Acessibilidade / Reportar erro

SOBRE AS INTERTEXTUALIDADES EM AMBIENTES DIGITAIS: O USO DE HASHTAGS

RESUMO

Desde o seu surgimento na década de 1990, as hashtags têm sido usadas com diferentes funções discursivas na internet e se tornado uma marca importante nesse ambiente. Neste trabalho, discutimos como elas, funcionando como um link, podem estabelecer relações intertextuais tanto em ambientes digitais quanto não digitais. Defendemos, à luz de Carvalho (2018), a hashtag como um diálogo marcado entre textos, ou seja, uma ocorrência intertextual por meio da qual um texto alude a um conjunto de textos, uma vez que, ao evocá-la, o usuário estabelece uma relação tangível com um conjunto inespecífico de textos. Para isso, analisamos três hashtags, sendo duas em ambiente digital, o Twitter, e uma em espaço não digital, as ruas da cidade de Fortaleza. À luz dos estudos da Linguística de Texto (Cavalcante et al, 2019), buscamos mostrar que, mesmo nascidas e pensadas no âmbito digital, as hashtags mantêm sua vitalidade em espaços não digitais.

intertextualidade; hashtags; hipertexto

Abstract

Carvalho (2018)CARVALHO, A. P. L. Sobre intertextualidades estritas e amplas. 2018. 136f. Tese (Doutorado em Linguística) – Programa de Pós-graduação em Linguística, Universidade Federal do Ceará, Fortaleza, 2018.

intertextuality; hashtags; hypertext

Considerações iniciais

Em 1945, ano do fim da Segunda Guerra Mundial, o engenheiro e inventor estadunidense Vannevar Bush publicou o artigo “As we may think” (Bush, 2011BUSH, V. Como podemos pensar. Trad. Luana Villac. Revista Latinoamericana de Psicopatologia Fundamental, São Paulo, v. 14, n. 1, p. 14–32, mar. 2011.), no qual propunha a ideia do memex, aparelho mecânico que possibilitaria arquivar e acessar, de maneira rápida e flexível, mesmo a distância, diferentes blocos de informações por meio de botões que levariam facilmente o leitor a pular dez ou cem páginas ou, ainda, voltar à primeira página do índice. O propósito do memex era mostrar também que, como diz Ribeiro (2008)RIBEIRO, A. E. Hipertexto e Vannevar Bush: um exame de paternidade. Informação e Sociedade: Estudos, João Pessoa, v.18, n.3, p. 45–58, set./dez. 2008., a mente humana não pensa linearmente, mas por associação. Mais tarde, essa ideia daria asas ao próprio surgimento da world wide web e à noção de links e hiperlinks, pelo menos cinquenta anos antes de eles se popularizarem no Brasil, por meio das amigáveis interfaces dos computadores de mesa. Autores como Barret (1989)BARRET, E. The society of text: hypertext, hypermedia and the social construction of information. Cambridge, Massachusetts: MIT Press, 1989., Ribeiro (2008)RIBEIRO, A. E. Hipertexto e Vannevar Bush: um exame de paternidade. Informação e Sociedade: Estudos, João Pessoa, v.18, n.3, p. 45–58, set./dez. 2008., entre outros, atribuem a Bush a idealização do hipertexto.

Sobre essas ideias, retomamos, neste estudo, uma cara discussão para a área de linguagem e tecnologia e suas pontes com a Linguística Textual, que envolve as intertextualidades em ambientes digitais. Partimos da ideia de que o fenômeno intertextual pode, por vezes, ser indistintamente atrelado à hipertextualidade, caso não se considere o tipo de relação estabelecida entre os textos1 1 Embora seja uma discussão cara, não a faremos neste artigo, por não estar entre nossos objetivos. . Na esteira das postulações esboçadas em Araújo e Lobo-Sousa (2009)ARAÚJO, J.; LOBO-SOUSA, A. C. Considerações sobre a intertextualidade no hipertexto. Linguagem em (Dis)curso, Palhoça, v. 9, n. 3, p. 565–583, set./ dez. 2009., entendemos que seja necessário reafirmar os limites para o que sejam as intertextualidades, sob pena de comprometer o potencial explicativo do fenômeno ou, ainda, de perdê-lo na nebulosa de outros fenômenos, sobretudo aqueles que admitimos como constitutivos, tais como o dialogismo bakhtiniano, a interdiscursividade e as heterogeneidades enunciativas. Por isso, neste trabalho, objetivamos discutir os limites das intertextualidades em ambiente digital, especificamente no uso de hashtags.

A noção de intertextualidade assumida neste trabalho, à luz da Linguística Textual, refere-se ao processo relacional comprovável entre textos específicos, bem como entre um texto e um conjunto de textos. Desse modo, entendemos como intertextuais as ocorrências que se situam desde as citações mais marcadas, até o que temos chamado de alusões amplas e imitações de gêneros e de estilos (Carvalho, 2018CARVALHO, A. P. L. Sobre intertextualidades estritas e amplas. 2018. 136f. Tese (Doutorado em Linguística) – Programa de Pós-graduação em Linguística, Universidade Federal do Ceará, Fortaleza, 2018.). Como critério para que se reconheçam as intertextualidades, admitimos a verificação de evidências de algum tipo de repetição nos textos. Assim, quanto menos marcada for a relação entre os textos, mais nos afastamos do fenômeno intertextual — que definimos como pontual, em geral planejado e sempre indiciado — e nos aproximamos do estatuto dialógico constitutivo de todos os usos linguageiros.

Para dar conta dessa proposta, parece-nos conveniente, em primeiro lugar, retornar ao conceito basilar sustentado pela Linguística Textual, qual seja, o de texto. Em seguida, passaremos a refletir sobre os fenômenos intertextuais e sobre o ambiente digital, ajustando a lupa para as hashtags, que, como links, podem ser marcas intertextuais nas redes (Xavier, 2002XAVIER, A. C. O Hipertexto na sociedade da informação: a constituição do modo de enunciação digital. 2002. Tese (Doutorado em Linguística) — Instituto de Estudos da Linguagem, Universidade Estadual de Campinas, Campinas, 2002.; Koch, 2004KOCH, I. G. V. Introdução à Linguística Textual: trajetória e grandes temas. São Paulo: Contexto, 2004.; Araújo; Lobo-Sousa, 2009ARAÚJO, J.; LOBO-SOUSA, A. C. Considerações sobre a intertextualidade no hipertexto. Linguagem em (Dis)curso, Palhoça, v. 9, n. 3, p. 565–583, set./ dez. 2009.). Sustentaremos a tese de que, a despeito da caracterização da hipertextualidade2 2 Vamos assumir a hipertextualidade aqui como ambiente digital, embora entendamos o risco que esse posicionamento representa. Remetemos o leitor para os trabalhos de Lobo-Sousa (2009), Elias e Cavalcante (2017) e Cavalcante et al. (2019), para discussão mais aprofundada. como modo particular de enunciação, a saber, uma enunciação digital (Xavier, 2002XAVIER, A. C. O Hipertexto na sociedade da informação: a constituição do modo de enunciação digital. 2002. Tese (Doutorado em Linguística) — Instituto de Estudos da Linguagem, Universidade Estadual de Campinas, Campinas, 2002.; Araújo; Lobo-Sousa, 2009ARAÚJO, J.; LOBO-SOUSA, A. C. Considerações sobre a intertextualidade no hipertexto. Linguagem em (Dis)curso, Palhoça, v. 9, n. 3, p. 565–583, set./ dez. 2009.; Cavalcante et al, 2019)3 3 Remeto o/a leitor/a a Araújo e Lima-Neto (2012), trabalho em que se questiona essa tese e sobre a qual não nos dedicamos a discutir neste trabalho. , nas análises do texto, há mais semelhanças do que diferenças entre fenômenos intertextuais realizados on-line ou off-line.

“Revisitando o estatuto do texto”4 4 Nomeamos a primeira seção deste artigo com uma alusão a um dos mais importantes trabalhos da Linguística Textual, o artigo Revisitando o estatuto do texto, escrito por Cavalcante e Custódio Filho (2010).

A reflexão acerca do conceito e das propriedades do texto segue vigorosa no âmbito da Linguística Textual, especialmente no momento em que se discute o espaço digital e sua relação com os modos de textualizar. Definir o texto, como bem diz Adam (2019)ADAM, J. M. Textos, tipos e protótipos. São Paulo: Contexto, 2019., é tarefa que esbarra em grandes obstáculos, principalmente por se tratar de um abrigo para diversas e heterogêneas realizações possíveis, que incluem desde conversas triviais até ocorrências digitais, que atualizam práticas e usos por meio de um dispositivo conectado à internet. Com as tecnologias digitais cada vez mais avançadas, os sujeitos de linguagem têm conseguido alargar sobremaneira as potencialidades enunciativas dos recursos sociossemióticos disponíveis. Hoje, são (praticamente) infinitas as maneiras de fazer texto.

Frente a tantas inovações, parece-nos oportuno retornar aos fundamentos teórico-epistemológicos que assumimos. Assim, pensaremos texto a partir das postulações de Bakhtin e seu círculo, uma vez que se encontram nelas as linhas de força que sustentam fenômenos como as intertextualidades, de que trataremos mais adiante. Faremos uma breve discussão de pontos que, conforme acreditamos, alicerçam nossa perspectiva de linguagem e de texto, bem como as suas consequências e desdobramentos para o exercício analítico.

Assumimos texto “como enunciado (no sentido dado a esse termo por Brait, 2016BRAIT, B. O texto nas reflexões do Círculo e de Bakhtin. In: BATISTA, R.de O. O texto e seus conceitos. São Paulo: Parábola Editorial, 2016. p.13-30.), que acontece como evento singular, compondo uma unidade de comunicação e de sentido em contexto, expressa por uma combinação de sistemas semióticos” (Cavalcante et al, 2019, p. 26). Essa concepção, como anunciamos, alinha-se ao postulado bakhtiniano de dialogismo, segundo o qual

Os enunciados não são indiferentes entre si nem se bastam cada um a si mesmos; uns conhecem os outros e se refletem mutuamente uns nos outros. Esses reflexos mútuos lhes determinam o caráter. Cada enunciado é pleno de ecos e ressonâncias de outros enunciados com os quais está ligado pela identidade da esfera de comunicação discursiva. Cada enunciado deve ser visto antes de tudo como uma resposta aos enunciados precedentes de um determinado campo (aqui concebemos a palavra “resposta” no sentido mais amplo): ela os rejeita, confirma, completa, baseia-se neles, subentende-os como conhecidos, de certo modo os leva em conta (Bakhtin, 2011BAKHTIN, M. Estética da criação verbal. São Paulo: Martins Fontes, 2011., p. 297).

Em outras palavras, cada texto se manifesta singular e situadamente, em uma dada esfera da atividade humana, compondo uma cadeia ininterrupta de interação. Nessa perspectiva, a interação só existe a partir de um enunciado — ou texto — que apresenta características fundamentais, a saber: a alternância de sujeitos, a qual lhe determina as fronteiras, e a conclusibilidade. Esta, por sua vez, é dada pela exauribilidade do objeto; o projeto de dizer do sujeito e os condicionamentos genéricos. Em termos práticos, entender o texto como uma unidade e um objeto de análise implica admiti-lo como sendo disciplinado por limites, isto é, como tendo começo, meio e fim. E mais: o texto só existe em relação a outros textos, frente aos quais manifesta uma atitude responsiva-ativa. (Bakhtin, 2011BAKHTIN, M. Estética da criação verbal. São Paulo: Martins Fontes, 2011.; Volóchinov, 2018VOLÓCHINOV, V. Marxismo e filosofia da linguagem: problemas fundamentais do método sociológico na ciência da linguagem. São Paulo: Ed. 34, 2018.).

Para uma análise textual, evidentemente também importam aspectos sociointeracionais e (inter)discursivos, assim como a heterogeneidade de vozes que marcam todo dizer. Contudo, o foco do analista do texto sempre estará voltado para as regularidades que organizam a produção e a interpretação dos sentidos. Nessa perspectiva, consideraram-se hoje também elementos como a (as)sincronicidade, a mídia, o caráter hipertextual e conectividade à internet (Muniz-Lima; Custódio-Filho, 2020), uma vez que atravessam os modos de textualizar.

Também não nos escapa a percepção de que muito do que se tem teorizado acerca de texto ainda não contempla certos recursos sociossemióticos e potencialidades disponíveis no universo das mídias e suporte digitais. Entretanto, defendemos que o conceito de texto, a despeito da mídia, do suporte ou do ambiente em que se realize, precisa ser válido e aplicável a qualquer realização. Ambiente, mídia ou suporte potencializam inúmeras e ricas textualizações, mas o texto — como objeto de análise — segue como evento, unidade conclusa de coerência em contexto.

A nosso ver, texto é texto, independentemente do ambiente em que se realiza. Essa defesa, cumpre notar, tolhe a atribuição de especificadores já cristalizados na literatura, como texto digital (Sousa, 2013SOUSA, M. C. P. Texto digital: uma perspectiva material. Revista da Anpoll, Londrina, n. 35, p. 15–60, jul./dez. 2013.; Araújo, 2013ARAÚJO, J. O texto em ambientes digitais. In: COSCARELLI, C. V. (org.). Leituras sobre a leitura: passos e espaços na sala de aula. Belo Horizonte: Vereda, 2013. v. 1. p. 88–115.) ou texto eletrônico (Marcuschi, 2004MARCUSCHI, L.A. Gêneros textuais emergentes no contexto da tecnologia digital. In: MARCUSCHI, L. A.; XAVIER, A. C. (org.). Hipertexto e gêneros digitais: novas formas de construção de sentido. Rio de Janeiro: Lucerna, 2004. p.13-67. ; Krug, 2019KRUG, F. S. O texto eletrônico e suas particularidades textuais. Texto livre: linguagem e tecnologia, Belo Horizonte, v. 12, n. 1, p. 37–47, jan.–abr. 2019.) ou ainda texto nativo digital (Giering; Pinto, 2021GIERING, M. E.; PINTO, R. O discurso digital nativo e a noção de textualidade: novos desafios para a Linguística Textual. Revista (Con)textos linguísticos, Vitória, v. 15, n. 31, p. 30–47, 2021.); em oposição aos textos que não estão na internet (ou pré-digitais)5 5 A questão é tão cristalizada que, pelo não uso de um especificador ao lado do termo texto, já se supõe que o referente aponta para o ambiente impresso, na modalidade escrita da língua. . O que parece existir, na verdade, é uma digitalidade do texto (Araújo, 2013ARAÚJO, J. O texto em ambientes digitais. In: COSCARELLI, C. V. (org.). Leituras sobre a leitura: passos e espaços na sala de aula. Belo Horizonte: Vereda, 2013. v. 1. p. 88–115.), posição assumida, provavelmente, por se atribuir ao texto certas características que, na verdade, não pertencem a ele, mas ao ambiente em que se realizam e circulam.

Sobre as intertextualidades e seus limites

O dialogismo bakhtiniano, como já mencionamos, apresenta-se como condição ideológica de todo matéria linguageira, o que significa que as relações entre os textos nunca se findam e, são, portanto, constitutivas. Entretanto, pontualmente é possível verificar evidências das ligações entre textos, únicos ou tomados em conjunto. Quando isso acontece, estamos diante do fenômeno a que temos chamado de intertextualidade.

Destacamos, com efeito, que as intertextualidades serão, sempre e irremediavelmente, constitutivamente dialógicas, ainda que nem todas as relações dialógicas sejam necessariamente intertextuais. Da mesma forma, também convém apontar as interseções e os distanciamentos entre a intertextualidade e outros fenômenos que, para nós, também são constitutivos: a interdiscursividade e as heterogeneidades enunciativas.

Advinda do arcabouço teórico da Análise do Discurso Francesa, a noção de interdiscursividade compreende que todo dizer integra uma discussão axiológica em grande escala, uma vez que responde, de algum modo, a um já-dito. Nessa perspectiva, os discursos comportam sempre discursos outros, na medida em que se constituem, sócio-historicamente, inscritos em sistema de restrições semânticas das formações das quais se originam. Em termos práticos, temos que os discursos serão sempre tomados em atravessamento, isto é, em relações interdiscursivas, quer de aliança ou de oposição, dada “a impossibilidade de dissociar a interação dos discursos do funcionamento intradiscursivo” (Maingueneau, 2008MAINGUENEAU, D. Gênese do discurso. São Paulo: Parábola Editorial, 2008., p. 37).

E, do mesmo modo que se dá com o dialogismo bakhtiniano, intertextualidade e interdiscursividade não se contrapõem. Também texto e discurso não se opõem, mas são tomados como interdependentes. Essa visão favorece uma análise que contemple aspectos atinentes a cada um, separadamente, mas sempre integrados. Importa, então, reafirmar que nem dialogismo nem interdiscursividade coincidem com a concepção de intertextualidade que estamos pleiteando. Dialogismo e interdiscursividade não implicam intertextualidade, ainda que o contrário seja verdadeiro.

Outro fenômeno, para nós também constitutivo, com o qual a intertextualidade, por vezes, se sobrepõe é o de heterogeneidade enunciativa. O dialogismo bakhtiniano foi retomado por Jacqueline Authier-Revuz (1982)AUTHIER-REVUZ, J. Hétérogénéité montrée et hétérogénéité constitutive: des éléments pour une approche de l’autre dans le discours. DRLAV, Paris, n. 26, p. 53–61, 1982. para a proposição do conceito, para o qual traz, como elemento diferencial, a incorporação da noção de inconsciente, advinda do arcabouço teórico da psicanálise freudo-lacaniana. Temos, pois, dialogismo e heterogeneidade como categorias que conduzem as reflexões acerca do sujeito discursivo. Evidencia-se o descentramento do eu, uma vez que um “eu” pressupõe sempre outros “eus”, constitutivos tanto do sujeito como do(s) discurso(s).

A noção de heterogeneidade se subdivide em constitutiva e mostrada. A primeira se relaciona à própria condição de existência dos sujeitos e dos discursos, considerando-se que todo discurso advém do entrelaçamento dos discursos em dispersão no meio social. A segunda, por sua vez, refere-se aos modos como a voz do outro se apresenta no fio do texto. A heterogeneidade mostrada dá, pois, a ver, a inscrição do outro e permite identificar construções nas quais vozes ou pontos de vista não coincidem, isto é, permite a apreensão de diferentes vozes enunciativas.

Chegando a este ponto, podemos afirmar que tanto dialogismo quanto interdiscursividade e heterogeneidade são fenômenos maiores que a intertextualidade, já que “toda intertextualidade supõe o caráter dialógico de todo discurso e o atravessamento de vozes que representam diferentes lugares sociais que se estabilizam e se desestabilizam durante as interações” (Cavalcante; Brito, 2011CAVALCANTE, M. M.; BRITO, M. A. P. Intertextualidades, heterogeneidades e referenciação. Linha d’Água, São Paulo, v. 24, n. 2, p. 83-100, 2011., p. 261). Isso posto, acentuamos que tanto a intertextualidade quanto a heterogeneidade mostrada se apresentam indiciadas quer por elementos tipográficos mais salientes quer por outros parâmetros textuais, como a referenciação. E, como dissemos, intertextualidade e heterogeneidade, por vezes, ainda que não se confundam, podem se sobrepor. Apesar disso, a investigação desses fenômenos se dá por bases epistemológicas distintas.

Após essa não tão breve demarcação de fronteiras, passemos, agora mais detidamente, a refletir acerca do fenômeno intertextual, que, embora não essencial, confere potencial criativo e argumentativo à textualização. À luz de Carvalho (2018)CARVALHO, A. P. L. Sobre intertextualidades estritas e amplas. 2018. 136f. Tese (Doutorado em Linguística) – Programa de Pós-graduação em Linguística, Universidade Federal do Ceará, Fortaleza, 2018., o que temos pleiteado é que as intertextualidades, fundadas no mecanismo da repetição, subdividam-se em: I) estritas, verificadas quando determinado texto incorpora parte de outro texto identificável, ou é dele uma transformação ou um comentário e II) amplas, dadas pela retomada não de um texto específico em outro, mas de um conjunto de textos.

São estritas as relações intertextuais dadas por copresença, isto é, inserções de parte(s) de um texto em outro, como ocorre nas citações, paráfrases e alusões, bem como por transformações de um texto em outro, realizadas por paródias e transposições. Também são estritas as metatextualidades, isto é, as relações estabelecidas por comentários a um texto-fonte específico. Cumpre notar que esses processos se manifestam em complementaridade. No caso das transformações, assim como nos de metatextualidade, sempre teremos ocorrências de copresenças (Faria, 2014FARIA, M. G. S. Alusão e citação como estratégias na construção de paródias e paráfrases em textos verbo-visuais. 2014. 118f. Tese (Doutorado em Linguística) - Universidade Federal do Ceará, Fortaleza, 2014.).

No bojo das intertextualidades amplas, estão: a) as alusões amplas, casos em que não há a retomada de um conjunto de textos, mas a uma referência difusa a fatos, conteúdos ou situações que, embora não retomem texto(s) específico(s), estabelecem uma relação ainda tangível entre um texto e diversos outros e b) a imitação de parâmetros composicionais, temáticos ou estilísticos de determinado gênero de estilo de autor, abstraída pela remissão a um conjunto inespecífico de textos. As ocorrências amplas, ainda que mais difusas, podem ser indiciadas por elementos textuais como a redundância de (sub)tópicos, a referenciação, a repetição de aspectos formais ou composicionais, dentre outros.

Esses tipos, embora qualitativamente distintos, não apenas não se excluem como comumente sobrepõem e se complementam. Não raro, flagramos num mesmo texto os tipos coexistindo. Vejamos um exemplo:

Figura 1
– Capitã Cloroquina

O texto acima retoma, por processo intertextual estrito, o depoimento da secretária de Gestão do Trabalho e Educação do Ministério da Saúde, Mayra Pinheiro, à CPI da Covid. Ao ser questionada pelo relator, Renan Calheiros, sobre o motivo pelo qual o governo não teria seguido as orientações da Organização Mundial da Saúde (OMS) quanto ao uso da cloroquina, Mayra Pinheiro destacou que o Brasil não seria obrigado a seguir a OMS e criticou posturas adotadas pela organização durante a pandemia. A médica afirmou também que não foi orientada a recomendar cloroquina para pacientes com coronavírus e que a pasta da Saúde nunca indicou tratamentos para a doença, divulgando apenas uma “nota orientativa” para médicos, ainda que, segundo ela, todos os recursos devessem ser utilizados.

Temos, além dessa retomada estrita, indiciada pela imagem da secretária e dos elementos verbais que aludem a trechos de seu depoimento, dois processos intertextuais: a imitação de parâmetros de gênero e o que temos chamado de alusão ampla. A imitação de gênero se verifica na caixa de remédio representada na roupa da depoente. O locutor repete o padrão composicional das embalagens de medicamentos, ainda que transgredindo elementos da forma e do conteúdo, com o propósito de criticar os que, contrariando todas as recomendações da OMS, insistiram em prescrever um remédio comprovadamente ineficaz para o tratamento da Covid-19. A alusão ampla, por sua vez, aparece indiciada pela imagem de inúmeros crânios, que apontam para as amplamente noticiadas mortes dos quase 500.000 brasileiros ao longo desse período pandêmico.

Vejamos mais um exemplo:

Figura 2
– Power Point

No exemplo, recuperamos muito facilmente a tão divulgada apresentação de PowerPoint feita por Deltan Dallagnol, numa coletiva de imprensa em 2016, para facilitar a compreensão das acusações feitas Ministério Público ao ex-presidente Lula. Segundo o coordenador da força-tarefa da Lava Jato, Lula seria cabeça de esquema de corrupção sem precedentes na Petrobrás. Ocorreu que o padrão da apresentação viralizou nas redes sociais, sendo constantemente evocado intertextualmente, como se vê. Anos depois, o texto ainda é retomado por processo intertextual estrito, mas também aludindo amplamente às circunstâncias em que ele surgiu, o que resulta numa convocação de elementos contextuais: um cenário de crise política encarado com uma explicação frágil para atitudes que tiveram graves desdobramentos para o país. No caso em tela, no centro da constelação aparece o nome da farmacêutica Pfizer, inúmeras vezes mencionada na CPI da Covid. Tornou-se público que a empresa entrou em contato diversas vezes com o governo federal, a fim de estabelecer parceria para a imunização dos cidadãos. As informações enfureceram grande parte da população e, em resposta, muitos textos manifestaram descontentamento com o descaso das autoridades frente às oportunidades de minimizar as perdas do povo brasileiro.

Como vemos, há o recurso parodístico de transformação do texto-fonte, mas também alusões ao conjunto de textos que partilharam o sentimento de revolta pela negligência do poder público no combate à doença. O texto se vale do humor e da sátira, aludindo a muitas práticas textuais pelas quais a Pfizer teria tentado chamar a atenção do presidente, incluindo stories com emoji de foguinho, recurso comum quando alguém tenta flertar pelas redes sociais.

Tratamos aqui de uma compreensão mais abrangente acerca das intertextualidades, que amplia a visão cristalizada de que o fenômeno se limita aos casos em que se dão relações entre textos específicos e recuperáveis. Nossa definição assume as relações verificáveis entre textos como objeto de análise, levando-as ao limite com os fenômenos constitutivos que aqui mencionamos. Assim, quanto mais indiciadas forem as ocorrências, isto é, quanto mais marcas (não necessariamente tipográficas, mas de toda ordem, desde que atestem as “repetições” de um texto ou de um conjunto de textos em outro), mais próximos estaremos de ocorrências intertextuais. Do mesmo modo, quanto mais difusas e menos apreensíveis forem as relações, mais próximos estamos de fenômenos constitutivos dos usos linguageiros.

Essa discussão dos limites das intertextualidades se deve ao nosso interesse, neste trabalho, em verificar suas relações em ambientes on e off-line, a partir dos quais se estabelece uma ligação infinita entre os textos que estão disponíveis no mundo, graças ao mecanismo de linkagem. Esse será o foco de nossas reflexões na próxima seção.

Todas as relações entre textos no ambiente digital são intertextuais?

Nossa resposta é não. Após refletir sobre os critérios a partir dos quais concebemos a intertextualidade, estenderemos o olhar para questionar o estatuto intertextual das relações entre textos nos ambientes digitais. Entendemos estes ambientes, fundamentados em Lévy (1999)LÉVY, P. Cibercultura. São Paulo: Editora 34, 1999., como espaços de unidades de dados chamados de bits, abreviação de binary digit, representado pelas sequências numéricas 0 e 1. Esses códigos constituem a linguagem dos computadores, mas chegam até nós transformados em texto escrito, imagens, sons ou a convergência dessas três semioses, por meio de telas constituídas por elementos específicos que permitem ler esses dados, laptops, desktops, smartphones e tablets. Como linguistas do texto, vamos até aí, na atualização desses textos nessas telas. Por trás desses códigos binários, estão diferentes tipos de linguagem, como Java, JavaScript, linguagem C, C++, Objective-C, Swift, PHP e tantas outras, cujo conhecimento aponta para outras áreas das Ciências da Computação.

Retomamos a reflexão empreendida por Araújo e Lobo-Sousa (2009)ARAÚJO, J.; LOBO-SOUSA, A. C. Considerações sobre a intertextualidade no hipertexto. Linguagem em (Dis)curso, Palhoça, v. 9, n. 3, p. 565–583, set./ dez. 2009., cuja relevância só aumentou, considerando que ainda não conseguimos dar conta de muitas das questões relacionadas aos modos de fazer texto no ambiente digital. São os autores os primeiros a responder negativamente à questão do subtítulo, dizendo que

[...] o fato de linkar um texto a outro não garante, necessariamente, o fenômeno intertextual. Assim, podemos sugerir que o link, a rigor, gera a hipertextualidade e não a intertextualidade, pois o que percebemos é que a intertextualidade pode até ser explicitada em um link, mas não gerada por ele. (Araújo; Lobo-Sousa, 2009ARAÚJO, J.; LOBO-SOUSA, A. C. Considerações sobre a intertextualidade no hipertexto. Linguagem em (Dis)curso, Palhoça, v. 9, n. 3, p. 565–583, set./ dez. 2009., p. 579).

A questão dos autores foi suscitada sobretudo pelas postulações de Xavier (2003)XAVIER, A. C. Hipertexto e intertextualidade. Caderno de Estudos Linguísticos, Campinas, v. 44, n. 1, p. 283–290, jan./jun. 2003., que imbrica hipertextualidade e intertextualidade. O autor defende uma “hiperintertextualidade infinita”. Segundo ele, os hiperlinks promovem uma relação estratégica entre os textos, de tal modo que, ao clicar, estaria estabelecida a intertextualidade. Para tal afirmação, assume as noções de intertextualidade explícita (planejada e marcada) e de conteúdo (dada pelo compartilhamento de temas), propostas por Koch (1991)KOCH, I. G. V. Intertextualidade e polifonia: um só fenômeno? DELTA, v. 7, n. 2, 1991.. Como bem já apontaram Araújo e Lobo-Sousa (2009)ARAÚJO, J.; LOBO-SOUSA, A. C. Considerações sobre a intertextualidade no hipertexto. Linguagem em (Dis)curso, Palhoça, v. 9, n. 3, p. 565–583, set./ dez. 2009., essas categorias intertextuais foram revistas pela própria Koch algum tempo depois. Além disso, também não se considerou a natureza das relações entre os textos ou, ainda, quais as evidências textuais da pleiteada intertextualidade. O autor assumiu apenas que o fato de estarem ligados pelo mecanismo dos hiperlinks já seria garantia do estatuto intertextual atribuído ao hipertexto.

Tanto em Xavier (2002)XAVIER, A. C. O Hipertexto na sociedade da informação: a constituição do modo de enunciação digital. 2002. Tese (Doutorado em Linguística) — Instituto de Estudos da Linguagem, Universidade Estadual de Campinas, Campinas, 2002. quanto em Araújo e Lobo-Sousa (2009ARAÚJO, J.; LOBO-SOUSA, A. C. Considerações sobre a intertextualidade no hipertexto. Linguagem em (Dis)curso, Palhoça, v. 9, n. 3, p. 565–583, set./ dez. 2009., p. 579), o hiperlink é visto como um dispositivo técnico-informático que interconecta textos ou fragmentos de textos, constituindo-se o principal responsável pela intertextualidade em ambientes digitais. Embora concordemos com a proposição dos últimos autores de que a hipertextualidade não é garantia para a existência da intertextualidade, buscamos ir um pouco além: primeiro, não limitamos o hiperlink à internet. Aqui, alinhamo-nos a Gualberto (2008)GUALBERTO, I. A influência dos hiperlinks na leitura de hipertexto enciclopédico digital. 2008. Tese (Doutorado em Estudos Linguísticos) — Programa de Pós-graduação em Estudos Linguísticos, Universidade Federal de Minas Gerais, Belo Horizonte, 2008., que o entende como os elos que ligam os nós — ou blocos textuais, organizados em blocos separados, mas inter-relacionados. Assim, “o hipertexto é uma rede desses nós, conectados pelas ligações” (Gualberto, 2008GUALBERTO, I. A influência dos hiperlinks na leitura de hipertexto enciclopédico digital. 2008. Tese (Doutorado em Estudos Linguísticos) — Programa de Pós-graduação em Estudos Linguísticos, Universidade Federal de Minas Gerais, Belo Horizonte, 2008., p.57). Nessa perspectiva, o que diferencia o hiperlink do link é apenas o prefixo, apontando o hiper para o universo digital, na esteira do grupo que defende as limitações do hipertexto à web8 8 Remetemos o leitor aos trabalhos de Koch (2002), Primo, Recuero e Araújo (2004), Gualberto (2008) e Hissa (2009), para aprofundamentos do conceito de hiperlink e possíveis classificações. . Essa primeira diferença é importante para mostrar que o que acontece nos ambientes digitais tem mais semelhanças do que diferenças com o que está fora de lá.

O que é interessante nas propostas seminais sobre estudos do hipertexto, que, mais tarde, voltaram a ser estudadas para explicar o que acontece num ambiente da internet, como em Lévy (1993)LÉVY, P. As tecnologias da inteligência: o futuro do pensamento na era da informática. Rio de Janeiro: Ed. 34, 1993. e Landow (1997)LANDOW, G. Web 2.0. Baltimore: Johns Hopkins University Press, 1997., é que a ideia de relacionar textos não é nada nova, por mais que essa relação seja estabelecida por meios mecânicos, como em Bush (2011BUSH, V. Como podemos pensar. Trad. Luana Villac. Revista Latinoamericana de Psicopatologia Fundamental, São Paulo, v. 14, n. 1, p. 14–32, mar. 2011., p. 126):

Portanto, a qualquer momento, quando um desses itens está em exibição, o outro pode ser instantaneamente reexibido, bastando apertar um botão situado abaixo do espaço do código correspondente. Além disso, quando numerosos itens tiverem sido unidos desta maneira para formar uma trilha, eles podem ser revisados um a um, rápida ou lentamente, com o girar de uma alavanca como aquela usada para virar as páginas de um livro. É exatamente como se itens físicos de fontes bem separadas tivessem sido unidos para formar um novo livro. É mais do que isso, já que qualquer item pode ser conectado a numerosas trilhas.

Nesse excerto, temos uma primeira ideia do que, mais à frente, seria o link, embora o autor não se utilize em nenhum momento, neste texto, dessa nomenclatura. Para Ribeiro (2008)RIBEIRO, A. E. Hipertexto e Vannevar Bush: um exame de paternidade. Informação e Sociedade: Estudos, João Pessoa, v.18, n.3, p. 45–58, set./dez. 2008., o que de fato era importante para Bush não era a técnica, “mas o modo associativo de fazer vínculos entre informações” (Ribeiro, 2008RIBEIRO, A. E. Hipertexto e Vannevar Bush: um exame de paternidade. Informação e Sociedade: Estudos, João Pessoa, v.18, n.3, p. 45–58, set./dez. 2008., p.55). Conectar dois blocos de informação era o mais relevante. Veja-se, portanto, que o princípio de ligar informações e textos não está nas tecnologias digitais. Como diz Coscarelli (2006COSCARELLI, C. V. Os dons do hipertexto. Littera, São Luís, 2006. Disponível em: http://www.letras.ufmg.br/carlacoscarelli/publicacoes/DonsDoHipertexto.pdf. Acesso em: 20 jan. 2021.
http://www.letras.ufmg.br/carlacoscarell...
, p. 8)

[...] linkamos o tempo todo. Na nossa língua temos, por exemplo, muitas formas de marcar esses links de um assunto para outro: ‘e por falar nisso’, ‘já que você tocou nesse assunto’ [...], ou de falar que estamos sugerindo outros centros de conversa: ‘mudando completamente de assunto’, ‘mudando da água para o vinho’, antes que eu me esqueça’, entre inúmeras outras.

Os exemplos da autora recaem sobre uma possível interação face a face. Entretanto, em suportes materiais, podemos usar o índice e ir direto ao ponto de interesse ou irmos a uma nota de rodapé ou de fim de capítulo e voltar; ou, ainda, ver uma citação e ir direto às referências de um artigo. Na frente de um computador ligado à internet (ou mesmo off-line, em alguns programas), com as técnicas de uso de touchscreen ou mouse, podemos clicar direto num hiperlink e ir para outro texto9 9 Se vier a esta nota de rodapé — um outro texto, portanto —, verá que o princípio dos links na hipertextualidade não muda em nada o que está acontecendo neste momento, durante sua leitura. Espera-se, agora, que o leitor acadêmico, ao finalizar este texto, volte os olhos para onde parou, provando que não-linearidade (ou multilinearidade ou deslinearidade) não são do ambiente digital, uma vez que o movimento esperado seria o mesmo, independentemente de ler este trabalho impresso ou em alguma tela. . O princípio é o mesmo. O que muda são as mídias, os suportes e as relações que nós, sujeitos da linguagem, estabelecemos com os textos e com o espaço em que eles se realizam.

Neste ponto, também parece oportuno refletir acerca das interações na web. Não negamos a rapidez e eficiência, além da navegabilidade nos espaços digitais da internet. É fato inquestionável que a popularização da internet provocou uma verdadeira revolução na comunicação humana e nos modos de textualizar. Há, como notamos, inúmeros gêneros e textos vinculados às necessidades enunciativas que emergem desse espaço heterogêneo de práticas discursivas e, evidentemente, não é possível negar que as tecnologias e o ambiente digital propiciam produtivos entrelaçamentos semióticos, bem como infinitas possibilidades de textualizações. Isso, porém, não quer dizer que estamos diante de uma forma ou particular de enunciar ou, mais precisamente, um modo de enunciação digital.

Conforme acreditamos, há, sim, múltiplas enunciações consubstanciadas no/pelo caráter multifacetado da textualidade pré-digital agora revestidas e/ou potencializadas por novidades técnicas em ambientes digitais (Araújo; Lima-Neto, 2012ARAÚJO, J. C.; LIMA-NETO, V. Ruptura não, linkagem sim: o hipertexto e as enunciações na web. Veredas: Revista de Estudos Linguísticos, Juiz de Fora, v. 16, n. 2, p. 56–67, 2012.). Esse raciocínio também vale para os links, tão antigos quanto a linguagem humana, e para as relações entre os nós que eles estabelecem, que não necessariamente apontam para relações intertextuais ou para uma dita intertextualidade infinita, já defendida anteriormente por Xavier (2002)XAVIER, A. C. O Hipertexto na sociedade da informação: a constituição do modo de enunciação digital. 2002. Tese (Doutorado em Linguística) — Instituto de Estudos da Linguagem, Universidade Estadual de Campinas, Campinas, 2002. e outros.

Cabe-nos aqui acentuar que, conforme defendemos, as intertextualidades, mesmo as amplas — situadas no limite com fenômenos como o dialogismo — estão atreladas à verificação de evidências textuais, isto é, marcas linguísticas de toda ordem. Sem a presença de indícios que atestem a repetição de um texto em outro(s), estaríamos tratando de outras relações que não as intertextuais. Não estamos, com isso, negando que possa se estabelecer relação intertextual pelos hiperlinks. Antes, porém, cabe indagarmos se é possível assegurar que toda forma de indexação de um texto a outro(s) será sempre intertextual. O que afirmamos a esse respeito é que entendemos a intertextualidade como um fenômeno maior (e independente, portanto) que a hipertextualidade.

Importa, entretanto, apontar um tipo particular de hiperlink que, a nosso ver, tem caráter naturalmente intertextual: a hashtag. É sobre que nos debruçaremos no próximo subtópico.

Hashtag na web e sua natureza intertextual

A hashtag, segundo Silva (2017SILVA, C. D. Hashtags sob o viés da Semântica da Enunciação. 2017. 228p. Tese (Doutorado em Estudos Linguísticos) – Universidade Federal de Minas Gerais, Belo Horizonte, 2017., p. 20) é “junção dos termos hash (cerquilha, em inglês) com tag (etiqueta) e diz respeito a uma cadeia de caracteres que formam uma unidade ao ser precedida pelo símbolo cerquilha”. Seu surgimento remete ao extinto IRC (Internet Relay Chat)10 10 Mais informações disponíveis em: https://pt.wikipedia.org/wiki/Internet_Relay_Chat#EFnet. Acesso em: 24 set. 2021. , na década de 1990, e funcionava como um tipo de encapsulador, com o propósito de organizar os tópicos de uma conversa. Sua popularização, entretanto, deu-se apenas em 2007, no Twitter, sendo utilizado como uma tag. Em 2009, tornou-se um link, com o propósito de agrupar textos sob um mesmo tópico e, como consequência, agrupar também pessoas, expressando uma ideia em comum.

Ao longo do tempo, outros sites de redes sociais também adotaram a hashtag como link, a saber, o Instagram e o Google+, em 2011, e o Facebook, em 2013. Diante de sua popularização, a hashtag também assumiu distintas funções sociais (Araújo, 2017ARAÚJO, C. T. M. As funções sociais e discursivas da #Hashtag em seus diversos contextos de uso. 2017. Dissertação (Mestrado em Linguística) — Programa de Pós-graduação em Linguística, Universidade de Brasília, Brasília, 2017.)11 11 Por questões de espaço, não nos debruçaremos nestas questões, mas remetemos o leitor para os trabalhos de Araújo (2017) e Burikova e Ovchinnikova (2021), que elencaram diversas funções discursivas, como conferir intensidade ao conteúdo semântico do texto, acrescentar contexto à mensagem, construir identidade de indivíduos, sugerir adesão à mobilização social, promover serviços, comentar emoções, entre outras. e formatações: palavras (#amor), expressões sem verbo (#lulalivre), sentenças (#euacreditoempapainoel) etc.

Tomamos aqui apenas um exemplo, para demonstrar como se dá o funcionamento no Twitter, em 2021:

Figura 3
#CPIdaCovid no Twitter

O recorte da tela acima foi feita no dia 28 de setembro de 2021, às 21h15, no dia em que ocorreu o depoimento de Bruna Morato13 13 Disponível em: https://www.youtube.com/watch?v=eFtfVEp__Gg. Acesso em: 28 set. 2021. , na Comissão Parlamentar de Inquérito da COVID-19, na Câmara Federal. Neste dia, a hashtag #CPIdaCOVID esteve, por algumas horas, como o assunto mais comentado na rede. O exemplo é interessante, para mostrar que a #CPIdaCOVID é um exemplar de intertextualidade ampla: as hashtags evocam diálogos amplos, mostrando que há uma relação tangível entre um conjunto de textos difusos (os depoimentos na CPI, postagens em diferentes sites de redes sociais, notícias etc.) que tratam do que aconteceu no Senado Federal naquela tarde. Num site de rede social, essa expressão imediatamente se torna um link, mostrando como se dá essa relação intertextual na própria materialidade do ambiente digital, reunindo centenas de milhares de textos em lista que se reportam ao mesmo conjunto de informações.

Em 2, aparece, tanto na postagem da Mídia Ninja quanto na da deputada Samia Bonfim, uma citação direta, de um texto proferido pela advogada Bruna Morato: “Óbito também é alta”, que, por sua vez, já seria uma alusão a um texto proferido com recorrência nos corredores do hospital então investigado. De toda forma, a citação da advogada (aqui, portanto, intertextualidade estrita, por copresença) viralizou nas redes.

Figura 4
#Obitotambéméalta

Notemos o movimento: a hashtag (e suas variações) #ÓbitoTambémÉAlta tornou-se também um dos mais comentados no Twitter neste dia e, pela volatilidade do ambiente, potencializou a elaboração de um conjunto de outros textos que logo se espraiaram pelas redes, gerando, mais uma vez, uma intertextualidade ampla. Trata-se, portanto, de um texto proferido fora do ambiente digital, mas que aumentou seu alcance pelas potencialidades técnicas das tecnologias digitais que constituem as redes sociais.

Vemos, então, o primeiro exemplo #CPIdaCOVID, como um texto produzido na e para a rede, com claro intuito de viralizar e reunir sob sua materialidade linguística um conjunto de textos que debatem sobre os fatos ocorridos no Senado, enquanto o segundo exemplo como um texto produzido fora do ambiente da internet, mas para lá migrado e se espraiando, sob uma tag, cuja função discursiva é, sobretudo, conferir intensidade ao conteúdo do texto (Araújo, 2017ARAÚJO, C. T. M. As funções sociais e discursivas da #Hashtag em seus diversos contextos de uso. 2017. Dissertação (Mestrado em Linguística) — Programa de Pós-graduação em Linguística, Universidade de Brasília, Brasília, 2017.), com claro propósito argumentativo de se posicionar contrariamente às práticas referidas, tidas como criminosas em determinados grupos sociais. Agora vejamos como uma hashtag, embora criada para circular em ambiente digital, tem tido absoluta eficácia fora dele também.

Hashtag fora da web

Araújo (2017)ARAÚJO, C. T. M. As funções sociais e discursivas da #Hashtag em seus diversos contextos de uso. 2017. Dissertação (Mestrado em Linguística) — Programa de Pós-graduação em Linguística, Universidade de Brasília, Brasília, 2017. desenvolve uma categorização para hashtags que têm funções discursivas diferentes fora do ambiente digital: um marcador de intensidade, quando a # funciona como “intensificador do conteúdo semântico da mensagem” (Araújo, 2017ARAÚJO, C. T. M. As funções sociais e discursivas da #Hashtag em seus diversos contextos de uso. 2017. Dissertação (Mestrado em Linguística) — Programa de Pós-graduação em Linguística, Universidade de Brasília, Brasília, 2017., p.106); um marcador de contexto, ou “um recurso semiótico que indica a informação que irá contribuir para a compreensão do conteúdo do texto (Araújo, 2017ARAÚJO, C. T. M. As funções sociais e discursivas da #Hashtag em seus diversos contextos de uso. 2017. Dissertação (Mestrado em Linguística) — Programa de Pós-graduação em Linguística, Universidade de Brasília, Brasília, 2017., p. 111); e, por fim, um instrumento de mobilização social, quando, sob sua tutela, uma hashtag tem o propósito de reunir grupos que defendem uma mesma causa e lutam por mudanças sociais.

A autora não se debruça sobre a potencialidade intertextual das hashtags, mas chama a atenção para a força que elas passaram a ter mesmo fora da internet. Tomamos o trabalho da autora como base, para discutir sobre o movimento #vaidarcerto, um bordão do médico Elias Leite, que, por conta da pandemia, fazia circular vídeos nas redes sociais como um propósito motivacional e — por que não? — promocional de uma empresa administradora de planos de saúde15 15 Mais sobre essa história pode ser lida em: https://www.opovo.com.br/noticias/especialpublicitario/unimedfortaleza/2021/04/08/voce-conhece----a-historia-por-tras-do--vaidarcerto.html . Disponível em: 25 set. 2021. .

O bordão espraiou-se fora da internet e hoje ocupa dezenas de espaços na cidade de Fortaleza, gerando uma paisagem semiótica cuja principal proposta é a de motivação da população no combate à pandemia. Atentemos para os três exemplos a seguir:

Figura 5
Hashtag utilizada fora do contexto digital

Figura 6
Hashtag em estabelecimento comercial

Figura 7
Hashtag em prédio residencial

Nas figuras 5 e 6, a hashtag foi utilizada em dois estabelecimentos comerciais, ocupando grande espaço em suas fachadas. Em 5, por exemplo, por saliência (Kress; Van Leeuwen, 2006KRESS, G.; VAN LEEUWEN, T. Reading images: the grammar of visual design. 2. ed. London: New York: Longman, 2006.), ela é mais destacada que o próprio nome da loja, tamanha a importância dada à campanha. Já em 7, a # ocupa um espaço mais tímido na fachada de um prédio residencial, também sugerindo que a campanha é adotada/ praticada por todos os moradores.

O que se vê é que a #VAIDARCERTO (e suas variantes) também viralizou, tornando-se um meme16 16 Aqui, meme está sendo entendido nos termos de Dawkins (2010), como um replicador cultural, ou seja, ideias que são replicadas de tempos em tempos numa dada cultura. , fora do ambiente digital, por meio de uma intertextualidade ampla, aludindo a uma rede difusa de fatos que envolvem a pandemia e a todo o sofrimento por ela causado à população, permitindo o estabelecimento de relações entre os textos imersos nesse contexto pandêmico. Logo, a ideia é que qualquer cidadão que circule pela cidade e se depare com essa paisagem semiótica nesse período se sinta acolhido por um discurso esperançoso de que a pandemia passará e todos ficarão bem. Isso só é possível porque esse texto foi produzido numa situação que envolve todos os habitantes do planeta, sem exceção, inclusive aqueles que circulam pela cidade de Fortaleza, sendo, portanto, um fato recuperável por todos os que sabem o que está acontecendo. Mesmo na possibilidade de não recuperarem, isso não inviabiliza o fenômeno.

Queremos dizer, com isso, que a hashtag deixou de fazer parte do universo digital e se espraiou para a vida pública fora da internet, fazendo com que as relações intertextuais estabelecidas não tivessem diferença alguma com aquela que acontece na internet. A compreensão do texto e a maneira como processamos cognitivamente a informação se dá muito mais no tripé autor-texto-leitor, independentemente do ambiente em que essa relação está acontecendo. A então condição de se tornar um link, ao se utilizar do símbolo #, mantém-se quando usado nas paredes de prédios e, por conseguinte, o seu potencial de estabelecer relações com outros textos, que, do ponto de vista do processamento cognitivo do ser humano (que funciona por associações, como o memex, de Bush), segue a mesma lógica do que acontece em ambientes digitais.

Defendemos, portanto, que as intertextualidades são uma estratégia de textualização que diz respeito muito mais ao produtor e ao leitor e suas habilidades de (re)construir sentido(s) do que aos ambientes nos quais os textos circulam. Não negamos o potencial de espraiamento de uma hashtag em ambiente digital, é evidente, mas o que queremos dizer é que, independentemente de aparecerem rapidamente em telas de smartphones ou estarem pichados em paredes de prédios, as relações intertextuais acontecem da mesma maneira do ponto de vista dos sujeitos. Há, portanto, muito mais semelhanças do que diferenças nas análises de texto realizadas em ambientes on ou off-line.

Considerações finais

Depois das discussões aqui empreendidas, consideramos importante lançar luz sobre os pontos que consideramos fulcrais: texto, a despeito do ambiente em que se atualize, é sempre texto. Desse modo, o uso de adjetivos como digital pode estabelecer uma relação de poder que, conforme entendemos, não deve existir. Basta pensarmos que não se marcava, costumeiramente, o uso de texto não digital, ou texto analógico.

O advento e o investimento em pesquisas voltadas ao ambiente digital parecem ter inaugurado uma assimetria entre textos, um certo privilégio ao que se tem chamado de textos digitais, como se se tratasse de um objeto novo, com características tão peculiares que o afastassem do que, até então, abrigava-se no conceito de texto. Não negamos o ambiente digital e suas potencialidades enunciativas, como maior interatividade e mais usos de recursos semióticos, mas o que pleiteamos aqui é que há mais semelhanças do que diferenças entre o que acontece nos universos on-line e off-line.

Nessa perspectiva, buscamos demonstrar que mesmo as relações pensadas e nascidas no âmbito digital — caso das hashtags — podem manter vitalidade em espaços não digitais. Defendemos aqui que a hashtag constitui um tipo particular de ocorrência intertextual, a saber, um recurso por meio do qual um texto alude a um conjunto de textos, uma vez que, ao evocá-la, o usuário estabelece uma relação tangível com um conjunto inespecífico de textos que comungam de dado pensamento. Há, nesse caso, um diálogo marcado — intertextual, portanto — entre textos.

REFERÊNCIAS

  • ADAM, J. M. Textos, tipos e protótipos. São Paulo: Contexto, 2019.
  • ARAÚJO, C. T. M. As funções sociais e discursivas da #Hashtag em seus diversos contextos de uso. 2017. Dissertação (Mestrado em Linguística) — Programa de Pós-graduação em Linguística, Universidade de Brasília, Brasília, 2017.
  • ARAÚJO, J. O texto em ambientes digitais. In: COSCARELLI, C. V. (org.). Leituras sobre a leitura: passos e espaços na sala de aula. Belo Horizonte: Vereda, 2013. v. 1. p. 88–115.
  • ARAÚJO, J. C.; LIMA-NETO, V. Ruptura não, linkagem sim: o hipertexto e as enunciações na web. Veredas: Revista de Estudos Linguísticos, Juiz de Fora, v. 16, n. 2, p. 56–67, 2012.
  • ARAÚJO, J.; LOBO-SOUSA, A. C. Considerações sobre a intertextualidade no hipertexto. Linguagem em (Dis)curso, Palhoça, v. 9, n. 3, p. 565–583, set./ dez. 2009.
  • AUTHIER-REVUZ, J. Hétérogénéité montrée et hétérogénéité constitutive: des éléments pour une approche de l’autre dans le discours. DRLAV, Paris, n. 26, p. 53–61, 1982.
  • BAKHTIN, M. Estética da criação verbal São Paulo: Martins Fontes, 2011.
  • BARRET, E. The society of text: hypertext, hypermedia and the social construction of information. Cambridge, Massachusetts: MIT Press, 1989.
  • BRAIT, B. O texto nas reflexões do Círculo e de Bakhtin. In: BATISTA, R.de O. O texto e seus conceitos. São Paulo: Parábola Editorial, 2016. p.13-30.
  • BURIKOVA, S.A.; OVCHINNIKOVA, E. Hashtag as modern text format in Linguistics. Laplage em Revista, Sorocaba, v. 7, n. 2, p. 261–268, maio/ago. 2021.
  • BUSH, V. Como podemos pensar. Trad. Luana Villac. Revista Latinoamericana de Psicopatologia Fundamental, São Paulo, v. 14, n. 1, p. 14–32, mar. 2011.
  • CARVALHO, A. P. L. Sobre intertextualidades estritas e amplas. 2018. 136f. Tese (Doutorado em Linguística) – Programa de Pós-graduação em Linguística, Universidade Federal do Ceará, Fortaleza, 2018.
  • CAVALCANTE, M. M. et al. O texto e suas propriedades: definindo perspectivas para análise. Revista (Con)textos Linguísticos, Vitória, v. 13, n. 25, p. 25–39, 2019.
  • CAVALCANTE, M. M.; BRITO, M. A. P. Intertextualidades, heterogeneidades e referenciação. Linha d’Água, São Paulo, v. 24, n. 2, p. 83-100, 2011.
  • CAVALCANTE, M. M.; CUSTÓDIO-FILHO, V. Revisitando o estatuto do texto. Revista do Gelne, Natal, v. 12, n. 2, 2010.
  • COSCARELLI, C. V. Os dons do hipertexto Littera, São Luís, 2006. Disponível em: http://www.letras.ufmg.br/carlacoscarelli/publicacoes/DonsDoHipertexto.pdf Acesso em: 20 jan. 2021.
    » http://www.letras.ufmg.br/carlacoscarelli/publicacoes/DonsDoHipertexto.pdf
  • DAWKINS, R. O gene egoísta São Paulo: EDUSP, 2010.
  • ELIAS, V. M.; CAVALCANTE, M. M. Linguística Textual e estudos do hipertexto: focalizando o contexto e a coerência. In: CAPISTRANO JÙNIOR, R.; LINS, M. P. P.; ELIAS, V. M. Linguística textual e Pragmática: uma interface possível. São Paulo: Labrador, 2017, p. 317–338.
  • FARIA, M. G. S. Alusão e citação como estratégias na construção de paródias e paráfrases em textos verbo-visuais. 2014. 118f. Tese (Doutorado em Linguística) - Universidade Federal do Ceará, Fortaleza, 2014.
  • GIERING, M. E.; PINTO, R. O discurso digital nativo e a noção de textualidade: novos desafios para a Linguística Textual. Revista (Con)textos linguísticos, Vitória, v. 15, n. 31, p. 30–47, 2021.
  • GUALBERTO, I. A influência dos hiperlinks na leitura de hipertexto enciclopédico digital. 2008. Tese (Doutorado em Estudos Linguísticos) — Programa de Pós-graduação em Estudos Linguísticos, Universidade Federal de Minas Gerais, Belo Horizonte, 2008.
  • HISSA, D. A organização das informações em portais educacionais a partir de links: uma descrição comparativa dos portais Centro Virtual Cervantes e Educarede. 2009. 196 f. Dissertação (Mestrado em Linguística Aplicada) - Universidade Estadual do Ceará, Fortaleza, 2009.
  • KOCH, I. G. V. Introdução à Linguística Textual: trajetória e grandes temas. São Paulo: Contexto, 2004.
  • KOCH, I. G. V. Desvendando os segredos do texto São Paulo: Cortez, 2002.
  • KOCH, I. G. V. Intertextualidade e polifonia: um só fenômeno? DELTA, v. 7, n. 2, 1991.
  • KRESS, G.; VAN LEEUWEN, T. Reading images: the grammar of visual design. 2. ed. London: New York: Longman, 2006.
  • KRUG, F. S. O texto eletrônico e suas particularidades textuais. Texto livre: linguagem e tecnologia, Belo Horizonte, v. 12, n. 1, p. 37–47, jan.–abr. 2019.
  • LANDOW, G. Web 2.0. Baltimore: Johns Hopkins University Press, 1997.
  • LÉVY, P. Cibercultura. São Paulo: Editora 34, 1999.
  • LÉVY, P. As tecnologias da inteligência: o futuro do pensamento na era da informática. Rio de Janeiro: Ed. 34, 1993.
  • LOBO-SOUSA, A. C. Hipertextualidade: uma abordagem enunciativa de hipertextos, 2009.154f. Dissertação (Mestrado em Linguística) — Universidade Federal do Ceará, Fortaleza, 2009.
  • MAINGUENEAU, D. Gênese do discurso São Paulo: Parábola Editorial, 2008.
  • MARCUSCHI, L.A. Gêneros textuais emergentes no contexto da tecnologia digital. In: MARCUSCHI, L. A.; XAVIER, A. C. (org.). Hipertexto e gêneros digitais: novas formas de construção de sentido. Rio de Janeiro: Lucerna, 2004. p.13-67.
  • MUNIZ-LIMA, I.; CUSTÓDIO FILHO, V. Revisitando o conceito de interação. Investigações, Recife, v. 33, n. esp., p. 141-164, 2020.
  • PRIMO, A.; RECUERO, R. da C.; ARAÚJO, R. M. Co-links: proposta de uma nova tecnologia para a escrita coletiva de links multidirecionais. Revista Fronteira, Belo Horizonte, v. VI, n. 1, p. 91–113, 2004.
  • RIBEIRO, A. E. Hipertexto e Vannevar Bush: um exame de paternidade. Informação e Sociedade: Estudos, João Pessoa, v.18, n.3, p. 45–58, set./dez. 2008.
  • SILVA, C. D. Hashtags sob o viés da Semântica da Enunciação 2017. 228p. Tese (Doutorado em Estudos Linguísticos) – Universidade Federal de Minas Gerais, Belo Horizonte, 2017.
  • SOUSA, M. C. P. Texto digital: uma perspectiva material. Revista da Anpoll, Londrina, n. 35, p. 15–60, jul./dez. 2013.
  • VOLÓCHINOV, V. Marxismo e filosofia da linguagem: problemas fundamentais do método sociológico na ciência da linguagem. São Paulo: Ed. 34, 2018.
  • XAVIER, A. C. Hipertexto e intertextualidade. Caderno de Estudos Linguísticos, Campinas, v. 44, n. 1, p. 283–290, jan./jun. 2003.
  • XAVIER, A. C. O Hipertexto na sociedade da informação: a constituição do modo de enunciação digital. 2002. Tese (Doutorado em Linguística) — Instituto de Estudos da Linguagem, Universidade Estadual de Campinas, Campinas, 2002.
  • 1
    Embora seja uma discussão cara, não a faremos neste artigo, por não estar entre nossos objetivos.
  • 2
    Vamos assumir a hipertextualidade aqui como ambiente digital, embora entendamos o risco que esse posicionamento representa. Remetemos o leitor para os trabalhos de Lobo-Sousa (2009)LOBO-SOUSA, A. C. Hipertextualidade: uma abordagem enunciativa de hipertextos, 2009.154f. Dissertação (Mestrado em Linguística) — Universidade Federal do Ceará, Fortaleza, 2009., Elias e Cavalcante (2017)ELIAS, V. M.; CAVALCANTE, M. M. Linguística Textual e estudos do hipertexto: focalizando o contexto e a coerência. In: CAPISTRANO JÙNIOR, R.; LINS, M. P. P.; ELIAS, V. M. Linguística textual e Pragmática: uma interface possível. São Paulo: Labrador, 2017, p. 317–338. e Cavalcante et al. (2019), para discussão mais aprofundada.
  • 3
    Remeto o/a leitor/a a Araújo e Lima-Neto (2012)ARAÚJO, J. C.; LIMA-NETO, V. Ruptura não, linkagem sim: o hipertexto e as enunciações na web. Veredas: Revista de Estudos Linguísticos, Juiz de Fora, v. 16, n. 2, p. 56–67, 2012., trabalho em que se questiona essa tese e sobre a qual não nos dedicamos a discutir neste trabalho.
  • 4
    Nomeamos a primeira seção deste artigo com uma alusão a um dos mais importantes trabalhos da Linguística Textual, o artigo Revisitando o estatuto do texto, escrito por Cavalcante e Custódio Filho (2010).
  • 5
    A questão é tão cristalizada que, pelo não uso de um especificador ao lado do termo texto, já se supõe que o referente aponta para o ambiente impresso, na modalidade escrita da língua.
  • 6
    Disponível em: https://www.instagram.com/p/CPVjMPgptJi/?utm_medium=share_sheet. Acesso em: 4 dez. 2023.
  • 7
    Disponível em: https://www.instagram.com/p/CP77V7yAzYE/?utm_medium=share_sheet. Acesso em: 4 dez. 2023.
  • 8
    Remetemos o leitor aos trabalhos de Koch (2002)KOCH, I. G. V. Desvendando os segredos do texto. São Paulo: Cortez, 2002., Primo, Recuero e Araújo (2004), Gualberto (2008)GUALBERTO, I. A influência dos hiperlinks na leitura de hipertexto enciclopédico digital. 2008. Tese (Doutorado em Estudos Linguísticos) — Programa de Pós-graduação em Estudos Linguísticos, Universidade Federal de Minas Gerais, Belo Horizonte, 2008. e Hissa (2009)HISSA, D. A organização das informações em portais educacionais a partir de links: uma descrição comparativa dos portais Centro Virtual Cervantes e Educarede. 2009. 196 f. Dissertação (Mestrado em Linguística Aplicada) - Universidade Estadual do Ceará, Fortaleza, 2009., para aprofundamentos do conceito de hiperlink e possíveis classificações.
  • 9
    Se vier a esta nota de rodapé — um outro texto, portanto —, verá que o princípio dos links na hipertextualidade não muda em nada o que está acontecendo neste momento, durante sua leitura. Espera-se, agora, que o leitor acadêmico, ao finalizar este texto, volte os olhos para onde parou, provando que não-linearidade (ou multilinearidade ou deslinearidade) não são do ambiente digital, uma vez que o movimento esperado seria o mesmo, independentemente de ler este trabalho impresso ou em alguma tela.
  • 10
    Mais informações disponíveis em: https://pt.wikipedia.org/wiki/Internet_Relay_Chat#EFnet. Acesso em: 24 set. 2021.
  • 11
    Por questões de espaço, não nos debruçaremos nestas questões, mas remetemos o leitor para os trabalhos de Araújo (2017)ARAÚJO, C. T. M. As funções sociais e discursivas da #Hashtag em seus diversos contextos de uso. 2017. Dissertação (Mestrado em Linguística) — Programa de Pós-graduação em Linguística, Universidade de Brasília, Brasília, 2017. e Burikova e Ovchinnikova (2021)BURIKOVA, S.A.; OVCHINNIKOVA, E. Hashtag as modern text format in Linguistics. Laplage em Revista, Sorocaba, v. 7, n. 2, p. 261–268, maio/ago. 2021., que elencaram diversas funções discursivas, como conferir intensidade ao conteúdo semântico do texto, acrescentar contexto à mensagem, construir identidade de indivíduos, sugerir adesão à mobilização social, promover serviços, comentar emoções, entre outras.
  • 12
    Disponível em: https://twitter.com/search?q=%23CPIdaCovid&src=typeahead_click. Acesso em: 28 set. 2021.
  • 13
    Disponível em: https://www.youtube.com/watch?v=eFtfVEp__Gg. Acesso em: 28 set. 2021.
  • 14
  • 15
  • 16
    Aqui, meme está sendo entendido nos termos de Dawkins (2010)DAWKINS, R. O gene egoísta. São Paulo: EDUSP, 2010., como um replicador cultural, ou seja, ideias que são replicadas de tempos em tempos numa dada cultura.

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    22 Dez 2023
  • Data do Fascículo
    2023

Histórico

  • Recebido
    21 Jul 2022
  • Aceito
    08 Jun 2023
Universidade Estadual Paulista Júlio de Mesquita Filho Rua Quirino de Andrade, 215, 01049-010 São Paulo - SP, Tel. (55 11) 5627-0233 - São Paulo - SP - Brazil
E-mail: alfa@unesp.br