Flora das cangas da Serra dos Carajás, Pará, Brasil: Burseraceae

Flora of the cangas of Serra dos Carajás, Pará, Brazil: Burseraceae

Resumo

É apresentado o levantamento das espécies de Burseraceae que ocorrem nas formações de canga na Serra dos Carajás, no estado do Pará, Brasil. Apenas uma espécie foi registrada: Protium pilosissimum. São fornecidos neste trabalho uma descrição morfológica para a espécie, ilustração e comentários taxonômicos.

Palavras-chave:
Amazônia; FLONA Carajás; florística; Protium

Abstract

The account of Burseraceae that have been reported growing on the cangas of Serra dos Carajás, Pará state, Brazil is presented, comprising of a single species recorded: Protium pilosissimum. A description, an illustration and comments are also provided.

Key words:
Amazon; FLONA Carajás; floristics; Protium

Burseraceae

Burseraceae Kunth é constituída por 19 gêneros e aproximadamente 750 espécies (Daly et al. 2012). A família possui distribuição pantropical, embora a tribo Protieae esteja melhor representada nos neotrópicos (Swart 1942). O hábito pode ser arbóreo ou arbustivo, por vezes rupícola ou muito raramente epifítico. As folhas também se apresentam variáveis e podem ser compostas imparipinadas, raramente bipinadas ou simples. A inflorescência é (pseudo-)terminal e/ou axilar, em tirso, pseudo-espiga, fascículo, panícula ou pseudo-racemo. As flores são actinomorfas, unissexuadas ou menos frequentemente bissexuadas. O fruto é do tipo drupa carnosa ou seca, ou ainda pseudocápsula (Daly et al. 2011). No Brasil ocorrem sete gêneros e 104 espécies distribuídas em todo território, com exceção do Rio Grande do Sul (BFG 2015). Nas cangas da Serra dos Carajás foi registrada apenas Protium pilosissimum Engl.

1. Protium Burm. f.

Os indivíduos de Protium geralmente são árvores ou raramente arbustos, com resina aromática transparente ou leitosa, folhas compostas imparipinadas, trifolioladas ou raramente unifolioladas. As flores são pediceladas, ou às vezes (sub)sésseis (Protium sect. Icicopsis), com sépalas parcialmente fundidas e pétalas distintas (raramente parcialmente conatas). O pistilo e o disco são sempre distintos, porém uma parte rudimentar do ovário pode ficar inteiramente embebida pelo disco, tendo sua base confluente com o mesmo, formando uma estrutura denominada ovario-disco. O fruto é do tipo drupa, de forma variável (ovoide-oblíquo, subgloboso ou elipsoide) (Daly 2011; Santamaría-Aguilar & Lagomarsino 2017).

O gênero possui aproximadamente 200 espécies (Daly 2017, comunicação pessoal), com distribuição pantropical (Santamaría-Aguilar & Lagomarsino 2017). No Brasil são referidas 68 espécies, não havendo registro para os estados do Rio Grande do Norte e Rio Grande Sul (BFG 2015). Segundo Daly (1992), a Amazônia é o principal centro de diversidade do gênero.

1.1. Protium pilosissimum Engl., Monogr. Phan. [A.DC. & C.DC.] 4: 80. 1883.Fig. 1a-h

Figura 1
a-h. Protium pilosissimum – a. hábito; b. tricomas em detalhe na face adaxial da folha; c. base da folha evidenciando a densidade dos tricomas; d. detalhe da folha evidenciando a nervação; e. detalhe da inflorescência; f. flor pistilada; g. flor pistilada com corola removida, evidenciando o gineceu e os estaminódios; h. flor pistilada com cálice, corola e estaminódios removidos, evidenciando o gineceu e o disco intraestaminal (Lobato et al. 3900).
Figure 1
a-h. Protium pilosissimum – a. habit; b. detail of hairy adaxial surface of the leaf; c. leaf base showing hair density of the trichomes; d. leaf detail showing venation; e. detail of the inflorescence; f. pistillate flower; g. pistillate flower with corolla removed, showing the gynoecium and staminodes; h. pistillate flower with calyx, corolla and staminodes removed, showing the gynoecium and intrastaminal disc (Lobato et al. 3900).

Árvores, até 6 m alt.; ramos pilosos a velutinos; folhas trifolioladas (raramente simples), alternas; pecíolo 1-4 cm compr.; peciólulo lateral 0,5-1 cm, peciólulo central 1,8-3 cm, piloso; lâmina foliar lateral 6-7,5 × 2,5-3,5 cm, lâmina foliar central 5,5-9 × 2,5-3,7 cm, cartácea, estreito-elíptica a elíptica, ápice acuminado, acúmen mucronado ou cuspidado, base cuneada a obtusa, margem inteira, nervação broquidódroma, proeminente na face abaxial e impressa na adaxial, velutina na face abaxial e pilosa na face adaxial. Inflorescência em panícula, pedúnculo 0,7-1,7 mm compr., piloso, pedicelo 1-2 mm compr., piloso. Botão floral 0,8-1,5 × 0,9-1,3 mm, piloso, ovoide. Flores estaminadas 3-4 mm compr.; cálice ca. 1 mm compr., carnoso, campanulado, piloso; corola 2-2,5 mm compr., filiforme, campanulada, pilosa externamente, glabra internamente, 4-meras, carnosas, triangulares, reflexas somente no ápice; estames 8, filetes filiformes conectados ao disco glabro; pistilódio 0,3-0,5 mm compr., piloso. Flores pistiladas 2-5 mm compr., 4-meras, creme; cálice ca. 1 mm compr., carnoso, campanulado, obtuso, piloso; corola 2-2,5 cm compr., campanulada, pilosa externamente, glabra internamente, pétalas carnosas, triangulares, reflexas somente no ápice; estaminódios 8, filetes filiformes; gineceu piloso, estilete distinto, estigma 4-lobado; disco intra-estaminal glabro. Fruto drupa deiscente, 6-9 mm diam., globoso a ovoide.

Material selecionado: Canaã do Carajás, S11D, 29.VI.2013, bot., fl., R.S. Santos & A.E. Rocha 94 (MG). Parauapebas, Serra dos Carajás, N4, 15.IV.2010, bot., fl., L.C.B. Lobato et al. 3900 (MG); 20-25 km NW of Serra Norte mining camp. 5°55'S, 50°26'W. 06.XII.1981, fr., D.C. Daly et al. 1760 (MG).

Material adicional examinado: BRASIL. MATO GROSSO: Cuiabá, Salgadeira, 17.VII.1994, fl., M. Macedo et al. 3897 (MG).

Protium pilosissimum apresenta uma ampla variação morfológica, principalmente em relação ao tipo de folha que pode ser simples ou trifoliolada (Douglas Daly, comunicação pessoal). A espécie é morfologicamente semelhante à P. aguilarii D.Santam., espécie recentemente descrita e endêmica da Costa Rica, cujas diferenças residem basicamente na pilosidade do fruto e dos pistilos de P. pilosissimum (vs. glabros) (Santamaría-Aguilar & Lagomarsino 2017). Protium costaricense (Rose) Engl. é outra espécie correlata morfologicamente a P. pilosissimum, mas que difere pelo indumento mais curto e menos denso das partes vegetativas e pelas inflorescências mais laxas e de ramos mais longos na primeira (Swart 1942).

A espécie ocorre no Brasil e na Bolívia (Daly 2014). No Brasil há registro para as regiões Norte (Acre, Amazonas, Pará e Rondônia), Nordeste (Maranhão) e Centro-Oeste (Goiás e Mato Grosso), principalmente em áreas de cerrado lato sensu, floresta de galeria e floresta estacional semidecidual (BFG 2015). Nas áreas de canga da Serra dos Carajás foi registrada na Serra Norte: N4 e Serra Sul: S11D.

• Lista de exsicatas
  Daly DC 1760 (1.1). Lobato LCB 3900 (1.1). Macedo M 3897 (1.1). Santos RS 94 (1.1).
• Editor de área: Dr. Pedro Viana

Agradecimentos

Agradecemos ao Instituto Tecnológico Vale e ao Museu Paraense Emílio Goeldi, a estrutura fornecida para realização deste trabalho. Ao curador dos herbário (MG), a disponibilidade dos materiais examinados. A Carla Texeira de Lima, a confecção das ilustrações. Ao Dr. Douglas Daly, as primorosas discussões e sugestões. À Dra. Daniela Cristina Zappi, a valiosa avaliação. Ao projeto objeto do convênio MPEG/ITV/FADESP (01205.000250/2014-10) e ao projeto aprovado pelo CNPq (455505/2014-4), o financiamento.

Referências

• BFG - The Brazil Flora Group (2015). Growing knowledge: an overview of seed plant diversity in Brazil. Rodriguésia 66: 1085-1113.
• Daly DC (1992) New taxa and combinations in Protium Burm. f. studies in neotropical Burseraceae VI. Brittonia 44: 280-299.
• Daly DC (2014) Burseraceae. Jørgensen PM, Nee MH & Beck SG (eds.) Catálogo de las plantas vasculares de Bolivia. Monographs in Systematic Botany from the Missouri Botanical Garden 127: 441-443.
• Daly DC, Fine PVA & Martínez-Habibe MC (2012) Burseraceae: a model for studying the Amazon flora. Rodriguésia 63: 21-30.
• Daly DC, Harley MM, Martínez-Habibe MC & Weeks A (2011) Burseraceae. In: Kubitzki K (ed.) The families and genera of vascular plants. Vol. X. Flowering plants. Eudicots: Sapindales, Cucurbitales, Myrtaceae. Springer-Verlag, Berlin. Pp. 76-104.
• Santamaría-Aguilar D & Lagomarsino LP (2017) Two new species and a new combination in Protium (Burseraceae) from Costa Rica. PhytoKeys 76: 89-113.
• Swart JJ (1942) A monograph of the genus Protium and some allied genera (Burseraceae). Recueil des Travaux Botaniques Neerlandais 39: 211-446.

Datas de Publicação

• Publicação nesta coleção
  Jul-Sep 2017

Histórico

• Recebido
  31 Mar 2017
• Aceito
  14 Jun 2017