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UM GRUPO EM MUDANÇA: OS LIVREIROS E O SABER PROFISSIONAL

A CHANGING GROUP: THE BOOK SELLERS AND THE PROFESSIONAL EDUCATION

Resumo

O artigo analisa como uma atividade produtiva, o comércio de livros, atua como elo unificador de um grupo. Centrado na figura do livreiro como o protagonista deste mercado, o texto explora a dupla matriz do objeto-livro, cultural e material, que acaba por definir uma estrutura dúbia, onde coexistem o promotor da cultura e o negociante de mercadorias. No plano microssociológico, busca-se entender a tensão, presente na formação profissional, entre o saber-fazer aprendido na lida diária (em uma prática que reconstrói o modelo mestre-aprendiz), frente ao aprendizado academicista. No plano macrossociológico, as mudanças na forma de venda de mercadorias em geral e a reformulação da prática de leitura impõem a criação de estratégias de adaptação frente ao novo mundo informacional. O estudo deste caso permite explorar as sociabilidades do grupo e o processo de construção de uma visão de mundo compartilhada fora dos espaços oficiais de formação profissional.

Palavras-chave
Profissões; Trabalho; Grupo; Formação; Livreiro

Abstract

The article examines how a productive activity - the book market - acts as a unifying bond for a certain group. Centered on the figure of the book seller as the protagonist of this market, the paper explores the double matrix of the book-object, cultural and material, which ultimately sets a dubious structure within which both the promoter of culture and the dealer coexist. On the micro-sociological level, we seek to understand the tension at the vocational education between the know-how learned in their daily works (in a routine that reconstructs the master-apprentice model), and the academic learning. On the macro-sociological level, the changes in the way goods in general are sold and the reshaping of the reading habits impose the introduction of strategies of adaptation towards the new world of information. The study of this case allows us to explore the sociability of the group and the process of building a shared vision of the world outside the official spaces of vocational education.

Keywords
Professions; Work; Groups; Professional education; Book seller

O artigo busca analisar como um grupo se constrói tendo como elo unificar o compartilhamento da mesma atividade produtiva: o comércio de livros.1 1 Os dados aqui apresentados integram a tese de doutorado sobre o tema, defendida em 2011, O livreiro e a lida com o (re)conhecimento: um estudo sobre identidade profissional. A pesquisa de campo ouviu 15 livreiros, no Rio de Janeiro, entre 2009 e 2010. Autores, editores, impressores... São muitos os agentes a movimentar as engrenagens do mercado editorial. Nas próximas páginas, no entanto, iremos nos dedicar ao livreiro, figura central no processo de circulação de ideias e de mediação cultural. Ainda que fortemente ligado aos meios acadêmicos e intelectuais, o livreiro não dispõe de um espaço de formação profissional institucionalizado - como um curso universitário, por exemplo; portanto, o processo de amalgamento das relações entre os vendedores de livros se processa no seu locus de trabalho, na prática da atividade profissional: na livraria se negociam obras e também se aprende um ofício.

Podemos creditar o nascimento do mercado editorial ao inventor da prensa tipográfica, Johannes Gutenberg, no século XV, que abriria as portas para um futuro de produção de livros em larga escala. Na primeira infância da indústria do livro, as profissões do livreiro se encontravam na mesma pessoa: era ele quem editava, imprimia e vendia o livro. Tal simbiose se perpetua por tanto tempo - no Brasil, pelo menos até o século XX (Bragança, 2002Bragança, Aníbal. (2002). Uma introdução à história editorial brasileira - Cultura. Revista de História e Teoria das Ideias, XIV, p. 57-83.) - que nem sempre será possível separar cada atividade.2 2 Não ignoro que existe uma larga discussão na literatura sobre Sociologia das Profissões que pontuam as diferenças conceituais entre profissão e ocupação; entretanto, para este artigo não irei me deter nesse debate por dois motivos: 1) a dicotomia profissão/ocupação é tributária de uma herança funcionalista que não considerou o universo das atividades produtivas ao restringir a análise às ocupações clássicas e/ou associadas às elites, como Medicina e Direito e; 2) por considerá-lo superado, no sentido de que outros pesquisadores já oferecem definições e esclarecimentos que permitem seguir além do debate nos trabalhos de campo. Tal discussão extrapola o objetivo deste artigo, que é mostrar a construção de grupo que compartilha de uma mesma atividade produtiva aprendida na prática. Para saber mais sobre tais discussões, ver Abbott (1988), Freidson (1986) e Larson (1977). Mas, com a evolução do maquinário de impressão, o aumento da produção de textos, a formação de leitores e a própria evolução do mercado editorial, essas três posições - editor, impressor e livreiro - acabaram por se dissociar, e a cada um deles coube um lugar no continnum educacional. Ao editor, a universidade; ao impressor, o curso técnico; ao livreiro, a prática da lida diária. Peça-chave no circuito que envolve produção, edição e venda de obras de leitura, o livreiro ocupou um lugar fundamental na circulação de ideias e na formação de ideologias nos séculos XIX e XX (Darnton, 1996Darnton, Robert. (1996). Revolução impressa: a imprensa na França, 1775-1800. São Paulo: Edusp.). Hoje, o proprietário da livraria3 3 No Brasil, de acordo com dados publicados no Diagnóstico do setor livreiro (2009), levantamento realizado pela Associação Nacional de Livrarias (ANL), existem 2.980 livrarias em funcionamento no Brasil, o que mostra um aumento de 11%, na comparação com o levantamento anterior, de 2006. Já para o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (Munic, 2009), estão em funcionamento 1.557 livrarias no território nacional, isto é, quase metade do aferido pela ANL. A diferença é resultado do entendimento que cada instituição tem do que caracteriza uma livraria. A definição adotada pela associação é mais abrangente, incluindo todos os estabelecimentos que comercializam livros, mas não exclusivamente este bem. Outros produtos negociados podem ser artigos de papelaria (34% delas), de música (CD e DVD, 53%), de informática e eletrônicos (24%) e brinquedos (18%). A empresa pode inclusive vender esses artigos como principais e ter como produto secundário um acervo de livros. Esses estabelecimentos são considerados livrarias pela ANL, que vê o local não apenas como uma papelaria ou loja de discos. Se levarmos em consideração o total de municípios brasileiros, 5.566, veremos que, apesar de o consumo de livros acontecer de forma preferencial na livraria, tais estabelecimentos ainda são poucos no país, sendo, portanto, a figura do livreiro uma referência nem sempre fácil. especializou-se nas técnicas do comércio e enfrenta a concorrência das novas tecnologias de comunicação, como as vendas online, e a evolução das práticas de leitura, como o formato digital.

No Brasil não há uma "escola de formação" - como veremos em detalhe mais à frente - que permita ao livreiro gozar de uma rede de vivência compartilhada com colegas que ambicionam exercer a mesma atividade. Portanto, cabe pensar quais são as formas pelas quais os livreiros estabelecem o processo de socialização coletiva e como os repassam aos demais interessados na profissão. Ao olhar para a "formação" do livreiro, espera-se contribuir para análise dos grupos profissionais cujos processos de socialização pelo trabalho não passam pelas instâncias legitimadas (escolas, cursos técnicos e universidades) e também lançar luz sobre a influência que mudanças no campo de atuação dos agentes podem trazer para a sobrevivência destes como entes produtivos.

Para entender melhor como os livreiros formam seus pares e, assim, estabelecem os limites do grupo, na primeira parte do artigo discorro sobre a dupla matriz do objeto-livro, cultural e material, que acaba por definir uma estrutura dúbia, na qual coexistem "dois agentes", o promotor da cultura e o negociante de mercadorias, presentes, no fim, na mesma pessoa. Na sequência, apresento a forma como o livreiro educa seus "alunos", fora do circuito legítimo escolar-acadêmico, em um modelo que resgata, em parte, o duo mestre-aprendiz. Nesta parte, cabe atentar para a capacidade que o livreiro tem de indexar as informações sobre os livros, expertise desenvolvida ao longo de sua vida profissional. Por fim, analiso em que medida as alterações no campo editorial, como o crescimento da produção editorial, a capitalização da livraria e os novos modelos de gestão impactam o saber-fazer do livreiro.

CAMPO EDITORIAL: LIVRO E COMÉRCIO

O que é um livro senão um objeto composto de várias folhas de papel, contendo um texto, manuscrito ou impresso, organizadas e presas por um dos lados e envolto por uma capa? Esta é uma definição básica calcada naquilo que o constitui, seus materiais e aparência. Mas, se for recorrer aos autores, literatos ou intelectuais, o livro pode significar muito mais, dependendo de seu conteúdo, do que ele guarda em si, nas palavras nele registradas: "Dentre os instrumentos inventados pelo homem, o mais impressionante é, sem dúvida, o livro. Os demais são extensões de seu corpo. O microscópio e o telescópio são extensões da visão; o telefone, uma extensão da voz, e, finalmente, temos o arado e a espada, ambos extensões do braço. O livro, porém, é outra coisa. O livro é uma extensão da memória e da imaginação" (Borges, 1985Borges, Jorge Luis. (1985). Cinco visões pessoais. Brasília: Ed. UnB.: s/p).

Portanto, dependendo do olhar dispensado ao livro é possível pensá-lo como algo singular - único mesmo em sua reprodutibilidade - ou algo ordinário, comercializado dentro de um círculo de produção industrial. Coser (1975)Coser, Lewis. (1975). Publishers as gatekeepers of ideas. The Annals of the American Academy of Political and Social Science, 421, p. 14-22., ao se debruçar sobre o mercado editorial dos Estados Unidos na década de 1970, destacou três características estruturais do setor. O primeiro atributo ficou preso à análise de época, diz respeito ao aspecto pulverizado da produção, quando existia uma multiplicidade de pequenas e médias editoras agindo de forma autônoma, dificultando um ordenamento do mercado. Com a profissionalização do setor, esse aspecto, em especial, sofreu forte influência externa, com a separação das etapas de produção. Na atualidade, o mercado editorial norte-americano é um dos mais concentrados do mundo, com conglomerados de entretenimento atuando em vários segmentos e na produção de várias mercadorias culturais (Schiffrin, 2006Schiffrin, André. (2006). O negócio dos livros. Rio de Janeiro: Casa da Palavra.).

Outra premissa seria intrínseca à produção de livros: a incerteza e imprevisibilidade das vendas. As editoras publicam textos com um considerável fator de risco frente à variedade de gostos dos leitores. São clássicos os casos sobre leilões de obras literárias e negociação de direitos autorais de textos considerados um fracasso certo que, na mão de outros editores, viraram best-sellers.4 4 São comuns na Feira de Frankfurt os leilões pelos direitos autorais de novos textos de escritores já consagrados. "O americano Nicholas Sparks, 45, é referência desse filão. Tanto que é personagem de um leilão disputado por editoras brasileiras durante a última Feira de Frankfurt. Venceu o grupo Sextante, que é dono do próximo livro, The best of me (O melhor de mim). Lançado neste mês nos EUA, sai aqui em 2012. Há ainda três por escrever e quatro antigos inéditos por aqui. Diz-se que o negócio chegou a US$ 2 milhões, mas as partes não confirmam a cifra. A Novo Conceito, que tornou Sparks um sucesso, mas perdeu a briga, ainda tem três títulos para editar, sendo dois para 2012. Cinco continuam no catálogo até 2017" . Ver "Editoras emplacam best-sellers de amor" (Folha de S. Paulo, 29 de setembro de 2011). Disponível em <http://www.folha.uol.com.br/ilustrada/998651-editoras-emplacam-best-sellers-de-amor.shtml>. Nuno Medeiros (2009)Medeiros, Nuno. (2009). Cavalheiros, mercadores ou centauros? Traços de actividade e sentido de si dos editores. In: Brasão, Inês (org.). Comunidades de leitura. Lisboa: Edições Colibri. chama de crise a constante imprevisibilidade do setor, que é considerada uma premissa do meio editorial. A incerteza quanto ao potencial de venda de determinado título marca o mercado de livros com um persistente risco de fracasso ou sucesso, que embala todos os lançamentos, atribuindo ao setor um constante sentimento de crise, visto que tudo pode dar errado a qualquer momento.

O último atributo sinalizado por Coser (1975)Coser, Lewis. (1975). Publishers as gatekeepers of ideas. The Annals of the American Academy of Political and Social Science, 421, p. 14-22. seria a prevalência de um modo de operação tradicional sobre a organização burocrática (Weber, 1994Weber, Max. (1994). Economia e sociedade. Brasília: Ed. Unb (Vol. 1).) presente na cadeia produtiva do livro. Essa premissa será facilmente identificada na reprodução do conhecimento para as novas gerações livreiras, discutido na segunda parte deste artigo.

O mercado editorial se constrói sobre essa tríade (centralização/pulverização, incerteza e tradição), que tem impacto direto sobre a percepção dos agentes em relação a si mesmos e como são entendidos socialmente: serão constantes os esforços para dissociar a produção de livros das práticas mercantis. Os escritores buscam ser vistos como artistas-celebridades, mesmo depois de discussão sobre a profissão de escritor durante a modernidade que perdura até hoje (Bourdieu, 1998Bourdieu, Pierre. (1998). Les règles de l'art: genèse et structure du champ littéraire. Paris: Seuil.); os editores, desde o século XIX, imprimem ao seu trabalho o ideal intelectual, dissociando-se do comércio e da produção física das obras.

A profissão oitocentista [do editor] define-se pelo seu distanciamento tanto do comércio e venda de livros quanto da arena técnica de impressão, movimento duplo suplementado pelo posicionamento do editor a fileira intelectual e artística. Optando pela integração na cultura como via de legitimação de uma independência, em termos de trabalho, os profissionais da edição colocam-se nas cercanias do estatuto que os autores reclamavam, processo táctico que gera uma tensão genética entre o ideal intelectual, veementemente defendido e proclamado, e a indeclinável realidade das contingências econômicas em que se realiza sua atividade (Medeiros, 2011: 25).

Já aos livreiros, como discurso possível de dissociação ao comércio, caberá o papel de promotor da cultura, o agente encarregado de fazer a ligação entre produtores e leitores.

De fato, no imaginário coletivo, a profissão de livreiro certamente está associada com a "cultura", sobretudo à cultura "legítima". É bem certo que, apesar da forte diversificação das práticas de lazer nos últimos 30, 40 anos, a leitura e o livro continuam a ser um hábito e um objeto com valorações positivas socialmente. Portanto, a primeira imagem que vem à mente dos "não-livreiros" nunca é a de um negócio que envolve, boa parte do tempo, um trabalho físico de manutenção, mas, na maioria das vezes, é o oposto do que aparece nas representações coletivas: a de um trabalho "intelectual" (Leblanc, 2010Leblanc, Frédérique. (2010). Les libraires de 1945 à nos jours, dispositions socioprofessionnelles et adaptations au monde culturel. In: Bertho, Sophie (org.). Deux siècles de vie littéraire en France. Freiburg: Frankreich-Zentrum, p. 51-76.: 61, tradução minha).

Apesar da adoção de tais estratégias de afastamento dos agentes das práticas comerciais, consideradas depreciativas, não se pode negligenciar o caráter lucrativo, financeiro do mercado editorial, que deve realimentar as possibilidades de subsistência da atividade cultural. O que se revela, então, em tais movimentos, é um modo de tensionar as duas dimensões, a comercial e a cultural, num jogo de oposição e atração, que ao fim mostra a forte imbricação desses dois polos como características existenciais deste mercado.

Diferente do editor, a imagem do livreiro está mais fortemente ligada ao eixo comercial do universo editorial, portanto, sua estratégia de afastamento passa pelo processo de formação de novos livreiros, separado dos espaços universitários. O aprendizado, fundamental ao entendimento do que é o grupo e seus limites, inscreve-se como um processo acumulativo, indeterminado, personalizado, dando ao livreiro-educador um status diferenciado do comerciante preso ao balcão.

PRÁTICA E TEORIA NO APRENDIZADO

O livreiro, especialista no ofício de negociar obras escritas, é visto como a pessoa que sabe de tudo um pouco (pelo menos o que integra o seu acervo ou o que conhece nos catálogos editoriais). Num mundo sem internet, sem fluxos globais de informação, sem acesso direto aos produtores do conhecimento materializado (editoras), eles atuavam como fontes de informação, eram a referência para diversos outros grupos profissionais, de onde poderiam acessar os dados de que precisavam para completar sua formação ou mesmo aprofundar seus conhecimentos. Não é que o livreiro dispusesse de ferramentas de indexação, como hoje trabalham os bibliotecários;5 5 E aqui se apresenta uma das diferenças entre eles e o campo da biblioteconomia: estes não têm como premissa vender o produto, mas ordená-lo de forma a ser mais facilmente encontrado ou mesmo preservado no futuro. A biblioteconomia, que hoje está mais próxima da ciência da informação do que do mercado de livros, é uma área do conhecimento especializada em pesquisar, desenvolver e utilizar os melhores métodos para tratar a informação, visando às suas recuperação e disseminação. Para o livreiro, manter um livro na estante é prejuízo - sua excelência está em encontrar o livro certo para cada comprador. era ele o indexador.6 6 Tal recurso, aqui nomeado de indexação, não apareceu claramente definido nas entrevistas, e sequer foi assim nomeado. O ato de indexar como a chave da profissão, como a expertise do livreiro, é uma definição construída na pesquisa, extraída da análise do campo, fruto da interpretação daquilo que nos "fala" o objeto. A capacidade de ofertar a informação sobre o livro não estava fora dele, mas na sua competência para escolher, filtrar, armazenar e organizar seu acervo e catálogos de forma que pudesse lançar mão deles na presença do cliente. Sua aptidão (não nata) de criar índices, listas de assuntos relacionados às fontes (livros), o levou a construir para si uma cultura geral que lhe possibilitava transitar por diversos grupos sociais, de mais ou menos prestígio. Os livreiros não apenas vendem um produto, mas acreditam fornecer um serviço ao cliente, que é entregar informação selecionada sobre um determinado tema. Eles filtram e organizam os dados que retiram de catálogos, das orelhas, dos materiais de divulgação, da rotina do trabalho, do contato com os consumidores e com esse conjunto de informações montam seus acervos e atendem aos clientes.

No Brasil, existem três instituições que oferecem cursos teóricos e conceituais/metodológicos para quem quer atuar no mercado livreiro. Não é preciso ter formação7 7 Existe uma tradição na Sociologia do Trabalho de diferenciação entre formação e qualificação. Não pretendo me aprofundar nela, pois fugiria ao escopo deste trabalho, mas para melhor entendimento, a formação refere-se a um processo prolongado de estudos, que se traduziria em um diploma. Já a qualificação seria um processo de curta ou média duração, pontual, que uniria experiência e educação. específica para abrir uma livraria ou ser contratado para trabalhar em uma - seja no cargo de atendente ou de gerente -, mas para quem busca se diferenciar neste segmento ou mesmo almeja seguir "carreira", dois caminhos se mostram prováveis. São cursos livres, organizados em módulos, disponíveis na Estação das Letras, no Rio de Janeiro, e, em São Paulo, na Universidade do Livro, da Universidade do Estado de São Paulo (Unesp), ou na Associação Nacional de Livrarias (ANL), no Rio de Janeiro.

Vejamos em detalhe os cursos. O oferecido pela Estação das Letras, um centro de estudos voltado para literatura, acontece uma vez por semestre e é procurado principalmente por pessoas das áreas de ciências humanas e sociais. Criado na década de 1980, as turmas comportam no máximo 30 e no mínimo 10 alunos. A duração é de uma semana, correspondendo a cerca de 10 horas. O formato é de seminário, com um palestrante por dia, abordando assuntos diversos. No fim do último dia do curso Formando livreiros, um "grande leitor" é convidado a falar de sua experiência como consumidor e o que espera de uma livraria. Já deram essa palestra Ruy Castro e Ítalo Moriconi, dentre outros. Suzana Vargas, organizadora do curso, conta que disponibiliza o cadastro de participantes das aulas às livrarias, para que possam realizar entrevistas e contratações a partir dele.

Já em São Paulo, os cursos são oferecidos em módulos específicos e não pretendem dar conta da totalidade dos aspectos da rotina de trabalho. Destacam-se Montagem e funcionamento de livraria independente e Gestão de compras de livros para livrarias, que completam, juntos, 21 horas oferecidas pela Universidade do Livro, da Universidade do Estado de São Paulo (Unesp).

Em 2008, a Associação Nacional de Livrarias criou o Programa ANL de capacitação dos profissionais do varejo das livrarias, com o intuito de permitir melhor formação das equipes que trabalham nestes ambientes. São diversos módulos, dentre eles Marketing pessoal para profissionais de livraria e Vitrinismo aplicado em livrarias, que duram em média oito horas e são oferecidos na sede, em São Paulo.

Se os cursos são escassos e restritos, o outro caminho para ser livreiro é empregar-se desde cedo em uma livraria. O aprendizado na prática é tática recorrente para quem quer abrir futuramente um comércio: "Formamos muitos livreiros aqui. Pessoas que foram meus funcionários abriram comércio e estão no mercado", conta a livreira A,8 8 Com o objetivo de preservar a identidade daqueles que participaram da pesquisa, apresento os depoimentos acompanhados das palavras Livreiros A, B, ou C (e assim por diante) para designar os entrevistados. com mais de 20 anos de mercado.

Como não existe uma legislação específica para orientar o exercício profissional nem uma formação técnico-profissional dirigida especificamente para o grupo, somente por meio de encontros com os livreiros foi possível efetivamente tentar delinear o corpo de conhecimentos específicos da profissão.

É na rotina da livraria que os saberes específicos da profissão são aprendidos. Os livreiros são unânimes quando falam do perfil do candidato a um emprego: gostar de ler, ter cultura geral, ser curioso, ter vontade de lidar com o público e, se possível, dominar uma língua estrangeira. É interessante que tais requisitos não coincidem com os conteúdos oferecidos pelos cursos analisados, visto que, como já salientamos, aqueles estão mais voltados para práticas comerciais. Para os livreiros, se a pessoa tiver as cinco características acima, tem grandes chances de ter sucesso no mercado de vendas de livros.

Segundo contam os livreiros, segue-se então o treinamento in loco, que não tem mistério: "começo pedindo para organizar uma seção, assim ele vai vendo como se ordenam os livros e conhecendo o acervo", relata livreiro B, no Centro do Rio de Janeiro. Depois de seguir para outras prateleiras, o funcionário passa para o atendimento ao público, depois para o caixa e assim experimenta, com o tempo, os diversos setores característicos de um estabelecimento comercial. Com o passar dos anos, toma "gosto pela coisa" e abre seu próprio negócio, ou acaba, o que é bem comum, herdando (comprando) a livraria em que trabalha. Aliás, é um traço recorrente neste mercado que ao longo dos anos a livraria venha a ter vários sócios ou trocas de proprietários. Tais alterações de comando podem ser explicadas pelo sucesso ou não do estabelecimento, ou mesmo pelas condições histórias e econômicas de determinada época9 9 Um exemplo disso aconteceu durante a ditadura militar, quando algumas livrarias foram vendidas, pois os donos foram perseguidos ou não conseguiram mais financiamentos para se manterem no mercado. (Hallewell, 1985Hallewell, Laurence. (1985). O livro no Brasil: sua história. São Paulo: Edusp.).

Os livreiros descrevem seu dia a dia, enumeram livros e referências advindas deles, e com isso produzem o conhecimento que os ajuda a atender clientes, a satisfazer gostos, a montar estoques e a realizar vendas; entretanto, nenhum deles atribuiu um nome a esse saber-fazer. Todos dominavam seu trabalho, sabiam o que faziam a cada dia, mas não pronunciaram um termo que pudesse sintetizar suas ações rotineiras. Esse saber-fazer foi chamado aqui de indexação, uma capacidade que o livreiro desenvolve ao longo de sua experiência na prática do trabalho, que lhe permite relacionar livros a autores, temas a títulos, assuntos a pessoas, palavras dispersas a obras impressas, exemplares a vendas. É um saber que se aprende no balcão da livraria (sur la tas, como diriam os livreiros franceses), a cada dia, todo o dia, ao longo de toda a vida profissional. É um conhecimento não formalizado, não ensinado em escolas e menos ainda em manuais. Cada livreiro descreve o modo como aprendeu e como desenvolveu um método de ensinar (uns mandam organizar as estantes, outros, que leiam os títulos); ou seja, só se aprende fazendo, sob a orientação do dono da livraria ou do livreiro mais antigo, de quem se herdará um modo particular de indexar, que será expresso em um conselho a um cliente e no sucesso da montagem de um estoque.

A prática da indexação diz respeito à habilidade de filtrar e interpretar as informações editoriais com o intuito de gerar um sentido, um significado compreensível para si e para os outros livreiros e, finalmente, para o cliente. É assim que eles se veem e é como gostariam de ser vistos socialmente: como produtores de sentidos. Portanto, a indexação é um conceito que trago para definir o trabalho do livreiro, que não compreende apenas a venda de um objeto dentro da economia dos bens simbólicos, mas, na visão deles, consiste em entregar um serviço de informação na forma de livro.

Portanto, a "formação" do livreiro evoca o retorno à relação mestre-aprendiz na qual o ensinamento não estava consolidado em um modelo padronizado e universal a ser replicado, como as profissões acadêmicas, mas em um saber-fazer único de cada mestre, que era incorporado pelo aprendiz e seguido à risca; com o passar dos anos, quando se tornasse mestre, poderia modificá-lo de acordo com o que acumulou em décadas de prática. Segundo Dubar (1991: 222)Dubar, Claude. (1991). La socialization: construction des identités sociales et professionnelles. Paris: Armand Colin., tal modelo remete a uma concepção de trabalho como arte, como se a acumulação de conhecimentos ao longo dos anos permitisse um aprimoramento constante e infinito da técnica. "A construção de uma identidade de uma profissão pressupõe uma transição subjetiva que permite a autoconfirmação de uma evolução regular concebida como um aperfeiçoamento progressivo de uma especialidade mais ou menos vivenciada como arte" (tradução minha). Tal concepção também impediria, conceitualmente, a construção ou associação a um conjunto de disciplinas estabelecidas que levassem o grupo a formar um conteúdo programático fechado, a ser ensinado fora do ambiente da livraria. O autor continua, destacando que sendo um circuito fechado de ensino, somente o próprio grupo pode criar seus critérios de validação de conhecimento e de identificação dos pares. "[A construção de uma identidade profissional] também supõe confirmações objetivas por uma comunidade de profissionais dotados de instrumentos próprios de legitimidade" (Dubar, 1991Dubar, Claude. (1991). La socialization: construction des identités sociales et professionnelles. Paris: Armand Colin.: 222, tradução minha).

O lugar privilegiado de indexador, de elo entre dois universos - o dos desejosos de informação editorial e o dos responsáveis pela publicação -, começa a mudar com o desenvolvimento do mercado livreiro, com a capitalização das editoras e livrarias e a entrada das tecnologias de gestão. A moderna forma de produção do livro - que ganhou cores, novos formatos, ilustrações - passa a demandar mais atenção do livreiro-editor. A separação dos dois ofícios aparece como inevitável. Aos editores caberá o trabalho de identificar novos autores, produzir livros e cuidar dos lançamentos; ao livreiro, o papel de comercializar o livro.

MUDANÇAS DENTRO E FORA DA LIVRARIA

A emergência das tecnologias da comunicação gerou novos desafios e possibilidades de interação social, o que levou a transformações radicais no modo de vida. As mudanças conduziram alguns autores a imaginar o nascimento de uma sociedade de informação, que consistiria na superação da modernidade ou na exacerbação de características já presentes nela. Não são poucos os teóricos que, desde o século passado, lançam suas análises sobre a nova configuração do mundo a fim de encontrar respostas para onde iremos. Bell (1977)Bell, Daniel. (1977). O advento da sociedade pós-industrial: uma tentativa de previsão social. São Paulo: Abril Cultural., Castells (1999)Castells, Manuel. (1999). A sociedade em rede. São Paulo: Paz e Terra., Bauman (1999), Kumar (1997)Kumar, Krishan. (1997). Da sociedade pós-industrial à pós-moderna: novas teorias sobre o mundo contemporâneo. Rio de Janeiro: Zahar. e Albrow (1997)Albrow, Martin. (1997). The global age: state and society beyond modernity. Stanford: University of California Press. debatem, a partir de pontos de vista diferentes, sobre a emergência da sociedade pós-moderna, ou tardia, ou pós-industrial, ou ainda de informação. É claro que cada abordagem guarda em si especificidades, pois cada autor expõe suas filiações teóricas e leituras de influência; entretanto, é possível encontrar um denominador comum entre tais perspectivas: a ideia de que passamos por um momento de transição entre uma forma de organização do mundo, para outra, na qual os dispositivos de comunicação (e consequentemente de interação) foram modificados diante da ruptura espaço-tempo promovida pelas novas tecnologias.

Um desses processos de mudança foi o que chamo aqui de capitalização do ambiente da livraria (a sua integração à indústria e à produção de massa) que veio influenciar de forma decisiva o trabalho do livreiro. Tais mudanças comprometeram sua capacidade de dar uma resposta satisfatória a uma demanda social. Logo, o aumento da complexidade das organizações trouxe para o interior das livrarias relações cada vez mais impessoalizadas e mais mediadas por controles gerenciais e procedimentos padronizados, afastando o livreiro da ponta de sua atividade, o convívio diário com o cliente.

A já mencionada separação entre as profissões do livro - editor, livreiro e impressor - tornou mais segmentada a cadeia produtiva, o que levou à incorporação de novas etapas na fabricação. Antes, no início do século passado, tudo estava localizado no mesmo local: na parte da frente do estabelecimento ficava a loja; no meio, ou no segundo andar, o escritório, onde o livreiro-editor recebia escritores e textos a publicar; e nos fundos, ou no anexo, estava a gráfica. O desenvolvimento tecnológico que favoreceu a produção em larga escala inviabilizou a proximidade, antes conveniente, de cada etapa. Era preciso mais espaço para as máquinas, os editores não tinham mais disponibilidade para ficar no atendimento e o livreiro sem tempo para ler os originais. Some-se a isso a maior capilaridade do mercado, com o crescimento de outras cidades e, consequentemente, a inclusão de canais de circulação do livro, que implicou a entrada de mais um agente na cadeia, o distribuidor. Antes, as tiragens eram de três mil cópias, agora, os best-sellers podem chegar a 8,5 milhões de exemplares.10 10 Número de cópias do livro Harry Potter e a Ordem da Fênix, nos Estados Unidos. No Brasil, o último livro de Thalita Rebouças, considerada uma autora de sucesso no segmento infanto-juvenil, saiu com tiragem de 30 mil exemplares, com o título Ela disse, ele disse. É preciso espaço, pessoal e logística para fazer esse mercado funcionar.

Esse é um panorama do setor, que ficou mais complexo, mas os efeitos também podem ser sentidos dentro da livraria, com alteração no trabalho de catalogação de livro. Tal processo implicou o abandono da referência do livreiro como peça fulcral na venda do livro. Antes, para se encontrar uma obra em um estabelecimento era preciso contar com a memória do livreiro. Ele sabia como e onde estavam os títulos e a temática que abordavam, afinal nem sempre o comprador sabia (sabe) exatamente o que quer. Em um segundo momento, com o próprio crescimento das livrarias, recorreu-se ao manuseio de fichas de papel, que continham informações sobre autor, livro e estoque. Confeccionadas pelos livreiros, dela fizeram uso funcionários e mesmo clientes (Gonçalves, 2007-2008Gonçalves, Carlos. (2007-2008). Análise sociológica das profissões: principais eixos de desenvolvimento. Revista da Faculdade de Letras, 17-18, p. 177-224.). Depois, surgiram os catálogos das editoras, onde apareciam relacionadas novas e antigas publicações. O passo seguinte foi a informatização de todo o processo, com os bancos de dados dos computadores, que permitem acessar não só o livro desejado, mas boa parte do acervo. E, por fim, o que vemos hoje, a utilização do computador com as informações sobre toda a rede de lojas, como também onde localizar o livro no mundo, com o acesso pela internet.

A alteração na forma de catalogar o livro, ou seja, de organizá-los nas prateleiras, feita de forma particular por cada livreiro, foi aos poucos sendo substituída por uma sistematização de padrão internacional de inventariar a produção editorial, a cargo dos bibliotecários e, mais recentemente, também pela ciência da informação.

A perda dessa autonomia teve um impacto sobre a função do livreiro na cadeia produtiva. A evolução na indexação o desloca da posição de referência para um ponto auxiliar, de apenas entregar o produto. Ele perde o papel de indexador. Portanto, um dos eixos que permitiam a ele criar uma estratégia de afastamento do comércio, do lucro, perde conteúdo, levando o livreiro a se dissociar ainda mais da imagem intelectual, construída para o editor, e restando apenas a faceta comerciante.

CONCLUSÃO

Longe de pretender esgotar as discussões que envolvem os impactos dos processos globalizantes sobre as profissões e, menos ainda, limitar a análise aqui proposta à leitura sobre os critérios de formação dos grupos, as questões expostas buscam trazer para o debate como alterações macroestruturais impelem coletividades a desenvolverem estratégias de ressignificação social e alternativas de conformação e passagem do conhecimento que as permitam não só sobreviver, como se dissociar do capitalismo e se associar a temas colocados como bem comum (Weber, 1994Weber, Max. (1994). Economia e sociedade. Brasília: Ed. Unb (Vol. 1).), como a cultura.

No plano microssociológico, os livreiros particularizam o modo como operam seus negócios, abertos apenas para aqueles que nele estão inseridos. Ao manter o aprendizado in loco sob o olhar e guia de um mestre-livreiro, eles se afastam da organização burocrática e, anacronicamente, reafirmam um modelo tradicional de passagem do conhecimento. Fora da livraria, tal estratégia não parece resistir à concorrência, nem mesmo aos avanços tecnológicos. A característica definidora do saber do grupo, a indexação, concorre com fontes alternativas de conhecimento e filtragem, que colocam em xeque a utilidade social dos livreiros como fornecedores de informação, e mesmo, como intermediários culturais.

Portanto, para o grupo a contradição não está apenas na dupla matriz do produto que comercializam, o livro, mas na própria natureza organizacional de seu campo de atuação: personalizado na reprodução do conhecimento e impessoalizado e racional na gestão do negócio. É no equacionamento desta dualidade que reside a sobrevivência social dos livreiros.

NOTAS

  • 1
    Os dados aqui apresentados integram a tese de doutorado sobre o tema, defendida em 2011, O livreiro e a lida com o (re)conhecimento: um estudo sobre identidade profissional. A pesquisa de campo ouviu 15 livreiros, no Rio de Janeiro, entre 2009 e 2010.
  • 2
    Não ignoro que existe uma larga discussão na literatura sobre Sociologia das Profissões que pontuam as diferenças conceituais entre profissão e ocupação; entretanto, para este artigo não irei me deter nesse debate por dois motivos: 1) a dicotomia profissão/ocupação é tributária de uma herança funcionalista que não considerou o universo das atividades produtivas ao restringir a análise às ocupações clássicas e/ou associadas às elites, como Medicina e Direito e; 2) por considerá-lo superado, no sentido de que outros pesquisadores já oferecem definições e esclarecimentos que permitem seguir além do debate nos trabalhos de campo. Tal discussão extrapola o objetivo deste artigo, que é mostrar a construção de grupo que compartilha de uma mesma atividade produtiva aprendida na prática. Para saber mais sobre tais discussões, ver Abbott (1988), Freidson (1986) e Larson (1977).
  • 3
    No Brasil, de acordo com dados publicados no Diagnóstico do setor livreiro (2009), levantamento realizado pela Associação Nacional de Livrarias (ANL), existem 2.980 livrarias em funcionamento no Brasil, o que mostra um aumento de 11%, na comparação com o levantamento anterior, de 2006. Já para o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (Munic, 2009), estão em funcionamento 1.557 livrarias no território nacional, isto é, quase metade do aferido pela ANL. A diferença é resultado do entendimento que cada instituição tem do que caracteriza uma livraria. A definição adotada pela associação é mais abrangente, incluindo todos os estabelecimentos que comercializam livros, mas não exclusivamente este bem. Outros produtos negociados podem ser artigos de papelaria (34% delas), de música (CD e DVD, 53%), de informática e eletrônicos (24%) e brinquedos (18%). A empresa pode inclusive vender esses artigos como principais e ter como produto secundário um acervo de livros. Esses estabelecimentos são considerados livrarias pela ANL, que vê o local não apenas como uma papelaria ou loja de discos. Se levarmos em consideração o total de municípios brasileiros, 5.566, veremos que, apesar de o consumo de livros acontecer de forma preferencial na livraria, tais estabelecimentos ainda são poucos no país, sendo, portanto, a figura do livreiro uma referência nem sempre fácil.
  • 4
    São comuns na Feira de Frankfurt os leilões pelos direitos autorais de novos textos de escritores já consagrados. "O americano Nicholas Sparks, 45, é referência desse filão. Tanto que é personagem de um leilão disputado por editoras brasileiras durante a última Feira de Frankfurt. Venceu o grupo Sextante, que é dono do próximo livro, The best of me (O melhor de mim). Lançado neste mês nos EUA, sai aqui em 2012. Há ainda três por escrever e quatro antigos inéditos por aqui. Diz-se que o negócio chegou a US$ 2 milhões, mas as partes não confirmam a cifra. A Novo Conceito, que tornou Sparks um sucesso, mas perdeu a briga, ainda tem três títulos para editar, sendo dois para 2012. Cinco continuam no catálogo até 2017" . Ver "Editoras emplacam best-sellers de amor" (Folha de S. Paulo, 29 de setembro de 2011). Disponível em <http://www.folha.uol.com.br/ilustrada/998651-editoras-emplacam-best-sellers-de-amor.shtml>.
  • 5
    E aqui se apresenta uma das diferenças entre eles e o campo da biblioteconomia: estes não têm como premissa vender o produto, mas ordená-lo de forma a ser mais facilmente encontrado ou mesmo preservado no futuro. A biblioteconomia, que hoje está mais próxima da ciência da informação do que do mercado de livros, é uma área do conhecimento especializada em pesquisar, desenvolver e utilizar os melhores métodos para tratar a informação, visando às suas recuperação e disseminação. Para o livreiro, manter um livro na estante é prejuízo - sua excelência está em encontrar o livro certo para cada comprador.
  • 6
    Tal recurso, aqui nomeado de indexação, não apareceu claramente definido nas entrevistas, e sequer foi assim nomeado. O ato de indexar como a chave da profissão, como a expertise do livreiro, é uma definição construída na pesquisa, extraída da análise do campo, fruto da interpretação daquilo que nos "fala" o objeto.
  • 7
    Existe uma tradição na Sociologia do Trabalho de diferenciação entre formação e qualificação. Não pretendo me aprofundar nela, pois fugiria ao escopo deste trabalho, mas para melhor entendimento, a formação refere-se a um processo prolongado de estudos, que se traduziria em um diploma. Já a qualificação seria um processo de curta ou média duração, pontual, que uniria experiência e educação.
  • 8
    Com o objetivo de preservar a identidade daqueles que participaram da pesquisa, apresento os depoimentos acompanhados das palavras Livreiros A, B, ou C (e assim por diante) para designar os entrevistados.
  • 9
    Um exemplo disso aconteceu durante a ditadura militar, quando algumas livrarias foram vendidas, pois os donos foram perseguidos ou não conseguiram mais financiamentos para se manterem no mercado.
  • 10
    Número de cópias do livro Harry Potter e a Ordem da Fênix, nos Estados Unidos. No Brasil, o último livro de Thalita Rebouças, considerada uma autora de sucesso no segmento infanto-juvenil, saiu com tiragem de 30 mil exemplares, com o título Ela disse, ele disse.

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    Jul-Dec 2013

Histórico

  • Recebido
    07 Maio 2012
  • Aceito
    20 Ago 2012
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