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Extrafiscalidade e Regulação da Economia: as mudanças tributárias nos Governos Lula e Dilma

Extrafiscality and Regulation of the Economy: tax changes in Lula and Dilma governments

Resumo

O presente artigo pretende demonstrar que a partir do segundo mandato de Lula (2007-2010), após o país ter conquistado a estabilidade fiscal, e devido à crise de 2008, a orientação da política fiscal e tributária se voltou para a competitividade internacional e o desenvolvimento do país. Lula passou a adotar políticas monetárias e fiscais "anticíclicas", a fim de recuperar o nível de atividade econômica o mais rápido possível. Essa virada foi feita por alterações e introdução de novos instrumentos extrafiscais da tributação, principalmente através de isenções fiscais e de redução de tributos sem, contudo, romper com os princípios do paradigma anterior, centrado na estabilização econômica e fiscal. Assim, tais mudanças foram feitas com modificações por meio de instrumentos tributários extrafiscais seguindo um processo de sedimentação institucional.

Palavras-Chave:
Tributação; Política Fiscal; Extrafiscalidade; Neoinstitucionalismo

Abstract

This article argues that from the second term of Lula (2007-2010), after the country achieved fiscal stability and due to the 2008 crisis, the orientation of fiscal and tax policy turns to international competitiveness and development of the country. Lula adopts "'countercyclical'" fiscal and monetary policies in order to recover the level of economic activity as quickly as possible. This change was made by modifications and introduction of new extrafiscal instruments of taxation, mainly through tax exemptions and tax reductions without, however, breaking with the principles of the previous paradigm, centered on economic and fiscal stabilization. Thus, such changes were made through modifications in the extrafiscal instruments of taxation following a process of institutional sedimentation.

Keywords:
Taxation; Fiscal Policy; Extrafiscality; Neoinstitutionalism.

1 Introdução

O sistema tributário brasileiro apresenta uma peculiaridade em relação a outros sistemas tributários presentes no mundo: a ampla possibilidade, outorgada constitucionalmente, de utilização da tributação com finalidade extrafiscal. Essa peculiaridade restou muito presente a partir do segundo mandato de Lula e no primeiro mandato do Governo Dilma, que se caracterizaram por uma série de mudanças, tanto em termos cognitivos como institucionais, feita por meio de alterações nos instrumentos da política fiscal e tributária do Brasil.

Se, até então, a política tributária era determinada muito mais pelos critérios da estabilização econômica e do ajuste fiscal, no qual a tributação tinha por função primordial a arrecadação de dinheiro aos cofres públicos para a manutenção do equilíbrio das contas públicas; a partir deste período, vislumbra-se uma mudança nos objetivos do paradigma da tributação: a utilização de instrumentos tributários voltados para o desenvolvimento e competitividade internacional, o que exige que a função extrafiscal da tributação seja colocada em prática com mais visibilidade do que até então.

Tal mudança teve como fundamento, em parte, a necessidade de resposta à crise de 2008, em virtude da qual a União apresentou uma série de medidas de ajustes na sua política econômica e fiscal. Tais medidas se mostraram inovadoras em comparação à história recente do Brasil, tendo em vista que se caracterizavam por serem medidas monetárias e orçamentárias anticíclicas com a finalidade de recuperar o nível de atividade econômica o mais rápido possível.

Essa mudança de orientação do paradigma teve por consequência a implementação de instrumentos ou alterações institucionais vinculadas à função extrafiscal da tributação, no sentido de intervir no campo econômico. Exemplos destas medidas são aquelas presentes no Programa de Aceleração do Crescimento e a redução de impostos e contribuições através de desonerações em várias áreas (setor elétrico, automóveis, produtos da linha branca, folha de salários). Tais medidas extrafiscais representam uma tentativa de estímulo à economia e à produção nacional e têm por fim adaptar o sistema aos novos princípios de desenvolvimento e de competitividade do país.

De um aspecto cognitivo e institucional, importante pontuar que as mudanças ocorridas não representaram uma modificação completa do sistema tributário e não tinham por objetivo romper, ao menos no início, com os primados da estabilidade econômica e fiscal, mas se caracterizam muito mais por mudanças pontuais, do tipo incrementalistavisando adaptar o sistema aos novos objetivos governamentais como eficácia do sistema, crescimento, desenvolvimento do país e a competitividade internacional. Ou seja, ao mesmo tempo é possível visualizar tanto uma mudança cognitiva do sistema tributário, tendo em vista que novos objetivos a serem seguidos foram acrescentados aos já existentes, quanto as mudanças por meio de instrumentos institucionais que adaptaram o sistema a esses novos objetivos. Ambas as mudanças, conforme dito, foram incrementais.

A partir do exposto, o objetivo do presente artigo será analisar, em uma primeira parte, a extrafiscalidade como uma das funções do sistema tributário brasileiro. Em um segundo momento, será mostrado de que maneira o paradigma da política econômica e fiscal do país sofreu mudanças cognitivas e institucionais a partir do segundo mandato do Governo Lula. Na terceira parte, veremos como mudanças pontuais e incrementais no sistema tributário brasileiro, através da utilização de instrumentos tributários extrafiscais como incentivos e desonerações, foram utilizados para implementar esta mudança de paradigma da política fiscal, principalmente após 2008. Assim, o artigo procura fazer uma análise de quais foram as razões para essas mudanças e como elas têm sido implementadas à luz do papel da extrafiscalidade no direito tributário brasileiro.

2 Extrafiscalidade como uma das Funções do Sistema Tributário Brasileiro

Os tributos têm por função primordial a arrecadação de recursos para financiar as atividades essenciais do Estado. Esta finalidade fiscal é comprovada, por exemplo, pelo fato de que a receita dos impostos e contribuições federais corresponde a aproximadamente 63,4% do total das receitas primárias do governo central1 Conforme dados da Secretaria do Tesouro Nacional referentes ao ano de 2014, sem contar as receitas da previdência social. . Schoueri (2005SCHOUERI, Luís Eduardo. Normas tributárias indutoras e intervenção econômica. Rio de Janeiro: Forense, 2005., p. 1) afirma que a expressão de Schumpeter "Estado de Imposto" reflete uma das características centrais dos Estados contemporâneos: "[...] sua fonte de financiamento é, predominantemente, de origem tributária e, especialmente, proveniente de impostos".

Os tributos, porém, podem ter outras funções, diversas da simples função fiscal-arrecadatória. Ao conjunto destas funções costuma se dar o nome de extrafiscalidade. Ou seja, a extrafiscalidade é a utilização da tributação para fins diversos ao da simples arrecadação de dinheiro ao poder público. Trata-se de uma maneira para se inibir ou incentivar a prática de determinados comportamentos, "[...] com vista à realização de outros valores constitucionalmente consagrados" (COSTA, 2005COSTA, Regina Helena. Apontamentos sobre a tributação ambiental no Brasil. : TÔRRES, Heleno Taveira. (Org.). Direito Tributário Ambiental. São Paulo: Malheiros, 2005. p. 312., p. 312).

Nessa esteira, costuma-se atribuir à tributação três funções: arrecadação, distribuição de renda e regulação da economia. Nesse sentido, Giambiagi (2008GIAMBIAGI, Fabio, ALÉM, Ana Claudia, Finanças Públicas: teoria e prática no Brasil. Rio de Janeiro, Elsevier, 2008. p. 10., p. 10) afirma que a política fiscal pode realizar a função alocativa, que se refere ao fornecimento de bens públicos; a "função distributiva", associada à redistribuição de renda por meio da tributação e, por último, a função corresponde à "estabilização", cujo objetivo é influenciar a política econômica para atingir certo nível de emprego, estabilidade dos preços e taxa de crescimento econômico. Ardant (1965ARDANT, Gabriel, Théorie sociologique de l'impôtParis : SEVPEN, 1965.) também enumera duas funções principais dos tributos: criar os recursos necessários para o funcionamento do Estado e assegurar o equilíbrio e a orientação da economia. Segundo o mesmo autor, a tributação "[...] permite também alterar a distribuição dos rendimentos e das fortunas, quer no sentido da consolidação de privilégios, quer no sentido da equalização das condições" (ARDANT, 1965ARDANT, Gabriel, Théorie sociologique de l'impôtParis : SEVPEN, 1965., p. 16).

A análise da utilização da tributação com finalidades extrafiscais atende a uma visão de que as normas tributárias não são neutras. Schoueri (2005SCHOUERI, Luís Eduardo. Normas tributárias indutoras e intervenção econômica. Rio de Janeiro: Forense, 2005., p. 1) ressalta que, a ideologia do Estado liberal, "[...] que atuaria como mero vigilante em uma economia que se auto-regulava [...]", foi superada por um modelo de Estado no qual este passa a desempenhar um papel mais interventivo na condução e funcionamento do campo econômico.

Tal contexto se reflete na Constituição Federal brasileira de 1988, quando esta enumera valores sociais que devem orientar não somente o Estado, mas também a ordem econômica nacional. Trata-se de uma Constituição dirigente que enuncia "[...] o conjunto de diretrizes, programas e fins [...] a serem pelo Estado e pela sociedade realizados" e que, por isso, implementa uma "nova ordem econômica" (GRAU, 2006GRAU, Eros Roberto. A ordem econômica na Constituição de 1988. 11. ed. Revista e atualizada., São Paulo: Malheiros 2006., p. 173).

Por essa razão é que se afirma que a Constituição de 1988, como instrumento para a concretização desses valores, adotou um modelo fiscal de "finanças funcionais", ou seja, que se propõem a intervir no campo socioeconômico, com fins de tutela, redistribuição, equilíbrio, etc. (SCHOUERI, 2005SCHOUERI, Luís Eduardo. Normas tributárias indutoras e intervenção econômica. Rio de Janeiro: Forense, 2005., p. 3).

Ao lado das funções distributivas e simplificadoras, também espécies do gênero extrafiscalidade, um dos instrumentos para a colocação em prática destas finanças funcionais é a utilização de normas tributárias com a função indutora. A análise dessas normas tributárias indutoras, segundo Schoueri (2005SCHOUERI, Luís Eduardo. Normas tributárias indutoras e intervenção econômica. Rio de Janeiro: Forense, 2005., p. 15), deve "[...] partir da idéia de que, afastado o dogma da neutralidade da tributação, passam elas a servir de instrumento do Estado na intervenção sobre o Domínio Econômico".

Uma das modalidades de intervenção por meio da tributação, e que foram utilizadas com maior frequência a partir do segundo mandato do Governo Lula, conforme se verá a seguir, ocorre com a indução por meio de estímulos ou incentivos. Nessa modalidade, "[...] proporciona o Estado vantagens adicionais àqueles que incorrem nos atos contemplados pela norma, que não seriam obtidas no livre funcionamento do mercado" (SCHOUERI, 2005SCHOUERI, Luís Eduardo. Normas tributárias indutoras e intervenção econômica. Rio de Janeiro: Forense, 2005., p. 54). Heleno Torres (2005TORRES, Heleno Taveira. Incentivos Fiscais na Constituição e o "Credito-Prêmio de IPI". Direito Tributário Atual, São Paulo: Dialética, v. 18, 2005., p. 79) chama a atenção para o papel promocional dos incentivos que "consiste no servir como medida para impulsionar ações ou corretivos de distorções do sistema econômico, visando atingir certos objetivos".

A partir desse breve panorama teórico, será possível ver, a seguir, como a função extrafiscal indutora da tributação estava na base e foi utilizada como instrumento para a modificação do paradigma2 2 No que se refere ao aspecto cognitivo, a análise será baseada em autores da abordagem cognitiva de políticas públicas, dando atenção principalmente aos processos de mudança dos paradigmas de política pública tal como identificado por Hall (1993), Hall e Taylor (1997) e Surel (1997, 1995). Em seu estudo sobre a política macroeconômica na Grã-Bretanha, Hall define um paradigma da política como um "[... ] quadro de idéias e normas que indica não só os objetivos da política pública e o tipo de instrumentos que podem ser usados para alcançá-los, mas também a natureza dos problemas a que vão supostamente lidar" (HALL, 1993, p. 297). da política econômica e fiscal pela qual passou o país a partir do segundo mandato do Governo Lula.

3 A Mudança da Política Tributária: da estabilidade fiscal às medidas extrafiscais

A partir da década de 1990, a política econômica e fiscal brasileira passou por um período dominado por um paradigma neoliberal, caracterizado por um movimento de liberalização e abertura da economia, privatizações, adoção de uma nova moeda. Este cenário, aliado aos acordos com o Fundo Monetário Internacional no contexto da crise global nos fins dos anos 90, impuseram uma agenda de ajuste fiscal estrito, no sentido da necessidade de reduzir as despesas e aumentar as receitas fiscais para alcançar superávits primários.

A tributação neste período seguia um paradigma fiscalista, que tinha como função primordial a arrecadação de receitas para contribuir para o equilíbrio das contas públicas. Ou seja, "[...] se, em 1988, os objetivos do novo paradigma eram a descentralização de poderes e de receitas, agora, a tributação é inteiramente voltada para estabilização econômica e para o ajuste das contas públicas" (LUKIC, 2014LUKIC, Melina Rocha. Reforma Tributária no Brasil: ideias, interesses e instituições. Curitiba: Juruá, 2014., p. 370).

Tendo em vista a descentralização de receitas e competências tributárias em prol dos Estados e Municípios realizada pela CF/88, a implementação desse novo paradigma implicou, por um lado, a recentralização do poder tributário nas mãos da União, na medida em que foi preciso que criar novos tributos - principalmente Contribuições Especiais, como a CSLL e a CPMF, por exemplo - para recuperar o nível de receita tributária e fazer frente às novas despesas sociais também trazidas pela CF/88. Além disso, várias limitações das competências tributárias e na liberdade de gasto de Estados e Municípios também foram implementadas neste período, tal como ocorreu com a Lei Kandir e a Lei de Responsabilidade Fiscal.

Em segundo lugar, tal processo teve por consequência um aumento considerável da carga tributária a partir do início da década de 1990. Se em 1988 a carga tributária correspondia a aproximadamente 22% do PIB, em 2013, essa carga alcançou o patamar de 35%. Essa política fiscalista também impediu a aprovação da reforma tributária durante o Governo Fernando Henrique Cardoso, já que, diante do contexto de crise internacional no final da década de 1990, tal reforma poderia trazer perdas na arrecadação principalmente da União, o que comprometeria o ajuste fiscal imposto por organismos internacionais à época.

Com a eleição de Lula para a presidência em 2003, a política econômica e fiscal levada a cabo até então continuou na mesma trajetória, guiada pela estabilização fiscal e pela manutenção do equilíbrio das contas públicas. Apesar da janela de oportunidade política (KINGDON, 2003KINGDON, John W. Agendas, alternatives and public policies. New York: Longman, 2003.; FAVRE, 1992FAVRE, P. (Dir.), Sida et politique - les premiers affrontements: 1981-1987. Paris: L'Harmattan, 1992.) que se criou para o avanço da questão tributária, o processo de reforma tributária quase não avançou (LUKIC, 2014LUKIC, Melina Rocha. Reforma Tributária no Brasil: ideias, interesses e instituições. Curitiba: Juruá, 2014.). Em razão do contexto econômico e dos compromissos assumidos perante os organismos internacionais, Lula garantiu a continuidade da política econômica e fiscal do seu antecessor, respeitando e garantido os acordos celebrados pelo Presidente Cardoso. Assim, de acordo com Lukic (2014LUKIC, Melina Rocha. Reforma Tributária no Brasil: ideias, interesses e instituições. Curitiba: Juruá, 2014., p. 364) "[...] o início de seu governo é fortemente marcado por um processo de path dependence , ou seja: continuação da política fiscal para manter e aprofundar o processo de estabilização e ajuste das finanças públicas".

Nesse período, a tributação assumira um papel eminentemente fiscal, ou seja, era um instrumento para garantir os objetivos das políticas econômica e fiscal. Para isso, fez-se necessário a adoção de medidas para aumentar as receitas, através do aumento ou criação de algumas contribuições especiais, por exemplo. Segundo Lukic (2014LUKIC, Melina Rocha. Reforma Tributária no Brasil: ideias, interesses e instituições. Curitiba: Juruá, 2014., p. 364), essas pequenas mudanças podem ser vistas como mudanças incrementais e alterações dos instrumentos de acordo com a lógica de "sedimentação"3 3 Segundo Thelen (2003), a mudança do tipo "sedimentação institucional" (institutional layering ), trata-se de uma renegociação parcial de alguns dos elementos de uma determinada instituição, deixando todos os outros inalterados. Existe "sedimentação institucional" quando se conjugam elementos de bloqueio e inovação: as instituições são mantidas, mas passam por alterações em alguns de seus componentes, a fim de se adaptar ao novo contexto econômico ou político, ou devido a uma nova distribuição de poder entre os atores (THELEN, 2003). (THELEN; MAHONEY, 2010THELEN, Kathleen; MAHONEY, James. A theory of gradual institutional change. : MAHONEY, James; THELEN, Kathleen (Ed.) Explaining Institutional Change: ambiguity, agency, and power. Cambridge University Press, 2010. p. 1-37.), a fim de preservar o grau de estabilização conquistada.

Assim, a utilização da tributação na sua função extrafiscal era feita apenas marginalmente e tais medidas não ocupavam um papel central na política tributária do governo.

A orientação da tributação no sentido de manter o equilíbrio fiscal alcançado pode ser verificada na primeira reforma proposta pelo Governo Lula em 2003. Tal proposta

[...] mostra bem essa dinâmica: não propunha um "deslocamento" das regras do sistema - em especial as relativas ao imposto sobre o consumo. Essa proposta, ao contrário, trazia apenas medidas específicas para atender as exigências de estabilidade fiscal, bem como algumas reivindicações dos atores, seguindo, assim, a mesma lógica de "sedimentação". (LUKIC, 2014LUKIC, Melina Rocha. Reforma Tributária no Brasil: ideias, interesses e instituições. Curitiba: Juruá, 2014., p. 308)

O que pautou a tramitação desta reforma foi a necessidade de aprovar medidas para a manutenção do paradigma fiscalista da tributação. Ou seja, tendo em vista a necessidade de aprovar rapidamente algumas mudanças para manter o nível de receitas do governo, discussões estruturais do sistema tributário brasileiro - como a reforma do ICMS - foram deixadas de lado, principalmente em virtude do conflito de interesse que tal discussão ensejaria entre os entes federativos.

Ao final, portanto, "apenas as questões menos polêmicas e exigidas para a estabilidade fiscal e econômica (prorrogação da CPMF e da DRU) foram aprovadas, em última análise, durante o primeiro mandato" (LUKIC, 2014LUKIC, Melina Rocha. Reforma Tributária no Brasil: ideias, interesses e instituições. Curitiba: Juruá, 2014., p. 308).

A estratégia do governo foi, portanto, de postergar a discussão de matérias mais polêmicas que diante do conflito de interesses e do contexto de poder de veto muito forte poderiam atrasar a aprovação das medidas necessárias para manter o equilíbrio das contas públicas, o que demonstra a clara intenção do governo de prosseguir com o paradigma fiscalista que dominava o sistema tributário brasileiro neste período.

Essa orientação fiscalista da tributação no Brasil começa a mudar, no entanto, a partir do segundo mandato do presidente Lula. Já nas eleições presidenciais de 2006, discussões acerca do esgotamento do modelo neoliberal até então em prática e sua dificuldade para promover o investimento, começaram a aflorar no cenário político. Estas discussões foram pautadas pela crise econômica e o aumento da taxa de juros no final do ano de 2005, momento no qual o governo teria que decidir se manteria as medidas até então seguidas ou realizar uma mudança de paradigma. Nesse contexto, surge um novo paradigma econômico e fiscal chamado de "desenvolvimentista" (BARBOSA; SOUZA, 2010BARBOSA, N.; SOUZA, J. A. P. A Inflexão do Governo Lula: política econômica, crescimento e distribuição de renda. : SADER, E.; GARCIA, M. A. (Org.). Brasil: entre o passado e o futuro. São Paulo: Fundação Perseu Abramo e Editora Boitempo, 2010. Disponível em: <Disponível em: https://nodocuments.files.wordpress.com/2010/03/barbosa-nelson-souza-jose-antonio-pereira-de-a-inflexao-do-governo-lula-politica-economica-crescimento-e-distribuicao-de-renda.pdf >. Acesso em: 25 de setembro de 2015.
https://nodocuments.files.wordpress.com/...
).

A mudança de paradigma também foi possível tendo em vista a estabilidade fiscal alcançada pelo país, que já não precisava provar aos investidores que era capaz de cumprir as promessas da eleição de 2002 (LOUREIRO; SANTOS, 2011LOUREIRO, Maria Rita; SANTOS, Fábio Pereira dos; GOMIDE, Alexandre de Ávila. Democracia, Arenas Decisórias e Política Econômica no Governo Lula. Revista Brasileira de Ciências Sociais, [S.l.], v. 26, n. 76, junho, 2011.). Além disso, contribuiu para a mudança os relatórios de organismos internacionais ao final de 2006 sobre a situação econômica do país, indicando os baixos níveis de crescimento econômico e o contexto internacional da crise de 2008 que influenciou fortemente o Brasil (LUKIC, 2014LUKIC, Melina Rocha. Reforma Tributária no Brasil: ideias, interesses e instituições. Curitiba: Juruá, 2014.).

Além das dificuldades econômicas, a mudança de paradigma econômico também encontrou dificuldades políticas, já que oposições à alteração ocorreram dentro do próprio governo. Para resolver esses desacordos políticos, o Ministro da Fazenda Antônio Palloci e sua equipe, defensores da orientação do equilíbrio orçamentário e fiscal, foram substituídos por uma equipe econômica que se identificava mais fortemente com o crescimento do mercado interno e que desejava estimular o consumo e aumentar o investimento. Tal mudança dos atores políticos responsáveis pela gestão econômica e fiscal do país possibilitou, portanto, que fosse realizada a implementação do paradigma desenvolvimentista.

Uma das principais medidas anunciadas pelo governo foi a criação de um plano para "destravar" a economia e alcançar um crescimento anual do PIB de 5% (LOUREIRO; SANTOS, 2011LOUREIRO, Maria Rita; SANTOS, Fábio Pereira dos; GOMIDE, Alexandre de Ávila. Democracia, Arenas Decisórias e Política Econômica no Governo Lula. Revista Brasileira de Ciências Sociais, [S.l.], v. 26, n. 76, junho, 2011.). Mattei e Magalhães (2011MATTEI, Lauro; MAGALHÃES, Luis Felipe. A Política econômica durante o Governo Lula (2003-2010): cenários, resultados e perspectivas. : PAULA, Marilene (Org.). Nunca antes na história desse país? Um balanço das políticas do Governo Lula. Rio de Janeiro, RJ: Fundação Heinrich Böll, 2011., p. 141) afirmam que essa medida representa uma "[...] uma intervenção mais forte do Estado na economia, recuperando sua capacidade de investimento, além de orientar os investimentos privados no sentido de ampliar a infraestrutura básica do país".

Barbosa e Souza (2010BARBOSA, N.; SOUZA, J. A. P. A Inflexão do Governo Lula: política econômica, crescimento e distribuição de renda. : SADER, E.; GARCIA, M. A. (Org.). Brasil: entre o passado e o futuro. São Paulo: Fundação Perseu Abramo e Editora Boitempo, 2010. Disponível em: <Disponível em: https://nodocuments.files.wordpress.com/2010/03/barbosa-nelson-souza-jose-antonio-pereira-de-a-inflexao-do-governo-lula-politica-economica-crescimento-e-distribuicao-de-renda.pdf >. Acesso em: 25 de setembro de 2015.
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, p. 10) afirmam que os defensores dessa nova visão defendem três linhas de atuação para o Governo Federal

[...] a adoção de medidas temporárias de estímulo fiscal e monetário para acelerar o crescimento e elevar o potencial produtivo da economia; a aceleração do desenvolvimento social por intermédio do aumento nas transferências de renda e elevação do salário mínimo; e o aumento no investimento público e a recuperação do papel do Estado no planejamento de longo prazo.

Ou seja, os defensores dessa corrente acreditavam que o aumento da demanda, da produção e dos investimentos seria possível pelo rápido crescimento econômico, o que possibilitaria um aumento da arrecadação e, por consequência, as políticas de transferências de renda poderiam ser implementadas sem causar um desequilíbrio das finanças públicas. Ou seja, na base desse novo paradigma estava o direcionamento do aumento das receitas fiscais para as transferências de renda às famílias (BARBOSA; SOUZA, 2010BARBOSA, N.; SOUZA, J. A. P. A Inflexão do Governo Lula: política econômica, crescimento e distribuição de renda. : SADER, E.; GARCIA, M. A. (Org.). Brasil: entre o passado e o futuro. São Paulo: Fundação Perseu Abramo e Editora Boitempo, 2010. Disponível em: <Disponível em: https://nodocuments.files.wordpress.com/2010/03/barbosa-nelson-souza-jose-antonio-pereira-de-a-inflexao-do-governo-lula-politica-economica-crescimento-e-distribuicao-de-renda.pdf >. Acesso em: 25 de setembro de 2015.
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). Nesse contexto, as despesas relativas aos gastos sociais aumentaram de 11,9% do PIB em 2002 para 13,45% em 2008 (MATTEI; MAGALHÃES, 2011MATTEI, Lauro; MAGALHÃES, Luis Felipe. A Política econômica durante o Governo Lula (2003-2010): cenários, resultados e perspectivas. : PAULA, Marilene (Org.). Nunca antes na história desse país? Um balanço das políticas do Governo Lula. Rio de Janeiro, RJ: Fundação Heinrich Böll, 2011.).

Em resumo, se as políticas econômica e fiscal iniciadas no Governo de Cardoso que tinham por características o equilíbrio das contas públicas através da realização de superávits primários obtidos principalmente com o aumento de tributos forem seguidas até 2006, um novo paradigma parece orientar tais políticas a partir do segundo mandato do presidente Lula, em que a tributação passou a ser utilizada com uma finalidade extrafiscal de buscar o crescimento e desenvolvimento do país. Ou seja, a mudança ocorrida consistiu em uma inversão dos princípios basilares do paradigma.

Se, pelo paradigma fiscalista, a austeridade fiscal era considerada como um fator determinante para o crescimento e desenvolvimento; o novo paradigma desenvolvimentista, conforme visto, defendia a ideia de que o crescimento econômico geraria mais receitas tributárias que permitiriam a continuação dos superávits necessários para equilibrar as finanças públicas (LOUREIRO; SANTOS, 2011LOUREIRO, Maria Rita; SANTOS, Fábio Pereira dos; GOMIDE, Alexandre de Ávila. Democracia, Arenas Decisórias e Política Econômica no Governo Lula. Revista Brasileira de Ciências Sociais, [S.l.], v. 26, n. 76, junho, 2011.). O crescimento obtido por meio desse paradigma permitiria ainda que mais recursos para investimentos públicos e programas sociais fossem gerados. Nesse contexto, a tributação adquiriu então uma função extrafiscal adicional de instrumento para o crescimento econômico do país (LOUREIRO; SANTOS, 2011LOUREIRO, Maria Rita; SANTOS, Fábio Pereira dos; GOMIDE, Alexandre de Ávila. Democracia, Arenas Decisórias e Política Econômica no Governo Lula. Revista Brasileira de Ciências Sociais, [S.l.], v. 26, n. 76, junho, 2011.). No próximo tópico, será analisado como esse novo paradigma foi colocado em prática, através da utilização da tributação com finalidade extrafiscal e seguindo um processo de mudança institucional pontual e por instrumentos.

4 A Utilização Extrafiscal da Tributação por meio das Desonerações Tributárias

Será visto nesta parte que a implementação do paradigma econômico e fiscal desenvolvimentista foi realizada pela adoção de políticas anticíclicas por parte do governo, dentro das quais estavam previstas diversas medidas tributárias extrafiscais, em especial desonerações tributárias em diversos setores.

Uma das defesas deste novo paradigma era a necessidade de investimento público, que no paradigma anterior havia sido reduzido em virtude da necessidade de manutenção do equilíbrio fiscal e da necessidade de se alcançar superávits primários. Um relatório do IPEA (2007)IPEA. Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada. Boletim de conjuntura, Brasília, DF: IPEA, n. 77, jun. 2007. demonstrou que a redução do investimento público, particularmente no setor de infraestrutura e a ausência de um quadro jurídico para estimular o investimento privado neste setor, poderiam trazer efeitos negativos sobre o crescimento econômico.

Assim, com a finalidade de aumentar o investimento público, especialmente em infraestrutura, o governo propôs em 2007 o Plano de Aceleração do Crescimento (PAC) que previa ações tanto para melhorar a gestão do estado quanto para estimular o investimento público e privado. Dentre as medidas propostas, estão desonerações tributárias para estimular o investimento privado e aumentar o consumo. As desonerações previstas envolviam o setor da construção, indústrias, infraestruturas pesadas e setor de alta tecnologia4 4 Para as empresas que fabricam televisores digitais e semicondutores, o PAC incluía a desoneração dos seguintes tributos: imposto de renda (16 anos), PIS, Cofins e IPI (15 anos), CIDE (12-16 anos). A aquisição de software usado por estas indústrias também seria beneficiada. Compras de determinados produtos siderúrgicos também se beneficiaram de uma redução de 5 a 0% da alíquota de IPI. Ganhos de fundos de investimento em infraestrutura estariam isentas do imposto recolhido sobre os ganhos. Computadores vendidos ao preço de até R$ 4.000 foram isentados da Cofins e do PIS. Essas medidas representaram uma renúncia fiscal de R$ 1,2 bilhões em 2007 e R$ 2,3 bilhões em 2008. (computadores, produção de semicondutores, equipamentos para televisão digital). Somente as medidas de desoneração fiscal contidas no PAC representaram um montante de R$ 1,41 bilhão em 2007. Se forem incluídas todas as medidas de desoneração no período, o total foi de R$ 6,6 bilhões em 2007 e R$ 11,5 bilhões em 2008 (MINISTÉRIO DA FAZENDA, 2008BRASIL. Ministério da Fazenda. Reforma Tributária. Brasília, DF: Ministério da Fazenda, 2008. Disponível em: <Disponível em: http://www.fazenda.gov.br/portugues/documentos/2008/fevereiro/Cartilha-Reforma-Tributaria.pdf >. Acesso em: 25 set. 2015
http://www.fazenda.gov.br/portugues/docu...
).

Importante salientar que, apesar das desonerações previstas, a implementação das medidas de estímulo ao investimento público e privado foi feita em um contexto de aumento das receitas tributárias. Tal aumento deve-se à alteração da estrutura do PIB brasileiro que, até 2006, era baseado em exportações5 5 O saldo das exportações até 2008 aumentou as reservas internacionais e, portanto, permitiu o ajuste externo da economia brasileira, com uma dívida externa do setor público próxima de zero em 2007. Ou seja, o país passou de uma dívida de quase 15% do PIB em 2003 para um saldo positivo e fez empréstimos ao FMI nos anos 2008 e 2009 (MATTEI; MAGALHÃES, 2001). e, a partir de então, baseou-se no mercado interno. Assim, a arrecadação relativa aos impostos relativos ao consumo interno foi a responsável pelo aumento das receitas tributárias. Segundo o IPEA (2007)IPEA. Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada. Boletim de conjuntura, Brasília, DF: IPEA, n. 77, jun. 2007., este crescimento das receitas baseadas no aumento do consumo interno foi responsável pelo financiamento das ações previstas no PAC e para a concessão de desonerações tributárias para setores específicos, sem que a estabilidade fiscal conquistada ficasse comprometida (IPEA, 2007IPEA. Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada. Boletim de conjuntura, Brasília, DF: IPEA, n. 77, jun. 2007.).

Outras medidas tributárias com a finalidade de regulação do mercado foram tomadas o período: para combater o aumento da inflação resultante do aumento dos preços internacionais das commodities, o governo reduziu os impostos sobre a venda de trigo e seus derivados; para enfrentar o aumento dos preços internacionais do petróleo, o governo promoveu uma diminuição da contribuição de intervenção no domínio econômico (CIDE) sobre o combustível e o diesel.

A extinção da CPMF (Contribuição Provisória sobre Movimentações Financeiras), no final de 2007, foi outro fator relevante e que teve por consequência a adoção de medidas tributárias compensatórias para fazer face à perda de arrecadação referente a este tributo. Segundo Barbosa e Souza (2010BARBOSA, N.; SOUZA, J. A. P. A Inflexão do Governo Lula: política econômica, crescimento e distribuição de renda. : SADER, E.; GARCIA, M. A. (Org.). Brasil: entre o passado e o futuro. São Paulo: Fundação Perseu Abramo e Editora Boitempo, 2010. Disponível em: <Disponível em: https://nodocuments.files.wordpress.com/2010/03/barbosa-nelson-souza-jose-antonio-pereira-de-a-inflexao-do-governo-lula-politica-economica-crescimento-e-distribuicao-de-renda.pdf >. Acesso em: 25 de setembro de 2015.
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), o fim da CPMF teria causado uma diminuição das receitas tributárias da União em cerca de 1,4% do PIB e um aumento na demanda e, portanto, da inflação. Para compensar esta queda da arrecadação e evitar o aumento da demanda, o governo promoveu um aumento do imposto sobre operações financeiras (IOF), com a criação da alíquota adicional de 0,38%, e da contribuição social sobre o lucro líquido (CSSL).

Essas medidas mostram que, apesar de a mudança do paradigma econômico e fiscal ser feita em parte pela adoção de medidas tributárias extrafiscais, o governo ainda mantinha preocupações relativas à estabilidade das contas públicas, já que o impacto do fim da CPMF teve por consequência a implementação de medidas para compensar a diminuição da arrecadação referente àquela contribuição. Ou seja, mesmo que uma nova visão estava sendo colocada em prática, o governo ainda procurava manter as bases do antigo paradigma fiscalista.

Nesse sentido, Loureiro e Santos (2011LOUREIRO, Maria Rita; SANTOS, Fábio Pereira dos; GOMIDE, Alexandre de Ávila. Democracia, Arenas Decisórias e Política Econômica no Governo Lula. Revista Brasileira de Ciências Sociais, [S.l.], v. 26, n. 76, junho, 2011., p. 66) afirmam que

[...] a tendência de mudança da agenda fiscal chega até o limite em que não ameace os interesses da coalizão política dominante no país, centrada no capital financeiro e em grupos "rentistas" [...] essa coalizão tem se expressado na ação dos dirigentes do Banco Central, respaldada pelo mainstream dominante na comunidade epistêmica (organismos internacionais, universidades norte-americanas e nacionais, empresas de consultoria etc.) e difundida constantemente na mídia.

Gobetti e Amado (2011GOBETTI, Sergio Wulff; AMADO, Adriana Moreira. Ajuste fiscal no Brasil: algumas considerações de caráter pós-keynesiano. Revista de Economia Política, [S.l.], v. 31, n. 1, 2011.) também julgam que essa mudança de paradigma surgiu sem romper com as bases da política econômica ortodoxa, como a defesa da autonomia e a política restritiva do Banco Central e a definição das taxas de juro baseados em modelos que garantam a neutralidade da moeda. Ou seja, as políticas de desenvolvimento econômico e social foram implementadas na medida em que não ameaçavam a estabilidade fiscal e a credibilidade exigida pelo mercado financeiro.

A avaliação de todas essas medidas iniciais voltadas para um paradigma "desenvolvimentista" foi marcada por um crescimento do PIB de 3,2% em 2003-2005 para 5,1% em 2006-20086 6 Esse crescimento foi obtido, segundo Barbosa e Souza (2010), graças ao controle da inflação e o declínio nas taxas de juros e, apesar de um aumento significativo em 2008, dos preços internacionais das matérias-primas agrícolas e minerais. Nota-se também dois outros fatores: o acúmulo de reservas internacionais, que reduziram a vulnerabilidade externa da economia e a valorização do real, que têm mitigado as pressões inflacionistas externas (BARBOSA; SOUZA, 2010). . A redução do saldo primário de 2,5% em 2003-2005 para 2,3% do PIB em 2006-2008 em consequência das iniciativas fiscais e tributárias durante o segundo mandato de Lula indica que o crescimento econômico induziu um aumento das receitas fiscais e financiou a expansão das despesas primárias segundo Barbosa e Souza (2010BARBOSA, N.; SOUZA, J. A. P. A Inflexão do Governo Lula: política econômica, crescimento e distribuição de renda. : SADER, E.; GARCIA, M. A. (Org.). Brasil: entre o passado e o futuro. São Paulo: Fundação Perseu Abramo e Editora Boitempo, 2010. Disponível em: <Disponível em: https://nodocuments.files.wordpress.com/2010/03/barbosa-nelson-souza-jose-antonio-pereira-de-a-inflexao-do-governo-lula-politica-economica-crescimento-e-distribuicao-de-renda.pdf >. Acesso em: 25 de setembro de 2015.
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).

A adoção de medidas extrafiscais continuou e até mesmo se aprofundou com a crise internacional de 2008. Face à diminuição forte e rápida da oferta de crédito interno, à redução dos preços internacionais de matérias-primas e do comércio internacional que afetou, por consequência, os exportadores brasileiros, o governo respondeu à crise com medidas "anticíclicas", com o objetivo de recuperar o nível de atividade econômica (BARBOSA; SOUZA, 2010BARBOSA, N.; SOUZA, J. A. P. A Inflexão do Governo Lula: política econômica, crescimento e distribuição de renda. : SADER, E.; GARCIA, M. A. (Org.). Brasil: entre o passado e o futuro. São Paulo: Fundação Perseu Abramo e Editora Boitempo, 2010. Disponível em: <Disponível em: https://nodocuments.files.wordpress.com/2010/03/barbosa-nelson-souza-jose-antonio-pereira-de-a-inflexao-do-governo-lula-politica-economica-crescimento-e-distribuicao-de-renda.pdf >. Acesso em: 25 de setembro de 2015.
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)7 7 Barbosa e Souza (2010) dividem as medidas tomadas pelo governo brasileiro à crise em três categorias: 1) as adotadas antes da crise, mas que ajudou o país neste período, 2) medidas de emergência, que foram implementadas após a crise e 3) medidas mais estruturais para combater os efeitos da crise. No que diz respeito à primeira categoria, observou-se o aumento do sistema de proteção da seguridade social, aumento do salário mínimo e do investimento público; as desonerações feitas pelo PAC e o PDP e a reestruturação de salários de funcionários públicos (BARBOSA; SOUZA, 2010). . Dessa forma, cabe salientar que as medidas de desoneração realizadas pelo governo desde 2007 foram mantidas durante o período de crise.

Dentro desta política anticíclica, o governo tomou medidas tributárias de emergência, como isenções temporárias de impostos para estimular a produção, o comércio e o consumo. Uma das medidas de grande destaque foi a redução do IPI sobre os automóveis - iniciada no final de 2008, pela MP n. 451, de 15 de dezembro de 2008, e prorrogada por diversas vezes8 8 Inicialmente a redução do IPI foi feita pela MP n. 451, de 15 de dezembro de 2008, que previa um prazo até 31 de março de 2009. O Decreto n. 6.809/09 prorrogou a vigência até 31 de junho de 2009. , que tinha por finalidade evitar um acúmulo de estoques na indústria. Ao longo de 2009, a mesma medida foi tomada para os setores de bens de consumo duráveis, materiais de construção, equipamentos, motocicletas, móveis e alimentos.

Pode-se observar pelo gráfico a seguir que a medida de desoneração do IPI automóveis promoveu uma retomada rápida da produção e vendas de veículos, parecendo cumprir com os objetivos propostos pelo governo. Entretanto, teve como contrapartida uma queda da arrecadação do IPI sobre esta base:

Figura 1
Desoneração IPI - Período Lula

Além disso, outra importante medida tributária tomada durante a crise foi a alteração das alíquotas do imposto de renda que passaram a ser de 7,5%, 15%, 22% e 27,5%9 9 Até 2008, havia apenas três alíquotas: zero, 15% e 27,5%. . O custo inicial de todas essas desonerações temporárias representou 0,3% do PIB em 2009 (BARBOSA; SOUZA, 2010BARBOSA, N.; SOUZA, J. A. P. A Inflexão do Governo Lula: política econômica, crescimento e distribuição de renda. : SADER, E.; GARCIA, M. A. (Org.). Brasil: entre o passado e o futuro. São Paulo: Fundação Perseu Abramo e Editora Boitempo, 2010. Disponível em: <Disponível em: https://nodocuments.files.wordpress.com/2010/03/barbosa-nelson-souza-jose-antonio-pereira-de-a-inflexao-do-governo-lula-politica-economica-crescimento-e-distribuicao-de-renda.pdf >. Acesso em: 25 de setembro de 2015.
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).

Com relação ao governo de Dilma Rousseff, já durante a sua campanha, ela demonstrou posicionamentos divergentes com relação à condução da política econômica e fiscal. Por um lado, declarou nas eleições sua discordância com a diminuição do superávit primário feito por Lula, afirmando que seria necessário manter as contas públicas em ordem (VALOR ECONÔMICO, 2010VALOR ECONÔMICO. On-line , edição do dia 31 de outubro de 2010.). Por outro lado, também salientou a necessidade de aumentar o investimento público e privado, através da redução de tributos sobre os investimentos (VALOR ECONÔMICO, 2010VALOR ECONÔMICO. On-line , edição do dia 31 de outubro de 2010.), em clara sintonia com o paradigma desenvolvimentista iniciado a partir do segundo mandato do Governo Lula.

Após a adoção das políticas mais expansionistas de Lula, Dilma chega ao poder com a missão reajustar as contas públicas e, neste sentido, realizou uma contingência do orçamento de R$ 50 bilhões em 2011 e R$55 bilhões em 2012 e um superávit primário de R$ 91 bilhões em 2011. Diante do sucesso observado em 2010, com a economia em crescimento de 7,5%, inflação de 5,9%, taxa de desemprego de 6,7% e resultado primário acima do necessário para estabilizar a dívida líquida, o Governo Dilma buscou novamente adotar os mesmos mecanismos tributários utilizados no período pós-crise, iniciando assim uma nova e mais intensa rodada de desonerações tributárias em 2012.

As primeiras medidas tributárias de desoneração para incentivar setores económicos foram previstas no "Plano Brasil Maior" em abril de 2012. Tal plano tinha por objetivo sustentar o crescimento econômico no contexto da crise internacional e as medidas tributárias buscavam apoiar a indústria, a tecnologia e o comércio internacional. O "Plano Brasil Maior" previa a redução do IPI sobre bens de capital, materiais de construção, caminhões e veículos, créditos tributários aos exportadores, mudança na contribuição para a seguridade social em vários outros setores, bem como a criação de um novo sistema de tributação para a indústria automobilística. Em abril de 2012, o governo aprofundou o plano e aumentou o número de setores que se beneficiavam.

Uma das principais medidas foi a desoneração do IPI incidente sobre os automóveis, tal como realizado no Governo Lula. No governo Dilma, a medida foi prevista pelo Decreto n. 7.725, de 21 de maio de 2012, e teria validade inicialmente até 31 de agosto de 2012, mas foi prorrogada por diversas vezes e vigorou até 31 de dezembro de 2014. Com o gráfico, a seguir, percebe-se que, ao contrário do que ocorreu no Governo Lula, tal como já foi visto, a medida de redução do IPI para o setor automobilístico não teve o mesmo impacto e a retomada da produção e vendas de veículos não foi tão rápida quanto no período anterior, apesar de a queda da arrecadação do IPI-automóveis ter sido significativa:

Figura 2
Desoneração IPI - Período Lula

Outra medida importante tomada durante o Governo Dilma foi a conhecida "Desoneração da Folha de Salários". Tal desoneração implicou uma mudança no cálculo da Contribuição Previdenciária Patronal para diversos setores - originalmente calculada com base na folha de salários, tal contribuição passou a ser calculada com base no faturamento da pessoa jurídica10 10 Para detalhes metodológicos e os impactos econômicos setoriais da desoneração da folha de salários, ver Afonso e Pinto (2014a), (2014b) e (2015). .

A mudança frequente na legislação referente à desoneração da folha de salários elevou a renúncia tributária estimada pelo governo de R$ 3,6 bilhões em 2012 para mais de R$ 20 bilhões ao ano, a partir de 2014, quando passou a contemplar a totalidade de setores beneficiados (56 setores) e deixou de ser provisória e passou a ser definitiva. Conforme demonstrado por Afonso e Pinto (2015AFONSO, J. R.; PINTO, V. C. Revisitando a desoneração que onera (empresas ou o governo) e que pune a produtividade. Texto de Discussão n. 75, [S.l.], Instituto Brasileiro de Economia - FGV: março, 2015. Disponível em: <Disponível em: http://bit.ly/1Hl7r9W >. Acesso em: 25 de setembro de 2015.
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), a desoneração da folha de salários perdeu o objetivo inicial que era o de socorrer a indústria doméstica intensiva em mão de obra, a partir do momento em que houve a expansão para outras atividades econômicas, como por exemplo, as de serviços e até mesmo atividades intensivas em capital.

Além dessas desonerações tributárias, outra importante medida trazida pela Medida Provisória n. 609, de 8 de março de 2013, foi a desoneração da cesta básica, que consistia em reduzir a zero as alíquotas do PIS/PASEP, do COFINS e do IPI, diminuindo, assim, o preço de alguns produtos de alimentação e higiene pessoal. Com essa medida, o Governo Federal esperava estimular o consumo de bens essenciais das famílias, priorizando aquelas de baixa renda, gerando assim um aquecimento na economia via maior consumo. Por fim, outras desonerações tributárias foram sendo previstas, como as referentes ao SIMPLES Nacional, dos planos de saúde, REINTEGRA, etc. Esse elevado volume de desonerações seguindo os mais diversos objetivos levou o Governo a um aumento crescente das renúncias tributárias. Se em 2010 o valor das renúncias tributárias estimadas pela Receita Federal era de R$2 bilhões, em 2014 essa estimativa passou a ser de quase de R$ 100 bilhões de reais, conforme tabela a seguir:

Tabela 1
Desonerações Tributárias Instituídas - em R$ Milhões Correntes - 2010 a 2014

Para concluir, é possível dizer que o paradigma da política fiscal e tributária sofreu modificações a partir do segundo mandato do presidente Lula. Durante o período 2003-2006, as políticas seguiram um modelo fiscalista iniciado no governo Cardoso. Tal modelo é marcado pela busca de estabilidade fiscal, equilíbrio das contas públicas e superávits primários, no qual a tributação tinha por papel fundamental a busca de recursos para satisfazer tais objetivos.

Já o segundo período do Governo Lula (2007-2010) e o primeiro mandato do Governo Dilma foram marcados por uma forte busca de intervenção do estado na economia, uma recuperação da capacidade de investimento e um direcionamento do investimento privado para desenvolver a infraestrutura básica do país (MATTEI; MAGALHÃES, 2011MATTEI, Lauro; MAGALHÃES, Luis Felipe. A Política econômica durante o Governo Lula (2003-2010): cenários, resultados e perspectivas. : PAULA, Marilene (Org.). Nunca antes na história desse país? Um balanço das políticas do Governo Lula. Rio de Janeiro, RJ: Fundação Heinrich Böll, 2011.). Conforme pode-se ver, todas as medidas tributárias extrafiscais representaram, portanto, mudanças por instrumentos do paradigma anterior para que este se adapte à nova orientação em um processo de sedimentação institucional (THELEN, 2003THELEN, Kathleen, How Institutions Evolve: Insights from Comparative-Historical Analysis. MAHONEY, James; RUESCHEMEYER, Dietrich (Ed.) Comparative Historical Analysis in the Social Sciences. New York: Cambridge University Press, 2003.).

5 Conclusão

Além da sua típica função fiscal, a tributação pode assumir em diversas ocasiões funções extrafiscais, voltadas não à arrecadação de dinheiro aos cofres públicos, mas à regulação da conduta de agentes sociais e econômicos. Essa função da tributação foi muito claramente utilizada como instrumento para uma mudança do paradigma da política fiscal e tributária no país a partir do segundo mandato do presidente Lula.

Tal mudança foi precedida por um período marcado pela estabilização econômica e equilíbrio das contas públicas, no qual o sistema tributário tinha como principal e quase única função, a geração de receitas tributárias para responder a esses primados. O esgotamento deste paradigma fiscalista, caracterizado pelos superávits primários sustentados principalmente pelo aumento contínuo da carga tributária, contribuiu para o surgimento de um novo paradigma fiscal no final do ano de 2007. Assim, o presente artigo procurou demonstrar que a partir do segundo mandato de Lula, novos rumos foram dados à tributação, que passou a ser utilizada também e com mais frequência que no período anterior, para fins extrafiscais, representados principalmente por desonerações aos mais diversos setores da economia. Tais desonerações tinham por principais objetivos estimular o consumo privado e impulsionar o investimento.

Essa utilização da tributação com fins extrafiscais foi um dos instrumentos utilizados para adaptar as políticas econômica e fiscal a um novo modelo voltado para o desenvolvimento do país, retorno do investimento e aumento do consumo. A lógica por detrás deste paradigma é que seria necessário adotar medidas de estímulo fiscal e monetário para acelerar o crescimento e aumentar o potencial de produção da economia. Estas medidas garantiriam, além de um aumento das receitas tributárias para garantir o equilíbrio das contas públicas, uma redução das desigualdades sociais e um desenvolvimento do investimento público.

Cumpre, portanto, ressaltar que, ao menos em um primeiro momento, a passagem ao modelo desenvolvimentista não visava abandonar os postulados do paradigma anterior, já que postulava, conforme aqui reiterado, que as medidas de estímulo fiscal garantiriam as receitas tributárias necessárias para que a estabilidade fiscal fosse mantida. Portanto, tal mudança de orientação do paradigma foi feita por mudanças institucionais do tipo sedimentação , ou seja, não buscavam romper abruptamente com as regras institucionais vigentes, mas somente ajustá-las, através de mudanças por instrumentos tributários e outros, ao novo contexto econômico do país.

Apesar disso, pode-se assistir já a partir de 2014, e com mais força em 2015, os efeitos que tais medidas trouxeram ao país: desequilíbrio das contas públicas e necessidade de novos ajustes fiscais. Mesmo que o governo tenha feito tentativas de compensar as perdas trazidas pela política fiscal expansionista por meio de receitas extraordinárias, elas não foram suficientes. Várias medidas estão sendo, atualmente, tomadas, como a reversão da desoneração da folha, o fim das desonerações de diversos setores, etc., para tentar retomar o equilíbrio fiscal. A questão que fica para análise posterior é se o país está caminhando novamente em direção ao paradigma anterior de austeridade fiscal.

Referências

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  • Conforme dados da Secretaria do Tesouro Nacional referentes ao ano de 2014, sem contar as receitas da previdência social.
  • 2
    No que se refere ao aspecto cognitivo, a análise será baseada em autores da abordagem cognitiva de políticas públicas, dando atenção principalmente aos processos de mudança dos paradigmas de política pública tal como identificado por Hall (1993)HALL, Peter A. Policy Paradigms, Social Learning, and the State: the case of Economic Policymaking in Britain. Comparative Politics, [S.l], v. 25, n. 3, p. 275-296, Apr., 1993. , Hall e Taylor (1997)HALL, Peter A; TAYLOR, Rosemary . La science politique et les trois néo-institutionnalismes. Revue Française de Science Politique, [S.l.], v. 47, n. 3-4, p. 469-496, juin-août, 1997. e Surel (1997SUREL, Yves. L'Etat et le livre: les politiques publiques du livre en France - 1957-1993. Paris: Harmattan, 1997., 1995SUREL, Yves. Les politiques publiques comme paradigmes. : FAURE A.; POLLET, G.; WARIN, P. (Dir.). La construction du sens dans les politiques publiques., Paris: L'Harmattan 1995.). Em seu estudo sobre a política macroeconômica na Grã-Bretanha, Hall define um paradigma da política como um "[... ] quadro de idéias e normas que indica não só os objetivos da política pública e o tipo de instrumentos que podem ser usados para alcançá-los, mas também a natureza dos problemas a que vão supostamente lidar" (HALL, 1993HALL, Peter A. Policy Paradigms, Social Learning, and the State: the case of Economic Policymaking in Britain. Comparative Politics, [S.l], v. 25, n. 3, p. 275-296, Apr., 1993. , p. 297).
  • 3
    Segundo Thelen (2003)THELEN, Kathleen, How Institutions Evolve: Insights from Comparative-Historical Analysis. MAHONEY, James; RUESCHEMEYER, Dietrich (Ed.) Comparative Historical Analysis in the Social Sciences. New York: Cambridge University Press, 2003., a mudança do tipo "sedimentação institucional" (institutional layering ), trata-se de uma renegociação parcial de alguns dos elementos de uma determinada instituição, deixando todos os outros inalterados. Existe "sedimentação institucional" quando se conjugam elementos de bloqueio e inovação: as instituições são mantidas, mas passam por alterações em alguns de seus componentes, a fim de se adaptar ao novo contexto econômico ou político, ou devido a uma nova distribuição de poder entre os atores (THELEN, 2003THELEN, Kathleen, How Institutions Evolve: Insights from Comparative-Historical Analysis. MAHONEY, James; RUESCHEMEYER, Dietrich (Ed.) Comparative Historical Analysis in the Social Sciences. New York: Cambridge University Press, 2003.).
  • 4
    Para as empresas que fabricam televisores digitais e semicondutores, o PAC incluía a desoneração dos seguintes tributos: imposto de renda (16 anos), PIS, Cofins e IPI (15 anos), CIDE (12-16 anos). A aquisição de software usado por estas indústrias também seria beneficiada. Compras de determinados produtos siderúrgicos também se beneficiaram de uma redução de 5 a 0% da alíquota de IPI. Ganhos de fundos de investimento em infraestrutura estariam isentas do imposto recolhido sobre os ganhos. Computadores vendidos ao preço de até R$ 4.000 foram isentados da Cofins e do PIS. Essas medidas representaram uma renúncia fiscal de R$ 1,2 bilhões em 2007 e R$ 2,3 bilhões em 2008.
  • 5
    O saldo das exportações até 2008 aumentou as reservas internacionais e, portanto, permitiu o ajuste externo da economia brasileira, com uma dívida externa do setor público próxima de zero em 2007. Ou seja, o país passou de uma dívida de quase 15% do PIB em 2003 para um saldo positivo e fez empréstimos ao FMI nos anos 2008 e 2009 (MATTEI; MAGALHÃES, 2001MATTEI, Lauro; MAGALHÃES, Luis Felipe. A Política econômica durante o Governo Lula (2003-2010): cenários, resultados e perspectivas. : PAULA, Marilene (Org.). Nunca antes na história desse país? Um balanço das políticas do Governo Lula. Rio de Janeiro, RJ: Fundação Heinrich Böll, 2011.).
  • 6
    Esse crescimento foi obtido, segundo Barbosa e Souza (2010)BARBOSA, N.; SOUZA, J. A. P. A Inflexão do Governo Lula: política econômica, crescimento e distribuição de renda. : SADER, E.; GARCIA, M. A. (Org.). Brasil: entre o passado e o futuro. São Paulo: Fundação Perseu Abramo e Editora Boitempo, 2010. Disponível em: <Disponível em: https://nodocuments.files.wordpress.com/2010/03/barbosa-nelson-souza-jose-antonio-pereira-de-a-inflexao-do-governo-lula-politica-economica-crescimento-e-distribuicao-de-renda.pdf >. Acesso em: 25 de setembro de 2015.
    https://nodocuments.files.wordpress.com/...
    , graças ao controle da inflação e o declínio nas taxas de juros e, apesar de um aumento significativo em 2008, dos preços internacionais das matérias-primas agrícolas e minerais. Nota-se também dois outros fatores: o acúmulo de reservas internacionais, que reduziram a vulnerabilidade externa da economia e a valorização do real, que têm mitigado as pressões inflacionistas externas (BARBOSA; SOUZA, 2010BARBOSA, N.; SOUZA, J. A. P. A Inflexão do Governo Lula: política econômica, crescimento e distribuição de renda. : SADER, E.; GARCIA, M. A. (Org.). Brasil: entre o passado e o futuro. São Paulo: Fundação Perseu Abramo e Editora Boitempo, 2010. Disponível em: <Disponível em: https://nodocuments.files.wordpress.com/2010/03/barbosa-nelson-souza-jose-antonio-pereira-de-a-inflexao-do-governo-lula-politica-economica-crescimento-e-distribuicao-de-renda.pdf >. Acesso em: 25 de setembro de 2015.
    https://nodocuments.files.wordpress.com/...
    ).
  • 7
    Barbosa e Souza (2010)BARBOSA, N.; SOUZA, J. A. P. A Inflexão do Governo Lula: política econômica, crescimento e distribuição de renda. : SADER, E.; GARCIA, M. A. (Org.). Brasil: entre o passado e o futuro. São Paulo: Fundação Perseu Abramo e Editora Boitempo, 2010. Disponível em: <Disponível em: https://nodocuments.files.wordpress.com/2010/03/barbosa-nelson-souza-jose-antonio-pereira-de-a-inflexao-do-governo-lula-politica-economica-crescimento-e-distribuicao-de-renda.pdf >. Acesso em: 25 de setembro de 2015.
    https://nodocuments.files.wordpress.com/...
    dividem as medidas tomadas pelo governo brasileiro à crise em três categorias: 1) as adotadas antes da crise, mas que ajudou o país neste período, 2) medidas de emergência, que foram implementadas após a crise e 3) medidas mais estruturais para combater os efeitos da crise. No que diz respeito à primeira categoria, observou-se o aumento do sistema de proteção da seguridade social, aumento do salário mínimo e do investimento público; as desonerações feitas pelo PAC e o PDP e a reestruturação de salários de funcionários públicos (BARBOSA; SOUZA, 2010BARBOSA, N.; SOUZA, J. A. P. A Inflexão do Governo Lula: política econômica, crescimento e distribuição de renda. : SADER, E.; GARCIA, M. A. (Org.). Brasil: entre o passado e o futuro. São Paulo: Fundação Perseu Abramo e Editora Boitempo, 2010. Disponível em: <Disponível em: https://nodocuments.files.wordpress.com/2010/03/barbosa-nelson-souza-jose-antonio-pereira-de-a-inflexao-do-governo-lula-politica-economica-crescimento-e-distribuicao-de-renda.pdf >. Acesso em: 25 de setembro de 2015.
    https://nodocuments.files.wordpress.com/...
    ).
  • 8
    Inicialmente a redução do IPI foi feita pela MP n. 451, de 15 de dezembro de 2008, que previa um prazo até 31 de março de 2009. O Decreto n. 6.809/09 prorrogou a vigência até 31 de junho de 2009.
  • 9
    Até 2008, havia apenas três alíquotas: zero, 15% e 27,5%.
  • 10
    Para detalhes metodológicos e os impactos econômicos setoriais da desoneração da folha de salários, ver Afonso e Pinto (2014AFONSO, J. R.; PINTO, V. C. Composição da desoneração (completa) da folha de salários. Texto de Discussão n. 41, [S.l.], Instituto Brasileiro de Economia - FGV: julho, 2014a. Disponível em: <Disponível em: http://goo.gl/Bc6euX >. Acesso em: 25 de setembro de 2015.
    http://goo.gl/Bc6euX...
    a), (2014AFONSO, J. R.; PINTO, V. C. Desoneração da folha de salários: breve panorama recente (até agosto de 2014). Nota Técnica, [S.l.], Instituto Brasileiro de Economia - FGV: dezembro, 2014b. Disponível em: <Disponível em: http://goo.gl/YOMZy3 >. Acesso em: 25 de setembro de 2015.
    http://goo.gl/YOMZy3...
    b) e (2015AFONSO, J. R.; PINTO, V. C. Revisitando a desoneração que onera (empresas ou o governo) e que pune a produtividade. Texto de Discussão n. 75, [S.l.], Instituto Brasileiro de Economia - FGV: março, 2015. Disponível em: <Disponível em: http://bit.ly/1Hl7r9W >. Acesso em: 25 de setembro de 2015.
    http://bit.ly/1Hl7r9W...
    ).

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    Jul-Dec 2015

Histórico

  • Recebido
    10 Jun 2015
  • Revisado
    21 Set 2015
  • Aceito
    13 Out 2015
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