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Além do Joá: infraestruturas e expansão urbana em direção à Barra da Tijuca

Resumo

Nas décadas de 1960 e 1970, a cidade do Rio de Janeiro expandia-se rumo ao recém-projetado bairro da Barra da Tijuca. A grande obra do complexo infraestrutural do Elevado do Joá colocou-se como elemento-chave dessa expansão, conectando a Zona Sul à Zona Oeste da cidade. O objetivo deste artigo é analisar como essa grande obra serviu de base não apenas para a construção material da expansão do mercado imobiliário, mas também para a construção de imaginários sociais e de novas formas urbanas. Através de matérias de jornal da época de sua construção, associamos a obra do Joá ao novo modelo de vida urbana que se construía no bairro modernista da Barra da Tijuca.

Joá; Barra da Tijuca; infraestruturas; expansão urbana

Abstract

During the 1960s and 1970s, the city of Rio de Janeiro was expanding towards the recently projected neighborhood of Barra da Tijuca. The massive construction of Elevado do Joá’s infrastructural complex emerged as a key element of that expansion, connecting the South and the West zones of the city. This article aims to analyze how this construction served as a foundation not only for the expansion of the real estate market, but also for the creation of social imaginaries and new urban forms. Through newspaper articles from that time, I associate Joá’s construction with a new model of urban life that was rising in the modernist neighborhood of Barra da Tijuca.

Joá; Barra da Tijuca; infrastructures; urban expansion

Introdução: rumo ao futuro

Rumo ao futuro: o turista não deve se deter apenas em Copacabana. O Rio continua crescendo em direção ao mar [...] Quem quiser tomar um banho de mar tranquilo, sem se sentir sufocado pela multidão de banhistas e pelos edifícios ao fundo, procura logo a Barra da Tijuca. (Jornal do Brasil, 8/1/1970, p. 8)

O Elevado do Joá, complexo infraestrutural que liga a Zona Sul com a Zona Oeste da cidade do Rio de Janeiro, destaca-se na paisagem carioca, espremido entre o Oceano Atlântico e o Maciço da Tijuca. Na época de sua construção, a obra mais cara do governo de Negrão de Lima (1965-1971) e alvo de inúmeras críticas, acidentes e atrasos, foi considerado algo inédito pelas dificuldades impostas pelas condições geológicas do terreno. Um de seus túneis, inclusive, foi considerado o segundo do gênero na época, ao lado apenas do Túnel de Yerba Buena, em San Francisco, Estados Unidos. Hoje, o elevado de dois andares conta com quatro túneis e um viaduto central de 1,25 quilômetro, sustentados por 32 pares de colunas de concreto sob as quais 6 faixas para automóveis e uma ciclovia se estabelecem. Foi por esse grandioso e árduo caminho que passaram não só os carros e caminhões, mas também as promessas, as infraestruturas e a expansão da malha urbana carioca.

A matéria intitulada “Roteiro do Rio (em construção) para os turistas” do dia 8 de janeiro de 1970, no Jornal do Brasil, aponta para o caminho para o “futuro”. Um futuro específico, particular de uma parte da expansão da cidade voltada às camadas com maior poder aquisitivo, que almejavam projetos de vida de distinção e privilégio. Em nome de uma expansão “em direção ao mar”, a cidade do Rio de Janeiro e seu desenvolvimento urbano produziram diversas camadas de promessas, materializadas em obras e lançamentos imobiliários, diferenciando um recorte da cidade em que a atenção pública e a oferta de infraestruturas urbanas possibilitariam uma vida simultaneamente cosmopolita e tranquila, de prestígio.1 1 “Tranquila” e “prestígio” são trazidos aqui como termos nativos da propaganda de empreendimentos que surgiram a partir da década de 1970.

A obra do Elevado do Joá representa essa construção de promessas que se amparam em infraestruturas para criar possibilidades de vida de prestígio. A matéria citada acima, anteriormente à sua inauguração, já aponta para o “futuro” que seria possibilitado àqueles que buscavam tranquilidade.2 2 Para uma discussão mais aprofundada da categoria tranquilidade na Zona Oeste carioca, ver Araujo e Cortado (2020). Ao lado da matéria, uma crônica do poeta Carlos Drummond de Andrade exalta o verão carioca, tradicional da rica Zona Sul e que “irrompeu na Barra da Tijuca” (Jornal do Brasil, 8/1/1970, 1º Caderno, p. 8). Em sua totalidade, a página de início de ano do Jornal do Brasil constrói projetos e anseios de uma continuação da expansão do Rio de Janeiro da orla, ainda desamparados por infraestruturas urbanas que os fizessem possíveis. As estradas que levariam a esse “futuro” da Barra da Tijuca seriam “estreitas, tortuosas e perigosas”. A construção do grandioso complexo infraestrutural do Joá, em suas pontes, túneis e viadutos que percorrem 3 quilômetros, apareceria como a solução para esse problema, para esses anseios desamparados. “No final de 1971, porém, o drama estará terminado”, aponta a matéria. “Três túneis, um free way e uma ponte ligarão a Zona Sul à Barra da Tijuca, em 10 minutos”. Mais uma vez, o túnel abrindo caminho para a expansão da cidade em direção ao mar. Mais um passo da expansão, abrindo caminho para novas promessas. Ao conectar a Barra à Zona Sul, o Elevado do Joá permite o fluxo não só de carros e pessoas, mas de empreendimentos, imaginários e tantas outras infraestruturas que ligam a nova região à malha urbana carioca.

Este ensaio tem como objetivo mobilizar uma perspectiva das infraestruturas enquanto composição de agentes humanos e não humanos e enquanto um “novo campo óptico através do qual podemos examinar as dimensões vividas da sociedade urbana” (Chattopadyay, 2012 apud Addie, Glass e Nelles, 2020ADDIE, J.-P.; GLASS, M. e NELLES, J. (2020). Regionalizing the infrastructure turn: a research agenda. Regional Studies, Regional Science, v. 7, n. 1, pp. 10-26., p. 11; tradução nossa),3 3 “new optical field through which we can examine the lived dimensions of urban society”. sobre o Elevado do Joá para pensar a construção de novas possibilidades de vida e de transformações na “cartografia física e simbólica do Rio” (O’Donnell, 2013O’DONNELL, J. (2013). A invenção de Copacabana: culturas urbanas e estilos de vida no Rio de Janeiro (1890-1940). Rio de Janeiro, Zahar., p. 23). Na história da expansão urbana da cidade do Rio de Janeiro, essas grandes infraestruturas de túneis que, a partir desse olhar infraestrutural, possuem papel de destaque por permitirem fluxos diversos, dos mais abstratos e invisíveis aos mais banais e aparentes, foram imprescindíveis. Desde a abertura dos caminhos para Copacabana, em 1892, até a construções dos túneis do Joá e do Pepino, ligando a Zona Sul da cidade ao novo bairro modernista da Barra da Tijuca, em 1971, a cidade foi se estendendo junto à orla do mar por meio das grandiosas obras que perfuravam os maciços. A partir do Elevado do Joá – oficialmente conhecido como Elevado das Bandeiras –, procuramos investigar o papel dessa infraestrutura nas promessas que se construíam no bairro da Barra da Tijuca nas décadas de 1960 e 1970. Em outras palavras, procuramos investigar o entrelaçamento entre a construção de infraestrutura e a construção de promessas como motor da expansão urbana.

Para tanto, fazemos um breve retorno ao papel dos túneis na história da expansão para a Zona Sul carioca, seguido de uma investigação mais aprofundada da construção e inauguração do Elevado do Joá. A partir desses casos, cuja principal fonte são notícias de jornais da época, voltamos para a discussão teórica sobre as infraestruturas urbanas e o papel de um olhar sociológico e antropológico sobre elas, buscando colocar os túneis como objetos centrais para a discussão, especialmente no caso do Rio de Janeiro. Enquanto símbolos da técnica e do progresso, essas materialidades de tijolos, cimento, pedras e aço se misturam com montanhas, mar e árvores, tanto física quanto simbolicamente, construindo uma paisagem dual. São as infraestruturas que abrem caminho para uma vida bucólica. É a promessa de vida bucólica que sustenta a construção de grandes obras. É a promessa de integração com a cidade que faz viáveis as promessas de vida isoladas da cidade. Enquanto símbolos máximos da modernidade, da ação do homem sobre a natureza, essas composições de concreto, fios e tijolos que furam montanhas e florestas beirando o oceano contraditoriamente são imprescindíveis para as possibilidades de uma vida na natureza, alternativa ao caos das cidades.

Abrindo caminho para o mar: os túneis na construção da expansão urbana dos ricos

A abertura de túneis é uma prática que teve protagonismo nos processos de expansão da malha urbana da cidade do Rio de Janeiro desde o final do século XIX, pelo menos no que tange a um dos sentidos dessa expansão. Assim como ela abriu o “caminho do mar” que colocou Copacabana como principal promessa de futuro para a vida das classes altas (O’Donnel, 2013), com o túnel Real Grandeza (atualmente conhecido como Túnel Velho) de 1892 e com o túnel Carioca (atualmente conhecido como Túnel Novo) em 1906, a abertura de túneis foi também essencial para a continuação da expansão que seguiu a orla do mar. Em 1971, dois importantes túneis foram inaugurados no Rio de Janeiro: o túnel Dois Irmãos (atualmente túnel Zuzu Angel), que ligava a Gávea ao bairro de São Conrado; e o túnel do Joá que, junto aos 3 quilômetros do elevado homônimo, ligava São Conrado à Barra da Tijuca. Com isso – passando também pelo túnel Sá Freire Alvim, de 1960, que ligava Copacabana a Ipanema –, o estado da Guanabara direcionava o principal caminho de sua expansão, de Copacabana percorrendo a orla marítima em direção ao Oeste. Por meio das montanhas que atravessam o Rio de Janeiro, construíram-se caminhos para integrar novas áreas à malha urbana da cidade, possibilitando expansões – do mercado imobiliário, das camadas médias e altas, da construção civil, assim como de estilos de vida e promessas de futuro.

O bairro de Copacabana, hoje principal cartão-postal da cidade, é um conhecido exemplo de uma rápida urbanização e chegada de infraestrutura a uma área até então “não urbanizada”. A título de ilustração, entre 1920 e 1970, enquanto a cidade cresceu 240%, o bairro cresceu 1.500% (Velho, 1973VELHO, G. (1973). A utopia urbana: um estudo de antropologia social. Rio de Janeiro, Zahar.). Copacabana, então, apresenta-se como um caso importante para pensar a construção do Elevado do Joá por alguns motivos: primeiro, as condições e promessas sobre as quais a ocupação inicial do bairro se deu mantêm um paralelo com as condições da expansão para a Barra da Tijuca, o que Balthazar (2020BALTHAZAR, A. C. (2020). O tempo da Barra da Tijuca: Concepções de passado, presente e futuro na narrativa midiática sobre o bairro. Dilemas – Revista de Estudos de Conflito e Controle Social, v. 13, n. 1, pp. 77-94., p. 92) classificou como retrato de uma “ordem temporal de sucessivas repetições”; segundo, as consequências dessa onda de urbanização se mostraram ser um dos principais motores para a expansão para a Barra da Tijuca, produzindo um determinado “caos urbano”, cuja alternativa precisaria de novos territórios para se concretizar; terceiro, o bairro apresenta um determinado “cacife” (O’Donnell, 2013O’DONNELL, J. (2013). A invenção de Copacabana: culturas urbanas e estilos de vida no Rio de Janeiro (1890-1940). Rio de Janeiro, Zahar.), um estilo de vida e status de prestígio, algo que aparenta ser de importância para a construção das promessas atreladas à expansão para a Barra, que busca seguir não apenas a orla como também o prestígio e as culturas urbanas a ela atrelados. Por último, há a hipótese de que exista uma dualidade entre isolamento versus conexão com o restante da cidade, que aparenta ser constitutiva de ambas as experiências, e que muito nos diz sobre a dialética relação entre infraestrutura e natureza que pretendemos aqui endereçar.

Partindo da inauguração do túnel Real Grandeza, O’Donnell (2013O’DONNELL, J. (2013). A invenção de Copacabana: culturas urbanas e estilos de vida no Rio de Janeiro (1890-1940). Rio de Janeiro, Zahar., p. 40) apresenta as principais promessas que se davam em relação ao “novo” bairro. Escritas nos bilhetes do bonde que chegava à estação de Copacabana, quadrinhas exaltavam tanto o aspecto bucólico quanto os ideais de modernidade que, naquela época, atrelavam-se ao valor da insalubridade. “Antídoto à nervosa vida urbana”, “lugar de beleza e contemplação”, são algumas das ideias exaltadas, ao lado de “região privilegiada de investimento” e “lugar do futuro”, nas classificações da autora (ibid.). Velho (1973)VELHO, G. (1973). A utopia urbana: um estudo de antropologia social. Rio de Janeiro, Zahar., analisando a já densamente urbanizada Copacabana, aponta para o seu caráter cosmopolita, de cidade grande, algumas décadas depois. Os túneis pelos quais passaram as quadrinhas, os bondes e as elites para a “vazia” Copacabana, logo passaram a levar eletricidade, asfalto, edifícios, classes médias e baixas. O caminho aberto pelos túneis buscando a orla levou uma complexidade de ideias, temporalidades e materiais. Os fluxos possibilitados por essa infraestrutura são muitos e diversos, são materiais e simbólicos, e alteram-se conforme a cidade por eles passa e se estabelece. O “cacife” de Copacabana, as culturas cosmopolitas e o estilo de vida praiano chegaram à orla pelos túneis, assim como trabalhadores e o mercado imobiliário. Possibilitando o fluxo para um “vazio” e afastado, os túneis também o conectam e o mesmo mercado imobiliário que se vende pela proximidade com a natureza e um retorno a um passado a-histórico (Balthazar, 2020BALTHAZAR, A. C. (2020). O tempo da Barra da Tijuca: Concepções de passado, presente e futuro na narrativa midiática sobre o bairro. Dilemas – Revista de Estudos de Conflito e Controle Social, v. 13, n. 1, pp. 77-94.) constrói um bairro símbolo da presença maciça da técnica, da população e de infraestruturas urbanas.

Em poucas décadas, Copacabana resultou em uma “falha” urbanística, um exemplo de “caos urbano”, que foi alvo de diversas críticas de jornalistas na segunda metade do século XX (Teixeira Alves, 2020TEIXEIRA ALVES, R. (2020). Entre o presente e o passado, o “futuro”: o processo de urbanização da Barra da Tijuca (RJ). Dissertação de mestrado. Rio de Janeiro, Universidade Federal do Rio de Janeiro.). Contudo, o prestígio e o “cacife” não deixaram de se estabelecer. A flexibilização das leis urbanísticas que tinham o intuito de incentivar a ocupação da região, somada à necessidade de mão de obra para suprir os serviços que rapidamente surgiam no bairro, transformou o bucólico areal, em seu “estágio pré-civilizatório” (O’Donnell, 2013O’DONNELL, J. (2013). A invenção de Copacabana: culturas urbanas e estilos de vida no Rio de Janeiro (1890-1940). Rio de Janeiro, Zahar., p. 32), em um bairro amontoado de prédios altos e cercado por favelas. As ruas, que seriam “antídoto à nervosa vida urbana”, rapidamente apresentavam uma densidade de pessoas heterogêneas, carros e poluição. Copacabana transformava-se, de um “pacato bairro à beira-mar, com casas em espaçosos terrenos”, em uma “floresta de cimento armado”, de um “lugar relativamente isolado” a “uma espécie de outro centro da cidade” (Velho, 1973VELHO, G. (1973). A utopia urbana: um estudo de antropologia social. Rio de Janeiro, Zahar., p. 27). O mercado imobiliário, ao esgotar as novas possibilidades de terrenos no bairro, expandiu-se para as áreas adjacentes que também continham o necessário para as promessas de uma vida de prestígio e de um estilo de vida praiano: os bairros de Ipanema e Leblon.

Ao encontrar a praia na busca de um “futuro” para as elites cariocas, a expansão urbana seguiu caminho para o Oeste, beirando o mesmo mar. Os bairros de Ipanema e Leblon, hoje detentores do metro quadrado mais caro do País, também apresentavam as características bucólicas de Copacabana, assim como também experimentaram uma rápida chegada do mercado imobiliário e de infraestruturas urbanas. Essa guinada das classes altas para os bairros recém-construídos da Zona Sul delineou uma separação mais aguda entre os ricos e pobres na cidade (Lago, 2015LAGO, L. C. (2015). Desigualdades e segregação na metrópole: o Rio de Janeiro em tempo de crise. Rio de Janeiro, Letra Capital.). O que Abreu chamou de uma “primeira fase de expansão acelerada da malha urbana” (1987, p. 43) e Lúcio Costa considerou como uma “segunda fase” da ocupação da cidade (Costa, 1969) só foi possível através da construção de túneis. Conforme a ocupação desses bairros ia se estabelecendo, essas infraestruturas serviam não só para o fluxo de materiais e ideias, mas também como um divisor da cidade. O “para cá” dos túneis, o perto do mar, designava um certo “cacife”, tanto que famílias de classes médias e altas trocavam suas amplas casas na Zona Norte por apartamentos menores, mas que lhes traziam um certo status, que as colocariam perto de “onde as coisas aconteciam” (Velho, 1973VELHO, G. (1973). A utopia urbana: um estudo de antropologia social. Rio de Janeiro, Zahar.). Seja a moradora de Copacabana mandando uma outra voltar para o subúrbio, seja os jovens das camadas médias praianas do Leblon chamando os suburbanos de pessoas do “além-túnel” (ibid., 1998, p. 26), a região costeira da cidade diferenciava-se do seu restante, simultaneamente se conectando e se isolando por meio dos túneis que cortavam a separação natural criada pelas montanhas. Também os túneis Santa Bárbara e Rebouças, que ligam a Zona Sul à Zona Central, ilustram essa dualidade. Meses atrás, a mãe de uma mulher grávida fatalmente atingida por um tiro da polícia mencionou, ao vivo na televisão, que há uma diferença entre o valor dado às vidas na Zona Sul e “do Rebouças pra cá”.

Seguindo a cronologia da expansão urbana pela orla marítima, Leblon e Ipanema rapidamente experimentaram o mesmo esgotamento em termos de possibilidades de expansão imobiliária. Da mesma forma que Copacabana, a heterogeneidade, a presença de favelas e o tráfego de automóveis desafiavam a vida tranquila e pacata que atraiu as primeiras famílias da elite. A busca por novas alternativas, tanto por moradores quanto pelo capital imobiliário, já se mostrava presente no final dos anos 1960. O incêndio de uma favela no coração do Leblon e o seu rápido aproveitamento para a construção do primeiro condomínio na Zona Sul carioca exemplificavam essa demanda. A destruição do que restava da favela Praia do Pinto, em 1969, em meio a uma política de remoção massiva de favelas, mostrou o que era tido como problema e aquilo que aparecia como alternativa. Tirar o indesejado não era suficiente, com o fantasma do caos urbano copacabanense batendo à porta. O condomínio, nesse momento ainda não completamente fechado, apresentava a possibilidade de uma nova forma de experimentar a cidade, uma nova maneira de combinar a dualidade isolamento e integração. Contudo, as novas terras necessárias para que os condomínios pudessem se concretizar se encontravam do outro lado de montanhas.

Essa necessidade de combinar a possibilidade de uma vida isolada de determinados aspectos e lugares da cidade com uma integração à sua malha urbana, infraestruturas e serviços, de forma a manter um determinado status, deparou-se com montanhas. Com um plano-piloto do maior urbanista da época em andamento na também “distante” e “vazia” Barra da Tijuca – como era tida Copacabana quase um século antes –, novos túneis eram necessários. As estradas “estreitas, tortuosas e perigosas” mencionadas na reportagem trazida anteriormente possibilitavam a chegada a essas novas áreas, mas não de uma forma que possibilitasse sua integração à malha urbana ou a chegada de infraestruturas. Nesse contexto de necessidade de expansão do mercado imobiliário, somado a um plano urbanístico sofisticado em andamento e a uma demanda por alternativas à já densamente urbanizada Zona Sul carioca, o Elevado do Joá aparece como uma obra de infraestrutura primordial para o projeto de expansão e construção de uma nova possibilidade de vida.

Elevado do Joá: futuro em construção

O Elevado do Joá possui papel central na expansão da malha urbana da cidade em direção à Barra da Tijuca. Um olhar mais atento a essa infraestrutura, então, pode nos ser útil para compreender os diferentes fluxos, tanto materiais quanto simbólicos, que ajudam a construir esse novo bairro modernista e, com ele, uma nova forma de morar na cidade. Aqui analisamos, através de algumas reportagens do Jornal do Brasil, o processo de construção física do Elevado, buscando apontar para a centralidade desse processo na construção simbólica das promessas que se atrelavam a essa nova etapa da expansão balneária da cidade.

“Barra da Tijuca ficará mais perto dos cariocas com a nova Auto-Estrada” (Jornal do Brasil, 7/3/1971, 1º Caderno, p. 34) dizia a manchete de uma reportagem de março de 1971. “A mais importante e mais cara obra realizada durante o Governo Sr. Negrão de Lima”, a autoestrada Lagoa-Barra prometia realizar a integração tão demandada pelo capital imobiliário, da Zona Sul balneária às terras “vazias”, mas planejadas, da Barra da Tijuca. A região já fazia parte do itinerário da cidade há décadas, apresentando poucos estabelecimentos e moradias, podendo ser acessada tanto pelas “tortuosas e perigosas” estradas que circundavam as encostas dos morros, quanto pelo lado de Jacarepaguá, pela parte mais central do território da cidade. O próprio Walt Disney fez uma visita à região em 1940, três décadas antes da construção do elevado. Essa acessibilidade, contudo, não dava conta dos anseios e ideais de progresso e futuro e das infraestruturas que tornariam aquele “sertão carioca” (Corrêa, 1936CORRÊA, A. M. (1936). O sertão carioca. Rio de Janeiro, Imprensa Nacional.) parte integrante da malha urbana da cidade. Com a autoestrada Lagoa-Barra, ou mais especificadamente o trecho do Elevado do Joá, o “acesso rápido, fácil e seguro à Barra da Tijuca” tornar-se-ia, enfim, viável.

Balthazar (2020)BALTHAZAR, A. C. (2020). O tempo da Barra da Tijuca: Concepções de passado, presente e futuro na narrativa midiática sobre o bairro. Dilemas – Revista de Estudos de Conflito e Controle Social, v. 13, n. 1, pp. 77-94. mostrou, a partir de matérias de jornais, como as promessas relacionadas ao bairro da Barra da Tijuca em muito repetiam aquilo que apareceu anteriormente em Copacabana. A exaltação de uma natureza intocada, de uma volta a um passado a-histórico, do estado de natureza rousseauniano contra os malefícios da cidade moderna que criava o centro da cidade como problema e Copacabana como solução, nos anos 1970 traz este último como problema e a Barra como solução. Essas “sucessivas repetições” que marcam o desenvolvimento urbano do Rio de Janeiro funcionam de modo a criar uma demanda e um vazio para que a alternativa seja construída. Contudo, é difícil tratar do caso da Barra como uma série de repetições daquilo que ocorreu quase um século antes. Nesse meio tempo, diversos fenômenos e experiências urbanas transformaram não apenas as demandas e alternativas, como também as noções acerca da cidade. Como buscamos mostrar em outro trabalho, devemos falar mais de uma “ordem processual de sucessivas acumulações” (Agueda, 2021AGUEDA, R. (2021). Do Leblon ao Novo Leblon: experiências de fechamento e o processo de expansão urbana em direção à Barra da Tijuca (RJ). Dissertação de mestrado. Rio de Janeiro, Universidade Federal do Rio de Janeiro., p. 157) que foram construindo os imaginários ao redor dos condomínios e do modo de viver da Barra da Tijuca ao longo de diversas experiências que se desenrolaram nesse processo de expansão.

Repetindo mecanismos do passado para criar alternativas novas, a construção simbólica e material da Barra da Tijuca necessitava de mecanismos mais complexos para se tornar viável. Ao invés do túnel de trilho de bonde que abriu caminho para Copacabana, aqui um colossal complexo infraestrutural é construído. No lugar das flexibilizações de regulamentos de construções para atrair investidores, na Barra um sofisticado plano urbanístico modernista cumpria esse papel. Enquanto o “futuro” em Copacabana se bastava muito mais na natureza, no novo bairro que se erguia, a técnica e as infraestruturas urbanas eram cruciais. Nessa nova etapa do desenvolvimento urbano da cidade, a natureza e a vida “afastada” da cidade só seriam possíveis se essa “cidade” viesse, de alguma maneira, junto. Nessa tentativa de conciliação, entre a técnica e a natureza, entre o cimento da ação do homem nas cidades e o verde intocado do mato, entre a vida da metrópole e um “sentimento antiurbano” (Low, 2001LOW, S. (2001). The edge and the center: gated communities and the discourse of urban fear. American Anthropologist, v. 103, n. 1, pp. 45-58., p. 45), é que o Elevado do Joá se coloca, permitindo o fluxo de pessoas, coisas e ideias para a construção da Barra da Tijuca.

No contexto muito singular de um período de milagre econômico, ditadura militar, ampla oferta de crédito imobiliário e obras infraestruturais grandiosas – vale mencionar a Ponte Rio-Niterói, que, na época em que começou sua obra, 1969, foi considerada a segunda maior ponte do mundo –, não basta olhar o processo de expansão urbana para a Barra da Tijuca como uma simples repetição de mecanismos do passado. Na década de 1970, a inclusão à malha urbana e suas infraestruturas aparecia como algo necessário para as camadas médias e altas que buscavam alternativas de prestígio. A chamada da matéria de janeiro de 1970 contendo os dizeres “Rio (em construção)” (Jornal do Brasil, 8/1/1970, Caderno B, p. 8) já aponta para o papel das obras e da integração da região com a cidade como um todo, mesmo que para vender uma natureza e um certo afastamento da urbanização densa. Assim como Harvey assinala sobre a construção de estradas no Peru, nesse contexto também predominava uma “sensação avassaladora de que as infraestruturas são a atual moeda de investimento em todo o planeta, a promessa de um futuro melhor” (Harvey, 2018HARVEY, P. (2018). “Infrastructures in and out of time: the promise of roads in contemporary Peru”. In: APPEL, H., ANAND, N. e GUPTA, A. (eds.). The Promise of Infrastructure. Durham, Duke University Press., p. 80; tradução nossa).4 4 “overwhelming sense that infrastructures are the current currency of investment across the planet, the go-to promise for a better future”. O “rumo ao futuro” que o Elevado do Joá prometia já se mostrava bem diferente do futuro prometido de Copacabana. Seguindo a proposta da autora, partimos aqui de uma perspectiva que explore “a força da promessa infraestrutural como um alinhamento temporal complexo e instável, enquanto procuramos especificar como a relação entre passado e futuro é articulada em e em torno das práticas de construção de estradas” (ibid., p. 82; tradução nossa).5 5 “the force of infrastructural promise as a complex and unstable temporal alignment, as I look to specify how the relationship between past and future is articulated in and around the practices of road construction”. A diferença é que o Elevado é, além de uma rua, ponte e túnel.

Sendo essa grande obra de concreto que se estende pela face de uma montanha cercada por mata e mar, as promessas atreladas a ela – direta ou indiretamente – dizem respeito a uma nova forma de morar. Aliadas à forma urbana carro-chefe da urbanização da Barra da Tijuca – os grandes condomínios residenciais –, tais promessas conciliavam os contrastantes ideais de sossego e tranquilidade com a oferta da mais moderna e abundante infraestrutura urbana. Morar “longe” do caos da cidade e, ainda sim, estar imerso na sua totalidade de oportunidades e conexões, constituía mais do que apenas novos empreendimentos ou um novo território. A renovação proposta para essa expansão – explícita tanto nas propagandas quanto nos nomes dos primeiros condomínios do bairro, Nova Ipanema e Novo Leblon – carrega uma nova forma de pensar o meio urbano, resultado das experiências passadas nos bairros da Zona Sul. Planejamento com natureza, “vista livre” e largas avenidas sem espaços para pedestres, grandes shopping centers e supermercados dividindo a paisagem dos morros que se estendem ao fundo, são todos retratos dessa conciliação entre a infraestrutura e a natureza, o concreto maciço das vigas estendendo-se sobre uma praia e ao lado de árvores intocadas.

Mas essa tentativa conciliatória teve um preço. Não apenas o preço mais alto entre todas as obras do governo de Negrão de Lima, mas o preço dos atrasos e das vidas de trabalhadores. Uma matéria de agosto de 1970, intitulada “Outro atraso”, traz que “o elevado do Joá deveria estar pronto no dia 2 de julho” (Jornal do Brasil, 16/8/1970, 1º Caderno, p. 31), mas que um novo adiamento fez com que sua conclusão fosse anunciada para dezembro daquele ano, deixando “os motoristas que não quiserem ficar durante quatro ou cinco horas presos num engarrafamento-monstro” apenas com as alternativas pelo Alto da Boa Vista ou Jacarepaguá. Aqui vemos como a infraestrutura viria para acabar com esse “engarrafamento-monstro”, algo que não condizia com as promessas de vida sossegada e tranquila da até então “vazia” Barra da Tijuca. No mês seguinte, outra reportagem adia ainda mais a conclusão, colocando que “Barra-Lagoa será usada em janeiro” (Jornal do Brasil, 23/9/1970, p. 15). Nesse mês, contudo, uma nova notícia afirma que “Auto-estrada da Barra continua sendo sonho” (Jornal do Brasil, 24/1/1971, p. 5) e que “apesar das promessas [...] ainda falta muito para que a auto-estrada fique pronta”. A reportagem segue dizendo que “assim, quem quiser ar puro e praias limpas terá que continuar enfrentando os congestionamentos”. É citado, ainda, como a demora “acabará por prejudicar a imagem da Barra da Tijuca” e que seria impossível concluir a obra ainda no governo de Negrão de Lima, a não ser que fosse inaugurada apenas como uma “liberação, em caráter precário, de alguns trechos”. Cinco dias depois, ainda em janeiro de 1971, uma nova reportagem anuncia: “Auto-estrada da Barra em tráfego dentro de um mês” (O Globo, 29/1/1971, Matutina, p. 10). A inauguração, contudo, só veio a ocorrer em 13 de março daquele ano, dois dias antes do fim do mandato de Negrão de Lima. Isso tudo porque, em julho de 1970, antes de todas essas notícias, o Jornal do Brasil estampava sobre a construção do elevado: “DER garante obra sem atraso” (Jornal do Brasil, 25/7/1970, 1º Caderno, p. 5).

Mais que os atrasos, a obra foi marcada também por acidentes e fatalidades. Sem mencionar as mortes decorrentes das remoções na cidade, intrinsecamente ligadas a esse mesmo processo de expansão urbana, o Elevado do Joá em si foi palco de fatalidades. Uma das reportagens acima, inclusive, garantindo a obra sem atraso, saiu junto da matéria sobre o acidente que matou dois operários – mostrando a necessidade de cumprir a promessa a qualquer custo. Na noite do dia 23 de julho de 1970, a “ponte do túnel do Joá desaba”, deixando, a princípio, dois operários mortos e 23 feridos (Jornal do Brasil, 24/7/1970, p. 1). Os escoramentos de madeira não sustentaram a laje de 70 toneladas de concreto, que caiu soterrando trabalhadores, sendo o número de desaparecidos ainda incerto quando os bombeiros faziam as buscas nos escombros – já que a empresa responsável pela obra não sabia informar o número de funcionários presentes no canteiro naquele momento. Uma reportagem do dia 25 de julho revela que os operários culpavam a precariedade dos escoramentos pelo acidente, na mesma semana em que a construtora, Rossi Engenharia S. A., havia se gabado por bater o recorde de uma viga concretada por dia (Jornal do Brasil, 25/7/1970, 1º Caderno, p. 5). Apesar da piora de estado de alguns dos sobreviventes e do risco de desabamento de outra laje, o diretor geral da DER (Departamento de Estradas de Rodagem) afirmou que “às duas horas da manhã, pouco depois do acidente, já havia gente trabalhando na obra, o que mostra que ela praticamente não parou”. Logo abaixo, o jornal conta a história de José, operário que morreu com a carta que acabara de receber de sua família no bolso.

A obra de infraestrutura mais cara e sofisticada do governo da época caía pela precariedade das madeiras que a sustentavam. Enquanto operários pioravam de estado de saúde e outros eram enterrados, “a obra não para”, tentando bater o recorde de vigas de concreto colocadas por dia. Afinal, como mencionou uma reportagem trazida acima, os atrasos afetaram a imagem da Barra da Tijuca e suas promessas, e a construção do “futuro” não poderia parar – inclusive por pressão de comerciantes, construtoras e associações de moradores. No mesmo mês, a avenida Niemeyer – também costeira e importante para a ligação entre a Zona Sul à Barra da Tijuca – foi interditada por uma fissura no piso (Jornal do Brasil, 25/7/1970, 1º Caderno, p. 1). Contudo, as obras e as promessas continuaram, na corrida para inaugurá-las ainda dentro do mandato de Negrão de Lima. Quatro meses depois do acidente, outra viga desabou no Elevado, matando mais um operário e ferindo outros onze (Jornal do Brasil, 12/3/1971, p. 5). Outros quatro meses depois desse último, agora em março de 1971, um terceiro desabamento feriu mais quatro trabalhadores, um deles com uma fratura no crânio, exatamente na véspera da inauguração do Elevado pelo governador em pessoa (Jornal do Brasil, 12/3/1971, p. 5). Enquanto isso, reportagens exaltavam a beleza da infraestrutura, como a matéria de novembro de 1970 – mesmo mês do segundo desabamento – que trazia: “Lagoa-Barra se delineia como a estrada mais bela” (Jornal do Brasil, 23/11/1970, 1º Caderno, p. 24). Já cinco dias após a inauguração, em março de 1971, uma reportagem detalha o perigo do Elevado, com postes no meio da rua e falta de sinalização, que “fazem da auto-estrada uma aventura até a Barra” (Jornal do Brasil, 18/3/1971, 1º Caderno, p. 5).

A reportagem “Negrão enfrenta uma maratona para inaugurar sua obra” (Jornal do Brasil, 14/3/1971, 1º Caderno, p. 26) traz uma foto do então governador cortando a faixa comemorativa do Elevado do Joá, a poucos dias do seu mandato acabar. Nesses eventos de inauguração, rituais em que as infraestruturas são encenadas enquanto evento, a intenção política e a abertura da infraestrutura enquanto possibilidades futuras são expostas (Harvey, 2008). Na abertura oficial do Elevado, o governador fez de tudo para garantir o capital político do feito. Independentemente dos problemas relatados, das mortes e dos atrasos, uma grandiosa obra abria caminho para novas possibilidades, de investimento, de promessas, de formas de vida. Sorrindo ao cortar a faixa, rodeado de amigos e apoiadores, antes de ter que ir rapidamente para a próxima inauguração do dia, Negrão de Lima inaugurava ali um mundo de novas possibilidades, de fluxos e interações que se dariam por e em função daquela ponte e túnel. Muito mais do que melhorar o trânsito, ali se criava a possibilidade de se afastar dos aspectos nefastos da urbanização densa, de se “isolar” sem deixar de se integrar. Muito mais do que possibilitar a chegada de pessoas e carros para a Barra, possibilitava a chegada de uma nova forma de vida, diferenciada por uma expansão específica da cidade em direção ao Oeste. Essa expansão pela orla é muito mais do que uma distinção geográfica, representa uma distinção de status e de oferta de infraestruturas, uma distinção de estilos de vida, mesmo se tratando de uma mesma Zona Oeste já habitada e com caminhos construídos.

Fluxos de infraestruturas: túnel e ponte. Mas também água, eletricidade, asfalto e telefone

O Elevado do Joá coloca-se como um objeto interessante para se analisar através do olhar das infraestruturas. Referimo-nos aqui à noção de uma virada infraestrutural dos estudos urbanos (Venkatesan, Bear e Harvey, 2018HARVEY, P. (2018). “Infrastructures in and out of time: the promise of roads in contemporary Peru”. In: APPEL, H., ANAND, N. e GUPTA, A. (eds.). The Promise of Infrastructure. Durham, Duke University Press.; Addie, Glass e Nelles, 2020ADDIE, J.-P.; GLASS, M. e NELLES, J. (2020). Regionalizing the infrastructure turn: a research agenda. Regional Studies, Regional Science, v. 7, n. 1, pp. 10-26.), considerando infraestruturas enquanto “redes construídas que facilitam o fluxo de bens, pessoas ou ideias e permitem sua troca no espaço” (Larkin, 2013LARKIN, B. (2013). The Politics and Poetics of Infrastructure. Annual Review of Anthropology, v. 42, pp. 327-343., p. 328; tradução nossa)6 6 “built networks that facilitate the flow of goods, people, or ideas and allow for their exchange over space”. e como “agenciamentos sociotécnicos de materialidade, formas e relações discursivas, fiscais e organizacionais” (von Schnitzler, 2016Von SCHNITLZER, A. (2016). Democracy’s infrastructure: techno-politics and protest after apartheid. Princeton, Princeton University Press., p. 25; tradução nossa).7 7 “socio-technical assemblages of materiality, discursive, fiscal, and organizational forms and relations”. Procuramos estabelecer diálogo principalmente com o trabalho de Harvey (2008), sobre a construção de estradas no Peru. Argumentamos, contudo, que o objeto do Elevado do Joá possui especificidades que fazem dele uma infraestrutura peculiar, que merece nossa atenção e que muito nos diz sobre o processo de expansão urbana para a Barra da Tijuca – pela orla.

Encarando as infraestruturas como “matéria que permite o movimento de outra matéria” (Larkin, 2013LARKIN, B. (2013). The Politics and Poetics of Infrastructure. Annual Review of Anthropology, v. 42, pp. 327-343., p. 329; tradução nossa),8 8 “matter that enables the movement of other matter”. o complexo infraestrutural de ponte, túnel e viaduto do Joá certamente se encaixa nessa definição, como uma materialidade, um objeto concreto (e de concreto), cuja principal função é possibilitar o movimento de outras materialidades. Túneis e pontes em sua essência funcionam para ligar dois pontos, como um de “seus objetivos práticos uma junção entre termos dissociados” (Simmel, 1996SIMMEL, G. (1996). A ponte e a porta. Revista Política & Trabalho, n. 12, pp. 11–15. Disponível em: https://periodicos.ufpb.br/ojs/index.php/politicaetrabalho/article/view/6379. Acesso em: 12 dez 2020.
https://periodicos.ufpb.br/ojs/index.php...
, p. 11). Funcionam para possibilitar o movimento de pessoas e coisas e, na cidade contemporânea, principalmente de automóveis. Para um bairro como a Barra da Tijuca, que ganhava seu planejamento urbano com largas avenidas e sem uma preocupação com a locomoção de pedestres, a passagem de automóveis era sim essencial. Contudo, a construção do elevado possibilitou o fluxo e o movimento de tantos outros elementos, materiais e imateriais.

O Elevado, enquanto túnel e ponte, coloca-se como possibilitador de fluxos literais. Além dos automóveis que atravessam diariamente, ele possibilita a passagem de uma expansão, a passagem do alcance da malha urbana da cidade. Permite o fluxo de projetos (Velho, 2003VELHO, G. (2003). Projeto e metamorfose: antropologia das sociedades complexas. Rio de Janeiro, Jorge Zahar.), de famílias que buscam novas vidas para seus filhos. Permite a passagem do progresso, que transformaria o “sertão carioca” na “Miami do Rio”9 9 Tanto “sertão carioca” quanto “Miami do Rio” são termos já utilizados pela mídia para se referir à Barra da Tijuca. O primeiro faz referência ao período anterior ao Plano Lúcio Costa, quando a área era considerada basicamente rural; foi cunhado pelo jornal Correio da Manhã e se tornou título de uma obra de Armando Magalhães Corrêa (1936). O segundo, utilizado principalmente pelo jornal O Globo, faz referência ao período atual do bairro, principalmente em relação à orla e ao Jardim Oceânico. ou na “Suíça carioca”.10 10 Termo nativo utilizado por um morador da Barra da Tijuca em uma live do Instagram sobre segurança pública e Barra da Tijuca. Permite a passagem do capital imobiliário, com seus investimentos e o crédito imobiliário. Permite, também, o fluxo social, das camadas médias em ascensão – ou os chamados “novos ricos” – que migravam em direção à orla na busca por status. E possibilita, acima de tudo, o fluxo de novas infraestruturas.

O foco em uma infraestrutura nos possibilita enxergar dinâmicas do dia a dia, muitas vezes invisibilizadas ou escondidas por detrás das materialidades dos fios, postes, canos ou pelo caráter ordinário e até entediante das infraestruturas, sendo “simultaneamente transparentes e opacas” (Star, 2020STAR, S. (2020). A etnografia da infraestrutura. Anthropológicas, ano 24, v. 31, n. 2, pp. 61-85., p. 61). Contudo, o foco em um complexo de infraestruturas que serve de base para o estabelecimento de outras tantas infraestruturas tem o potencial de nos mostrar dinâmicas mais amplas, que dizem respeito aos imaginários acerca da cidade e sobre novas configurações urbanas e modos de vida. O Elevado do Joá é, por si só, um “conjunto de operações”, esse emaranhado de redes, materiais e natureza (RAO, 2015RAO, V. (2015). City as archive: contemporary urban transformations and the possibility of politics. Education: The Present is the Future, n. 4, pp. 178-186.) explicitado não só pelo entrelaçamento do concreto com tijolos, madeira, fios, morro, mar e árvore, como também pelos carros-pipa, que passaram a atravessar por ali para chegar onde “nunca houve água” (Jornal do Brasil, 26/4/1979, 1º Caderno, p. 15), e pela “luz, gás, água, telefone e assistência médica” que chegavam no “mais novo bairro da cidade” (Jornal do Brasil, 29/7/1979, Revista do Domingo, p. 114). Uma reportagem de 1979 ilustra isso trazendo que “o gás de rua, que rompeu os morros para vir do Leblon até a Barra” (Jornal do Brasil, 11/1/1979, 1º Caderno, p. 5), já havia chegado nos grandes condomínios que apareciam isolados na paisagem ainda de restinga e mangue. Muito além de representar o caráter relacional das infraestruturas (Graham e McFarlane, 2015GRAHAM, S. e MCFARLANE, C. (eds.) (2015). Infrastructural lives: urban infrastructure in context. Londres/Nova York, Routledge.) ou o seu entrelaçamento dinâmico e denso (Bucciareli, 1994 apud Star, 2020STAR, S. (2020). A etnografia da infraestrutura. Anthropológicas, ano 24, v. 31, n. 2, pp. 61-85.) o objeto do Elevado funciona como uma infraestrutura para outras infraestruturas – uma metainfraestrutura? –, uma materialidade que habilita o movimento de outras infraestruturas, um complexo sistema de suporte não apenas para sociedades modernas (Carse, 2017CARSE, A. (2017). “Keyword: infrastructure: How a humble French engineering term shaped the modern world”. In: HARVEY, P.; JENSEN, C. B. e MORITA, A. (orgs.). Infrastructures and social complexity. Londres/Nova York, Routledge, pp. 27-39.), como também para outros desses sistemas de suportes. Em si mesmo, reflete a “qualidade recursiva das relações infraestruturais – as dobras e sobreposições de múltiplos sistemas infraestruturais coexistentes” (Harvey, 2008, p. 85; tradução nossa).11 11 “recursive quality of infrastructural relations – the enfoldings and overlaps of multiple coexisting infrastructural systems”. O “romper o morro” só se deu pelos túneis do Elevado; e se manter pela costa só foi possível pelas pontes do Elevado. O que nos leva a uma diferenciação importante: a especificidade da expansão pela orla.

A expansão urbana da cidade do Rio de Janeiro deu-se de forma dual. Seja pela classificação de Abreu (1987)ABREU, M. (1987). A evolução urbana do Rio de Janeiro. Rio de Janeiro/Iplanrio, Zahar., que considera a expansão para Copacabana a primeira fase de expansão acelerada da malha urbana, seja pela de Lúcio Costa, que separa esse processo entre a ocupação do centro como uma primeira fase, seguida da expansão para a Zona Sul e Zona Norte e, em seguida, para a Barra da Tijuca (Costa, 1969), ambas identificam tal dualidade, quando houve uma expansão em direção ao mar e uma outra adentrando o território. O que discutimos aqui não é a diferença de oferta de serviços e prioridade do poder público, ou de uma “Zona Sul rica e uma Zona Norte pobre”, mas sim uma diferença em termos de propostas de estilos de vida e formas de viver. O Rio de Janeiro costeiro tem, historicamente, carregado um ethos específico, praiano e de prestígio, sempre em oposição ao subúrbio. Os túneis da cidade cumprem um papel importante nessa oposição, diferenciando não só os corpos “do Rebouças pra cá”, dos “além-túnel” e dos sem “cacife”, como as possibilidades de vida e de relação com o meio urbano. A etapa de expansão para a Barra da Tijuca, tida, pelo autor de seu plano-piloto, como uma forma de acabar com a divisão da cidade e “fechar o ciclo” em um ponto de encontro entre as duas expansões, na realidade deu-se em uma contraditória simultaneidade entre oposição e apropriação da própria Zona Sul. Buscando manter o status atrelado a essa expansão “pela orla”, mas se distanciando do “caos urbano” e daquilo que foi tido – ou construído – como problemas da urbanização, a construção de um complexo de ponte e túnel ajuda a abrir caminho ao mesmo tempo que mantém distante essa nova possibilidade que se abre na “cartografia física e simbólica do Rio” (O’Donnell, 2013O’DONNELL, J. (2013). A invenção de Copacabana: culturas urbanas e estilos de vida no Rio de Janeiro (1890-1940). Rio de Janeiro, Zahar., p. 23).

Harvey (2008) atribui às estradas e às suas histórias a possibilidade de revelar “os impulsos oscilantes e contraditórios de integração territorial e extensão desterritorializante” (p. 86; tradução nossa).12 12 “the oscillating and contradictory impulses of territorial integration and deterritorializing extension”.. É nessa dupla e conflitante dimensão que propomos olhar o Elevado. Ao se colocar como essa grande infraestrutura de concreto, símbolo da técnica e da modernidade, com o segundo túnel de seu tipo no mundo, ele traz “a promessa [...] de movimento para frente, de transição acelerada do passado para o futuro” (ibid., p. 87; tradução nossa).13 13 “the promise [...] of forward movement, of accelerated transition from the past to the future”. Ao mesmo tempo, ao se delinear “como a estrada mais bela”, possuindo vistas para o monólito de cartão-postal da Pedra da Gávea e para o Oceano Atlântico, estendendo-se por 3 quilômetros isolados de outras construções, ruas e prédios, ele faz menção a um caminho oposto, de uma certa volta a passados, tanto aquele a-histórico rousseauniano14 14 Esse “passado a-histórico rousseauniano” seria aquele vinculado não a um marco temporal específico, mas a uma ideia de um estado de natureza, sem vinculações empíricas, e sim em abstrações de uma sociedade pré-civilização, em um sentido positivo. a que Balthazar (2020)BALTHAZAR, A. C. (2020). O tempo da Barra da Tijuca: Concepções de passado, presente e futuro na narrativa midiática sobre o bairro. Dilemas – Revista de Estudos de Conflito e Controle Social, v. 13, n. 1, pp. 77-94. se refere, como àquele passado mais recente, de uma Zona Sul praiana tranquila. Nessa confluência de temporalidades, esse complexo de infraestruturas carrega o imaginário que se construía do “novo bairro” da Barra da Tijuca, de um isolamento sem abrir mão dos serviços, de um “longe” integrado, de fácil acesso. Essa ideia é bem ilustrada pela edição da Revista de Domingo do Jornal do Brasil de julho de 1979. Trazendo na capa uma foto da praia da Barra com os dizeres “Barra da Tijuca: um novo estilo de vida” (Jornal do Brasil, 29/7/1979, Revista do Domingo, pp. 95-126), a edição inteira alterna entre páginas que evocam o aspecto bucólico do bairro, com imagens da praia e das montanhas e páginas com mapas mostrando a integração e as vias de acesso ao bairro. É a mesma ideia por trás dos “bairros planejados” que se tornaram os protagonistas da urbanização da região, os grandes condomínios que apareciam como “ilhas urbanas”, garantindo camadas de fechamento ao mesmo tempo que os integravam aos serviços e benefícios da cidade.

Nos anos que seguiram à construção do Elevado do Joá, as promessas em relação ao bairro viraram-se para as outras infraestruturas que chegariam, agora por meio das recém-construídas pontes e túneis. “Ruas asfaltadas, iluminação pública e até telefone” (Jornal do Brasil, 2/12/1976, 1º Caderno, p. 8); “Cetel anunciou que [...] colocará à venda mais 3.120 telefones residenciais na Barra da Tijuca” (Jornal do Brasil, 2/12/1976, 1º Caderno, p. 8); “Emílio Ibrahim anuncia que água para Baixada e Barra é prioridade do Governo” (Jornal do Brasil, 6/4/1979, 1º Caderno, p. 16); e “Energia e toda a rede de luz e força para iluminação pública e particular; Todo um sistema de abastecimento d’água [...] com estação de tratamento de grande capacidade” (Jornal do Brasil, 8/12/1976, 1º Caderno, p. 5), são algumas das promessas em relação às infraestruturas que passaram a surgir depois que o Elevado incorporou o bairro à malha urbana da cidade e permitiu o fluxo dessas infraestruturas, cada qual carregada de novas promessas. As próprias pedras e tijolos que sobraram da obra do Elevado vieram a ser aproveitadas para a construção de estradas na Barra da Tijuca, assim como tornou-se financeiramente viável a locomoção dos carros-pipa para suprir a demanda da região. Essa grandiosa infraestrutura se mostrou primordial não só para o fluxo de promessas e agentes, mas de novas infraestruturas, cada qual possibilitando novos fluxos de promessa e agentes.

Considerações finais

O Elevado do Joá aparece na história da expansão urbana carioca como peça-chave para compreender o processo específico que diz respeito à expansão pela orla em direção à Zona Oeste. Como essa assemblagem ou “agrupamentos instáveis e não coerentes de materiais, habilidades e práticas heterogêneas” (Harvey, 2008, p. 84; tradução nossa),15 15 “unstable and noncoherent gatherings of heterogeneous materials, skills, and practices”. ele incorpora diversos materiais, dinâmicas sociais, vidas e promessas que sustentam essa extensão da malha urbana baseada em uma nova proposta de estilo de vida. Um olhar atento à sua história e composição nos ajuda a compreender as “experiências diferenciadas da vida cotidiana e [...] expectativas de futuro” (Appel, Anand e Gupta, 2018APPEL, H.; ANAND, N. e GUPTA, A. (eds.) (2018). The Promise of Infrastructure. Durham, Duke University Press., p. 3; tradução nossa).16 16 “differentiated experiences of everyday life and [...] expectations of the future”.

Esse complexo infraestrutural de pontes, túneis e viaduto lança luz sobre as dinâmicas passadas da produção da cidade e para os ideais do futuro que buscam se estabelecer. Como uma espécie de máquina do tempo do multiverso, permite voltar a passados distintos ao mesmo tempo que nos leva ao futuro, associando-se a ideais fictícios de um passado a-histórico, a memorias nostálgicas de um passado intermediário e a memórias ruins de um passado recente que se mantém no presente, mas sempre se colocando “rumo ao futuro”.

Como as infraestruturas em geral, o Elevado “compõe a arquitetura para a circulação, literalmente fornecendo a sustentação das sociedades modernas, e gera o ambiente da vida cotidiana” (ibid.; tradução nossa),17 17 “comprise the architecture for circulation, literally providing the undergirding of modern societies, and they generate the environment of everyday life”. mas de uma sociedade moderna bem específica, que se dá na tentativa de conciliar ideais opostos. Como símbolo de separação na cidade, o túnel delimita o antes e o depois, construindo esse “novo” ao mesmo tempo que busca integrá-lo ao “antigo”, valendo-se de sua bagagem simbólica de prestígio. O distante, que por si só não seria suficiente, torna-se integrado. A paisagem das florestas intocadas e da natureza exuberante é cortada pelo cinza do cimento e do progresso, da arquitetura modernista e da presença das infraestruturas urbanas. O Elevado coloca-se, ainda, como evidência física de uma sequência de eventos e dinâmicas sociais (Larkin, 2013LARKIN, B. (2013). The Politics and Poetics of Infrastructure. Annual Review of Anthropology, v. 42, pp. 327-343.) que culminaram na expansão para a Barra da Tijuca.

Nessa amálgama de conflituosas promessas interdependentes, o Elevado do Joá apresenta a base para a criação de um modelo de vida inédito, impulsionado pelo capital imobiliário. O ethos barrense (Lima, 2007LIMA, D. (2007). Ethos “emergente”: as pessoas, as palavras e as coisas. Horizontes Antropológicos. Porto Alegre, ano 13, n. 28.), os “condomínios-cidade” (Agueda, 2020AGUEDA, R. (2020). Construindo infraestrutura para as elites: os grandes condomínios da Barra e um novo modelo de se morar na cidade. Revista Anthropológicas, ano 24, v. 31, n. 2, pp. 153-179.), o papel de um “subúrbio global” (Herzog, 2013HERZOG, L. (2013). Barra da Tijuca: the political economy of a global suburb in Rio de Janeiro, Brazil. Latin American Perspectives, v. 40, n. 2, pp. 118-134.) e uma forma urbana inédita na cidade foram todos construídos junto das vigas de concreto da Rossi Engenharia, nesse fluxo de agentes, promessas e outras infraestruturas que, pelo asfalto do Elevado, chegaram à Barra da Tijuca.

Figura 1
Jornal do Brasil, 7/3/1971

Figura 2
Jornal do Brasil, 23/11/1970

Figura 3
Jornal do Brasil, 24/7/1970

Figura 4
Obra túnel do Joá, anos 1970

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  • TEIXEIRA ALVES, R. (2020). Entre o presente e o passado, o “futuro”: o processo de urbanização da Barra da Tijuca (RJ). Dissertação de mestrado. Rio de Janeiro, Universidade Federal do Rio de Janeiro.
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  • Von SCHNITLZER, A. (2016). Democracy’s infrastructure: techno-politics and protest after apartheid. Princeton, Princeton University Press.

Notas

  • 1
    “Tranquila” e “prestígio” são trazidos aqui como termos nativos da propaganda de empreendimentos que surgiram a partir da década de 1970.
  • 2
    Para uma discussão mais aprofundada da categoria tranquilidade na Zona Oeste carioca, ver Araujo e Cortado (2020)ARAUJO, M.; CORTADO, T. (2020). Zona Oeste do Rio de Janeiro, fronteira dos estudos urbanos? Dilemas – Revista de Estudos de Conflito e Controle Social, v. 13, n. 1, pp. 7-30. Disponível em: https://revistas.ufrj.br/index.php/dilemas/article/view/29498. Acesso em: 12 dez 2020.
    https://revistas.ufrj.br/index.php/dilem...
    .
  • 3
    new optical field through which we can examine the lived dimensions of urban society”.
  • 4
    overwhelming sense that infrastructures are the current currency of investment across the planet, the go-to promise for a better future”.
  • 5
    the force of infrastructural promise as a complex and unstable temporal alignment, as I look to specify how the relationship between past and future is articulated in and around the practices of road construction”.
  • 6
    built networks that facilitate the flow of goods, people, or ideas and allow for their exchange over space”.
  • 7
    socio-technical assemblages of materiality, discursive, fiscal, and organizational forms and relations”.
  • 8
    matter that enables the movement of other matter”.
  • 9
    Tanto “sertão carioca” quanto “Miami do Rio” são termos já utilizados pela mídia para se referir à Barra da Tijuca. O primeiro faz referência ao período anterior ao Plano Lúcio Costa, quando a área era considerada basicamente rural; foi cunhado pelo jornal Correio da Manhã e se tornou título de uma obra de Armando Magalhães Corrêa (1936)CORRÊA, A. M. (1936). O sertão carioca. Rio de Janeiro, Imprensa Nacional.. O segundo, utilizado principalmente pelo jornal O Globo, faz referência ao período atual do bairro, principalmente em relação à orla e ao Jardim Oceânico.
  • 10
    Termo nativo utilizado por um morador da Barra da Tijuca em uma live do Instagram sobre segurança pública e Barra da Tijuca.
  • 11
    recursive quality of infrastructural relations – the enfoldings and overlaps of multiple coexisting infrastructural systems”.
  • 12
    the oscillating and contradictory impulses of territorial integration and deterritorializing extension”..
  • 13
    the promise [...] of forward movement, of accelerated transition from the past to the future”.
  • 14
    Esse “passado a-histórico rousseauniano” seria aquele vinculado não a um marco temporal específico, mas a uma ideia de um estado de natureza, sem vinculações empíricas, e sim em abstrações de uma sociedade pré-civilização, em um sentido positivo.
  • 15
    unstable and noncoherent gatherings of heterogeneous materials, skills, and practices”.
  • 16
    differentiated experiences of everyday life and [...] expectations of the future”.
  • 17
    “comprise the architecture for circulation, literally providing the undergirding of modern societies, and they generate the environment of everyday life”.

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    05 Dez 2022
  • Data do Fascículo
    Jan-Apr 2023

Histórico

  • Recebido
    8 Mar 2022
  • Aceito
    8 Jun 2022
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