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Prospecção fitoquímica de três leguminosas e associação com incidência de coleópteros xilófagos1 1 Programa de Pós-Graduação em Fitotecnia - (UFRRJ)

Phytochemical prospection of three leguminosae species and woodborer beetles incidence

Resumo

As essências arbóreas Clitoria fairchildiana, Piptadenia gonoacantha e Schizolobium parahyba foram analisadas através de prospecção química do extrato metanólico das madeiras com auxílio da análise com RMN de frações do extrato das madeiras sadias e expostas às condições naturais de ataque por insetos xilófagos (Coleoptera: Scolytidae e Platypodidae). A comparação dos espectros de RMN (1H por 13C) não revelou diferença na composição química da madeira nas duas condições experimentais. A menor concentração de taninos e fenóis em C. fairchildiana e alta ocorrência nas outras espécies, foi o único parâmetro químico que justifica a maior incidência de insetos degradadores nesta espécie.

Palavras-chaves
Clitoria fairchildiana; Piptadenia gonoacantha; Schizolobium parahyba; Coleóptera.

Abstract

The arboreal essences Clitoria fairchildiana, Piptadenia gonoacantha and Schizolobium parahyba were analyzed by chemical prospection besides NMR (1H and or 13C) spectral analysis of the fractions from methanolic extracts of the healthy wood and after exposure on natural woodborer beetles (Coleoptera: Scolytidae e Platypodidae) habitat. The NMR spectral analysis did not show chemical difference of the woods extracts on the both experimental conditions. C. fairchildiana had more woodborer beetles incidence. Only the high concentration of tannins and phenols on both other species was used to make a relationship among chemical differences on natural classes of compounds and the woodborer beetles incidence.

Key words
Clitoria fairchildiana; Piptadenia gonoacantha; Schizolobium parahyba; coleóptera.

Introdução

A composição química de espécies vegetais, especialmente daquelas encontradas nas florestas tropicais, ainda está longe de ser descrita em sua totalidade. Considerando a biodiversidade existente nas florestas brasileiras e os poucos estudos bioquímicos existentes a respeito de nossas essências arbóreas, constata-se facilmente a necessidade do aumento de pesquisas envolvendo a caracterização química destas espécies nativas.

A química de produtos naturais tem sido favorecida, nas últimas décadas, pelo advento de técnicas modernas de análise orgânica, como cromatografia e espectrometria, que têm possibilitado o isolamento e identificação de substâncias naturais, mesmo quando em pequenas quantidades (Ferri, 1996FERRI, P. H. Química de produtos naturais: métodos gerais. In: DI STASI, L. C. (Org.) Plantas medicinais: arte e ciência - Um guia de estudo interdisciplinar. São Paulo: Editora da Universidade Estadual Paulista. 1996, 10, 129-56.). Matos (1988)MATOS, F. J. A. Introdução à fitoquímica experimental. Fortaleza: Editora da Universidade Federal do Ceará, (Coleção Ciência, 3). 1988, 124p. ressalta a utilização destas técnicas viabilizando a caracterização química mais precisa das plantas.

Cerca de 90% do material lenhoso das madeiras tropicais é constituído de substâncias macromoleculares (Harborne, 1997). Contudo, substâncias de baixo peso molecular podem influenciar nas propriedades da madeira, sendo capazes, por exemplo, de dificultar seu processamento industrial. Estes materiais são subdivididos em matéria inorgânica e orgânica. Esta última é constituída de diferentes classes de produtos naturais, como carboidratos, taninos, terpenos, glicerídeos, alcalóides, flavonóides, e outros (Fengel & Wegener, 1989FENGEL, D.; WEGENER, G. Wood - Chemistry, ultrastructure, reactions. New York: Walter de Gruyter. 1989, 613.).

As diversas classes de metabólitos especiais têm recebido classificações adicionais (subclasses) devido a variações estruturais que revelam a adaptação de muitas plantas a variáveis ambientais (p. ex., seca e frio) ou a resposta das plantas a outras formas de vida que interfiram em seu desenvolvimento, como bactérias, fungos, insetos, moluscos e mamíferos ruminantes (Harborne, 1997).

Este trabalho teve como objetivos: analisar a madeira de três essências arbóreas Clitoria fairchildiana R. Howard (Leg., Papilionoideae), Piptadenia gonoacantha (Mart.) Macbr. (Leg., Mimosoideae) e Schizolobium parahyba (Vell.) Blake (Leg., Caesalpinoideae) usando prospecção fitoquímica, com auxílio da análise de espectros de Ressonância Magnética Nuclear (RMN) e revisão da literatura sobre estudo fitoquímico dos gêneros; fazer comparações entre as classes de substâncias detectadas na madeira das espécies, e, verificar se houve modificações na composição química, ao nível de metabólitos especiais, após exposição durante 60 dias à incidência de coleópteros xilófagos (Scolytidae e Platypodidae); além de avaliar a possível associação entre as classes de compostos e a incidência destes insetos.

Material e Métodos

Material vegetal: Piptadenia gonoacantha (Mart.) J.F. Macbr, (exsicata No- 6939, conhecida como pau jacaré); Schizolobium parahyba (ou S. parahybae) (exsicata No 1171, conhecida como guapuruvu) e C. fairchildiana (exsicata No 5122, conhecida como sombreiro) foram coletadas na Floresta Nacional Mário Xavier, em Seropédica, RJ, em abril de 2000, cujas exsicatas estão depositadas no herbário RBR, Dpto de Botânica-IB-UFRRJ.

Procedimento experimental: Toras de madeira das espécies, comcascae com 1mdecomprimento, foram expostas horizontalmente ao solo, à temperatura ambiente, em fragmento de floresta onde havia incidência de coleobrocas. Escolheram-se as toras com maior incidência de danos pelos degradadores de madeira (Luns, 2004LUNZ, A. M.. Suscetibilidade a Scolytidae e Platypodidae (Coleoptera) e Prospecção Fitoquímica da Madeira de Quatro Essências Arbóreas em Duas Formações Florestais. Tese de Doutorado, Programa de Pós-Graduação em Fitotecnia, Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro, 2004, 64p.) para análise fitoquímica. Amostras com 300 g de madeira sem cascas, obtidas antes e depois da exposição ao ataque das coleobrocas, foram moídas em moinho de martelo, acondicionadas separadamente em recipientes de vidro e adicionado metanol como solvente. Após filtração, obtiveram-se as soluções dos extratos que foram concentradas em evaporador rotativo sob pressão reduzida e colocadas em recipiente aberto para completa evaporação do solvente. Este processo foi repetido cinco vezes visando a completa extração dos metabólitos especiais de cada madeira analisada. Após secagem dos extratos, foram obtidos os resíduos correspondentes aos extratos metanólicos de cada espécie sadia (1) e exposta (2), com os seguintes códigos: S. parahyba [SPM1 (3,47g), SPM2 (2,1 g)], C. fairchildiana [CFM1 (4,68g;) CFM2 (3,2 g)] e P. gonoacantha [PGM1 (6,49g), PGM2 (5,2 g).

Os extratos metanólicos foram submetidos à análise através de prospecção química para detectar as possíveis classes de substâncias naturais adaptando a metodologia sugerida por Matos (1988)MATOS, F. J. A. Introdução à fitoquímica experimental. Fortaleza: Editora da Universidade Federal do Ceará, (Coleção Ciência, 3). 1988, 124p. e usando as informações de referências adicionais (Wall et al., 1954WALL, J. M.; KRIDER, M. M.; KREWSON, C. F.; EDDY, C. R.; WILLAMAN, J. J.; CORELL, D. S.; GENTRY, H. S. Steroidal sapogenins VII. Survey of plants for steroidal sapogenins and other constituents. Journal of the American Pharmacists Association. V. 63, 1-7, 1954.; Costa, 1972COSTA, A. F. Farmacognosia. 4° ed. Lisboa: Fundação Calouste Gulbenkian. 1972, II,1117.; Domínguez, 1973DOMÍNGUEZ, X. A. Métodos de investigación fitoquímica. México: Limusa-Wiley. 1973, 281.; Merck, 1980MERCK, E. Reactivos de coloración para cromatografia en capa fina y en papel. Alemanha: Darmstaadt. 1980, 76p.). Esta abordagem consistiu de testes com reagentes, onde a cor e/ou consistência do produto permitisse indicar se no material analisado haviam constituintes pertencentes às classes dos ácidos orgânicos (Merck, 1980MERCK, E. Reactivos de coloración para cromatografia en capa fina y en papel. Alemanha: Darmstaadt. 1980, 76p.); açúcares redutores, carotenóides e xantofilas, catequinas, depsídio e depsidonas, derivados da cumarina, heterosídios cianogênicos, purinas e sacarídios (Costa, 1972COSTA, A. F. Farmacognosia. 4° ed. Lisboa: Fundação Calouste Gulbenkian. 1972, II,1117.); alcalóides, flavonóides, esteróides e triterpenóides (Wall et al., 1954WALL, J. M.; KRIDER, M. M.; KREWSON, C. F.; EDDY, C. R.; WILLAMAN, J. J.; CORELL, D. S.; GENTRY, H. S. Steroidal sapogenins VII. Survey of plants for steroidal sapogenins and other constituents. Journal of the American Pharmacists Association. V. 63, 1-7, 1954.); glicosídios cardiotônicos e lactonas (Domínguez, 1973DOMÍNGUEZ, X. A. Métodos de investigación fitoquímica. México: Limusa-Wiley. 1973, 281.), além de quinonas e saponinas (Matos, 1988MATOS, F. J. A. Introdução à fitoquímica experimental. Fortaleza: Editora da Universidade Federal do Ceará, (Coleção Ciência, 3). 1988, 124p.).

Considerando a dificuldade de observar cores na prospecção química dos extratos brutos (SPM, CFM e PGM) e a diferença de solubilidade apresentada no material, decidiu-se considerar informações de espectros de ressonância magnética nuclear e/ou infravermelho. Para esta análise, foram utilizados CDCl3, MeOH-D4 e DMSO-D6 como solventes de acordo com a solubilidade do material. Após esta análise, verificou-se que os espectros dos extratos brutos não tinham boa resolução, impedindo a observação dos sinais pertencentes aos componentes minoritários e, por isso optou-se por um fracionamento dos mesmos.

Os extratos de cada madeira, antes (1) e depois (2) da exposição às condições naturais para infestação dos insetos, foram submetidos a fracionamento em coluna cromatográfica com gel de sílica, utilizando em ordem crescente de polaridade os solventes: hexano, diclorometano, clorofórmio, acetato de etila e metanol. Foram feitos testes de solubilidade com clorofórmio e dimetil-sulfóxido com as frações coletadas para posteriormente dissolvê-las em CDCl3 ou DMSO-D6, para registro dos espectros de RMN no aparelho marca Bruker AC-200E (1H: 200 MHz; 13C: 50,3 MHz). Os espectros de infravermelho foram obtidos em espectrofotômetro Perkin-Elmer 1605 FT-IT usando filmes em pastilha de NaCl. Os espectros de RMN foram analisados procurando associar as feições e deslocamentos químicos dos sinais com os possíveis sinais das substâncias pertencentes às respectivas classes detectadas pela prospecção química. As frações obtidas em quantidade suficiente foram analisadas com espectros de RMN de carbono-13 e apresentaram assim, informações mais precisas, permitindo inclusive sugerir a presença de alguns constituintes. Em alguns casos, cujos espectros de infravermelho eram pouco informativos, os espectros de RMN de carbono-13 permitiram tiram conclusões mais seguras. O levantamento na literatura sobre o estudo químico dos gêneros das essências estudadas serviu como informação adicional, para confirmar algumas observações da análise química e física (RMN).

Resultados e Discussão

A comparação entre os espectros de RMN dos extratos das essências avaliadas, obtidos a partir das madeiras sadias (1) e das madeiras expostas ao habitat natural dos insetos degradadores (2) não mostraram alterações qualitativas nas classes de metabólitos especiais existentes nas plantas. Assim, considerou-se apenas os resultados dos testes de prospecção química (Tabela 1) e os espectros de RMN (Tabela 2) provenientes de amostras de madeiras sadias, para fins de discussão.

Das classes de substâncias avaliadas pela prospecção química das madeiras das espécies, sobressaíram aquelas com estruturas compostas por açúcares, esteróides, triterpenóides, flavonóides e saponinas. Os sinais observados nos espectros de RMN e a solubilidade das frações serviram para dirimir dúvidas surgidas durante as interpretações da análise química dos extratos, confirmada a presença de saponinas, alcalóides, flavonóides e ácidos nas três essências analisadas.

Esteróides e terpenóides constituíram as classes de substâncias naturais mais frequênte nas três espécies. Do fracionamento do extrato de P. gonoacantha, foi inclusive recolhido um maior número de frações devido à detecção, com reagentes Liebermann-Burchard, de significativa quantidade desses terpenóides.

Nascimento (2003)NASCIMENTO, I. A. Estudo químico da madeira de Schizolobium parahyba. Seropédica, Dissertação de Mestrado, Programa de Pós-Graduação em Química Orgânica, Departamento de química-ICE. Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro. 2003. isolou e identificou, entre outras substâncias, dois esteróides (sitosterol e estigmasterol) da madeira de S. parahyba (Carvalho et al, 2008CARVALHO, M. G. de; NASCIMENTO, I. A.; CARVALHO, A. G. DE 5-Desoxiflavonóides e Lignana Isolados da Madeira de Schizolobium parahyba (Vell.) S.F. Blake (guapuruvu). Quimica Nova. 2008 (QN-0264-07-V3) in press.), concordando, também, com os resultados desta análise. Os esteróides estão presentes no substrato alimentar de insetos, além de auxiliarem a proliferação de fungos (Alexopoulos et al., 1996ALEXOPOULOS, C. J.; MIMS, C. W.; BLACKWELL, M. Introductory mycology. 4° ed. New York: John Wiley & Sons. 1996, 869p.), a maioria simbiontes de insetos. Apesar de ter sido verificada a presença destas substâncias em todos os extratos obtidos, houve diferença na incidência dos insetos nas madeiras analisadas (Luns, 2004LUNZ, A. M.. Suscetibilidade a Scolytidae e Platypodidae (Coleoptera) e Prospecção Fitoquímica da Madeira de Quatro Essências Arbóreas em Duas Formações Florestais. Tese de Doutorado, Programa de Pós-Graduação em Fitotecnia, Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro, 2004, 64p.). Supõe-se que as essências com menor proliferação dos insetos (P. gonoacantha e S. parahyba) tenham um metabolismo diferenciado de C. fairchildiana, gerando, além desses estróides, estruturas esteroidais com funções adicionais, capazes de exercer atividade oposta às propriedades dos mesmos. Esta diferença no desenvolvimento dos insetos nas madeiras e a semelhança na triagem fitoquímica entre as essências analisadas, levam a crer que a análise fitoquímica deva ser mais detalhada para que se possa chegar à identificação dos constituintes ativos capazes de influenciar no desenvolvimento do inseto. Para isso, no entanto, a determinação das classes dos constituintes secundários não foi suficiente para que se pudesse chegar a tal conclusão.

A presença de espuma detectada quando as frações foram dissolvidas em dimetil-sulfóxido confirmou a existência de saponinas nos extratos, sendo menos significativo em Piptadenia gonoacantha. As saponinas são constituídas de triterpenos ou esteróides como agliconas e diferentes tipos de unidades de carboidratos. São conhecidas como eficazes agentes antibacterianos e antifúngicos (Bramley, 1997BRAMLEY, P. M. Isoprenoid metabolism. In: DEY, P.; HARBORNE, J. (Eds.) Plant Biochemistry, V. 11, 417-38, 1997.; Harborne, 1997) e algumas como repelentes e inseticidas, principalmente as derivadas do ácido ursólico (triterpenos com carboxila no C-28) (Adeoye & Waigh, 1983ADEOYE, A. O.; WAIGH, D. R. Secoiridoid e triterpenic acids from the stems of Nauclea diderrochii. Phytochemistry. V. 22, 975, 1983.; Jayasinghe & Fugimoto, 1999JAYASINGHE, U.L.B.; FUJIMOTO, Y. Insecticidal saponin from Pometia eximia. Fitoterapia. V. 70, 87-88, 1999.; Silvia et al, 2001SILVIA, M.; NORA, M.; MARIA, L. G. R.; EDUARDO, A.; MARIA, L. V.; VICTOR, N.; ROBERT B.; GUILLERMO, D.; LAURA, A.. Bioactive oleanolic acid saponins and other constituents from the roots of Viguiera decurrens. Phytochemistry. V. 56, 93-97, 2001.). Considerando-se que houve maior incidência de coleobrocas em C. fairchildiana, pode-se deduzir que as saponinas nesta madeira possuam diferentes tipos de estrutura e, por isso apresentaram atividades diferentes.

De acordo com Fengel & Wegener (1989)FENGEL, D.; WEGENER, G. Wood - Chemistry, ultrastructure, reactions. New York: Walter de Gruyter. 1989, 613., os flavonóides constituem uma classe de substâncias especiais encontradas facilmente em extratos de madeiras de Leguminosae. Harborne et al. (1971)HARBORNE, J. B.; BOULTER, D.; TURNER, B. L. Chemotaxonomy of the Leguminosae. London: Academic Press Inc.. 1971, 612. já haviam afirmado que plantas desta família são excepcionalmente ricas em flavonóides, com vários registros de estruturas únicas existentes somente ou em particular abundância nesta família. De fato, nos extratos das leguminosas avaliadas foram detectados flavonóides. Silva et al. (1998aSILVA, B. P.; BERNARDO, R. R.; PARENTE, J. P. Clitoriacetal 11-O-β-D-Glucopyranoside from Clitoria fairchildiana. Phytochemistry, 47, 1, 121-4, 1998a., bSILVA, B. P.; BERNARDO, R. R.; PARENTE, J. P. Rotenoids from roots of Clitoria fairchildiana. Phytochemistry, 49, 6, 1787-1789, 1998b.) descreveram o isolamento e identificação de rotenóides em raízes de C. fairchildiana. Em particular, os rotenóides são isoflavonas modificadas com atividade inseticida (Ferreira et al., 2001FERREIRA, J. T. B.; CORRÊA, A. G.; VIEIRA, P. C. Produtos naturais no controle de insetos. São Carlos: Ed. da UFSCar. 2001, 26.). Considerando a alta incidência de insetos nas toras desta planta, é provável que os flavonóides encontrados em C. fairchildiana pertençam a uma subclasse de substâncias distinta da dos rotenóides isolados das raízes ou que os mesmos estejam presentes também na madeira, mas em menores quantidades, a ponto de não interferirem no desenvolvimento dos insetos.

Tabela 1
Classes de substâncias avaliadas na prospecção química dos extratos metanólicos da madeira das três essências.
Table 1
Class of evaluated compounds in the methanolic extracts from the wood of three species.
Tabela 2
Confirmação das classes de substâncias com a análise dos espectros de Ressonância Magnética Nuclear das frações dos extratos metanólicos das madeiras de três essências..
Table 2
Confirmation of the class of compounds by the nuclear magnetic resonance spectral analysis of methanolic extracts from the wood of three species.

Gomes (2002)GOMES, M. S. R. Constituintes químicos isolados da raiz de Piptadenia rigida. Seropédica, Dissertação de Mestrado, Programa de Pós-Graduação em Química Orgânica, Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro, Seropédica. 2002. desenvolveu o estudo fitoquímico das raízes e caule de Piptadenia rigida e identificou sitosterol, dois triterpenos (betulina e lupeol), fenóis e flavonóides (uma flavanona, duas flavonas e uma chalcona). Neste trabalho, o autor cita a ocorrência de diversas substâncias neste gênero, tais como: alcalóides indólicos (das classes: bufotenina e teobromina), flavonóides (flavanona glicosilada) e taninos (catéquicos e hidrolisáveis). Em trabalho recente desenvolvido por Cardozo (2006)CARDOZO, A. R. C. Metabólitos Especiais Isolados de Galhos e Folhas de Piptadenia gonoacantha (Mart.) J. F. Macbr. (Leguminosae) e de Flores de Laseguea erecta Mull. Arg (Apocynaceae). Dissertação de Mestrado, Programa de Pós-Graduação em Química Orgânica, Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro. 2006. foram identificados sitosterol, estigmasterol, 3-ß,D-glicopiranosilsistosterol, três flavonóides (apigenina, 5-metil-apigenina e 7,4’-diiroxi-5,3’-dimetoxiflavona) e o éster N-benzoilfenilalanilato de 2-benzoilamida-3-fenilpropila (conhecido como asperfenamato) em galhos de P. gonoacantha. Cardozo (2006)CARDOZO, A. R. C. Metabólitos Especiais Isolados de Galhos e Folhas de Piptadenia gonoacantha (Mart.) J. F. Macbr. (Leguminosae) e de Flores de Laseguea erecta Mull. Arg (Apocynaceae). Dissertação de Mestrado, Programa de Pós-Graduação em Química Orgânica, Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro. 2006. identificou nas folhas desta espécie além de um derivado do ácido benzóico, dois flavonóides C-gligosilados, a vitexina e isovitexina. Estas informações confirmam as conclusões das análises realizadas neste trabalho com a madeira de P. gonoacantha, que, além de outras classes de metabólitos especiais, detectaram-se esteróides, saponinas e flavonóides.

Estudos semelhantes sobre S. parahyba foram desenvolvidos por Nascimento (2003)NASCIMENTO, I. A. Estudo químico da madeira de Schizolobium parahyba. Seropédica, Dissertação de Mestrado, Programa de Pós-Graduação em Química Orgânica, Departamento de química-ICE. Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro. 2003. e Carvalho et al (2008)CARVALHO, M. G. de; NASCIMENTO, I. A.; CARVALHO, A. G. DE 5-Desoxiflavonóides e Lignana Isolados da Madeira de Schizolobium parahyba (Vell.) S.F. Blake (guapuruvu). Quimica Nova. 2008 (QN-0264-07-V3) in press., conduzindo ao isolamento e identificação de esteróides, triterpenos e flavonóides (flavonas) e uma lignana da madeira da planta. Estes resultados confirmam as informações descritas no presente trabalho.

Verificou-se uma forte indicação da presença de alcalóides no extrato de C. fairchildiana, tanto na análise química, quanto na análise dos espectros de RMN das frações de média polaridade. Isto é indicativo de alcalóides pouco oxigenados e não glicosilados, podendo desta forma, pertencer à classe de alcalóides indólicos. Di Stasi (1996)DI STASI, L. C. Química de produtos naturais: principais constituintes ativos. In: DI STASI, L. C. (Org.) Plantas medicinais: arte e ciência - Um guia de estudo interdisciplinar. São Paulo: Editora da Universidade Estadual Paulista. 1996, 109-28. afirma que tal classe de metabólito possui grande importância como marcadora filogenética, e relaciona uma série de famílias botânicas que têm em comum o fato de apresentarem todos ou quase todos os representantes desses alcalóides.

Os espectros (RMN1H e IV) apresentaram sinais indicativos de ácidos orgânicos em C. fairchildiana, carotenóides e xantofilas em P. gonoacantha, tidas como suspeitas pela prospecção fitoquímica. No que se refere aos ácidos orgânicos, houve uma indicação segura com os sinais [RMN1H: δH 2.3 (t, 7Hz), 1,8(m), 0.90(t) e IV: ν máx 2000-3500 cm-1] bem característicos desses ácidos e nos casos de carotenóides, xantofilas e purinas os sinais aparecem na região de núcleos aromáticos, podendo estar sobrepostos pelos sinais dos flavonóides que ocorrem com maior abundância nesta família. Nestes casos, foram considerados simplesmente os resultados da análise química.

Os taninos e fenóis não foram abundantes no extrato de C. fairchildiana com a análise dos espectros de RMN 13C; no entanto, tais classes foram observadas nas outras essências, com mais intensidade em frações de P. gonoacantha. Isto confirma os estudos de Gonçalves & Lélis (2001)GONÇALVES, C. A.; LELIS, R. C. C. Teores de taninos da casca e da madeira de cinco leguminosas arbóreas. Floresta e Ambiente. V. 8, 1, 167-73, 2001. que, em testes de verificação de taninos condensados em cinco leguminosas arbóreas, constataram que as cascas e madeira de P. gonoacantha possuem altas concentrações destas substâncias, considerando-a uma reserva em potencial de tanino para fins industriais. Além da diferença quanto aos tipos de flavonóides, rotenóides em C. fairchildiana (Silva et al, 1998aSILVA, B. P.; BERNARDO, R. R.; PARENTE, J. P. Clitoriacetal 11-O-β-D-Glucopyranoside from Clitoria fairchildiana. Phytochemistry, 47, 1, 121-4, 1998a. e 1998bSILVA, B. P.; BERNARDO, R. R.; PARENTE, J. P. Rotenoids from roots of Clitoria fairchildiana. Phytochemistry, 49, 6, 1787-1789, 1998b.) e flavonas e flavanonas nas outras espécies (Nascimento, 2003NASCIMENTO, I. A. Estudo químico da madeira de Schizolobium parahyba. Seropédica, Dissertação de Mestrado, Programa de Pós-Graduação em Química Orgânica, Departamento de química-ICE. Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro. 2003. e Cardozo, 2006CARDOZO, A. R. C. Metabólitos Especiais Isolados de Galhos e Folhas de Piptadenia gonoacantha (Mart.) J. F. Macbr. (Leguminosae) e de Flores de Laseguea erecta Mull. Arg (Apocynaceae). Dissertação de Mestrado, Programa de Pós-Graduação em Química Orgânica, Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro. 2006.), os taninos constituem uma diferença química significativa entre a espécie mais suscetível ao inseto (C. fairchildiana) e as outras. Esta constatação e as observações de Ayres et al (1997)AYRES, M. P.; CLAUSEN, S. F.; MACLEAN, Jr.; REDMAN, A. M.; REICHARDT, P. B. Diversity of structure and antiherbivore avtivity in condensed tannins. Ecology 78: 1696-1712,1997. e Julio et al (2005)JULIO, M. M.; ULYSSES, P. A.; ELCIDA, L. A. Taninos: uma abordagem da química à ecologia. Química Nova. V. 28, 5, 892-896, 2005., permitem sugerir que um maior teor de taninos inibe o desenvolvimento de coleópteros xilófagos na madeira de leguminosas arbóreas.

Conclusões

As classes dos esteróides, triterpenóides, ácidos orgânicos, carboidratos, alcalóides, flavonóides e saponinas foram detectados nos extratos de C. fairchildiana, P. gonoacantha e S. parahyba.

Não foram observados modificações quanto à composição química original dos metabólitos especiais dos extratos das três essências analisadas, quando expostos à degradação por insetos xilófagos num período de 60 dias.

Considerando os resultados deste trabalho e de estudo fitoquímico das três essências florestais divulgados na literatura, a espécie C. fairchildiana apresenta carotenóides e não serve como fonte de taninos, sendo a espécie com maior incidência de coleópteros degradadores de madeira, enquanto as demais metabolizam flavonas e flavanonas e são consideradas fontes de taninos e foram menos atacadas pelos coleópteros.

Certamente, a composição química do material analisado influencia na incidência e desenvolvimento dos insetos. Porém, em níveis estruturais mais especializados, não percebidos na detecção da classe de substâncias às quais eles pertencem, como por exemplo, modificação de esqueleto carbônico ou funções nas estruturas dos terpenóides. Sendo assim, existe a necessidade da realização de experimentos que conduzam ao isolamento e/ou à identificação dos constituintes dessas essências, aliado ao monitoramento com coleópteros. Isto permitirá aferir, com mais precisão, se os taninos e/ou flavonas e flavanônas, ou terpenos modificados interfiram na ocorrência destes insetos em P. gonoacantha e S. parahyba.

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    20 Out 2023
  • Data do Fascículo
    Jan-Jul 2007

Histórico

  • Recebido
    07 Maio 2004
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