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Leitores-experts e o processo de construção de representações mentais: analisando o texto, as ideias centrais e unidades menores de ideias 1 1 Pesquisa registrada no CEP/Unoesc: Processo/Parecer n°: 083/2004.

Expert readers and the process of construction of mental representations: analyzing the text, the main ideas and smaller units of ideas

Resumo

Considerando os pilares da construção da (compreensão em) leitura - leitor, texto, atividade e contexto - e os processos do discurso na e para a aprendizagem, busca-se tecer reflexões relacionadas ao texto e à (compreensão em) leitura, tais como: propósitos, procedimentos e problemas. Como fundamento, são utilizadas abordagens de trabalho com as informações do texto propostas por Meyer e colegas, Van Dijk e W. Kintsch e colegas. Dois estudos são apresentados, observando-se unidades menores de ideia - UMIs - como elementos básicos à construção das ideias centrais e do nível mais alto de representação. Os resultados apontam para a percepção de UMIs mais importantes numa síntese por leitores-experts, mas esperava-se maior coincidência na seleção. Paralelamente, vê-se a possibilidade do uso de UMIs como andaimes para aprendizagem de leitores em formação.

Palavras-chave:
compreensão em leitura; processos do discurso; representações mentais; habilidade de síntese; unidade menor de ideia

Abstract

Comprehending texts from a cognitive-process perspective involves cornerstones such as reader, text, activity, context, and discursive processes. When related to the teaching-learning process, these elements have different importance. Based on Meyer and colleagues and Van Dijk, W. Kintsch and colleagues, this article discusses two studies to reflect upon and analyze the text and reading comprehension, including purposes, procedures, and problems, outlining the small unit ideas (SUI) as the basic factor to the construction of main ideas and the top-level structure. The results indicate that expert-readers perceive a set of main SUI, although a larger coincidence was expected, besides signaling a prospective use of SUIs to scaffold the teaching-learning processes of reading comprehension and summary construction of younger readers.

Keywords:
reading; reading comprehension; discourse processes; mental representations; summary skills; small unit ideas

1 Diferentes peças do contexto: o conhecimento, a compreensão e o texto

Sociedade do conhecimento e era da informação são dois dos rótulos que se atribuem para referenciar a atualidade, isto é, o final do século XX e início do XXI. Ao se observar a(s) possibilidade(s) de registro e compartilhamento de conhecimento, não há dúvidas de que se presencia algo impossível de ser experimentado antes e importa chamar atenção para o papel das linguagens, em especial, o da linguagem verbal e sua modalidade escrita nesse contexto. Apesar das mudanças e diversificação de processos, propiciados à comunicação humana pelas Tecnologias (e/ou Digitais) da Informação e Comunicação (T(D)ICs), a modalidade escrita continua a desempenhar um papel significativo - sistema econômico e eficaz - de registrar e compartilhar informações e conhecimento produzidos ao longo do tempo. Por essas razões, o acesso pleno ao texto, ou seja, inserção no mundo da escrita, é requisito básico (e, portanto, sinônimo de inclusão) na sociedade moderna pós-industrial. Entretanto, no Brasil, a marginalização ainda é evidente e pesquisas realizadas nas últimas décadas têm apontado para essa realidade, tanto pelos resultados de dados oficiais como o Ministério da Educação, e.g., dados do Sistema de Avaliação da Educação Básica (Saeb), quanto pelos resultados de estudos de outras instituições, como o Instituto Paulo Montenegro, por meio do Indicador de Alfabetismo Funcional - INAF em várias edições: 2001 a 2018. (AÇÃO EDUCATIVA; IPM, 2018AÇÃO EDUCATIVA; INSTITUTO PAULO MONTENEGRO. Indicador de alfabetismo funcional (Inaf). São Paulo: Ação Educativa, 2018. Disponível em: Disponível em: https://bit.ly/2UDRhcV . Acesso em: 4 mai. 2020.
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)

Partindo desse contexto e pressupostos, ser capaz de decodificar e compreender o que foi registrado, ou seja, ler e construir uma representação mental do texto é fundamental para se chegar a um dos pilares do desenvolvimento das sociedades pós-industriais: a aprendizagem por meio do texto escrito. (ALEXANDER; JETTON, 2000ALEXANDER, P. A.; JETTON, T. L. Learning from text: a multidimensional and developmental perspective. In: KAMIL, M. L.; MOSENTHAL P. B.; PEARSON, P. D.; BARR, R. (Ed.). Handbook of reading research. Abingdon: Routledge, 2000. v. 3, p. 285-310.; GOLDMAN; SCARDAMALIA, 2013GOLDMAN, S. R; SCARDAMALIA, M. Managing, understanding, applying, and creating knowledge in the information age: next-generation challenges and opportunities. Cognition and Instruction, London, v. 31, n. 2, p. 255-269, 2013.; MORAIS, 2014MORAIS, J. Alfabetizar para a democracia. Porto Alegre: Penso, 2014.) Em outras palavras, é necessário que o indivíduo - reconhecendo seu papel fundamental no processo - seja capaz de reconhecer e estabelecer relações entre o texto (e o conjunto de seus elementos em seus níveis mais altos e mais baixos de processamento) e os conhecimentos armazenados em sua memória. Assim, ele pode construir um modelo de situação que ampare sua compreensão ao longo da leitura do texto (KINTSCH; VAN DIJK, 1978KINTSCH, W.; VAN DIJK, T. A. Toward a model of text comprehension and production. Psychological review, Washington, DC, v. 85, n. 5, p. 363-394, 1978.; VAN DIJK; KINTSCH, 1983VAN DIJK, T. A.; KINTSCH, W. Strategies of discourse comprehension. London: Academic Press. 1983.; KINTSCH, 1998KINTSCH, W. Comprehension: a paradigm for cognition. New York: CUP, 1998.) e, dessa forma, tem a possibilidade de construir um percurso bem-sucedido de leitura e compreensão, bem como de aprender por meio de textos. Obviamente, a explosão na produção (e especialização) do conhecimento e as T(D)ICs têm complexificado as relações desse quadro, mas, observando isso, pode-se entender a dimensão e importância da (compreensão, da instrução e da pesquisa em) leitura, em especial, no âmbito acadêmico - i.e., da educação básica à universidade, por excelência -, bem como o papel do texto no percurso de construção, armazenamento e recuperação do conhecimento. (CROSSLEY; ALLEN; KYLE; McNAMARA, 2014CROSSLEY, S. A.; ALLEN, L. K.; KYLE, K.; McNAMARA, D. Analyzing discourse processing using a simple natural language processing tool. Discourse Processes, London, v. 51, n. 5-6, p. 511-534, 2014. Disponível em: Disponível em: https://bit.ly/3vWiJ2C . Acesso em: 25 jun. 2021.
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; MOJE; STOCKDILL; KIM; KIM, 2011MOJE, E. B., STOCKDILL, D., KIM, K.; KIM, H. J. The role of text in disciplinary learning. In: KAMIL, M. L.; PEARSON, P. D.; MOJE, E. B.; AFFLERBACH, P. (Ed.). Handbook of reading research , Abingdon: Routledge , 2011. v. 4, p. 453-486.; WADE; MOJE, 2000WADE, S. E.; MOJE, E. B. The role of text in classroom learning. In: KAMIL, M. L.; PEARSON, P. D.; MOJE, E. B.; AFFLERBACH, P. P. (Org.) Handbook of reading research , v. 3, Routledge, 2000. p. 609-627. )

No conjunto dessas considerações, insere-se o presente trabalho, que tem por objetivo tecer algumas reflexões a respeito de propósitos, procedimentos e problemas relacionados à (compreensão em) leitura e ao texto no contexto acadêmico-escolar, a partir de dois estudos. Alguns pontos motivam, em especial, essas reflexões. São eles: (1) O texto tem sido a base do registro e da transmissão de informações, bem como da possibilidade de ampliação de conhecimentos em diversas áreas do saber, uma vez que pode funcionar como memória (individual e/ou coletiva). (BRITTON; BLACK, 1985BRITTON, B. K.; BLACK, J. B. Understanding expository text. In: BRITTON, B. K.; BLACK, J. B. (Org.). Understanding expository text: from structure to process and world knowledge. Abingdon: Routledge , 1985. p. 1-9.) (2) O(s) texto(s) (e suas informações) é(são) apresentado(s), em certa medida, de forma a permitir a construção de representação(ões) mental(is), observando, assim, o empacotamento das informações em sua tessitura - as tramas do texto -, considerando um possível leitor. (GOLDMAN; RAKESTRAW, 2000GOLDMAN, S. R.; RAKESTRAW, J. A. Structural aspects of constructing meaning from text. In: KAMIL, M. L.; MOSENTHAL P. B.; PEARSON, P. D.; BARR, R. (Ed.). Handbook of reading research . Abingdon: Routledge , 2000. p. 311-335.) (3) O texto e suas informações são (re)organizados, sintetizados e (re)integrados ao conhecimento prévio em diversas instâncias (ou seja, as informações são construídas, mantidas e/ou recuperadas) (MEYER; McCONKIE, 1973MEYER, B.; McCONKIE, G. W. What is recalled after hearing a passage? Journal of educational psychology, Washington, DC, v. 65, n. 1, p. 109-117, 1973.; KINTSCH, 1998KINTSCH, W. Comprehension: a paradigm for cognition. New York: CUP, 1998.; PERFETTI; BRITT; GEORGI, 1995PERFETTI, C. A.; BRITT, M. A.; GEORGI, M. C. Text-based learning and reasoning: studies in history. Abingdon: Routledge , 1995.), fazendo da habilidade de síntese uma das habilidades centrais à (compreensão em) leitura. (4) O texto, ao mesmo tempo que necessita de conhecimento armazenado na memória de longo prazo do leitor, ou seja, se serve desse conhecimento para a construção de representações mentais, também modifica as já existentes.

Dois deles - pontos 2 e 3 - são mais importantes, a princípio, para este trabalho, pois se busca estudar o empacotamento da informação no texto e a avaliação e seleção das informações mais importantes por leitores-experts (alto grau de letramento) para a composição de uma síntese do texto. A fim de cumprir esse objetivo, buscou-se, de um lado, amparo em duas grandes abordagens a respeito da organização das informações do texto, apresentadas por Bonnie Meyer e colegas e por Van Dijk e W. Kintsch. Somaram-se, ainda, outros estudos envolvendo novas abordagens de trabalho com a legibilidade - readability, em inglês - (CROSSLEY; ALLEN; KYLE; McNAMARA, 2014CROSSLEY, S. A.; ALLEN, L. K.; KYLE, K.; McNAMARA, D. Analyzing discourse processing using a simple natural language processing tool. Discourse Processes, London, v. 51, n. 5-6, p. 511-534, 2014. Disponível em: Disponível em: https://bit.ly/3vWiJ2C . Acesso em: 25 jun. 2021.
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; CROSSLEY; KYLE; McNAMARA, 2015CROSSLEY, S. A.; KYLE, K.; McNAMARA, D. S. To aggregate or not? linguistic features in automatic essay scoring and feedback systems. The Journal of Writing Assessment, v. 8, n. 1, 2015.; CROSSLEY; SKALICKY; DASCALU; McNAMARA; KYLE, 2017CROSSLEY, S. A.; SKALICKY S.; DASCALU, M.; McNAMARA, D.; KYLE, K. Predicting text comprehension, processing, and familiarity in adult readers: new approaches to readability formulas. Discourse Processes , London, v. 54, n. 5-6, p. 340-359, 2017.), dentre eles, o Coh-Metrix aplicado em duas bases ao português do Brasil, isto é, a partir do Coh-Metrix-Port e do Coh-Metrix-Dementia. (CUNHA; SOUSA; MANSUR; ALUÍSIO, 2015CUNHA, A.; SOUSA, L. B.; MANSUR, L.; ALUÍSIO, S. M. Automatic proposition extraction from dependency trees: helping early prediction of Alzheimer disease from narratives. In: INTERNATIONAL SYMPOSIUM ON COMPUTER-BASED MEDICAL SYSTEMS, 28., 2015, Washington, DC. Anais […]. Washington, DC: IEEE Computer Society, 2015. p. 127-130.) Esse conjunto teórico subsidiou a elaboração de um instrumento de seleção-avaliação das ideias mais importantes, mais tarde submetido a leitores com alto grau de letramento, esperando-se elevado grau de concordância em torno das ideias centrais e a possível generalização dos processos desenvolvidos. Como desdobramento, visando à futura aplicação a outros textos e construção de material de suporte ao processo de ensino-aprendizagem em leitura, aplicou-se o instrumento resultante do estudo 1 a um conjunto de sínteses de um grupo de leitores acadêmico-iniciantes de graduação, configurando-se no estudo 2. A partir desse pano de fundo, inicia-se o artigo com a revisão desses pressupostos teóricos mencionados para, na continuidade, explicitar os materiais e procedimentos do estudo e a análise de dados e considerações.

2 Recuperando e entendendo a trajetória dos estudos

A leitura passou a ser reconhecida como uma área de estudos há mais ou menos um século e, desde então, as relações e papéis que leitor, texto, contexto e processos de compreensão estabelecem entre si têm sofrido mudanças em sua dinâmica. (FOX; ALEXANDER, 2017FOX, E.; ALEXANDER, P. A. Text and comprehension: a retrospective, perspective, and prospective. In: ISRAEL, S. E. (Org.). Handbook of research on reading comprehension, 2. ed. New York: The Guilford Press, 2017. p. 335-352.; PEARSON; CERVETTI, 2015PEARSON, P. D.; CERVETTI, G. N. Fifty years of reading comprehension theory and practice. In: PEARSON, P. D.; HIEBERT, E.H. (Ed.). Research-based practices for teaching common core literacy. New York: Teachers College Press, 2015. p. 1-24.; 2017) Os paradigmas têm se reconfigurado ao longo do tempo (devido aos resultados de pesquisas) e as abordagens já não enfatizam os elementos ora dos modelos ascendentes (bottom-up) (GOUGH, 1972GOUGH, P. B. One second of reading. In: KAVANAGH, J. F.; MATTINGLY, I. G. (Ed.). Language by ear and by eye: the relationships between speech and reading. Cambridge: Mit Press, 1972.), ora dos descendentes (top-down) (GOODMAN, 1976GOODMAN, K. S. Reading: a psycholinguistic guessing game. In: SINGER, H.; RUDDELL, R. B. (Ed.). Theoretical models and processes of reading. Newark: IRA, 1976. p. 497-508. ). Ao contrário, entende-se que ler para compreender envolve tanto o texto quanto o leitor, reconhecendo-se a complexidade de ambos e adicionando-se o próprio processo de interação e o contexto da situação da leitura. Assim, entende-se que não há um leitor ideal, um texto exemplar, um contexto típico ou único e que as relações entre as características de cada um - texto, leitor, atividade a ser realizada e contexto - acabam por influenciar e interferir no processo de construção da(s) representação(ões) mental(is), ou, em outras palavras, na compreensão em leitura. (PEARSON; CERVETTI, 2015PEARSON, P. D.; CERVETTI, G. N. The roots of reading comprehension instruction. In: ISRAEL, S. E. (Ed.). Handbook on reading comprehension. New York: Guilford Publications, 2017. p. 12-56.; VAN DEN BROEK; HELDER, 2017VAN DEN BROEK, P.; HELDER, A. Cognitive processes in discourse comprehension: passive processes, reader-initiated processes, and evolving mental representations. Discourse Processes , London, v. 54, n. 5-6, p. 360-372, 2017.)

Contudo, ao mesmo tempo que se reconhece a inter-relação e integração desses fatores no processo da leitura, também se verifica a necessidade de se estabelecer recortes para que se possa estudar e entender melhor e, em maior profundidade, as particularidades e o papel de cada um deles, tanto no conjunto quanto em situações específicas. Assim, sendo pilares do processo, a discussão central se dará em torno do texto e do leitor, enfatizando o texto expositivo.

2.1 Bases teóricas para construção de representação mental

Ao longo da trajetória dos estudos em leitura, uma das questões discutidas tem sido a importância e a necessidade de se chegar às ideias principais de um determinado texto e o processo de construção e integração dessas ideias, sendo sensível àquelas que são as mais importantes ou centrais. (MEYER; RYCE, 1984MEYER, B.; RICE, Elizabeth. The structure of the text. In: PEARSON, P. D.; (Org.) Handbook of reading research . Longman, 1984. p. 319-352.) Em outras palavras, a importância e a necessidade de se construir uma representação mental do texto - construto psicolinguístico - que envolve a habilidade de síntese. Diferentes caminhos foram apresentados para esse processo, considerando as variáveis que influenciam o processo de leitura, ou seja, o leitor, o texto, a atividade e o contexto (sociocultural). (WADE-STEIN; KINTSCH, 2004WADE-STEIN, D.; KINTSCH, E. Summary street: interactive computer support for writing. Cognition and instruction, London, v. 22, n. 3, p. 333-362, 2004.)

Reconhece-se que há um grau de subjetividade no estabelecimento dessas ideias, observando as variáveis mencionadas na leitura, mas, ao mesmo tempo, entende-se que o leitor precisa ser capaz de, em certa medida, perceber e fazer uso dos elementos que estão dados/salientes no texto e que refletem escolhas do autor na construção de seu olhar a respeito do mundo. A estrutura/organização do discurso permite depreender, no texto expositivo, a conexão entre as ideias (construção mais alta dessa organização - top-level structure) e a subordinação/hierarquização entre as ideias. Isso, por sua vez, influencia na quantidade de informação armazenada e possível de ser recuperada (MEYER; BRANDT; BLUTH, 1980MEYER, B.; BRANDT, D. M.; BLUTH, G. J. Use of top-level structure in text: key for reading comprehension of ninth-grade students. Reading research quarterly, v. 16, n. 1, p. 72-103, 1980.; MEYER; McCONKIE, 1973MEYER, B.; McCONKIE, G. W. What is recalled after hearing a passage? Journal of educational psychology, Washington, DC, v. 65, n. 1, p. 109-117, 1973.) e, consequentemente, na qualidade do que pode ser armazenado. Então, mais uma vez, se tem um círculo que pode ser vicioso ou virtuoso: ser capaz de perceber permite lembrar mais, o lembrar mais, lembrar melhor, e, portanto, permite aprender mais.

As abordagens de trabalho de Meyer e colegas e Van Dijk e W. Kintsch e colegas apresentam questões importantes ao estudo do texto e às habilidades de percepção, construção e integração das ideias e ao processamento em leitura. A seguir, discutem-se pontos que auxiliam a compreensão dos procedimentos e instrumentos deste trabalho.

2.1.1 Meyer: organização da macroestrutura na construção de estrutura mais alta (top-level structure)

Ao longo de seus trabalhos, Meyer e colegas (MEYER, 1975MEYER, B. The organization of prose and its effects on memory. Vol. 1. Amsterdam; Oxford: North-Holland Publishing Company, 1975.; MEYER, 1985MEYER, B. Prose analysis: purposes, procedures, and problems. In: BRITTON, B. K.; BLACK, J. B. (Org.). Understanding expository text: from structure to process and world knowledge . New Jersey: Lawrence Erlbaum Associates, 1985. Parte 1: p. 11-64; Parte 2: 269-304.; MEYER; BRANDT; BLUTH, 1980MEYER, B.; BRANDT, D. M.; BLUTH, G. J. Use of top-level structure in text: key for reading comprehension of ninth-grade students. Reading research quarterly, v. 16, n. 1, p. 72-103, 1980.; MEYER; McCONKIE, 1973MEYER, B.; McCONKIE, G. W. What is recalled after hearing a passage? Journal of educational psychology, Washington, DC, v. 65, n. 1, p. 109-117, 1973.; MEYER; RAY, 2011MEYER, B.; RAY, M. N. Structure strategy interventions: increasing reading comprehension of expository text. International Electronic Journal of Elementary Education, Kütahya, v. 4, n. 1, p. 127-152, 2011.) destacam a importância de perceber a estrutura de conteúdo do texto expositivo e a capacidade de reconhecer esses padrões na organização geral das ideias no texto, para a memória e a aprendizagem. Em outras palavras, é necessário se examinar o texto, a fim de perceber como, proporcionalmente, as unidades se inter-relacionam. Uma vez compreendida essa organização, outros processos, como a percepção dos argumentos que se amparam na macro-organização e a construção de síntese, tornam-se mais acessíveis ao processamento. (MEYER; McCONKIE, 1973MEYER, B.; McCONKIE, G. W. What is recalled after hearing a passage? Journal of educational psychology, Washington, DC, v. 65, n. 1, p. 109-117, 1973.) Meyer (1985) aponta três níveis primários de estruturação dos textos expositivos: o âmbito da sentença, isto é, a esfera do como as ideias são organizadas nas orações e períodos e como eles (orações e períodos) se relacionam no texto, denominado nível microestrutural; o segundo, relativo à organização lógico-argumentativa, chamado nível macroestrutural; e, por fim, o nível mais alto de organização, que direciona o texto como um todo, nível abstrato de organização (top-level). Além desses, a autora estabelece cinco grupos básicos de organização das relações entre os elementos da macroestrutura, propostos nos textos expositivos de forma explícita ou implícita: (problema/solução); comparação; causa (antecedente/consequente); descrição; e coleção (relação). O reconhecimento dessas estruturas facilita a construção da representação mental no processo da compreensão em leitura.

Para Meyer, as unidades de base de análise para o processamento - construto cognitivo - são as “idea units”. Ou seja, unidades de ideias que se organizam a partir de um construto organizacional mais alto, sendo centrais ou periféricas, de acordo com a importância que assumem, revelando a intencionalidade do autor. Nos textos expositivos, isso mostra as conexões lógicas entre as unidades de ideias (idea units), bem como a subordinação e a superordenação entre elas, diferenciando, por exemplo, um texto de uma lista de palavras ou sentenças.

Em diferentes estudos, a autora mostra a existência de ideias que recebem lugar de destaque na hierarquia das estruturas de conteúdo e, na medida em que o texto tem sua continuidade e outras ideias se relacionam a uma dessas unidades, se evita a repetição de conteúdo, na superfície, procedendo o apagamento em proposição subordinada. Esse processo torna-se mais efetivo quando as unidades de ideias podem ser organizadas nas relações da estrutura em seu nível mais alto de abstração.

2.1.2 W. Kintsch e Van Dijk: base textual (text-base) e modelo de situação (situation model)

W. Kintsch, Van Dijk e colegas voltam-se para o processamento e os diferentes níveis envolvidos no processamento da informação para a compreensão. Nessa abordagem, o processamento e a compreensão do texto envolvem o trabalho com a microestrutura e a macroestrutura, a construção da base textual e do modelo de situação que, em seu conjunto, possibilitam a representação mental do texto. (KINTSCH, 1998KINTSCH, W. Comprehension: a paradigm for cognition. New York: CUP, 1998.; KINTSCH; VAN DIJK; KINTSCH, 1983VAN DIJK, T. A.; KINTSCH, W. Strategies of discourse comprehension. London: Academic Press. 1983.; VAN DIJK, 1978) O processamento em leitura e processos dele decorrentes são desencadeados por elementos linguísticos e suas combinações possibilitam a formação de proposições - as unidades base do processamento. Essas, por sua vez, estabelecem relações entre si para a composição da microestrutura. As macroproposições - mais amplas em seu grau de generalidade - permitem a construção da coerência em nível cognitivo mais alto, ou seja, o da macroestrutura. A macroestrutura pode vir apresentada de forma explícita, ou não, no texto. Dessa forma, o processamento da microestrutura e da macroestrutura permite, em primeira instância, estabelecer a base textual e, em conjunto com a memória semântica, a construção do modelo de situação. Em outras palavras, ao mesmo tempo que a representação mental de um texto envolve a integração de informações dos níveis mencionados (e de subprocessos que ainda lhes são subjacentes), do conhecimento (relevante) armazenado na memória, ainda demanda compreensão em profundidade. Ativação e recuperação das representações desse conhecimento e a construção de inferências são exemplos de processos necessários à(s) representação(ões) mental(is). Alterações em processos de construção e integração podem resultar em diferenças significativas às representações mentais.

Van Dijk e W. Kintsch (1983) entendem que o leitor constrói a macroestrutura do texto tão logo entenda que possui informação suficiente para isso. Desdobramentos de outras pesquisas apontam que isso acontece com o leitor adulto (e com experiência) (LORCH; LORCH; MATTHEWS, 1985LORCH, R. F.; LORCH, E. P.; MATTHEWS, P. D. Online processing of the topic structure of a text. Journal of memory and language, Amsterdam, v. 24, n. 3, p. 350-362, 1985.), e, ao mesmo tempo, outros estudos observam que o leitor em formação não necessariamente procede da mesma maneira. (MEYER; BRANDT; BLUTH, 1980MEYER, B.; BRANDT, D. M.; BLUTH, G. J. Use of top-level structure in text: key for reading comprehension of ninth-grade students. Reading research quarterly, v. 16, n. 1, p. 72-103, 1980.; PERFETTI, 1985PERFETTI, C. A. Reading ability. Oxford: Oxford University Press, 1985.) Por sua vez, em trabalho posterior, W. Kintsch (1998) pondera que a construção da microestrutura e da macroestrutura do texto-base nem sempre é espelho do modelo situacional, pois o leitor pode se distanciar do plano do autor e reestruturar o texto, tanto local quanto globalmente. O modelo situacional implica elaboração de conhecimento e conhecimento que advém da interpretação.

Ambas as abordagens anteriormente apresentadas lidam com a estrutura hierárquica das ideias do e no texto. Ambas trabalham com a recorrência de conceitos e as relações lógicas e semânticas. Variam na sua formalização, pois suas unidades de processamento organizam-se de modo distinto para a sua composição. Na abordagem de W. Kintsch, conta-se com as informações bottom-up na microestrutura para acionar as informações na memória do leitor e para posterior construção-integração do texto-base e do modelo de situação. Na abordagem de Meyer, a percepção da relação mais alta de organização do texto é fundamental para a construção e organização das unidades de ideias. Ambas trabalham com o princípio de um construto de representação de ideias e proposições e apresentam aplicações diferentes para as perguntas de pesquisa e na avaliação da compreensão, bem como das tarefas de compreensão decorrentes da complexidade do texto e dos processos psicolinguísticos de leitura e escrita.

Neste trabalho, de cunho aplicado, ambas as abordagens interessam, devido às relações que estabelecem com a construção da compreensão em leitura e a construção, integração e armazenamento das informações para e no processo de elaboração de síntese e, portanto, do trabalho das ideias mais importantes em textos de maior extensão. Assim, com base nas explanações teóricas previamente mencionadas, buscou-se despetalar o texto, construindo para esse trabalho unidade menores de ideias (doravante, UMIs) - unidades mais curtas em sua extensão do que as dadas no texto-base (text-base), mas observando a macroestrutura e unidades de ideias apresentadas.

Dois estudos compõem o presente trabalho. O primeiro teve por objetivo verificar, inicialmente, se as UMIs propostas e apresentadas na matriz de avaliação estavam contempladas no texto original e, em segundo lugar, se haveria um conjunto comum de unidades que seriam entendidas por experts como as mais importantes a figurar em um resumo/síntese após a leitura. No segundo, buscou-se verificar a proximidade e/ou distanciamento de sínteses elaboradas em uma tarefa de leitura, por leitores acadêmicos em formação, a partir do conjunto de UMIs elencadas como as mais relevantes a figurarem em uma síntese. A seguir, busca-se detalhar esses dois estudos.

3 Estudo um

3.1 Método

3.1.1 Participantes

Participaram deste estudo cinco experts, leitores com alto grau de letramento e escolarização - i.e., doutores em áreas relacionadas aos estudos da linguagem com alta proficiência em leitura e conhecedores da tarefa de síntese.

3.1.2 Materiais e procedimentos

Para o primeiro estudo, utilizou-se um texto expositivo de revista de divulgação científica, intitulado “Água de lastro. Ameaça aos ecossistemas” (SILVA; FERNANDES; LARSEN; SOUSA, 2002SILVA, J. S. V.; FERNANDES, F. C.; LARSEN, K. T. S.; SOUZA, R. C. C. L. Água de lastro: ameaça aos ecossistemas. Ciência Hoje, v. 32, n. 188, p. 38-43, 2002.) - doravante Água, que aborda o problema gerado pelo descarte da água de lastro no transporte marítimo e as consequências aos ecossistemas. O texto original foi analisado, inicialmente, de forma manual, utilizando medidas propostas pela Teoria Sistêmica Funcional (EGGINS, 2004EGGINS, S. An introduction to systemic functional linguistics. London/New York: Continnuum International Publishing Group, 2004.), em seu número total de palavras e densidade lexical e complexidade sintática. Posteriormente, passou por análise de métricas no Coh-Metrix em versão para a língua portuguesa (ALUÍSIO; CUNHA; SCARTON, 2016ALUÍSIO, S. M.; CUNHA, A.; SCARTON, C. Evaluating progression of aAlzheimer’s disease by regression and classification methods in a narrative language test in portuguese. In: INTERNATIONAL CONFERENCE ON THE COMPUTATIONAL PROCESSING OF PORTUGUESE, 12., 2016, Tomar. Anais […]. Tomar: Propor, 2016. p. 109-114.; CUNHA; SOUSA; MANSUR; ALUÍSIO, 2015CUNHA, A.; SOUSA, L. B.; MANSUR, L.; ALUÍSIO, S. M. Automatic proposition extraction from dependency trees: helping early prediction of Alzheimer disease from narratives. In: INTERNATIONAL SYMPOSIUM ON COMPUTER-BASED MEDICAL SYSTEMS, 28., 2015, Washington, DC. Anais […]. Washington, DC: IEEE Computer Society, 2015. p. 127-130.; SCARTON; ALUÍSIO, 2010SCARTON, C. E.; ALUÍSIO, S. M. Análise da inteligibilidade de textos via ferramentas de processamento de língua natural: adaptando as métricas do Coh-Metrix para o português. Linguamática, v. 2, n. 1, p. 45-61, 2010.), com um número maior de medidas disponíveis. Para essa análise, foram selecionadas algumas das métricas que analisam diferentes características linguísticas e indicam a complexidade do processamento, considerando os processos envolvidos na leitura e compreensão do texto em seu nível mais alto (processos cognitivos e metacognitivos e níveis de representações mentais). As métricas (os índices) se relacionam, por exemplo, ao número de palavras, número de parágrafos, números de períodos, relação de types e tokens, diversidade lexical, lematização, elementos da complexidade sintática - e.g., média de palavras antes do verbo principal -, correferentes, o dado e o novo (new and given), relações conjuntivas, sinalizadores da estrutura retórica.

A partir do texto-base e seus parágrafos, períodos e orações, ou seja, da estrutura de superfície, um conjunto de UMIs do texto foi construído, observando-se a estrutura em árvore das unidades e seu imbricamento no texto. Cada período foi segmentado em unidades menores, observando as proposições dadas no texto-base. A partir da análise da estrutura de superfície do texto, do léxico e da estrutura das orações, alguns procedimentos foram necessários às UMIs: (1) na construção das unidades, manteve-se sempre um verbo que se possibilita manter uma ideia apresentada no texto-base; (2) apagamentos foram realizados, considerando modificadores, i.e., advérbios e adjetivos nos sintagmas, conectivos e possíveis exemplos; (3) reiterações de nomes ou sintagmas nominais, foram feitas quando esses elementos eram necessários para a compreensão da UMI em si e, assim, mantidos entre parênteses ou colchetes, sinalizando construção ou recuperação de uma ideia apresentada anteriormente.

As UMIs buscaram observar o aparecimento das ideias apresentadas no texto para construção da(s) ideia(s) central(is), esclarecendo que não se entende um texto como uma lista de frases, mas que a apresentação/posição das ideias, a estrutura lógica e as repetições são aspectos importantes para a representação mental. (MEYER; McCONKIE, 1973MEYER, B.; McCONKIE, G. W. What is recalled after hearing a passage? Journal of educational psychology, Washington, DC, v. 65, n. 1, p. 109-117, 1973.) Dois experts em leitura (doravante, EL) discutiram o conjunto de UMIs do texto “Água”, a partir do texto original e de um conjunto de UMIs, considerando as questões teóricas, anteriormente discutidas por Meyer e colegas e W. Kintsch e Van Dijk e colegas, para a construção do instrumento. A seguir, a título de exemplificação, apresenta-se um trecho de “Água”, parte do segundo parágrafo, e o respectivo conjunto de UMIs construídas para a avaliação por parte dos EL e para a avaliação e seleção por parte dos leitores-experts.

Quadro 1
Água: texto original e texto-base UMIs

Ressalta-se que o processo de construção das UMIs observou as ideias importantes para a construção do tema central e a macroestrutura, simplificando a intrincada teia de ideias apresentada na estrutura de superfície. Por isso, conforme já se mencionou, a repetição de algumas unidades lexicais ocorre no interior das UMIs, assim como, exemplos de um conceito podem ter sido apagados em sua formulação.

Em etapa posterior, os leitores-experts realizaram a leitura do texto, uma tarefa de avaliação das UMIs e uma tarefa de seleção de um terço das UMIs, considerando as mais importantes a serem contempladas em uma síntese. Cada leitor-expert recebeu uma cópia das instruções da tarefa, do texto original e do conjunto de UMIs em planilha para a realização das tarefas: a primeira parte consistiu em avaliar se as UMIs estavam contempladas no texto de forma integral, parcial ou não constavam - buscava-se verificar a validade de construção da UMI, isto é, ela não deveria ser elegível, uma vez julgada inexistente pelo princípio da coerência e validação interna -; a segunda compreendeu em selecionar as mais importantes, considerando determinado número, correspondente a 1/3 do número total, e especificado nas instruções. O conjunto de UMIs foi fornecido e, por isso, se pediu aos experts que primeiro avaliassem a existência/presença dessas UMIs no texto “Água” para, depois, elencar os mais importantes a constar em tarefa de síntese. Caso se tivesse proposto uma tarefa aberta, não se teria a possibilidade de julgar/avaliar as unidades de forma semelhante a partir das respostas de todos os leitores, nem seria possível a construção de instrumento e/ou material com possíveis andaimes para o processo ensino-aprendizagem de compreensão em leitura e de síntese.

A partir da análise dos conjuntos de UMIs, buscou-se a validade dessas unidades no processo de construção da(s) representação(ões) mental(is) e o estudo da seleção de um conjunto de unidades por leitores altamente proficientes. Considerando as habilidades de leitores com alto grau de expertise em leitura e tarefa comum, se esperava elevado índice de concordância na identificação e seleção das UMIs mais importantes a comporem uma síntese a partir da leitura de textos expositivos (no caso, artigos de divulgação científica, Journalistic Reported Versions, JRV (YARDEN; NORRIS; PHILLIPS, 2015YARDEN, A.; NORRIS S.P.; PHILLIPS, L.M. Adapted primary literature. New York: Springer, 2015.), sendo essas essenciais para a compreensão do texto. (CIRILO; FOSS, 1980CIRILO, R. K.; FOSS, D. J. Text structure and reading time for sentences. Journal of Verbal Learning and Verbal Behavior, Amsterdam, v. 19, n. 1, p. 96-109, 1980. Disponível em: Disponível em: https://bit.ly/3dfi0mu . Acesso em: 25 jun. 2021.
https://bit.ly/3dfi0mu...
; SCHRAW; WADE; KARDASH, 1993SCHRAW, G.; WADE, S. E.; KARDASH, C. A. Interactive effects of text-based and task-based importance on learning from text. Journal of educational psychology , Washington DC, v. 85, n. 4, p. 652-661, 1993.)

3.1.3 Resultados e discussão

Considerando a proposta de Meyer (1973MEYER, B.; McCONKIE, G. W. What is recalled after hearing a passage? Journal of educational psychology, Washington, DC, v. 65, n. 1, p. 109-117, 1973.; 1985MEYER, B. Prose analysis: purposes, procedures, and problems. In: BRITTON, B. K.; BLACK, J. B. (Org.). Understanding expository text: from structure to process and world knowledge . New Jersey: Lawrence Erlbaum Associates, 1985. Parte 1: p. 11-64; Parte 2: 269-304.) para a análise de diferentes tipos de organização da macroestrutura do texto expositivo, observa-se no texto “Água”, a organização problema-solução. Em outras palavras, o texto organiza-se em torno de argumentos que apresentam um problema: a água de lastro e a ameaça que ela pode representar. No decorrer do texto, outros argumentos são tecidos, apresentando algumas possíveis medidas para amenizar o problema, buscando-se, assim, uma solução. Contudo, a identificação da estrutura mais alta de organização desse texto não se apresenta de forma tão transparente e, tampouco, o tema do texto pode ser confirmado sem que se avance na leitura. O tema central é a água de lastro como ameaça aos ecossistemas, em princípio anunciado pelo título, mas o texto dedica-se, em primeiro lugar, a apresentar o problema, considerando também o subtema espécies exóticas, que ganha peso importante em relação ao tema central na construção dos argumentos, pois as espécies exóticas são a ameaça final aos ecossistemas endêmicos.

A composição do texto “Água”, a partir de algumas de suas métricas, revela um texto com 824 palavras, dividido em 13 parágrafos e 35 períodos. Os parágrafos se estruturam com a média de 2,69 períodos e os períodos apresentam a média de 23,54 palavras. O número médio de orações por sentença é de 1.91. E a média de palavras que antecedem o verbo principal é de 6.34. Esses dados, em seu conjunto, indicam que o texto apresenta dificuldade média a alta. Isso se confirma ao se considerar o Índice Flesch no valor de 31.81, que situa o texto entre os níveis de maior complexidade para a leitura.

Conforme mencionado, na tarefa apresentada aos leitores-experts, um conjunto de UMIs foi fornecido em uma matriz a partir da qual eles deveriam proceder o trabalho de análise e seleção. Setenta e nove (79) UMIs compunham a matriz de “Água”. Os resultados da primeira tarefa de avaliação revelaram alto grau de confiabilidade das unidades, i.e., 95% das UMIs tiveram entre 80 e 100% de avaliação positiva de sua presença no texto-base original. Os outros 5% obtiveram índices entre 60% e 70%. Na segunda tarefa, que compreendeu a seleção de 22 dentre as 79 UMIs,2 2 Ou seja, próximo de um terço do conjunto de UMIs, apresentado como os mais importantes para a construção de uma síntese. os experts não selecionaram 35 delas e atribuíram pontuação a outras 44. Dentre as 44 UMIs pontuadas, 21 foram selecionadas, ao menos, por três dos leitores-experts, compreendendo quase 30% do conjunto das UMIs, número próximo ao solicitado na tarefa de seleção para a composição da síntese. As outras 23 UMIs selecionadas variaram no grau de concordância entre os experts.

As UMIs foram agrupadas a partir da concordância estabelecida entre os experts. Ou seja, as UMIs selecionadas, por ao menos três ou mais dos leitores-experts, formaram o conjunto considerado nuclear. Estabeleceu-se também um conjunto periférico, a partir das UMIs quando houve variação na escolha, i.e., igual ou menor que dois experts e, por fim, um terceiro conjunto foi formado pelas UMIs não selecionadas ou descartadas (veja quadro 2). O conjunto nuclear de UMIs possibilita algumas inferências ao se buscar o mapeamento das unidades centrais para a síntese.

Quadro 2
CORE com as 21 UMIs selecionadas pelos leitores-experts

O primeiro movimento feito foi agrupar as UMIs pela proximidade de assunto. Ao se observar seis das primeiras UMIs da matriz (1, 3, 8, 5, 9, 14) e elencadas como importantes a configurar em uma síntese, pode-se perceber a identificação, por parte dos experts, da existência da questão-problema. Não considerando a ordem da apresentação das ideias no texto-base, e sim a estrutura do conteúdo, percebe-se que os leitores escolheram as UMIs que se relacionam à configuração do problema que é posteriormente elaborado ao longo dos demais parágrafos (e/ou UMIs). Eles detectam que há um problema e ele está relacionado à água de lastro e introdução/invasão de espécies exóticas em ecossistemas. Isso pode ser detectado ao observarmos a recorrência dessas ideias nas UMIs selecionadas.

Embora para a composição das UMIs tenha sido importante, em certa medida, manter a sequência das ideias apresentadas no texto, considerando que elas foram assim apresentadas e essa ordem era necessária, em alguns momentos, para o encadeamento da hierarquia das ideias, ao pensar no processo da construção da representação mental, esse aspecto pode ter importância relativa. A escolha das UMIs aponta para isso. O que se depreende do processo de seleção é a ênfase no efeito do problema, os efeitos da água de lastro, ou seja, as espécies exóticas (o que são, como chegam, seus impactos). O conjunto de UMIs selecionado revela, inicialmente, em que compreendem as espécies exóticas: animais e plantas em ecossistema alheio ao seu. Somam-se a essa informação o despertar da atenção da comunidade científica e do governo e seus resultados em impactos ecológicos e econômicos. Na composição do problema, indica-se como seres e materiais são levados de um lugar a outro do mundo, isto é, pelo transporte de longa distância. Há transferência contínua de organismos pela água de lastro, por isso a água de lastro é ameaça.

Outras cinco das UMIs que seguem (26, 27, 30, 29, 35) contribuem para o refinamento das ideias. Pontua-se qual e em que medida o transporte de longa distância - transporte marítimo - tem papel de destaque no problema, esclarecendo a respeito de sua contribuição, i.e., eliminação ou redução de barreiras entre ecossistemas e consequente homogeneização. Essas UMIs - chamadas aqui de nucleares, pois são parte do primeiro conjunto selecionado -, assim como as anteriores, não oferecem detalhes a respeito do agente do problema, ou seja, a água de lastro. Isso permite pensar que, em princípio, o leitor entende que essa informação pode ser inferida a partir de outros elementos nas UMIs, por exemplo, (09) “Transporte de longa distância leva seres e materiais de um lugar a outro do mundo”; (14) “Há transferência contínua de organismos através da água de lastro”; (27) “O transporte marítimo internacional contribui para eliminar ou reduzir barreiras”; (35) “Transferem-se 10 milhões de toneladas de água de lastro anualmente em todo o mundo”. Uma vez conhecendo a relação da água para o problema, se poderia dispensar detalhamentos ou explicações de sua função na navegação. Mais importante são as informações relativas aos números em relação à ameaça e seu resultado: a homogeneização.

Observando o texto-base, as UMIs e as UMIs nucleares, percebe-se que, após situar o problema de forma geral, os experts focam na particularização do problema, no contexto brasileiro, devido ao (33) predomínio do comércio exterior e extensa costa e à (41) ausência de controle dos lançamentos da água de lastro (nos portos), movimento feito adiante no texto original novamente (i.e., trazer a discussão para a situação do Brasil), mas que foi contemplado sem alusão direta, como se pode ver adiante. Na continuidade, as UMIs especificam o que implica o sucesso de colonização, explicando que (48) o ponto de descarga da água pode favorecê-lo e que (50) portos situados em áreas protegidas são mais suscetíveis. Apontam consequências, i.e., problemas para animais e plantas nativos e para a população humana local, destacando que ações que modificam ou degradam (o ambiente ou o regime hidrográfico) criam novas oportunidades para o estabelecimento de espécies. O conjunto final de UMIs, formado por outras quatro, dirige a atenção, novamente, para o contexto brasileiro, mas isso precisa ser inferido devido a afirmações em UMIs anteriores (33 e 41) que se relacionam a outras três selecionadas (73, 74 e 76). Anteriormente, mencionou-se que o Brasil não tem controle do lançamento da água de lastro e que possui extensa costa, duas ideias que agora podem ser associadas a UMI (73), referindo-se ao número de portos e variedades de ecossistemas, razões da dificuldade no monitoramento e controle da água de lastro, a UMI (74) que menciona o vasto território nacional e a (76) que retoma o controle e o gerenciamento do problema, o qual precisa do monitoramento do ambiente. Por fim, destaca que (77) para o controle é necessário cumprir o pré-requisito de se conhecer flora e fauna locais.

O segundo conjunto de UMIs - chamado aqui de estendido, i.e., selecionadas por apenas dois dos experts - apresenta, primeiramente, também o problema de ameaça aos ecossistemas (2, 4). Contudo, o direcionamento do problema passa para o modo como os animais e plantas exóticos são levados a novos ecossistemas e abordam a água de lastro e seu papel na navegação (12, 13, 15, 16, 23, 24). Um segundo grupo de UMIs aborda outra faceta do problema que são a prevalência do comércio exterior marítimo e os números decorrentes e relacionados ao Brasil e a água de lastro (31, 32, 36, 38, 42, 43). Outro pequeno grupo explica a diferença entre registro ou introdução de espécie em novo ambiente e a colonização (47, 55, 60, 61). Por fim, outras UMIs chamam atenção para o problema em todo o mundo e uma solução paliativa, como a esterilização da água de lastro (68, 69, 70,71).

O último conjunto de UMIs deste estudo engloba aquelas que não foram selecionadas por nenhum dos experts para a composição do conjunto essencial a figurar em uma síntese. Analisando as 35 UMIs que foram desprezadas, é possível identificar algumas características que vale assinalar. Entre elas, percebe-se que explicações que detalham uma ideia foram deixadas de lado. Há dois exemplos de conjunto de UMIs que mostram isso: um deles detalha o papel e a função da água de lastro (17, 18, 19, 20, 21, 22, 25), o outro esclarece a respeito de outros elementos que contribuem com o processo de assentamento de espécies, mas sua relação é indireta ao tema central (56, 57, 58, 59, 62, 63, 64, 65, 66). Além disso, UMIs que carregam uma informação que pode ser considerada “velha” (HAVILAND; CLARK, 1974HAVILAND, S. E.; CLARK, H. H. What’s new? Acquiring new information as a process in comprehension. Journal of Verbal Learning and Verbal Behavior , Amsterdam, v. 13, n. 5, p. 512-521, 1974.), i.e., (46) “Um navio deslastra ao carregar”, levando-se em conta as informações anteriores a respeito da água de lastro, ou podem, ainda, ser parte do conhecimento prévio do leitor - (56) “A introdução ocorre em um local, um ambiente”, considerando que se trata de introdução de espécies e, portanto, a noção de espaço está presente - também foram desconsideradas pelos leitores-experts.

A análise dos três conjuntos de UMIs, especialmente, as que compõem o conjunto nuclear, revela que os experts realizaram a tarefa considerando a existência de organização problema-solução. As UMIs escolhidas buscam caracterizar o problema - (1) a água de lastro e (2) a invasão de ecossistemas -, apresentando fatores que agravam essa ameaça, ou seja, o comércio marítimo que elimina ou reduz as barreiras entre ecossistemas e a falta de conhecimento das autoridades brasileiras, considerando os lançamentos da água de lastro e os diferentes ecossistemas da extensa costa do Brasil. Essas duas questões são características do problema, mas também são apontadas como uma possível solução. O conhecimento desses fatores contribuiria para medidas minimizadoras. Esse comportamento dos experts vai ao encontro da defesa de Meyer, e Van Dijk e W. Kintsch a respeito da importância da percepção e construção da macroestrutura do texto para a compreensão. Organizar as informações advindas do texto, a partir de uma estrutura de organização mais alta, permite avaliar, de forma mais segura, as informações que têm mais peso para a construção das representações mentais do texto e, de forma sintética, passarão a integrar as redes de conhecimento anterior, podendo ser, então, armazenadas e recuperadas da memória de longo prazo. Certamente, essa habilidade está relacionada à experiência em leitura do leitor. Observa-se aqui o comportamento de leitores experientes na tarefa. Ao mesmo tempo, pode-se pensar na viabilidade de se prover ao leitor em construção e, por isso, menos experiente, atividades que lhe forneçam andaimes (scaffolding) à análise das UMIs existentes no texto e àquelas que podem ser as mais relevantes de acordo com a estrutura mais alta de organização. (GRAESSER; GERNSBACHER; GOLDMAN, 2018GRAESSER, A. C.; GERNSBACHER, M. A; GOLDMAN, S. Afterword. World-wide changes in discourse and the changing field of discourses processes. In: SCHOBER, M. F.; RAPP, D. N.; BRITT, M. A. (Ed.). The Routledge handbook of discourse processes. Abingdon: Routledge , 2018. p. 390-396.)

4 Estudo Dois

4.1 Método

4.1.1 Participantes

Onze estudantes do primeiro ano de um curso de graduação - bacharelado - foram selecionados, considerando o seu desempenho em um teste de compreensão em leitura. Seis deles tiveram alto desempenho nas atividades de compreensão, enquanto cinco deles apresentaram desempenho baixo. Eles(as) produziram as sínteses em uma segunda etapa de um estudo envolvendo a compreensão em leitura realizado por Finger-Kratochvil3 3 O trabalho completo pode ser acessado no repositório institucional da Universidade Federal de Santa Catarina. Disponível em: https://repositorio.ufsc.br/handle/123456789/94372. Acesso em: 28 jun. 2021. (2010).

4.1.2 Materiais e procedimentos

O segundo estudo buscou conhecer a aproximação e/ou distanciamento de informações entre os conjuntos de UMIs selecionados pelos experts e as sínteses de onze acadêmicos, leitores em formação, divididos em dois grupos - alta e baixa performance - em compreensão em leitura, a partir de um teste elaborado e validado estatisticamente em outro estudo. (FINGER-KRATOCHVIL, 2010FINGER-KRATOCHVIL, C. Estratégias para o desenvolvimento da competência lexical: relações com a compreensão em leitura. 2010. Tese (Doutorado em Letras) - Universidade Federal de Santa Catarina, Florianópolis, 2010.) Os participantes realizaram a construção de uma síntese a partir da leitura do texto “Água”, em tela digital, e a tarefa de pensar em voz alta (protocolo verbal). As sínteses foram construídas de forma livre, podendo ser feitas notas na janela inferior à janela em que o texto original foi disponibilizado para a leitura, por meio da interface do Translog®.

Primeiramente, a partir das sínteses, dois experts em leitura, considerando as 79 UMIs construídas, buscaram detectar a existência de forma integral, parcial (ou a ausência) de informações. Assim, estabeleceu-se uma pontuação de 2 a 0 para cada uma das UMIs, podendo os participantes, hipoteticamente, chegar ao máximo de 158 pontos, caso contemplassem todas as informações existentes nas UMIs. Em um segundo momento, passou-se à análise da existência das informações das UMIs que compuseram as sínteses, partindo dos dois conjuntos de UMIs que receberam alguma pontuação na avaliação dos leitores-experts - i.e., o conjunto nuclear e o estendido -, a fim de verificar a aproximação e/ou distanciamento entre as informações selecionadas pelos leitores em formação e os experts. Tendo em vista os escores dos participantes no teste CF-K de leitura (FINGER-KRATOCHVIL, 2010FINGER-KRATOCHVIL, C. Estratégias para o desenvolvimento da competência lexical: relações com a compreensão em leitura. 2010. Tese (Doutorado em Letras) - Universidade Federal de Santa Catarina, Florianópolis, 2010.), esperava-se que houvesse diferenças nas sínteses elaboradas entre grupos, variando o número de unidades de conteúdo passíveis de recuperação a partir das UMIs. Dessa forma, esperava-se que os participantes com melhores escores no teste de leitura apresentariam sínteses com maior número de informações e, portanto, com melhor qualidade comparativamente. Além disso, observado o conjunto nuclear de UMIs, contava-se com uma aproximação maior entre as UMIs e as informações por eles selecionadas na composição das sínteses. A tabela a seguir apresenta os dados do desempenho no teste de leitura, da pontuação geral em relação às 79 UMIs, e em relação aos dois conjuntos de UMIs selecionados pelos experts.

Tabela 1
Desempenho no teste CF-K de leitura e pontuação a partir das 79 UMIs

Observando os dados da segunda e terceira colunas da Tabela 1 - desempenho no teste CF-K de leitura e pontuação a partir das 79 UMIs -, percebe-se que os participantes com melhor desempenho no teste (i.e., CSPP0812, CSPP0818, CSPP0829, CSPP0830, CSPP0838), comparativamente, são os que apresentam melhor pontuação quando considerado o conjunto de todas as UMIs, com exceção de CSPP0801, confirmando-se a expectativa do efeito Mateus (STANOVICH, 1986STANOVICH, K. E. Cognitive processes and the reading problems of learning disabled children: evaluating the assumption of specificity. In: TORGESEN, J.; WONG, B. (Ed.). Psychological and educational perspectives on learning disabilities. New York: Academic Press, 1986. p. 87-131.) para a maior parte dos participantes. Nota-se também uma variação entre os participantes na pontuação, verificando-se diferenças de quantidade de informação nas sínteses, que pode ser indicativo de diferenças tanto na compreensão leitora, quanto nas habilidades de avaliação e seleção das informações entendidas como relevantes a constar na síntese. Essas questões ficam ainda mais salientes quando se observa o desempenho dos demais participantes que obtiveram escores baixos no teste CF-K de leitura. A pontuação apresenta-se baixa em relação ao conjunto das UMIs e, quando analisada de forma comparada com o grupo anterior, também revela baixa quantidade de informações. Contudo, esses índices precisam ser analisados com cuidado, pois podem ser enganosos (em parte), caso a pontuação alcançada tenha alta relação com os dois conjuntos de UMIs selecionados. Assim, é prudente analisar, ao menos, o conjunto nuclear de UMIs.

A quarta coluna da tabela apresenta os resultados dos escores da avaliação relativos ao conjunto nuclear de UMIs. Ou seja, as UMIs que obtiveram maior percentual de acordo (e, portanto, entendidas como importantes) entre os cinco leitores-experts do estudo um, discutido anteriormente. O conjunto de 21 UMIs poderia resultar em 42 pontos se todas elas tivessem sido contempladas integralmente. A análise tanto da pontuação quanto do percentual obtidos pelos participantes aponta, com exceção para CSPP0818, índices de menos de 50% de compatibilidade e correspondência entre as sínteses elaboradas e as informações das UMIs que compõem esse conjunto. Os resultados, em certa medida, corroboram a expectativa anterior de que os leitores com melhor desempenho no teste de leitura apresentariam pontuação mais alta. Mas índices abaixo de 50% parecem indicar que há uma distância entre a compreensão dos leitores-experts e a dos leitores em formação. Caso se considerasse a formação de um grupo com pontuação mediana, ou seja, apresentando índices em torno de 50% de compatibilidade como resultado esperado e/ou possível para leitores em formação, ao analisar os resultados da pontuação de grande parte dos participantes, ainda assim, se verificaria que vários deles apresentaram escores na casa dos 20%. Isso não significa resultado satisfatório, mas poderia apontar, parcialmente, para carências na construção de habilidades, até aquele momento, na trajetória dos participantes, apontando para a importância do trabalho de habilidades de leitura, em especial, as de construção do texto-base e modelo situacional, a ser desenvolvido ao longo da trajetória acadêmica.

Observando os resultados do conjunto nuclear e considerando o leitor em formação, decidiu-se ampliar a análise para o conjunto estendido de UMIs, também selecionado pelos experts, mas com grau menor de concordância, a fim de verificar se os participantes teriam selecionado informações desse conjunto que lhes possibilitaria compor a síntese. A pontuação e o percentual obtidos compõem a última coluna da tabela 1. Os dados mostram que, ampliando o conjunto de informações possíveis de seleção, a pontuação e os percentuais dos participantes não apresentam resultados uniformes para cima ou para baixo. Em nenhum caso decresce a pontuação ao conjunto de UMIs. Contudo, variam os reflexos desse aumento quando analisados os percentuais. O conjunto estendido permite observar que os participantes se utilizam de informações que compõem esse segundo conjunto, menos central, mas não desprezável. Porém, os percentuais não indicam aumento proporcional. Além disso, apenas a análise quantitativa não permite verificar se há um incremento na coerência das unidades de ideias menores e informações selecionadas.

Por fim, cabe pontuar que, na análise geral, houve também seleção de informações que faziam parte do conjunto de UMIs não elencadas pelos leitores-experts como relevantes para uma síntese, indicando, dessa maneira, fragilidades na habilidade de percepção do valor das informações para a representação do texto. Esses dados apontam tanto para a importância de se expandir o estudo, aplicando essa matriz de UMIs para um número maior de textos com características semelhantes em termos de métricas e com organização problema-solução, quanto de se estudar também a coerência das unidades e informações avaliadas pelos leitores em formação como importantes para compor uma síntese do texto.

5 Considerações finais

Por meio das UMIs, buscou-se desempacotar o conjunto de informações do texto a fim de estudar, indiretamente, o comportamento dos leitores-experts na seleção de unidades de conteúdo que, de acordo com sua experiência de leitor, seriam as mais importantes a integrar uma síntese do texto. A construção dessa matriz de UMIs teve por objetivo averiguar que informações seriam elegíveis no conjunto, a consonância entre experts e o que ambos os aspectos poderiam indicar. Ao mesmo tempo, passou-se a avaliar a viabilidade de aplicação desse instrumento, isto é, matrizes de UMIs, como possível material de suporte para o processo de ensino-aprendizagem da compreensão em leitura, especialmente, a habilidade de síntese, como andaimes (scaffolding) para o processo e para a avaliação.

Em relação aos aspectos iniciais, percebe-se que os resultados corroboram estudos anteriores, apontando para a sensibilidade dos leitores experientes à organização das ideias, considerando a estrutura mais alta. (MEYER; RAY, 2011MEYER, B.; RAY, M. N. Structure strategy interventions: increasing reading comprehension of expository text. International Electronic Journal of Elementary Education, Kütahya, v. 4, n. 1, p. 127-152, 2011.) Essa sensibilidade, por sua vez, orienta o selecionar de informações e, assim, o construir da(s) representação(ões) mental(is) do texto. O conjunto de informações, chamado aqui de nuclear, reflete a compreensão dos leitores-experts a respeito de ideias que são centrais para a compreensão e essa percepção reflete o conhecimento de que essas ideias estão organizadas a partir de uma estrutura (ou estruturas) que se faz(em) presente(s) no texto expositivo. Contudo, algumas reflexões são necessárias. Primeiramente, a expectativa em torno do número de UMIs com percentual de concordância entre os experts era mais alta. Esperava-se que as 22 UMIs da tarefa tivessem um percentual de concordância entre 80 e 100%. Contudo, apenas 43% da UMIs escolhidas tiveram esse percentual de concordância. De um lado, isso chamou atenção para a necessidade de se repensar a proporção de UMIs estabelecida para a seleção, pois a restrição pode ter interferido nos resultados. A abertura do conjunto possível para a seleção poderá trazer maior congruência à escolha dos experts, tendo em vista que as UMIs selecionadas nos dois conjuntos - o conjunto nuclear e o conjunto estendido - se configuraram em torno da organização mais alta problema-solução. Por outro, entende-se também a necessidade de se aplicar esse instrumento, ou seja, uma matriz de UMIs, a um número maior de textos expositivos, considerando as estruturas mais altas de organização - comparação, problema-solução, causa e efeito, sequenciação, coleção, descrição -, a fim de verificar quais seriam os percentuais de acordo na seleção das UMIs entre leitores-experts, variando, por sua vez, a organização. Ressalta-se que, uma vez preparada, a matriz de UMIs pode ser aplicada a um conjunto maior de leitores, ampliando-se a validade dos conjuntos resultantes e a aplicabilidade de seus resultados. Porém, como o trabalho de análise dos textos e construção da matriz têm demanda alta de recursos cognitivos e de tempo, a utilização de instrumentos de Processamento de Linguagem Natural (PLN) pode ser um importante caminho para a viabilidade de um projeto de pesquisa de maior fôlego.

Observando-se, ainda, os experts na resolução da tarefa, importa pontuar que o comportamento apresentado, muito provável, seja decorrente de amplo conhecimento e experiência prévios em leitura de cada um deles que acabam por se tornar um conhecimento “partilhado” entre leitores e que se apresenta, nesse contexto, em um conjunto de saberes comuns em relação à leitura de textos, resultando em UMIs a serem selecionadas e/ou a serem desconsideradas na resolução da tarefa. Esses aspectos levam à reflexão do que se interpretou como habilidade ainda frágil dos(as) estudantes no segundo estudo.

Como se pontuou na discussão dos resultados do estudo dois, a aplicação da matriz de UMIs às sínteses elaboradas por acadêmicos em início de formação apontou para a existência de lacunas entre as ideias dos conjuntos das informações das UMIs selecionados pelos experts e as reportadas, em seus textos, pelos leitores em formação. Infere-se, portanto, a existência de lacunas na habilidade de percepção das informações mais relevantes, que pode ser decorrente também da frágil habilidade de utilizar elementos e pistas oferecidos no texto para a construção do texto-base e pela ausência de uma trajetória mais sólida que lhes tenha permitido construir conhecimento a respeito da organização da estrutura do texto expositivo. Assim, em princípio, a utilização de matrizes de UMIs como andaimes para o processo de construção das habilidades de percepção das ideias importantes para a compreensão, e, como parte desse caminho, a construção de habilidade de síntese apresenta-se como questão promissora a ser expandida em futuros estudos. A disposição das UMIs em um quadro que permita, ao professor e ao estudante, a discussão do valor das informações na tarefa - isto é, as repetições de ideias que revelam a importância de um conceito apresentado, as ideias que não podem ser apagadas e precisam ser mantidas ativadas para a compreensão da ideia seguinte, a ideia que pode ser considerada hipônima de um conjunto de ideias - pode vir a contribuir, de forma significativa, para a construção de uma habilidade cara ao processo de ler para compreender e ler para aprender.

Em relação ao uso de uma matriz de UMIs para o processo de avaliação, o estudo se mostra possível, mas, ao mesmo tempo, os resultados da aplicação do conjunto nuclear e do conjunto estendido às sínteses revelam a necessidade de certa flexibilidade na forma de validação de unidades entre texto-síntese e UMIs. Embora, percentualmente, não se tenha obtido ganho significativo entre os índices dos dois conjuntos e as sínteses, percebe-se aumento no quantitativo de informações, o que parece sinalizar a construção de habilidades que, se amparadas, podem resultar em melhora nas habilidades da compreensão em leitura, especialmente da habilidade de síntese. Convém lembrar que a proposta de tarefa de síntese solicitada aos acadêmicos foi livre; em outras palavras, não se estabeleceram parâmetros que poderiam auxiliar quando da avaliação com um instrumento com uma matriz de UMIs. Assim, diferentes fatores - e.g., conhecimentos prévios, objetivos individuais de leitura, valoração da atividade - podem ter contribuído para as diferenças, e não apenas a habilidade de síntese.

No percurso acadêmico, desde as fases iniciais da trajetória de formação até a universidade, considerando a compreensão em leitura e seu complexo conjunto de habilidades, a síntese é destacada por pesquisadores como habilidade de valor fundante. Afinal, constante e continuamente, se trabalha com um número muito maior de informações do que aquelas que serão relevantes para determinada tarefa (acadêmica ou não), tornando-se necessário perceber que informações o autor, ao longo do texto, sinaliza como sendo as mais importantes para a construção de seu ponto de vista, assim como, quais são as informações que passam a ser relevantes a partir dos propósitos do leitor, considerando o mesmo texto. Espera-se com as reflexões apresentadas, neste trabalho, ter contribuído para chamar atenção para algumas das questões que ainda carecem de novos estudos em torno da compreensão em leitura, especialmente, quando se considera o texto e o leitor em formação.

Agradecimentos

A professora Claudia Finger-Kratochvil agradece ao professor dr. Charles Perfetti pelos momentos de rica discussão a respeito deste trabalho durante o período de pós-doutorado, em que foi acolhida de maneira fraterna e generosa no LabPerfetti, que constitui o Learning Research & Development Center, na Universidade de Pittsburgh. A responsabilidade pelas ideias desenvolvidas, no entanto, deve ser atribuída à autoria apresentada.

Aos colegas que se dispuseram a colaborar como leitores-experts no julgamento das UMIs, sincero agradecimento. Não os(as) nomino por questões éticas.

Ao apoio da Universidade Federal da Fronteira Sul - UFFS para a realização do pós-doutorado, período de ir além das fronteiras. Sem o programa de capacitação de docentes institucional, esse estágio de aperfeiçoamento teria sido pouco provável.

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    Pesquisa registrada no CEP/Unoesc: Processo/Parecer n°: 083/2004.
  • 2
    Ou seja, próximo de um terço do conjunto de UMIs, apresentado como os mais importantes para a construção de uma síntese.
  • 3
    O trabalho completo pode ser acessado no repositório institucional da Universidade Federal de Santa Catarina. Disponível em: https://repositorio.ufsc.br/handle/123456789/94372. Acesso em: 28 jun. 2021.

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    18 Out 2021
  • Data do Fascículo
    Jul-Sep 2021

Histórico

  • Recebido
    02 Jun 2020
  • Aceito
    09 Fev 2021
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