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SOCIEDADE PÓS-MODERNA, CONSUMO SUSTENTÁVEL E ORGANIZAÇÃO DAS NAÇÕES UNIDAS: A BUSCA INCOMPLETA POR SOLIDARIEDADE

Resumo

Dada a importância de manter os níveis de consumo dentro da capacidade de carga do meio ambiente e dos limites naturais para o crescimento, este artigo examina as interconexões entre a sociedade pós-moderna, a Organização das Nações Unidas (ONU) e o consumo sustentável. Ao longo do texto são analisadas as principais características da sociedade pós-moderna e sua relação com o problema da insustentabilidade. Admite-se como fundo o processo histórico de luta da ONU por uma comunidade global sustentável, baseado em dados de desigualdades sociais e sobre o impacto humano nos ecossistemas. O artigo destaca a necessidade de uma governança global forte, aliada à mudança de hábitos da sociedade e ao uso de práticas de economia solidária para auxiliar na efetivação do direito-dever ao consumo sustentável. A pesquisa é qualitativa, exploratória, descritiva e dedutiva O procedimento metodológico é bibliográfico e documental.

Palavras-chave:
consumo sustentável; economia solidária; governança global; sociedade pós-moderna; Organização das Nações Unidas

Abstract

Given the importance of keeping consumption levels within the environment’s carrying capacity and natural limits to growth, this article examines the interconnections between postmodern society, the United Nations (UN) and sustainable consumption. Throughout the article, the main characteristics of postmodern society and their relationship with the problem of unsustainability are analyzed. The historical process of the UN’s struggle for a sustainable global community, based on data on social inequalities and the human impact on ecosystems, is taken as a background. The article highlights the need for strong global governance, combined with changing society’s habits and the use of solidary economy practices to support the realization of the right and duty to sustainable consumption. The research is qualitative, exploratory, descriptive and deductive. The methodological procedure is bibliographical and documentary.

Keywords:
sustainable consumption; solidarity economy; global governance; postmodern society; United Nations Organization

Resumo

Dada la importancia de mantener los niveles de consumo dentro de la capacidad de carga del medio ambiente y los límites naturales al crecimiento, este artículo examina las interconexiones entre la sociedad posmoderna, la Organización de las Naciones Unidas (ONU) y el consumo sostenible. A lo largo del texto se analizan las principales características de la sociedad posmoderna y su relación con el problema de la insostenibilidad. Se admite como antecedente el proceso histórico de la lucha de la ONU por una comunidad mundial sostenible, basada en datos sobre las desigualdades sociales y sobre el impacto humano en los ecosistemas. El artículo subraya la necesidad de una gobernanza mundial fuerte, sumada a un cambio en los hábitos de la sociedad y al uso de prácticas de economía solidaria para ayudar a hacer valer el derecho y el deber de consumir de forma sostenible. La investigación es cualitativa, exploratoria, descriptiva y deductiva. El procedimiento metodológico es bibliográfico y documental.

Palabras clave:
consumo sostenible; economía solidaria; gobernanza mundial; sociedad posmoderna; Organización de las Naciones Unidas

Introdução

As questões que envolvem consumo são bastante amplas. Mesmo as sociedades mais simples consomem necessariamente água, alimentos, energia e minerais, ou seja, cada ato de consumo tem consequências ambientais. Com isso, há tempos se reconhece a importância de se manterem os níveis de consumo dentro da capacidade de carga do meio ambiente ou dos limites naturais para o crescimento.

A base intelectual dessa ideia foi lançada na Inglaterra já no século XVIII por Thomas Malthus em seu Ensaio sobre o Princípio da População. Outros fundamentos mais modernos foram trazidos no fim dos anos 1960 e início de 1970 por uma série de publicações incluindo o relatório do Clube de Roma Os limites do crescimento e o alerta no neomalthusiano Ehrlich em A bomba populacional.

Todos esses trabalhos documentaram um confronto inevitável entre demandas materiais de uma população mundial em constante expansão e recursos ambientais finitos cada vez mais esgotados, isto é, entre a poluição ambiental crescente e o enfraquecimento da capacidade dos ecossistemas para se regenerar. De maneira simples, as mensagens desafiaram os ideais de crescimento.

O desenvolvimento sustentável, como estratégia de consenso, condiciona expressamente o ideal de desenvolvimento à capacidade de atender às necessidades das gerações futuras. O ato de consumo insere-se em um complexo processo de produção, venda, uso e descarte que impacta as relações humanas e o meio ambiente em escala global. Consumir, portanto, envolve uma dimensão ética e reclama responsabilidade social e ecológica. Daí falar em consumo sustentável como um dos objetivos a serem globalmente atingidos.

Com efeito, este trabalho visa analisar as interconexões existentes entre a sociedade pós-moderna, a Organização das Nações Unidas (ONU) e o consumo sustentável, com o objetivo geral de identificar o caminho já percorrido na luta global por sustentabilidade e desafios ainda pendentes.

Nessa perspectiva, a primeira seção explicará o conceito de sociedade pós-moderna na visão de Zygmunt Bauman, David Harvey e Milton Santos, expondo suas características e suas repercussões sobre a condição humana e as estruturas sociais.

A segunda seção abordará brevemente ao processo de dinamogenesis dos direitos humanos e sua classificação em gerações. Após compreender o consumo sustentável na terceira geração, fundada no ideal de solidariedade, serão estudados alguns referenciais teóricos que inauguraram o debate a respeito da insustentabilidade da sociedade pós-moderna.

A seção três detalhará o processo histórico de luta da ONU por uma comunidade global sustentável. Nesse sentido, serão traçados os caminhos percorridos desde a Conferência de Estocolmo de 1972 até o estabelecimento dos 17 Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS) da Agenda 2030.

Por fim, na quarta seção, serão apresentados dados internacionais de desigualdades sociais e do impacto humano sobre os ecossistemas naturais, relacionando-os aos desafios que a sociedade pós-moderna e a ONU experimentam no plano de efetivação da sustentabilidade e, particularmente, do consumo sustentável, um dever-direito de solidariedade.

1 A sociedade pós-moderna, a desregulação do mercado global e a patologia do consumo

A sociedade pós-moderna surge na segunda metade do século XX e caracteriza-se por seu acelerado ritmo de mudança, pela inebriante liberdade individual de escolha, pela desregulação dos mercados em escala global, pelo risco e pelo estado de incerteza permanentes, além da sensação constante de insegurança (BAUMAN, 1998BAUMAN, Z. O mal-estar da pós-modernidade. Rio de Janeiro: Zahar, 1998.).

O fenômeno também é chamado “modernidade líquida”, em uma metáfora que alude ao derretimento dos valores sólidos que marcaram as sociedades modernas. Para Bauman (2001, p. 12BAUMAN, Z. Modernidade líquida. Rio de Janeiro: Zahar, 2001.), essa fluidez, típica de um cenário que agora permite livre fluxo do capital e do mercado globais, afeta profundamente “os padrões de comunicação e coordenação entre as políticas da vida conduzidas individualmente, de um lado, e as ações políticas de coletividades humanas, de outro”, implicando desintegração da rede social e falência das entidades de defesa coletiva.

Em obra de 1989, Harvey (1992HARVEY, D. Condição pós-moderna: uma pesquisa sobre as origens da mudança cultural. São Paulo: Loyola, 1992.) analisava as transformações político-econômicas advindas do capitalismo a partir da década de 1970 e, em igual sentido, alertava para os poderes aumentados de flexibilidade e mobilidade que as sociedades criavam em prol do capital. O geógrafo chamou de acumulação flexível o regime que conduzia a mudanças nos processos de trabalho, no mercado, na produção e nos padrões do consumo, agora menos rígidos pela tênue regulação estatal e pelo influxo de inovações empresariais, tecnológicas e organizacionais.

Harvey (1992HARVEY, D. Condição pós-moderna: uma pesquisa sobre as origens da mudança cultural. São Paulo: Loyola, 1992.) também notava que as novas experiências estavam a transformar a vida social, porque a nova estética, a pós-moderna, celebrava valores como diferença, efemeridade, espetáculo, modas fugazes e mercantilismo da cultura, a fim de induzir necessidades e estimular um alto padrão de consumo em benefício dos grandes mercados que se abriam e cresciam.

De fato, com relação à condição humana, a sociedade pós-moderna cria a figura do consumidor sem limites. Para ela, “o consumo é a medida de uma vida bem-sucedida” (BAUMAN, 1998, p. 50BAUMAN, Z. O mal-estar da pós-modernidade. Rio de Janeiro: Zahar, 1998.). De tanto consumir, as pessoas tornam-se produtos ou mercadorias, e seus sofrimentos passam a decorrer mais da superabundância de possibilidades do que da existência de proibições. É que “o ímpeto de consumo, exatamente como o impulso de liberdade, torna a própria satisfação impossível, porque […]”necessitamos sempre de mais liberdade do que temos” (BAUMAN, 1998, p. 175BAUMAN, Z. O mal-estar da pós-modernidade. Rio de Janeiro: Zahar, 1998.) e, assim, consome-se desenfreadamente.

A síntese desse processo, fortemente influenciado pela globalização e pela publicidade massiva, destrói as habilidades necessárias para a convivência e o entendimento mútuo. Ocupadas em ganhar mais dinheiro para comprar mais, as pessoas têm menos tempo para a empatia e para a negociação duradoura; estão sempre cansadas e sem tempo (BAUMAN, 2011BAUMAN, Z. A Ética é possível em um mundo de consumidores? Rio de Janeiro: Zahar, 2011.).

Os fatores estruturais da sociedade pós-moderna impactam a relação tempo-espaço, encurtando-os, fomentam o individualismo e o consumismo e redesenham os vínculos de trabalho e as relações sociais, que se tornam flexíveis e efêmeras. Esse mecanismo social também gera enorme desigualdade entre ricos e pobres e cria espaço propício a tensões e ideias segregacionistas (BAUMAN, 1998BAUMAN, Z. O mal-estar da pós-modernidade. Rio de Janeiro: Zahar, 1998.; 2001BAUMAN, Z. Modernidade líquida. Rio de Janeiro: Zahar, 2001.; 2011BAUMAN, Z. A Ética é possível em um mundo de consumidores? Rio de Janeiro: Zahar, 2011.).

Não por outro motivo, Bauman sustenta que “‘as leis do mercado’ não são um bom sucedâneo das ‘leis da natureza’ ou das ‘leis da história’, sem se falar da ‘lei do progresso’” (1998, p. 247BAUMAN, Z. O mal-estar da pós-modernidade. Rio de Janeiro: Zahar, 1998.), sendo imperioso que a política pós-moderna se guie pelos princípios de “Liberdade, Diferença e Solidariedade”. Esta última, a solidariedade, constitui “condição necessária […] para o bem-estar da liberdade e da diferença” e é improvável que aflore sem intervenção política, uma vez que exige firme resistência à “desregulamentação e à privatização dos crescentes mercados globalizados” (1998, p. 256BAUMAN, Z. O mal-estar da pós-modernidade. Rio de Janeiro: Zahar, 1998.).

Santos (2001SANTOS, M. Por uma outra globalização: do pensamento único à consciência universal. 6. ed. Rio de Janeiro: Record, 2001.) atribui à globalização uma perversidade sistêmica, na medida em que conduz a situações estruturais de opressão, como desemprego, pobreza e fome. Conforme o geógrafo, a narrativa de uma aldeia global, que traria difusão instantânea de informações e homogeneização a todo o planeta, não revela a dinâmica real do processo, o qual exclui muitos da fruição de seus benefícios e gera profundas desigualdades sociais. O culto ao consumo, que pouco ou nada auxilia na construção de uma cidadania universal, é a uniformidade que a globalização estimula, adverte o professor.

Enfim, embora o processo de globalização não possa mais ser revertido, muitos assuntos devem depender do consentimento e da capacidade de resistir ao modo enviesado imposto à condição humana. É que a globalização traz desafios éticos, uma vez que, a partir dela, todos dependem uns dos outros, e as consequências das ações agora são de alcance global e podem influenciar e prejudicar pessoas e gerações que jamais se conhecerão (BAUMAN, 2011BAUMAN, Z. A Ética é possível em um mundo de consumidores? Rio de Janeiro: Zahar, 2011.).

2 A percepção do problema da insustentabilidade da sociedade

Os direitos humanos classificam-se em gerações, à vista de sua historicidade1 1 As gerações dos direitos humanos foram tratadas por Vasak, em aula proferida em 1979 em Estrasburgo. O tema veio a ser abordado por Bobbio, na obra A era dos direitos, quando se tornou amplamente conhecido. Alguns preferem (CANOTILHO, 2000, p. 380-381) o uso do termo dimensão, no lugar da palavra geração, que sugere a ideia de troca do velho pelo novo, quando o que ocorre é um processo de coexistência e complementação. . Na primeira, incluem-se os políticos e de liberdade, que exigem postura negativa do Estado. Na segunda, inserem-se os sociais, econômicos e culturais, que, de cunho prestacional, requerem atuação do Estado para garantia. Na terceira geração, encontram-se os direitos de natureza difusa, como o desenvolvimento, a defesa do consumidor e o meio ambiente equilibrado. Pode-se dizer que, se a liberdade é o valor que imanta a primeira geração e a igualdade, a segunda, a solidariedade ou a fraternidade orientam os direitos de terceira geração (BONAVIDES, 2013, p. 581BONAVIDES, P. Curso de Direito Constitucional. 28. ed. atual. São Paulo: Malheiros, 2013.; ROCASOLANO; SILVEIRA, 2010, p. 201ROCASOLANO, M. M.; SILVEIRA, V. O. Direitos humanos: conceitos, significados e funções. São Paulo: Saraiva, 2010.).

Uma vez que os direitos humanos nascem ou se desenvolvem por meio de conquistas históricas (BOBBIO, 2004BOBBIO, N. A Era dos Direitos. Rio de Janeiro: Elsevier, 2004.) ou do processo de dinamogenesis (ROCASOLANO; SILVEIRA, 2010ROCASOLANO, M. M.; SILVEIRA, V. O. Direitos humanos: conceitos, significados e funções. São Paulo: Saraiva, 2010.), é importante conhecer os caminhos galgados para que o consumo sustentável fosse compreendido como um direito de solidariedade. Isso pressupõe a análise do nascimento e do desenvolvimento do conceito de sustentabilidade.

Nesse sentido, cabe mencionar alguns referenciais teóricos que contribuíram ao início do debate do tema, a fim de preparar terreno para, no próximo tópico, analisar o processo histórico de luta dinamizado no âmbito do Sistema Internacional de Direitos Humanos.

A insustentabilidade da sociedade passa a ser mais notada na segunda metade do século XX, especialmente em virtude do descontrolado processo de industrialização, que começa a poluir o ar e a água e a provocar desastres ambientais, como o decorrente do lançamento de resíduos tóxicos por indústria química na baía de Minamata no Japão2 2 O evento implicou, a partir de 1950, a morte de peixes, o adoecimento de milhares de pessoas e centenas de óbitos pela contaminação por metilmercúrio. Em 2013, celebrou-se a Convenção de Minamata sobre Mercúrio, que foi promulgada no Brasil pelo Decreto Legislativo n. 9.470, de 14 de agosto de 2018. .

Posição de destaque nesse contexto ocupa a obra Primavera Silenciosa de Rachel Carson. Publicado em 1962, o livro da bióloga marinha acena para o grave risco aos animais e à saúde humana que o uso desenfreado de agrotóxico estava a causar nos Estados Unidos da América (CARSON, 2010CARSON, R. L. Primavera silenciosa. São Paulo: Gaia, 2010.).

Pouco após o alerta de Carson, Garret Hardin, biólogo da Universidade da Califórnia em Santa Bárbara, publica A tragédia dos Comuns. Embora focasse no dilema do aumento populacional3 3 Assumindo perspectiva já defendida por Thomas Malthus, na obra Um ensaio sobre o princípio da população, publicada em Londres no ano de 1798. , o artigo de Hardin, de 1968, ficou conhecido pela crítica ao uso desmedido de bens da coletividade por interesses puramente individuais. Para tanto, o professor utiliza-se da metáfora do pasto aberto a todos os criadores de animais, que, sem nenhum regramento, logo se torna insustentável. A partir disso, Hardin defende a necessidade de arranjos sociais que limitem a liberdade de uso dos bens comuns, como os bens da natureza (HARDIN, 1968HARDIN, G. The tragedy of the commons: the population problem has no technical solution; it requires a fundamental extension in morality. Science, v. 162, n. 3859, p. 1243-1248, 1968.).

Em 1973, Schumacher estrutura a célebre obra Small is Beautiful, vertida em português como O negócio é ser pequeno. Nela, o economista britânico de origem alemã alerta para a ação humana devastadora sobre o meio ambiente, quando enuncia que:

O homem moderno não se experiencia a si mesmo como uma parte da natureza, mas como uma força exterior destinada a dominá-la e a conquistá-la. Ele fala mesmo de uma batalha contra a natureza, esquecendo que, se ganhar a batalha, estará do lado perdedor. Até data recente, a batalha parecia ir suficientemente bem para dar-lhe a ilusão de poderes ilimitados, mas não tanto para tornar visível a possibilidade de vitória total. Esta agora está à vista, conquanto só uma minoria esteja começando a perceber o que isto significa para a continuidade da existência do gênero humano (SCHUMACHER, 1983, p. 12SCHUMACHER, E. F. O negócio é ser pequeno: um estudo de economia que leva em conta as pessoas. 4. ed. Rio de Janeiro: Zahar, 1983.).

(SCHUMACHER, 1983SCHUMACHER, E. F. O negócio é ser pequeno: um estudo de economia que leva em conta as pessoas. 4. ed. Rio de Janeiro: Zahar, 1983.) critica a Economia por focar excessivamente em aspectos quantitativos e desprezar relevantes influxos qualitativos, como as diferenças entre bens primários, que o homem tem de adquirir da natureza, e os bens secundários, obtidos a partir daqueles. Como o ponto de vista é o lucro privado, a Economia equipara essas espécies de bens e, em sua metodologia, acaba por ignorar a dependência do homem em face do mundo natural. O foco quantitativo implica que a Economia não se desvincule do conceito de crescimento puramente numérico, o que permite ao mercado tratar todos os bens pela mesma etiqueta de preços, embora o custo seja essencialmente distinto entre bens primários e secundários e entre bens primários renováveis e não renováveis.

Para (SCHUMACHER, 1983SCHUMACHER, E. F. O negócio é ser pequeno: um estudo de economia que leva em conta as pessoas. 4. ed. Rio de Janeiro: Zahar, 1983.), as diferenças de qualidade são de natureza metaeconômica, uma vez que têm de ser identificadas antes de iniciada a análise econômica, como uma etapa prévia necessária a conferir o devido valor aos recursos da natureza, o que obriga a Economia a também olhar para os sistemas do planeta Terra. São palavras do economista:

Como a Economia trata do homem em seu meio-ambiente, podemos esperar que a Meta-Economia consista de duas partes – uma tratando do homem e a outra do meio-ambiente. Por outras palavras, podemos esperar que a Economia infira suas metas e seus objetivos dum estudo do homem e extraia pelo menos grande parte de sua metodologia dum estudo da natureza (SCHUMACHER, 1983SCHUMACHER, E. F. O negócio é ser pequeno: um estudo de economia que leva em conta as pessoas. 4. ed. Rio de Janeiro: Zahar, 1983., p 46).

Em seus ensaios, (SCHUMACHER, 1983SCHUMACHER, E. F. O negócio é ser pequeno: um estudo de economia que leva em conta as pessoas. 4. ed. Rio de Janeiro: Zahar, 1983.) enfatiza a inobservância das leis do universo pelos modelos de produção e consumo da sociedade da época, que não apenas afetam o meio ambiente, como colaboram para a distribuição injusta de poder e riquezas. Ele defende a inviabilidade de qualquer empresa humana que consome rapidamente seu próprio capital insubstituível, os recursos da Terra, e propugna a mudança de rota para adoção de novos métodos de produção e de padrões de consumo traduzidos por um estilo de vida planejado para ser permanente. É forte seu apelo à redução do consumo, quando diz que:

Nem pode a luta contra a poluição ser bem-sucedida se os modelos de produção e consumo continuarem a existir numa escala, complexidade e grau de violência que, conforme está ficando cada vez mais evidente, não se enquadram nas leis do universo a que o homem está tão sujeito quanto o restante da criação. Tampouco existirá a possibilidade de reduzir a taxa de esgotamento de recursos ou de criar harmonia nas relações entre os que possuem e os que não possuem riqueza e poder enquanto não existir em parte alguma a ideia de que ter o bastante é bom e ter mais do que o bastante é mau (SCHUMACHER, 1983, p. 313SCHUMACHER, E. F. O negócio é ser pequeno: um estudo de economia que leva em conta as pessoas. 4. ed. Rio de Janeiro: Zahar, 1983.).

De modo geral, (SCHUMACHER, 1983SCHUMACHER, E. F. O negócio é ser pequeno: um estudo de economia que leva em conta as pessoas. 4. ed. Rio de Janeiro: Zahar, 1983.) é crítico à cultura do materialismo. Centrando seu pensamento na ética e na escala humana, ele sustenta que o gigantismo de organizações pode ter efeitos destrutivos ao homem e à Terra, na medida em que, sem regulação adequada e tecnologia apropriada, causa desequilíbrios naturais e desigualdades sociais.

As lições de (SCHUMACHER, 1983SCHUMACHER, E. F. O negócio é ser pequeno: um estudo de economia que leva em conta as pessoas. 4. ed. Rio de Janeiro: Zahar, 1983.) edificam-se em marco que inaugura a sensibilidade global a questões ambientais e seus impactos antropogênicos4 4 Induzidos ou alterados pela presença e pela atividade do ser humano. . Segundo Mebratu (1998, p. 8MEBRATU, D. Sustainability and sustainable development: historical and conceptual review. Environmental Impact Assessment Review, v. 18, n. 6, p. 493-520, 1998.), embora com algumas ideias polêmicas, a visão de Schumacher focada no esgotamento dos recursos de Terra e na necessidade de a economia olhar para aspectos sociais e ecológicos alimentou defensores do meio ambiente, de maneira tal que, para alguns, o economista britânico é reputado o precursor do conceito de desenvolvimento sustentável5 5 Vale anotar que, em 1970, o cientista e economista romeno Nicholas Georgescu-Roegen já desenvolvia a questão da ecologia no seio da economia, conforme lembra Serge Latouche, em seu livro Pequeno Tratado do Decrescimento Sereno. A obra de Nicholas é chamada A Lei da Entropia e o Processo Econômico. .

Sachs também censura a visão reducionista da Economia. Argumentando que as questões econômicas devem ser harmonizadas com as questões sociais e ecológicas, o professor (SACHS, 2009SACHS, I. Caminhos para o desenvolvimento sustentável. Rio de Janeiro: Garamond, 2009.) usa o termo ecodesenvolvimento já na década de 1970, a partir de sugestões de Maurice Strong, a quem assessorava nos preparativos da Conferência de Estocolmo de 1972.

Mais tarde, o termo cunhado dará lugar à locução desenvolvimento sustentável, cujo conceito será trabalhado e difundido por Sachs que, além de professor universitário, atua como perito e consultor de governos e organismos internacionais. Na larga trajetória, Sachs (2009SACHS, I. Caminhos para o desenvolvimento sustentável. Rio de Janeiro: Garamond, 2009.) combate com firmeza as ideias de crescimento a qualquer custo e propõe caminhos para que as sociedades possam autogerir a natureza de modo sensato, em prol do bem-estar das atuais e das futuras gerações, um imperativo de solidariedade sincrônica e diacrônica.

Defensor de uma economia política, para além de uma economia apenas ecológica6 6 Igualmente contrária à economia tradicional, uma proposta que busca conciliar a economia política e a economia ecológica vem a ser desenvolvida por Leff (2015) em meados da década de 1990. Para o mexicano, o movimento ambiental e as lutas sociais em busca de melhores qualidade de vida e condições sustentáveis provocam uma nova dinâmica que pode ser chamada de reapropriação social da natureza, a qual se preocupa com a distribuição ecológica, com a justiça ambiental e com a autonomia cultural, isto é, aprofunda-se em questões de equidade. , Sachs (2009SACHS, I. Caminhos para o desenvolvimento sustentável. Rio de Janeiro: Garamond, 2009.) bem destaca que, se cabe às ciências naturais dizer o que é necessário a um mundo sustentável, compete às ciências sociais articular as estratégias rumo a esse objetivo, o que exige tocar em temas sensíveis como as profundas desigualdades existentes entre Norte e Sul.

Ainda na década de 1970, Donella Meadows, Dennis Meadows, Jorgen Randers e William Behrens II, cientistas do Instituto de Tecnologia de Massachusetts (MIT), publicam o relatório Limites do Crescimento. O trabalho, destinado ao Clube de Roma, conclui que, se mantidas as tendências de produção e consumo e de crescimento populacional, a capacidade do planeta seria esgotada em pouco tempo, conforme síntese a seguir:

Se as atuais tendências de crescimento da população mundial, industrialização, poluição, produção de alimentos e esgotamento de recursos continuarem inalteradas, os limites do crescimento neste planeta serão alcançados em algum momento nos próximos cem anos. O resultado mais provável será um declínio bastante súbito e incontrolável da população e da capacidade industrial.

É possível alterar essas tendências de crescimento e estabelecer uma condição de estabilidade ecológica e econômica sustentável no futuro. O estado de equilíbrio global poderia ser projetado para que as necessidades materiais básicas de cada pessoa na terra sejam satisfeitas e cada pessoa tenha a mesma oportunidade de realizar seu potencial humano individual (MEADOWS, 1972, p. 1MEADOWS, D. H. et al. The limits to growth: a report to the club of Rome (1972). Washington, DC: Potomac Associates, 1972. Disponível em: http://www.donellameadows.org/wp-content/userfiles/Limits-to-Growth-digital-scan-version.pdf. Acesso em: 26 maio 2022.
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).

O informe científico finaliza advertindo acerca da necessidade de estipular limites ao crescimento para que a sociedade respeite a capacidade da Terra e dure por gerações. O imperativo de transição ficou claro nestes dizeres:

Se há motivo para profunda preocupação, também há motivo para esperança. Limitar deliberadamente o crescimento seria difícil, mas não impossível. O caminho a seguir é claro e os passos necessários; embora sejam novos para a sociedade, estão dentro das capacidades humanas. O homem possui, por um pequeno momento em sua história, a mais poderosa combinação de conhecimento, ferramentas e recursos que o mundo já conheceu. Ele tem tudo o que é fisicamente necessário para criar uma forma totalmente nova de sociedade humana – uma que seria construída para durar por gerações. Os dois ingredientes que faltam são um objetivo realista e de longo prazo que pode guiar a humanidade para o equilíbrio da sociedade e a vontade humana de atingir esse objetivo. Sem esse objetivo e um compromisso com ele, as preocupações de curto prazo gerarão o crescimento exponencial que leva o sistema mundial aos limites da Terra e ao colapso final. Com esse objetivo e esse compromisso, a humanidade estaria pronta agora para iniciar uma transição controlada e ordenada do crescimento para o equilíbrio global (MEADOWS, 1972, p. 9MEADOWS, D. H. et al. The limits to growth: a report to the club of Rome (1972). Washington, DC: Potomac Associates, 1972. Disponível em: http://www.donellameadows.org/wp-content/userfiles/Limits-to-Growth-digital-scan-version.pdf. Acesso em: 26 maio 2022.
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).

No mesmo ano do relatório apresentado ao Clube de Roma, a ONU promove a Conferência sobre o Meio Ambiente Humano em Estocolmo, dando início à discussão mais ampla da temática em nível internacional.

3 A ONU e a luta por sustentabilidade

Estocolmo foi a primeira iniciativa global com o objetivo de levantar e debater o impacto humano sobre o meio ambiente. Ao convocar a conferência, a ONU visava construir diretrizes aos Estados para proteção e preservação ambientais, conforme sugerido pela Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura (UNESCO).

Em 1972, aprovou-se a Declaração de Estocolmo com 26 princípios comuns, que, em resumo, relacionam a vida digna e o bem-estar do ser humano ao direito ao meio ambiente de qualidade; destacam o direito das gerações presentes e futuras à preservação dos recursos naturais; pregam o ordenamento racional do uso da natureza e a importância da ciência e da tecnologia para descobrir, evitar e combater riscos ambientais; recomendam esforços para educação ambiental, salientando a responsabilidade das empresas e dos meios de comunicação de massa; e ressaltam a cooperação internacional em matéria ambiental.

A mais disso, a Declaração enfatiza que os desafios de proteção do meio ambiente são distintos entre países desenvolvidos e em desenvolvimento, na medida em que os primeiros têm questões resultantes da industrialização e do desenvolvimento tecnológico e os segundos experimentam problemas ligados ao subdesenvolvimento e à ausência de níveis mínimos de vida digna. Daí por que alguns princípios comuns, como os n. 9, 10, 11, 12, 20 e 23, objetivam atender a essa desigualdade. As diretivas orientam que os países desenvolvidos devem prestar auxílio e compartilhar conhecimentos e tecnologia aos países em desenvolvimento, ao passo que estes podem ter níveis de proteção ambiental diferenciados, mais tênues do que o consenso internacional recomenda, em face do alto custo social imposto. Cuida-se da chamada responsabilidade comum, mas diferenciada entre os Estados.

Malgrado uma soft law7 7 Para mais informações sobre normas de soft law, confira-se Campello e Reis (2018). , sem efeito vinculante como um tratado, a Declaração de Estocolmo foi de extrema importância para visibilidade e engajamento ambientais8 8 Dela resultou o estabelecimento de ministérios ambientais e agências em mais de 100 países e o início do crescimento explosivo do número de organizações não governamentais (ONGs) dedicadas à proteção ambiental e questões pertinentes (LENS; NATH, 2003, p. 11). .

Como produto de Estocolmo também é criado o Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente (PNUMA), o United Nations Environment Programme (UNEP), com a missão de determinar a agenda ambiental global e proporcionar lideranças e parcerias na proteção do meio ambiente.

Em 1980, a União Internacional para a Conservação da Natureza (IUCN) publicou o relatório Word conservation strategy: living resource conservation for sustainable Development. Dedicado a traçar uma estratégia de conservação ambiental de longo prazo, o trabalho conceitua desenvolvimento como “a modificação da biosfera e a aplicação de recursos humanas, financeiros, vivos ou não vivos, para satisfazer as necessidades humanas” (IUCN, 1980IUCN – INTERNATIONAL UNION FOR CONSERVATION OF NATURE AND NATURE RESOURCES. Word conservation strategy: living resource conservation for sustainable development. Gland: IUCN, 1980. Disponível em: https://portals.iucn.org/library/efiles/documents/wcs-004.pdf. Acesso em: 26 maio 2022.
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), ao mesmo tempo em que o limita às dimensões econômicas, sociais e ecológicas da sustentabilidade (cap. 1, item 3). No capítulo 20, o consumo das sociedades desenvolvidas ou afluentes, em contraste a quadros de grave escassez em países menos favorecidos, recebe atenção nestes termos:

Em muitas partes do mundo, as pressões da população estão exigindo recursos além da capacidade de sustentação da natureza. Cada país deve ter uma política de população consciente para evitar ao máximo a propagação de tais situações e, eventualmente, alcançar um equilíbrio entre os números e o meio ambiente. Ao mesmo tempo, é essencial que os afluentes constranjam suas demandas de recursos e, de preferência, as reduzam, deslocando parte de sua riqueza para atender os desfavorecidos. Em grande medida, a sobrevivência e o futuro dos pobres dependem da conservação e compartilhamento pelos ricos.

Em 1982, ocorre a Estocolmo+10, em Nairóbi, no Quênia, levando ao estabelecimento da Comissão Mundial sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento (CMMAD). Em 1983, a ONU encomenda um relatório à CMMAD, presidida por Gro H. Brundtland. Em 1987, é publicado o Nosso Futuro Comum, também chamado Relatório Brundtland, em homenagem à 1ª Ministra da Noruega que presidiu os trabalhos.

De acordo com o Nosso Futuro Comum (1987, p. 5CMMAD – COMISSÃO MUNDIAL SOBRE O MEIO AMBIENTE E DESENVOLVIMENTO. Nosso futuro comum. 2. ed. Rio de Janeiro: FGV, 1991.), “a produção industrial cresceu mais de 50 vezes no último século, sendo que quatro quintos desse crescimento se deram a partir de 1950”, com profundo impacto à biosfera e à capacidade de regeneração da Terra. Essa escala de crescimento industrial, que se fez também nos países em desenvolvimento, cria vínculos novos entre a economia global e a ecologia global, a exigir soluções cooperativas internacionais, para além de fortes atitudes internas dos Estados, diz o relatório. O trabalho também reforça a necessidade de auxílio financeiro e técnico aos países menos desenvolvidos, porque todos já, ricos e pobres, grandes e pequenos, precisam empreender mudanças a caminho do desenvolvimento sustentável.

A Comissão Brundtland define desenvolvimento sustentável como “o desenvolvimento que atende às necessidades do presente sem comprometer a capacidade das gerações futuras de atender às suas próprias necessidades”, um conceito aberto que contém dois elementos-chave: (1) necessidades, que devem ser atendidas com absoluta prioridade para proteção do pobres do mundo; e (2) limitação da tecnologia e das estruturas sociais à capacidade do meio ambiente, para garantia das necessidades presentes e futuras. Como visto, fatores sociais (redução da pobreza) e ecológicos (melhoria do ambiente) se entrelaçam fortemente nessa definição (MEBRATU, 1998, p. 501–502MEBRATU, D. Sustainability and sustainable development: historical and conceptual review. Environmental Impact Assessment Review, v. 18, n. 6, p. 493-520, 1998.).

Em 1992, realizou-se a Conferência das Nações Unidas sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento9 9 Note-se que a palavra “Desenvolvimento” agora é inserida no nome da Conferência, o que reflete a afirmação de um processo histórico coroado com o Relatório Brundtland de 1987 e com a Declaração sobre o Direito ao Desenvolvimento da ONU (Res. 41/128). (CNUMAD), também chamada Cúpula da Terra, Eco-92 ou Rio-92. Daí advém a Agenda 21, um programa de ação global com 40 capítulos. No item 4.3, observa-se que os padrões de produção e consumo, especialmente os dos países industrializados, são a principal causa da contínua degradação ambiental, e adverte-se que o crescimento econômico, acelerado pela globalização, tem repercutido de modo injusto e desigual nas várias partes do mundo, com agravamento da pobreza e da fome nos países em desenvolvimento (ONU, 1995ONU – ORGANIZAÇÃO DAS NAÇÕES UNIDAS. Conferência das Nações Unidas sobre o Meio Ambiente e Desenvolvimento (1992, Rio de Janeiro): de acordo com a Resolução n. 44/228 da Assembleia Geral da ONU, de 22-12-89, estabelece uma abordagem equilibrada e integrada das questões relativas a meio ambiente e desenvolvimento: a Agenda 21. Brasília, DF: Câmara dos Deputados, 1995. (Série Ação Parlamentar, n. 56). Disponível em: https://edisciplinas.usp.br/pluginfile.php/528199/mod_resource/content/0/Agenda%2021.pdf. Acesso em: 24 abr. 2023.
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).

A Agenda 21 representou um consenso de que os países desenvolvidos devem liderar a promoção de padrões de consumo mais sustentáveis. Esse tema é controverso em face ao conflito ambiental que existe entre os países dos hemisférios Norte e Sul. No debate sobre sustentabilidade o Norte costuma culpar o Sul pela superpopulação e o Sul culpa o Norte pelo consumo excessivo. Em uma visão mais extrema, coloca-se o desenvolvimento sustentável como uma maneira de negar aos países em desenvolvimento o mesmo estilo de vida e níveis de consumo desfrutados pelos países desenvolvidos.

Da Eco-92 ainda resultam a Declaração do Rio sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento com 27 princípios; a Convenção das Nações Unidas de Combate à Desertificação; a Convenção sobre Diversidade Biológica; a Convenção Quadro das Nações Unidas sobre Mudanças Climáticas, além da Declaração de Princípios sobre Uso de Florestas.

Estabelecendo princípios de extrema relevância, como o da precaução e o do prévio estudo do impacto ambiental, a Declaração do Rio ainda alerta que aos Estados cabe reduzir e eliminar os sistemas de produção e consumo não sustentáveis (princípio 8) e estabelece que as autoridades nacionais devem fazer uso de instrumentos econômicos, além de fomentar a internalização dos custos ambientais no processo de formação de preços de mercado, no intuito de exigir que o causador da contaminação suporte seus respectivos custos de reabilitação, considerando o interesse público, mas sem distorcer o comércio e os investimentos internacionais (princípio 16 – poluidor-pagador).

Apesar de não ter obtido uma hard law para proteção ambiental, a Rio-92 deixou como grande legado o próprio processo de preparação, que começou ainda em 1989 e promoveu quatro reuniões em distintas partes do mundo, o que propiciou visibilidade ao conceito de desenvolvimento sustentável, fazendo que pessoas de diferentes regiões do globo passassem a indagar o que isso significa, como pode ser posto em prática e se já se está a seu caminho (MEBRATU, 1998, p. 502MEBRATU, D. Sustainability and sustainable development: historical and conceptual review. Environmental Impact Assessment Review, v. 18, n. 6, p. 493-520, 1998.).

Conforme Sanchés e Croal (1998MEBRATU, D. Sustainability and sustainable development: historical and conceptual review. Environmental Impact Assessment Review, v. 18, n. 6, p. 493-520, 1998.), embora sem algo vinculante que abordasse o desafio de escolher caminhos políticos sustentáveis, é inegável que a Rio-92 contribuiu ao cenário internacional, máxime porque é a partir dela que o instrumento da avaliação de impacto ambiental passa a ser previsto ou aperfeiçoado na legislação de muitos países.

Em 1997, a ONU reúne-se para identificar os entraves na implementação da Agenda 21 e definir prioridades de atuação, avaliação conhecida como Rio+5. Pouco depois, em 1999, a ONU amplia suas diretrizes de proteção ao consumidor estabelecidas inicialmente em 1985 pela Resolução 39/248, para incluir o consumo sustentável fortemente aderido aos direitos de educação e de informação adequada. De relevo mencionar os seguintes tópicos das novas guidelines, também uma soft law internacional:

29. O acesso do consumidor a informações precisas sobre o impacto ambiental de produtos e serviços deve ser incentivado por meio de perfis de produtos, relatórios ambientais da indústria, centros de informações para consumidores, programas de rotulagem ecológica voluntários e transparentes e linhas diretas de informações sobre produtos.

30. Os Estados-Membros, em estreita colaboração com fabricantes, distribuidores e organizações de consumidores, devem tomar medidas relativas a alegações ou informações ambientais enganosas na publicidade e outras atividades de marketing. O desenvolvimento de códigos e padrões de publicidade apropriados para a regulamentação e verificação de alegações ambientais deve ser incentivado.

45. Os Estados-Membros devem encorajar as organizações de consumidores e outros grupos interessados, incluindo os meios de comunicação social, a realizar programas de educação e informação, inclusive sobre os impactos ambientais dos padrões de consumo e sobre as possíveis implicações, incluindo benefícios e custos, de mudanças no consumo, especialmente para o benefício de grupos de consumidores de baixa renda em áreas rurais e urbanas.

Em 2000, a ONU aprova a Declaração do Milênio com oito Objetivos de Desenvolvimento do Milênio (ODM) a serem alcançados até 2015. O ODM n. 7 liga-se à garantia de sustentabilidade ambiental, e o n. 8 vincula-se à execução de uma parceria global para o desenvolvimento. Também em 200010 10 Em 1987, a Comissão Mundial das Nações Unidas sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento solicitou a criação de uma carta contendo os princípios fundamentais para o desenvolvimento sustentável. A elaboração da Carta da Terra foi um dos assuntos inacabados da Cúpula da Terra do Rio 1992. Em 1994, Maurice Strong, secretário geral da Cúpula da Terra e presidente do Conselho da Terra, e Mikhail Gorbachev, presidente da Cruz Verde Internacional, lançaram uma nova iniciativa da Carta da Terra com o apoio do governo dos Estados Unidos. A Comissão da Carta da Terra foi formada em 1997 para supervisionar o projeto. Após anos de consulta e elaboração, a Carta da Terra é lançada em junho de 2000. , é lançada a Carta da Terra, uma declaração de princípios éticos considerados fundamentais para o século XXI na busca de uma comunidade sustentável, justa e pacífica. A Carta da Terra representa grande avanço ao exaltar o princípio de respeito e cuidado pela comunidade da vida e o valor da integridade ecológica.

Em 2002, Joanesburgo sedia a Conferência da ONU chamada Cúpula Mundial sobre o Desenvolvimento Sustentável ou Rio+10, com o objetivo de analisar o progresso da Agenda 21. Tal como a Rio-92, a Rio+10 é precedida de um longo processo de preparação, com reuniões em várias partes do globo, razões por que fomenta expectativas de grandes avanços.

No entanto, a Declaração de Joanesburgo, o principal produto da Rio+10, praticamente reafirma os princípios já celebrados em Estocolmo e na Rio-92 e muito pouco traz em termos novos. Como o compromisso do desenvolvimento sustentável já havia sido assumido na Agenda 21, o foco estava em como implementar e monitorar esse ideal. Nesse sentido, foi dada ênfase à responsabilidade empresarial, com debates acerca da possibilidade de acordos ou tratados internacionais, parcerias público-privadas e novas regulamentações nacionais, além de uma rotulagem ecológica obrigatória, para alcance de modos de produção e consumo mais sustentáveis. Mas os Estados Unidos se recusaram a assumir qualquer um desses compromissos específicos e, em conjunto com a Austrália, foram contra a adoção de metas de aumento de energia por fontes renováveis (SEYFANG, 2003, p. 226).

A minuta da Declaração de Joanesburgo continha 69 artigos, mas apenas 37 restaram de fato aprovados. De modo geral, o documento indica que as ameaças ao ambiente têm crescido nos últimos dez anos; aponta os desafios atuais para a implementação do desenvolvimento sustentável, aguçados com o advento do processo de globalização; admite a importância de uma política multinível, de longo prazo e com ampla participação para responder a esses desafios; e reforça o uso de instrumentos de política ambiental, assim como a necessidade de capacitação, treinamento, educação, transferência de tecnologia e outras ações importantes (HENS; NATH, 2003, p. 22HENS, L.; NATH, B. The Johannesburg Conference. Environment, Development and Sustainability, v. 5, n. 1, p. 7-39, 2003.). De particular relevância é a expressa menção à responsabilidade corporativa por meio das seguintes bases principiológicas:

27. Concordamos que, na busca de suas atividades legítimas, o setor privado, tanto as grandes empresas quanto as pequenas, têm o dever de contribuir para a evolução de comunidades e sociedades equitativas e sustentáveis.

28. Concordamos também em prover assistência para ampliar oportunidades de emprego geradoras de renda, levando em consideração a Declaração de Princípios e Direitos Fundamentais no Trabalho da Organização Internacional do Trabalho (OIT).

29. Concordamos que é necessário que as empresas do setor privado implementem suas responsabilidades corporativas. Isso deve ocorrer num contexto normativo, transparente e estável.

Em conjunto com a Declaração de Joanesburgo, é aprovado um plano de implementação da Agenda 21. A mudança de padrões insustentáveis de consumo e produção está inserida no capítulo III, que prevê uma gama de ações, como a educação e a informação do consumidor, o uso da ecoeficiência e de práticas de produção mais limpas, além da análise do ciclo de vida baseado no conhecimento científico. Segundo Hens e Nath (2003, p. 24HENS, L.; NATH, B. The Johannesburg Conference. Environment, Development and Sustainability, v. 5, n. 1, p. 7-39, 2003. e 38), temas centrais do capítulo foram objetos de grande desacordo, como energia renovável, subsídios à energia e produtos químicos e de saúde, o que torna questionável a capacidade do mundo de realmente caminhar em direção à sustentabilidade por meio da assunção de obrigações concretas por governos e empresas.

Enfim, em Joanesburgo, verifica-se um descompasso considerável entre o discurso e a vontade dos Estados e do setor corporativo de celebrar compromissos sustentáveis efetivos.

Igual conclusão é encontrada na Rio+20. O mundo respondia à crise de 2009 e, também por isso, poucos estavam dispostos a assumir obrigações. Na preparação do evento, realizado no Rio de Janeiro, descarta-se o objetivo de ajustar normas internacionais vinculantes, mas apenas se almeja renovar e/ou revisar compromissos de desenvolvimento sustentáveis e identificar lacunas de implementação. Por consequência, em 2012, a Rio+20 discute questões sobre economia verde, eficiência do setor produtivo e erradicação da pobreza novamente sem estratégia clara e concreta de ação política (GUIMARÃES; FONTOURA, 2012, p. 25–27GUIMARÃES, R. P.; FONTOURA, Y. S. R. Rio+ 20 ou Rio-20? Crônica de um fracasso anunciado. Ambiente & Sociedade, São Paulo, v. 15, n. 3, p. 19-39, 2012.).

A Declaração da Rio+20, chamada O Futuro que Queremos, enumera 283 itens sobre consensos na busca do desenvolvimento sustentável, mas que não abordam obrigações específicas. A temática do consumo e da produção é ali prevista em três tópicos, a saber:

224. Recordamos os compromissos assumidos na Declaração do Rio, a Agenda 21 e na JPOI sobre consumo e produção sustentáveis e, em particular, o pedido no capítulo 3 do JPOI, para incentivar e promover o desenvolvimento de um Programa-Quadro de 10 anos (10YFP). Reconhecemos que mudanças fundamentais na forma como as sociedades consomem e produzem são indispensáveis para se alcançar o desenvolvimento sustentável global.

225. Os países que se comprometeram a eliminar progressivamente as políticas prejudiciais e ineficientes de subvenção aos combustíveis fósseis reiteram seu compromisso, uma vez que essas subvenções incitam o consumo perdulário e comprometem o desenvolvimento sustentável. Convidamos todos a considerarem a racionalização das subvenções aos combustíveis fósseis, removendo as distorções de mercado, inclusive por meio da reestruturação da tributação e da eliminação progressiva de subsídios prejudiciais, lá onde existirem, de modo a expressar os seus efeitos sobre o meio ambiente, considerando plenamente as necessidades e condições específicas dos países em desenvolvimento, com o objetivo de minimizar os possíveis impactos adversos ao seu desenvolvimento, de uma forma que proteja os pobres e as comunidades afetadas.

226. Adotamos o planejamento de 10 anos de programação (10YFP) sobre o consumo e produção sustentáveis (SCP), como consta do documento A/CONF.216/5, e destacamos que os programas incluídos nos 10YFP têm um caráter facultativo. Convidamos a Assembleia Geral das Nações Unidas em sua 67ª Sessão, a designar um organismo das Nações Unidas composto por Estados-Membros para tomar as medidas necessárias a operacionalizar plenamente o quadro.

Talvez o maior fruto da Rio+20 tenha sido a articulação para construção de Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS), em substituição aos Objetivos de Desenvolvimento do Milênio (ODM). Os tópicos 245 a 251 de O Futuro que Queremos tratam exatamente disso. O grupo de trabalho que veio a ser criado para a tarefa apresenta seu relatório final à ONU em 2014, com a sugestão de 17 novos objetivos (agora ODS) e 169 metas específicas para monitoramento e alcance até 2030.

Lançada em 2015, a Agenda 2030 da ONU nasce com 17 ODS e 169 metas e inaugura “um novo paradigma para um modelo mais equilibrado de desenvolvimento sustentável com o fortalecimento da proteção do meio ambiente”. A agenda preocupa-se em “combater as desigualdades e a discriminação, a fim de que ‘ninguém seja deixado para trás’”, e os que estão mais atrás sejam prioritariamente atendidos (CAMPELLO, 2020, p. 25–26CAMPELLO, L. G. B. Direitos Humanos e a Agenda 2030: uma mudança de paradigma em direção a um modelo mais equilibrado para o desenvolvimento sustentável. In: CAMPELLO, L. G. B. (coord.). Direitos humanos e meio ambiente: os 17 objetivos de desenvolvimento sustentável da Agenda 2030. São Paulo: IDHG, 2020. p. 22-41.).

Abrangendo tanto problemas sociais como pobreza, fome, trabalho decente e educação de qualidade, quanto problemas ecológicos como energia limpa, vida na água e na terra e consumo e produção sustentáveis, de modo indivisível e interdependente, a Agenda 2030 estipula condutas procedimentais e materiais concretas. As primeiras consistem em deveres instrumentais como o de fornecer acesso à informação ambiental prevista na meta 12.811 11 “Até 2030, garantir que as pessoas, em todos os lugares, tenham informação relevante e conscientização para o desenvolvimento sustentável e estilos de vida em harmonia com a natureza”. ou o de facilitar a participação pública nos processos de tomada de decisões ambientais disposto na meta 16.712 12 “Garantir a tomada de decisão responsiva, inclusiva, participativa e representativa em todos os níveis”. ; já as obrigações materiais protegem diretamente direitos humanos, como o direito à saúde, garantido pela meta 3.9, ao estipular que se deve, “até 2030, reduzir substancialmente o número de mortes e doenças e por produtos químicos perigosos, contaminação e poluição do ar, da água e do solo” (CAMPELLO, 2020, p. 34–38CAMPELLO, L. G. B. Direitos Humanos e a Agenda 2030: uma mudança de paradigma em direção a um modelo mais equilibrado para o desenvolvimento sustentável. In: CAMPELLO, L. G. B. (coord.). Direitos humanos e meio ambiente: os 17 objetivos de desenvolvimento sustentável da Agenda 2030. São Paulo: IDHG, 2020. p. 22-41.).

Nesse contexto, é de relevo destacar o ODS 12, com a temática “consumo e produção responsáveis”, além da meta 12.5, cuja pretensão é de, até 2030, diminuir substancialmente os resíduos por meio da redução do consumo. Essa meta, a toda evidência, repercute diretamente nos hábitos da sociedade pós-moderna.

Por fim, a Agenda 2030 significa um importante avanço ao apontar caminhos mais precisos para o desenvolvimento sustentável e exigir produção e monitoramento de dados; no entanto, também é certo que ela não é dotada de força coativa ou vinculante, o que mantém ainda fraco o sistema internacional de proteção dos direitos humanos.

4 A necessidade de revisitar a sociedade pós-moderna e a governança global

O conhecimento científico atual viabiliza monitorar o impacto das atividades humanas sobre o meio ambiente. No entanto, essas métricas não têm apresentado a devida evolução em termos de sustentabilidade. Alguns indicadores merecem alusão.

Experimenta-se enorme dificuldade de evitar o aquecimento global e controlar os impactos climáticos. Embora o Protocolo de Montreal (1987), o Protocolo de Kyoto (1997) e agora o Acordo de Paris (2015) prevejam metas de redução de emissões de gases do efeito estufa, o Sexto Relatório de Avaliação do Painel Intergovernamental de Mudanças Climáticas13 13 O IPCC é o órgão da ONU que avalia a ciência relacionada às mudanças climáticas, reunindo especialistas de todo o mundo. (IPCC, 2022IPCC – INTERGOVERNMENTAL PANEL ON CLIMATE CHANGE. Climate change 2022: mitigation of climate change – summary for policymakers. Geneva: IPCC, 2022. Disponível em: https://www.ipcc.ch/report/ar6/wg3/downloads/report/IPCC_AR6_WGIII_SPM.pdf. Acesso em: 5 jun. 2022.
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) indica que as emissões antropogênicas, induzidas pelo ser humano, aumentaram 12% desde 2010 e 54% desde 1990. Daí que, para cumprir a meta do Acordo de Paris, que visa manter o aumento da temperatura global em até 1,5℃ acima dos níveis pré-industriais, as emissões terão de parar de crescer até 2025 e cair 43% até 2030.

Além de ecologicamente abusivas, tais emissões refletem uma geografia de desigualdade social. Segundo Gore (2021GORE, T. Carbon inequality in 2030. Oxford: Oxfam, 2021. Disponível em: https://oxfamilibrary.openrepository.com/bitstream/handle/10546/621305/bn-carbon-inequality-2030-051121-en.pdf. Acesso em: 21 jun. 2022.
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), estima-se que, até 2030, o 1% mais rico da população mundial (cerca de 80 milhões de pessoas) terá pegadas de carbono 25% maiores do que em 1990, cerca de 30 vezes mais do que o nível global per capita compatível com 1,5℃, ao passo que a pegada dos 50% mais pobres (cerca de 4 bilhões de pessoas) deverá manter-se bem abaixo da meta de 1,5℃. Em sentido semelhante, o IPCC (2022, p. 13IPCC – INTERGOVERNMENTAL PANEL ON CLIMATE CHANGE. Climate change 2022: mitigation of climate change – summary for policymakers. Geneva: IPCC, 2022. Disponível em: https://www.ipcc.ch/report/ar6/wg3/downloads/report/IPCC_AR6_WGIII_SPM.pdf. Acesso em: 5 jun. 2022.
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) aponta que “os países menos desenvolvidos (LDCs) e os Pequenos Estados Insulares em Desenvolvimento (SIDS) têm emissões per capita muito mais baixas (1,7 tCO2-eq e 4,6 tCO2-eq, respectivamente) do que a média global (6,9 tCO2-eq), excluindo CO2-LULUCF”.

Por outro lado, há o grave problema do consumo excessivo de plástico. Conforme o World Wildlife Fund for Nature (WWF), os solos, as águas doces e os oceanos estão contaminados com macro, micro e nanoplásticos e estima-se o consumo de 104 milhões de toneladas métricas de plástico até 2030. Os nanoplásticos são ingeridos por meio de alimentos e de água potável, e ainda não se conhecem todas as consequências dessa ingestão, mas já se sabe que a poluição plástica mata a vida selvagem, danifica os ecossistemas e polui a atmosfera. Não obstante, carece-se de uma abordagem sistemática global exigindo do produtor a responsabilidade por todo o ciclo de vida do plástico, cuja fabricação se tornou menos custosa e se proliferou nos últimos tempos14 14 É preciso obrigar, em todos os níveis, à melhoria de gestão desse resíduo, com a criação e a implementação de métodos de reuso e reciclagem, além da redução da produção e do consumo a limites aceitáveis. Os custos operacionais da reciclagem do plástico são altos e têm tornado a atividade economicamente inviável. Daí a necessidade de tratamento normativo adequado, mesmo porque o excesso desse material, sem forte regulamentação e fiscalização, também induz ao risco de incineração, produzindo mais poluição (WWF, 2019). .

Aqui também prepondera a geografia dos países afluentes, uma vez que quase metade de todo o plástico é usado na criação de produtos descartáveis e a maioria desses produtos é consumida em países de renda alta ou média-alta (WWF, 2019, p. 8, 10, 12WWF – WORLD WILDLIFE FUND FOR NATURE. Solucionar a poluição plástica: transparência e responsabilização. Gland: WWF, 2019.Disponível em: https://www.wwf.org.br/?70222/Brasil-e-o-4-pais-do-mundo-que-mais-gera-lixo-plastico. Acesso em: 5 jun. 2022.
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e 14). Um estudo mais recente da WWF (2022WWF – WORLD WILDLIFE FUND FOR NATURE. Impacts of plastic pollution in the oceans on marine species, biodiversity and ecosystems. Gland: WWF, 2022. Disponível em: https://wwfbr.awsassets.panda.org/downloads/wwf_impacts_of_plastic_pollution_on_biodiveristy_.pdf. Acesso em: 5 jun. 2022.
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) indica com precisão os efeitos adversos que a poluição plástica tem causado nos oceanos, estimando que os detritos plásticos devam quadruplicar até 2050, se não houver uma mudança de modelagem no sistema atual.

Convém anotar que a humanidade já cruzou o espaço operacional seguro do processo de introdução de novas entidades (PERSSONet al., 2022PERSSON, L. et al. Outside the safe operating space of the planetary boundary for novel entities. Environmental Science & Technology, v. 56, n. 3, p. 1510-1521, 2022.), no qual se inclui o plástico, assim como já transgrediu os limites seguros de outros cinco processos autorreguladores da resiliência e do equilíbrio do Sistema Terrestre: as mudanças climáticas; a integridade da biosfera; a interferência nos ciclos globais de nitrogênio e fósforo; o uso global de água verde; e as mudanças no uso do solo (ROCKSTRÖMet al., 2009ROCKSTRÖM, J. et al. A safe operating space for humanity. Nature, v. 461, n. 7263, p. 472-475, 2009.; STEFFENet al., 2015STEFFEN, W. et al. Planetary boundaries: guiding human development on a changing planet. Science, v. 347, n. 6223, p. 1259855, 2015.; WANG-ERLANDSSONet al., 2022WANG-ERLANDSSON, L. et al. A planetary boundary for green water. Nature Reviews Earth & Environment, v. 3, n. 6, p. 380-392, 2022.).

Outros dados de relevo são a pegada ecológica e a biocapacidade do planeta, calculadas pela York University, em parceria com a Global Footprint Network. A pegada ecológica indica, em hectares, a porção de terra e água que uma pessoa ou a sociedade utiliza em média para se sustentar, ao passo que o índice de biocapacidade representa a quantidade de recursos naturais disponíveis, respeitado o seu processo de regeneração. Nesse sentido, verifica-se que, desde 1971, a pegada ecológica da humanidade ultrapassa a biocapacidade do planeta; em 2018, isso foi ultrapassado em 75%. Em termos globais, estima-se que a população já usa em média 50% a mais dos recursos disponíveis, o que esgota rapidamente o capital natural, que perde sua capacidade de renovação. A média mundial é de 2,7 hectares globais por pessoa, ao passo que a biocapacidade disponível do planeta é de apenas 1,8 hectares. E projeções para 2050 estimam que dois planetas seriam necessários, se mantido o padrão de consumo (GLOBAL FOOTPRINT NETWORK, 2022GLOBAL FOOTPRINT NETWORK. Advancing the Science of Sustainability. Release Notes: national ecological footprint and biocapacity accounts, 2022 Edition. Disponível em: https://footprint.info.yorku.ca/files/2022/03/nfa-2022-release-notes.pdf?x61824. Acesso em: 21 jun. 2022.
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; THE NATIONAL FOOTPRINT…, 2022THE NATIONAL FOOTPRINT and biocapacity accounts launch event (part 1), 2022. 1 vídeo (19min45s). Publicado pelo canal Ecological Footprint Iniciative. Disponível em: https://www.youtube.com/watch?v=IG-vFrcP8pc&t=863s. Acesso em: 21 jun. 2022.
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).

Ademais, calcula-se que 90% da perda de biodiversidade e do estresse hídrico sejam provocados pela extração e pelo processamento desmedidos de recursos naturais, segundo o relatório Construindo sociedades resilientes após a pandemia da Covid-19 (IPCC, 2022IPCC – INTERGOVERNMENTAL PANEL ON CLIMATE CHANGE. Climate change 2022: mitigation of climate change – summary for policymakers. Geneva: IPCC, 2022. Disponível em: https://www.ipcc.ch/report/ar6/wg3/downloads/report/IPCC_AR6_WGIII_SPM.pdf. Acesso em: 5 jun. 2022.
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).

Enfim, esse cenário trágico indica que são os ricos que mais poluem e tornam inalcançável o cumprimento da meta de Paris e dos ODS. Aliás, são eles, ou melhor, suas multinacionais, que, segundo Bauman, ditam padrões de hiperconsumo à sociedade global.

Obviamente que a desigualdade social não se apresenta apenas “nas pegadas”. Ela decorre de um abismo estrutural na distribuição de renda no planeta. O relatório da Oxfam A desigualdade mata (AHMED, 2022AHMED, N. et al. A desigualdade mata: a incomparável ação necessária para combater a desigualdade sem precedentes decorrente da Covid-19. Oxford: Oxfam, 2022. Disponível em: https://www.oxfam.org.br/justica-social-e-economica/forum-economico-de-davos/a-desigualdade-mata/. Acesso em: 21 jun. 2022.
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) aponta que as 10 pessoas mais ricas do mundo aumentaram suas fortunas de US $700 bilhões para US $1,5 trilhão, a uma taxa de US $15 mil por segundo ou US $1,5 bilhão por dia, durante os dois primeiros anos da pandemia de Covid-19. Em compensação, a renda de 99% da humanidade caiu e mais de 160 milhões de pessoas ingressaram na pobreza. Segundo a pesquisa, essa desigualdade contribui para a morte de 21 mil pessoas por dia ou quatro pessoas por segundo, se levados em conta fatores como falta de acesso à saúde pública, violência de gênero, fome e crise climática.

Assim, há um sistema injusto que se retroalimenta, cujas interconexões precisam ser urgentemente alteradas. É esse recorte de realidade que justifica, aliás, sustentar que o consumo sustentável é um direito e um dever15 15 Em regra, ao direito corresponde a outra face do dever e, tratando-se de bens difusos, como os de terceira geração, todos são, a um só tempo, titulares de direitos e devedores. As pessoas jurídicas, aliás, têm um dever especial na proteção do meio ambiente; devem garantir a sustentabilidade da produção e do consumo, seja porque exploram recursos naturais (empresas), seja porque governam tais recursos (Estados-nacionais e Organizações Internacionais integradas por Estados-membros). humano de solidariedade em construção, na perspectiva de que desafios significativos no plano de sua efetividade ainda persistem.

E esses desafios exigem refletir, entre outros temas, sobre o papel da governança global, sobre o papel da economia e sobre o papel da sociedade e do próprio ser humano.

Com relação à governança global, apesar do forte apelo sintetizado na declaração da sociedade civil (RESTAURAR…, [s.d.]RESTAURAR a nossa casa comum: Declaração para Estocolmo+50. Stockholm Declaration. Disponível em: https://stockholmdeclaration.org/wp-content/uploads/2022/12/Stockholm-Declaration_PT.pdf. Acesso em: 24 abr. 2023.
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), não foi agora na Estocolmo+50, realizada na Suécia, em junho de 2022, que se obteve um instrumento jurídico internacionalmente vinculante, embora discursos daí resultantes exortem “para a necessidade urgente de ações ousadas e deliberadas, bem como uma vontade política clara para […] fortalecer o sistema multilateral, aumentar a ambição e a solidariedade” (UNEP, 2022UNEP – UNEP ENVIRONMENTAL PROGRAMME. Presidents´ Final Remarks to Plenary: key recommendations for accelerating action towards a healthy planet for the prosperity of all. New York: UNEP, 2022. Disponível em: https://wedocs.unep.org/bitstream/handle/20.500.11822/40110/Key%20Messages%20and%20Recommendations%20-%20Formatted.pdf?sequence=1&isAllowed=y. Acesso em: 25 jun. 2022.
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).

Logo, o processo histórico de luta por uma completa solidariedade perdura. Algumas propostas já defendiam um sistema internacional forte, como o Anteprojeto de Pacto Global para o Meio Ambiente elaborado em 2017, e Os Princípios de Haia de 2018 para uma Declaração Universal sobre Responsabilidades pelos Direitos Humanos e Tutela da Terra.

Ano passado, o Secretário-Geral da ONU, no relatório Nossa Agenda Comum (UN, 2021UN – UNITED NATIONS. Our common agenda. New York: UN, 2021. Disponível em: https://www.un.org/en/common-agenda. Acesso em: 24 abr. 2023.
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), prometeu pedir “a um Conselho Consultivo de Alto Nível, liderado por ex-Chefes de Estado e de Governo, que identifique bens públicos globais e outras áreas de interesse comum onde as melhorias de governança são mais necessárias”. Tal conselho foi criado em 2022 e apresentará subsídios para a Cúpula do Futuro a ser realizada já em 2023.

Espera-se que um novo modelo de governança global, com um outro multilateralismo e uma solidariedade completa ou real, possam advir desse trabalho. O mundo contemporâneo, desregulado, veloz, complexo e multifacetado, exige repensar a governança dos bens da Terra. Os danos sociais e ecológicos criados pelo sistema atual requerem um novo desenho de democracia, de soberania e de proteção dos direitos humanos. Um modelo cosmopolita e sem precedentes na história, que seja forte, mas, ao mesmo tempo, saiba coordenar ações em vários domínios de políticas, produzindo sinergia.

Um exemplo pode bem ilustrar a importância do que se fala.

Segundo o IPCC, as tecnologias digitais (internet das coisas, robótica e inteligência artificial) podem ajudar na mitigação das mudanças climáticas, mas seus ganhos serão anulados se a demanda por bens e serviços crescer em razão do uso de dispositivos digitais. É que, ao elevar o consumo, haveria aumento do lixo eletrônico. Ademais, o emprego de tais tecnologias poderia repercutir gravemente no mercado de trabalho e na separação digital já instalada na sociedade. Então, as tecnologias digitais, para descarbonizar a atmosfera, precisam ser governadas adequadamente, a fim de se inibirem ou diminuírem os efeitos colaterais de seu uso. Um regime justo de transição que garanta o emprego deve ser criado no curso da mudança estrutural da economia de alto para baixo carbono, pois “caminhos de mitigação ambiciosos implicam mudanças grandes e às vezes disruptivas na estrutura econômica, com consequências distributivas significativas, dentro e entre países” [IPCC (2022IPCC – INTERGOVERNMENTAL PANEL ON CLIMATE CHANGE. Climate change 2022: mitigation of climate change – summary for policymakers. Geneva: IPCC, 2022. Disponível em: https://www.ipcc.ch/report/ar6/wg3/downloads/report/IPCC_AR6_WGIII_SPM.pdf. Acesso em: 5 jun. 2022.
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), p. 15; 47].

Por consequência, é imprescindível uma mudança de rota, devidamente controlada, a fim de assegurar o bem-viver das atuais e das futuras gerações e de garantir a equidade na distribuição dos recursos e o equilíbrio do planeta Terra. Direitos humanos como a vida, a saúde, a integridade física e moral, a alimentação decorrem desse compromisso instrumental.

O interessante é que o IPCC (2022, p. 46IPCC – INTERGOVERNMENTAL PANEL ON CLIMATE CHANGE. Climate change 2022: mitigation of climate change – summary for policymakers. Geneva: IPCC, 2022. Disponível em: https://www.ipcc.ch/report/ar6/wg3/downloads/report/IPCC_AR6_WGIII_SPM.pdf. Acesso em: 5 jun. 2022.
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) alerta que, “mesmo que amplos esforços globais de mitigação sejam implementados, haverá uma grande necessidade de recursos financeiros, técnicos e humanos para adaptação”, com vistas a alcançar a justiça climática. Nesse contexto, parece evidente que a futura governança da Terra terá de considerar que os maiores protagonistas na emissão de poluentes e na obtenção de lucros no mercado internacional devam contribuir em maior extensão para essa grandiosa tarefa.

Assim, embora a Agenda 2030 seja ampla e estimule a implementação de ODS em nível local, permanecem questões técnicas e complexas a exigir uma abordagem forte de governança em escala global, a fim de suprir lacunas em assuntos que os Estados têm fragilidade ou incapacidade de tratar, como ocorre com a questão da responsabilidade climática. Essas pressões sistêmicas geram riscos de inação da Agenda 2030 no âmbito interno (DENNY; CASTRO; MAXIAO YAN, 2017DENNY, D. M. T.; CASTRO, D.; MAXIAO YAN, E. Agenda 2030 measurements and finance: interaction of International Investment Law and sustainability. Veredas do Direito, Belo Horizonte, v. 14, n. 30, p. 53-76, set./dez. 2017. Disponível em: http://revista.domhelder.edu.br/index.php/veredas/issue/view/44. Acesso em: 23 abr. 2023.
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).

Ademais, é de relevo destacar que, a partir de uma mudança discursiva, trabalhos crescentes têm focado em considerações de justiça para gerir os impactos humanos causados ao Sistema Terrestre (RAWORTH, 2019RAWORTH, K. Economia donut: uma alternativa ao crescimento a qualquer custo. Rio de Janeiro: Companhia das Letras, 2019.). Imbuídos desse propósito, em 2023, um grupo de cientistas naturais e sociais assumiu o desafio de abordar as fronteiras planetárias em conjunto com questões sensíveis como a do acesso básico e universal a alimentos, água, energia e infraestrutura. A intenção foi a de abrir o debate sobre quais seriam os limites justos de carga humana para cada processo autorregulador da Terra, a par dos limites seguros já estipulados pelas ciências naturais (GUPTA, 2023GUPTA, J. et al. Earth system justice needed to identify and live within Earth system boundaries. Nature Sustainability, 2023. Disponível em: https://www.nature.com/articles/s41893-023-01064-1. Acesso em: 8 maio 2023.
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).

Discutir acesso universal mínimo a alimentos, água, energia e infraestrutura (moradia e transporte) envolve questões de equidade na distribuição dos recursos naturais do planeta, o que também sugere uma abordagem jurídica vinculante em escala global.

Mas, ao lado de uma governança global forte, é preciso conscientizar a sociedade e o ser humano de seu papel transformador. As crises ecológica e social podem receber forte auxílio se revisitados os hábitos de vida e a compreensão que as pessoas têm da natureza. A alteração dos padrões de consumo, especialmente dos mais ricos, pode interferir nas emissões de gases do efeito estufa, gerando redução de 40% a 70% até 2050 (IPCC, 2022IPCC – INTERGOVERNMENTAL PANEL ON CLIMATE CHANGE. Climate change 2022: mitigation of climate change – summary for policymakers. Geneva: IPCC, 2022. Disponível em: https://www.ipcc.ch/report/ar6/wg3/downloads/report/IPCC_AR6_WGIII_SPM.pdf. Acesso em: 5 jun. 2022.
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). Hábitos como caminhar e andar de bicicleta, evitar voos de longa distância e usar energia de maneira mais eficiente nas construções são exemplos de medidas de mitigação. Mas não se pode, enfim, descurar do maior poder que a sociedade dispõe (que independe de ciência e tecnologia), que é o de reduzir os níveis do consumo, adequando-os ao que é necessário para bem-viver.

A difusão da economia solidária também pode reduzir o déficit de solidariedade da sociedade pós-moderna. Estruturada em resposta a carências que o sistema capitalista neoliberal tem dificuldade de resolver, em especial o alto índice de desemprego e a pobreza, a economia solidária propõe alternativas de geração de trabalho e renda aos excluídos (SINGER, 2001SINGER, P. Economia solidária versus economia capitalista. Sociedade e Estado, Brasília, DF, v. 16, p. 100-112, 2001.). Ela introduz uma dimensão ética às relações de consumo, comércio, produção, serviços, finanças e tecnologia, priorizando a cooperação, a autogestão, o bem-estar humano, a equidade de gênero e o equilíbrio dos ecossistemas, entre outros valores (MANCE, 2005MANCE, E. A. A revolução das redes de colaboração solidária. In: ENCONTRO INTERNACIONAL DE ECONOMIAS SALESIANAS, 2005, Sevilha. Disponível em: http://www.solidarius.net/mance/biblioteca/A_Revolucao_das_Redes_de_Colaboracao_Solidaria.pdf. Acesso em: 20 abr. 2023.
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).

Organizada em redes colaborativas, a economia solidária baseia-se em autogestão, não admite a exploração do trabalho e a dominação de mercado, além de exigir a preservação dos ecossistemas e o compartilhamento de excedentes em fundos solidários. Grupos de produção comunitária, cooperativas e associações de produção; autogestão de empresas pelos trabalhadores; sistemas locais de intercâmbio, organizações de certificação e etiquetagem; financiamento solidário; consumo crítico e solidário e grupos de aquisição solidária; economia de comunhão; e difusão de softwares livres e tecnologias livres e sustentáveis são alguns exemplos de práticas de economia solidária que podem indicar um novo caminho traçado para respeitar a dignidade humana e o equilíbrio dinâmico do planeta (MANCE, 2005MANCE, E. A. A revolução das redes de colaboração solidária. In: ENCONTRO INTERNACIONAL DE ECONOMIAS SALESIANAS, 2005, Sevilha. Disponível em: http://www.solidarius.net/mance/biblioteca/A_Revolucao_das_Redes_de_Colaboracao_Solidaria.pdf. Acesso em: 20 abr. 2023.
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).

Conclusão

Implementar amplamente o consumo sustentável ainda é um grande desafio que, entre outros temas conexos, exige repensar a sociedade pós-moderna, a governança global dos bens da Terra e as práticas econômicas.

Consumir de modo sustentável pressupõe o respeito ao direito das atuais e das futuras gerações de terem suas necessidades básicas atendidas, o que inclui o direito a um meio ambiente equilibrado.

Acontece que a sociedade pós-moderna estimula o hiperconsumo. Ela surge na década de 1970, induzida por mudanças político-econômicas que transformam os processos de trabalho, mercado, produção e padrão de consumo. Tudo passa a ser mais móvel e mais flexível. O Estado, a seu turno, exercendo menos influência na economia e nas relações sociais, permite um grande acúmulo de capital pelas corporações transnacionais.

Para sustentar a nova dinâmica, de alcance global, criam-se, então, narrativas e necessidades que tornam o ser humano mais individualista e geram um déficit de solidariedade a alimentar situações estruturais de desigualdade social, como desemprego, pobreza e fome.

É também por volta do surgimento da sociedade pós-moderna que se amplia a consciência ambiental no mundo, em resposta ao crescimento da atividade industrial que, sem controle, já polui o ar e a água e causa desastres. Logo estudiosos começam a advertir que as atividades humanas requerem limites e o ideal do desenvolvimento sustentável passa a ser defendido.

Desde 1972, a ONU tem conduzido atividades com vistas a avançar na proteção do meio ambiente e da sustentabilidade. Em cinco décadas de luta, muitas conquistas ocorreram, sobretudo a incorporação do meio ambiente equilibrado no direito interno de centenas de países, mas muitos desafios ainda estão pendentes. Embora a atual Agenda 2030 preveja 17 ODS e 169 metas, abrangendo uma multiplicidade de assuntos, ela ainda é um instrumento não vinculante.

Os dados atuais que medem a degradação do planeta alertam que a humanidade já transgrediu seis das nove fronteiras planetárias, o que afeta a capacidade de resiliência do Sistema Terrestre. Os dados também indicam que as emissões antropogênicas de CO², que causam o aquecimento global, originam-se, em grande parte, dos mais ricos, que são os que têm também um padrão maior de consumo. E, para além dessa geografia de desigualdade ecológica, os dados ainda apontam uma geografia de desigualdade social, dado o abismo estrutural na distribuição de renda do planeta, que foi amplificado pela pandemia de Covid-19.

Esse cenário indica a existência de um sistema injusto que se retroalimenta, cujas interconexões urgem ser alteradas. Para tanto, um primeiro e importante passo é a celebração de um tratado internacional para gerir os ecossistemas, bens comuns da humanidade. Mas, apesar da pressão crescente da sociedade civil e de organizações internacionais, isso ainda é uma grande luta. A Estocolmo+50, em 2022, não logrou êxito em fortalecer a governança global nesse sentido.

Outro passo importante é revisitar o hiperconsumo da sociedade pós-moderna, a partir da compreensão das implicações que cada ato de consumo traz para o equilíbrio do planeta. Além de cultivar hábitos mais sustentáveis, é preciso igualmente reduzir os níveis de consumo, adequando-os ao necessário para bem-viver.

Por fim, outro caminho relevante é a maior difusão das práticas de economia solidária, que articula soluções de trabalho e renda para as pessoas excluídas do sistema econômico atual, priorizando a cooperação, a autogestão, o bem-estar humano e o uso sustentável dos recursos da natureza.

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    » https://wedocs.unep.org/bitstream/handle/20.500.11822/32287/COVIDIRPPT.pdf?sequence=3&isAllowed=y
  • UNEP – UNEP ENVIRONMENTAL PROGRAMME. Presidents´ Final Remarks to Plenary: key recommendations for accelerating action towards a healthy planet for the prosperity of all. New York: UNEP, 2022. Disponível em: https://wedocs.unep.org/bitstream/handle/20.500.11822/40110/Key%20Messages%20and%20Recommendations%20-%20Formatted.pdf?sequence=1&isAllowed=y Acesso em: 25 jun. 2022.
    » https://wedocs.unep.org/bitstream/handle/20.500.11822/40110/Key%20Messages%20and%20Recommendations%20-%20Formatted.pdf?sequence=1&isAllowed=y
  • WANG-ERLANDSSON, L. et al. A planetary boundary for green water. Nature Reviews Earth & Environment, v. 3, n. 6, p. 380-392, 2022.
  • WWF – WORLD WILDLIFE FUND FOR NATURE. Solucionar a poluição plástica: transparência e responsabilização. Gland: WWF, 2019.Disponível em: https://www.wwf.org.br/?70222/Brasil-e-o-4-pais-do-mundo-que-mais-gera-lixo-plastico Acesso em: 5 jun. 2022.
    » https://www.wwf.org.br/?70222/Brasil-e-o-4-pais-do-mundo-que-mais-gera-lixo-plastico
  • WWF – WORLD WILDLIFE FUND FOR NATURE. Impacts of plastic pollution in the oceans on marine species, biodiversity and ecosystems. Gland: WWF, 2022. Disponível em: https://wwfbr.awsassets.panda.org/downloads/wwf_impacts_of_plastic_pollution_on_biodiveristy_.pdf Acesso em: 5 jun. 2022.
    » https://wwfbr.awsassets.panda.org/downloads/wwf_impacts_of_plastic_pollution_on_biodiveristy_.pdf
  • THE NATIONAL FOOTPRINT and biocapacity accounts launch event (part 1), 2022. 1 vídeo (19min45s). Publicado pelo canal Ecological Footprint Iniciative. Disponível em: https://www.youtube.com/watch?v=IG-vFrcP8pc&t=863s Acesso em: 21 jun. 2022.
    » https://www.youtube.com/watch?v=IG-vFrcP8pc&t=863s
  • Como citar este artigo (ABNT):
    CAMPELLO, L. G. B.; TRINDADE, J. R. O. Sociedade pós-moderna, consumo sustentável e Organização das Nações Unidas: a busca incompleta por solidariedade. Veredas do Direito, Belo Horizonte, v. 20, e202445, 2023. Disponível em: http://www.domhelder.edu.br/revista/index.php/veredas/article/view/2445. Acesso em: dia mês. ano.
  • 1
    As gerações dos direitos humanos foram tratadas por Vasak, em aula proferida em 1979 em Estrasburgo. O tema veio a ser abordado por Bobbio, na obra A era dos direitos, quando se tornou amplamente conhecido. Alguns preferem (CANOTILHO, 2000, p. 380-381CANOTILHO, J. J. G. Direito Constitucional e Teoria da Constituição. 4. ed. Coimbra: Almedina, 2000.) o uso do termo dimensão, no lugar da palavra geração, que sugere a ideia de troca do velho pelo novo, quando o que ocorre é um processo de coexistência e complementação.
  • 2
    O evento implicou, a partir de 1950, a morte de peixes, o adoecimento de milhares de pessoas e centenas de óbitos pela contaminação por metilmercúrio. Em 2013, celebrou-se a Convenção de Minamata sobre Mercúrio, que foi promulgada no Brasil pelo Decreto Legislativo n. 9.470, de 14 de agosto de 2018.
  • 3
    Assumindo perspectiva já defendida por Thomas Malthus, na obra Um ensaio sobre o princípio da população, publicada em Londres no ano de 1798.
  • 4
    Induzidos ou alterados pela presença e pela atividade do ser humano.
  • 5
    Vale anotar que, em 1970, o cientista e economista romeno Nicholas Georgescu-Roegen já desenvolvia a questão da ecologia no seio da economia, conforme lembra Serge Latouche, em seu livro Pequeno Tratado do Decrescimento Sereno. A obra de Nicholas é chamada A Lei da Entropia e o Processo Econômico.
  • 6
    Igualmente contrária à economia tradicional, uma proposta que busca conciliar a economia política e a economia ecológica vem a ser desenvolvida por Leff (2015) em meados da década de 1990. Para o mexicano, o movimento ambiental e as lutas sociais em busca de melhores qualidade de vida e condições sustentáveis provocam uma nova dinâmica que pode ser chamada de reapropriação social da natureza, a qual se preocupa com a distribuição ecológica, com a justiça ambiental e com a autonomia cultural, isto é, aprofunda-se em questões de equidade.
  • 7
    Para mais informações sobre normas de soft law, confira-se Campello e Reis (2018CAMPELLO, L. G. B; REIS, J. H. S. Razões para a utilização das normas de soft law no Direito Internacional do Meio Ambiente. Revista Brasileira de Direito Internacional, Salvador, v. 4, n. 1, 2018, p. 83-103.).
  • 8
    Dela resultou o estabelecimento de ministérios ambientais e agências em mais de 100 países e o início do crescimento explosivo do número de organizações não governamentais (ONGs) dedicadas à proteção ambiental e questões pertinentes (LENS; NATH, 2003, p. 11HENS, L.; NATH, B. The Johannesburg Conference. Environment, Development and Sustainability, v. 5, n. 1, p. 7-39, 2003.).
  • 9
    Note-se que a palavra “Desenvolvimento” agora é inserida no nome da Conferência, o que reflete a afirmação de um processo histórico coroado com o Relatório Brundtland de 1987 e com a Declaração sobre o Direito ao Desenvolvimento da ONU (Res. 41/128).
  • 10
    Em 1987, a Comissão Mundial das Nações Unidas sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento solicitou a criação de uma carta contendo os princípios fundamentais para o desenvolvimento sustentável. A elaboração da Carta da Terra foi um dos assuntos inacabados da Cúpula da Terra do Rio 1992. Em 1994, Maurice Strong, secretário geral da Cúpula da Terra e presidente do Conselho da Terra, e Mikhail Gorbachev, presidente da Cruz Verde Internacional, lançaram uma nova iniciativa da Carta da Terra com o apoio do governo dos Estados Unidos. A Comissão da Carta da Terra foi formada em 1997 para supervisionar o projeto. Após anos de consulta e elaboração, a Carta da Terra é lançada em junho de 2000.
  • 11
    “Até 2030, garantir que as pessoas, em todos os lugares, tenham informação relevante e conscientização para o desenvolvimento sustentável e estilos de vida em harmonia com a natureza”.
  • 12
    “Garantir a tomada de decisão responsiva, inclusiva, participativa e representativa em todos os níveis”.
  • 13
    O IPCC é o órgão da ONU que avalia a ciência relacionada às mudanças climáticas, reunindo especialistas de todo o mundo.
  • 14
    É preciso obrigar, em todos os níveis, à melhoria de gestão desse resíduo, com a criação e a implementação de métodos de reuso e reciclagem, além da redução da produção e do consumo a limites aceitáveis. Os custos operacionais da reciclagem do plástico são altos e têm tornado a atividade economicamente inviável. Daí a necessidade de tratamento normativo adequado, mesmo porque o excesso desse material, sem forte regulamentação e fiscalização, também induz ao risco de incineração, produzindo mais poluição (WWF, 2019WWF – WORLD WILDLIFE FUND FOR NATURE. Solucionar a poluição plástica: transparência e responsabilização. Gland: WWF, 2019.Disponível em: https://www.wwf.org.br/?70222/Brasil-e-o-4-pais-do-mundo-que-mais-gera-lixo-plastico. Acesso em: 5 jun. 2022.
    https://www.wwf.org.br/?70222/Brasil-e-o...
    ).
  • 15
    Em regra, ao direito corresponde a outra face do dever e, tratando-se de bens difusos, como os de terceira geração, todos são, a um só tempo, titulares de direitos e devedores. As pessoas jurídicas, aliás, têm um dever especial na proteção do meio ambiente; devem garantir a sustentabilidade da produção e do consumo, seja porque exploram recursos naturais (empresas), seja porque governam tais recursos (Estados-nacionais e Organizações Internacionais integradas por Estados-membros).

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    04 Set 2023
  • Data do Fascículo
    2023

Histórico

  • Recebido
    28 Set 2022
  • Aceito
    08 Maio 2023
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