão “conteúdo” debruça-se sobre o uso dos aplicativos pelos agentes, gerando consequências intencionais e não intencionais. Estas dimensões ligam os conceitos principais: grupos sociais, composto por cooperativas, empresas de aplicativos, agentes públicos, taxistas e usuários; esquemas interpretativos, representando a percepção que cada grupo social tem sobre a tecnologia; mecanismos de negociação, caracterizado pela maneira como cada grupo social atua em relação à tecnologia; e, por fim, a tecnologia como prática, expressando os rumos que a tecnologia percorre por resultado da negociação entre os grupos sociais.
Comentários Finais
O estudo teve como objetivo verificar como se deram as mudanças em um modelo de negócio em um cenário de inovação potencializado pelo uso de tecnologias de informação. A principal contribuição do estudo é mostrar que a adequação de um modelo de negócio tradicional se apropria de novas formas de geração de valor, disponibiliza o produto/serviço da empresa a outros segmentos de clientes, melhora a proposta de valor, torna possível a utilização de novos canais de entrega, estreita relações com os clientes, e simplifica a estrutura de custos percebida. Ele, o modelo de negócio, se apropria de algumas formas de criação de valor da nova forma negocial, mas ancora-se, em parte, nas suas fontes de vantagem competitiva tradicional. É possível explorar a ampliação de parcerias e colaboração na criação de valor agregado.
A principal limitação deste estudo é de natureza metodológica. Foram coletados dados de motoristas de táxi, passageiros e organizações, mas há uma quase ausência da voz das agências reguladoras, que representam o lado governamental. Estas vozes podem ser interessantes para o entendimento de criação/modificação de forças externas ao negócio, de regulação, que podem vir a afetar o modelo em um contexto de disseminação de uma tecnologia.
O estudo pode ser aperfeiçoado com a inclusão de novos casos de estudo. Como oportunidades de pesquisa futura, a inclusão do aplicativo UBER no contexto e consequente adequação do modelo de negócios tradicional podem avançar as elucidações da pesquisa atual. As fases de descrença, proteção e adequação, que foram caracterizadas neste estudo para descrever o modelo de negócio adequando-se à tecnologia ao longo do tempo, são outra oportunidade de estudos futuros. Haverá um padrão de comportamento quando entrantes fazem uso de tecnologia e ameaçam um modelo de negócio estabelecido? Outras oportunidades de pesquisas futuras incluem a elaboração de um estudo bibliométrico sobre a evolução e abrangência do conceito de modelo de negócios, como a tecnologia interage com modelos de negócios, ou suas explicações, mais recentemente caracterizados, e a análise de modelos de negócio de empresas de software.
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Datas de Publicação
-
Publicação nesta coleção
13 Dez 2018 -
Data do Fascículo
2018
Histórico
-
Recebido
04 Abr 2016 -
Aceito
14 Ago 2018