Parâmetros e tipos de avaliação da disartria na esclerose lateral amiotrófica

RESUMO

Objetivo

identificar estudos a respeito dos parâmetros e dos tipos de avaliação utilizados para avaliar a disartria na esclerose lateral amiotrófica (ELA).

Estratégia de pesquisa

estudo de revisão integrativa da literatura realizada nas bases de dados LILACS, SciELO, PubMed, Web of Science, CINAHL, Scopus e Cochrane, por meios dos descritores, em português e em inglês, “Avaliação AND Disartria AND Esclerose Lateral Amiotrófica”.

Critérios de seleção

os critérios de inclusão foram: artigos que abordavam estudos sobre avaliação da disartria na ELA, nas línguas inglesa, espanhola e portuguesa, disponíveis na íntegra, no período de 2015 a 2022.

Resultados

do total de 38 estudos, apenas 3 usaram um único tipo de avaliação da disartria. A maior parte dos estudos utilizou mais de um tipo de avaliação variando de 2 a 4. Foram 3 os tipos de avaliação mais utilizados, com o intuito de avaliar o grau de inteligibilidade de fala: avaliação perceptivo-auditiva (31 estudos), avaliação acústica (18 estudos) e avaliação do movimento (27 estudos).

Conclusão

a avaliação da disartria na ELA é realizada por diferentes procedimentos e com vários parâmetros de análise, em especial pela avaliação perceptivo-auditiva e do movimento.

Palavras-chave:
Esclerose lateral amiotrófica; Avaliação; Disartria; Inteligibilidade da fala; Medida da produção da fala; Acústica da fala

ABSTRACT

Purpose

to identify studies regarding the parameters and types of assessment used to evaluate dysarthria in amyotrophic lateral sclerosis (ALS).

Research strategy

an integrative literature review study was conducted on the LILACS, SciELO, PubMed, Web of Science, CINAHL, Scopus, and Cochrane databases using the descriptors “Assessment AND Dysarthria AND Amyotrophic Lateral Sclerosis” in both Portuguese and English.

Selection criteria

the inclusion criteria consisted of articles that addressed studies on dysarthria assessment in ALS, written in English, Spanish, and Portuguese, which should be available in full, and published from 2015 to 2022. Results: out of the total of 38 studies, only 3 used a single type of dysarthria assessment. Most studies employed more than one type of assessment, ranging from 2 to 4 types. Three assessment types were predominantly used to assess the degree of speech intelligibility: auditoryperceptual assessment (31 studies), acoustic assessment (18 studies), and movement assessment (27 studies).

Conclusion

dysarthria assessment in ALS is conducted through various procedures and with multiple analysis parameters, notably through auditory-perceptual and movement assessments.

Keywords:
Amyotrophic lateral sclerosis; Assessment; Dysarthria; Speech intelligibility; Speech production measurement; Speech acoustics

INTRODUÇÃO

A esclerose lateral amiotrófica (ELA) é uma doença neuromuscular degenerativa que acomete neurônios motores superiores e/ou inferiores. É considerada uma doença rara e atinge duas a cada 100.000 pessoas ao ano, sendo o gênero masculino mais afetado que o feminino, com proporção de 2:1 e a média de idade de acometimento é de 57 anos(¹-³).

Devido à desordem neuromuscular, os pacientes com ELA apresentam declínios multidimensionais, entre eles, as alterações na fala, que, geralmente, se caracterizam pela presença de lentidão, fraqueza, imprecisão articulatória e incoordenação do sistema estomatognático(⁴). Assim, a comunicação por meio da fala fica comprometida, ocorrendo a disartria, definida como um distúrbio que acomete as bases motoras da fala: respiração, fonação, ressonância, articulação e prosódia(⁵).

A disartria pode estar presente em várias doenças e ocorre devido a uma lesão no sistema nervoso central ou periférico(⁶). É classificada como: flácida (associada ao comprometimento do neurônio motor inferior); espástica (associada a lesões nos neurônios motores superiores); atáxica (causada por disfunção cerebelar); hipocinética (relacionada a um distúrbio do sistema extrapiramidal) e mista (associada a danos em mais de uma área, resultando em, ao menos, duas características entre as supracitadas)(⁷).

Na ELA, a disartria pode ocorrer com características espásticas ou flácidas, os pacientes geralmente apresentam deficiência na articulação, fala lenta e laboriosa, produção consonantal imprecisa, hipernasalidade e aspereza(⁸). No entanto, seja disartria espástica ou flácida, os pacientes com ELA que apresentam esse quadro têm um comprometimento considerável na comunicação(⁹).

Devido a esses impactos na comunicação, é importante dar atenção à inteligibilidade de fala - a facilidade com que um ouvinte é capaz de compreender a fala de seu interlocutor -, realizando avaliações periódicas, bem como propor intervenções para prevenir o isolamento comunicativo, inclusive com os familiares e cuidadores(¹⁰).

A ELA ainda não tem cura e seu diagnóstico é lento, leva em torno de 12 meses para ser definido e isso ocorre porque ainda não existe um marcador que possa sinalizar um diagnóstico mais precoce(¹). Apenas os exames neurológicos e os testes básicos de fala, como taxa de fala e inteligibilidade, não são avaliações sensíveis aos sintomas das fases iniciais da doença(¹¹). Por isso, algumas pesquisas têm se empenhado na busca desse marcador, com o intuito de realizar um monitoramento e tomadas de decisões para intervenções mais rápidas e eficazes(¹²).

Essa lentidão no diagnóstico pode comprometer a mobilidade, deglutição, fala e comunicação do paciente, comprometendo a qualidade de vida e trazendo prejuízos biopsicossociais(¹³-¹⁵). Assim, é necessário intervir com o acompanhamento de uma equipe multiprofissional, que trabalhará de forma interdisciplinar, com o intuito de promover o máximo possível de qualidade de vida para o paciente e para seus familiares, por meio de orientações sobre os cuidados adequados para lidar com toda a situação(⁹,¹⁶). No tocante à disartria, cabe ao fonoaudiólogo detectar, avaliar e intervir com base nos pilares da evidência científica, em tempo hábil e de maneira eficaz, evitando, assim, a perda da autonomia de comunicação do paciente(¹⁷).

Destarte, considerando as características específicas da ELA e o impacto negativo na função da fala, gerando prejuízos na comunicação e qualidade de vida dos indivíduos acometidos, justifica-se a relevância de realizar um estudo que sintetize os parâmetros e os tipos de avaliação da disartria, que poderá servir de suporte para as condutas oferecidas a esse público.

OBJETIVO

Identificar estudos a respeito dos parâmetros e dos tipos de avaliação utilizados para avaliar a disartria na ELA.

ESTRATÉGIA DE PESQUISA

Trata-se de um estudo de revisão integrativa da literatura, que é uma ferramenta relevante no campo da saúde, pois sintetiza as pesquisas disponíveis sobre determinada temática e direciona a prática pautada no conhecimento científico(¹⁸). Para conduzir esta revisão, buscaram-se artigos que respondessem à seguinte pergunta: “Quais os tipos de avaliação e parâmetros utilizados para avaliar a disartria decorrente da ELA?” Para isso, foram realizadas as seguintes etapas: preparação da pergunta condutora, definição dos descritores, seleção dos critérios de inclusão e exclusão dos artigos, coleta dos artigos, aplicação critérios de elegibilidade, leitura dos títulos e resumos e leitura dos artigos.

As bases consultadas foram: LILACS, SciELO, PubMed, Web of Science, CINAHL, Scopus e Cochrane, usando os descritores “Evaluation AND Dysarthria AND Amyotrophic Lateral Sclerosis”, “Assessment AND Dysarthria AND Amyotrophic Lateral Sclerosis”, “Avaliação AND Disartria AND Esclerose Lateral Amiotrófica”, direcionados conforme a pergunta de pesquisa.

CRITÉRIOS DE SELEÇÃO

Na busca, foram incluídos artigos científicos publicados em inglês, português e espanhol, entre 2015 e 2022, que estivessem disponíveis gratuitamente nas bases de dados. Foram excluídos artigos de revisão de literatura de qualquer tipo, editoriais, cartas ao editor e anais de eventos, assim como estudos nos quais, embora os participantes da pesquisa apresentassem disartria, não tinham ELA.

ANÁLISE DOS DADOS

Após a realização das estratégias de pesquisa e obtenção dos estudos para compor a revisão da literatura, os artigos foram lidos na íntegra e alguns dados foram extraídos e alocados em planilha eletrônica digital. Foram analisados os seguintes dados dos artigos: objetivo, amostra, instrumentos utilizados para avaliar disartria, tipo de análise e de estudo e os principais resultados.

RESULTADOS

Como primeiro resultado da busca em todas as bases, encontrou-se um total de 973 artigos, conforme mostra o Quadro 1.

Quadro 1
Número de artigos encontrados nas bases de dados em função dos descritores utilizados na pesquisa bibliográfica

DESCRITORES	LILACS	SciELO	PubMED	Web of Science	CINAHL	Scopus	Cochrane
Evaluation AND Dysarthria AND Amyotrophic Lateral Sclerosis	1	1	456	13	14	2	0
Assessment AND Dysarthria AND Amyotrophic Lateral Sclerosis	0	1	441	32	10	1	0
Avaliação AND Disartria AND Esclerose Lateral Amiotrófica	0	1	0	0	0	0	0
Total = (973)	1	3	897	45	24	3	0

A seleção inicial dos artigos baseou-se na leitura do título e resumo, a partir da qual, considerando os critérios de inclusão, foram selecionados 45 artigos para leitura do texto completo. Após a leitura completa, restaram 38 artigos que obedeciam ao escopo estabelecido para o trabalho, conforme fluxograma apresentado na Figura 1.

Figura 1
Fluxograma de seleção dos artigos incluídos em revisão integrativa da literatura sobre os tipos de avaliação e instrumentos utilizados para avaliar a disartria decorrente da esclerose lateral amiotrófica

Entre os estudos encontrados, apenas 2 eram da literatura nacional, representando 5,2% da amostra, sendo os outros 36 (94,7%) da literatura internacional: 23 (60,5%) dos Estados Unidos (EUA), 3 (7,8%) do Canadá, 2 (5,2%) da Finlândia, 1 (2,6%) da Itália, 1 (2,6%) da Polônia, 1 de Genebra (2,6%) e 5 realizados em conjunto com os EUA e Canadá (13,1%).

Quanto à abordagem das pesquisas, verificou-se que, das 38 publicações selecionadas, 2 foram qualiquantitativas(¹⁹,²⁰) e as demais foram quantitativas. A estatística utilizada variou em função de cada estudo, havendo estudos com análise estatística descritiva e inferencial.

O tamanho da amostra total dos estudos foi de 1619 participantes, variando de 10 a 147, com média de 41,02 participantes por estudo. A média de idade dos grupos de estudo foi de 60 anos, sendo que 2 artigos não usaram média de idade e sim faixa de idade(²⁰,²¹). Com relação ao gênero, houve predomínio de participantes do masculino, com 690, e o feminino com 438. Um estudo não especificou a idade ou o gênero(²²).

Com relação ao tipo de estudo, 13 foram longitudinais, 24 transversais e 1 estudo transversal com uma parte da amostra longitudinal(²³).

Para avaliação da disartria na ELA, foram 3 os tipos de avaliação mais utilizados nos estudos pesquisados: avaliação perceptivo-auditiva (31), avaliação acústica (18 estudos) e avaliação do movimento (27 estudos), todas com o intuito de avaliar o grau de inteligibilidade de fala (Quadro 2). Todos os 38 estudos encontrados nas bases de dados utilizaram mais de um tipo de avaliação, variando de 2 a 4.

Quadro 2
Análise dos artigos utilizados na revisão

ARTIGOS ANALISADOS NA REVISÃO
AVALIAÇÃO DA DISARTRIA NA ESCLEROSE LATERAL AMIOTRÓFICA
Makkonen et al.(19)	Rong & Green(24)	Wang et al.(25)
Chiaramonte et al.(20)	Makkonen et al.(26)	Rong et al.(21)
Berry et al.(27)	Pawlukowska et al.(28)	Yunusova et al.(29)
Allison et al.(30)	Lee et al.(31)	Rong et al.(32)
Kuruvilla-Dugdale & Chuquilin-Arista(33)	Rong(34)	Leite & Constantini(35)
Green et al.(36)	Lee et al.(37)	Leite et al.(38)
Rong et al.(39)	Eshghi et al.(40)	Tanchip et al.(41)
Kuruvilla-Dugdale et al.(42)	Shellikeri et al.(23)	Shellikeri et al.(43)
Lee et al.(44)	Searl et al.(45)	Lancheros et al.(46)
Stipancic et al.(22)	Bandini et al.(47)	Stipancic et al.(48)
Lee & Bell(49)	Allison et al.(50)	Gutz et al.(51)
Lee et al.(52)	Kuruvilla-Dugdale & Mefferd(53)	Eshghi et al.(54)
	Wang et al.(55)	Kim et al.(56)
VARIÁVEIS OBTIDAS NOS ESTUDOS
LONGITUDINAL	TRANSVERSAL
Makkonen et al.(19)	Allison et al.(30)	Eshghi et al.(40)
Chiaramonte et al.(20)	Kuruvilla-Dugdale & Chuquilin-Arista(33)	Shellikeri et al.(23)
Berry et al.(27)	Green et al.(36)	Searl et al.(45)
Rong et al.(39)	Kuruvilla-Dugdale et al.(42)	Allison et al.(50)
Stipancic et al.(22)	Lee et al.(44)	Kuruvilla-Dugdale & Mefferd(53)
Shellikeri et al.(23)	Lee & Bell(49)	Yunusova et al.(29)
Bandini et al.(47)	Lee et al.(52)	Leite & Constantini(35)
Wang et al.(55)	Rong & Green(24)	Leite et al.(38)
Wang et al.(25)	Makkonen et al.(26)	Shellikeri et al.(43)
Rong et al.(21)	Pawlukowska et al.(28)	Lancheros et al.(46)
Rong et al.(32)	Lee et al.(31)	Eshghi et al.(54)
Tanchip et al.(41)	Rong(34)	Kim et al.(56)
Stipancic et al.(48)	Lee et al.(37)
Gutz et al.(51)
ANÁLISE PERCEPTIVO-AUDITIVA	ANÁLISE ACÚSTICA	ANÁLISE DO MOVIMENTO
Makkonen et al.(19)	Chiaramonte et al.(20)	Makkonen et al.(19)
Chiaramonte et al.(20)	Green et al.(36)	Chiaramonte et al.(20)
Berry et al.(27)	Rong et al.(39)	Kuruvilla-Dugdale & Chuquilin-Arista(33)
Allison et al.(30)	Lee et al.(44)	Rong et al.(39)
Green et al.(36)	Lee et al.(31)	Lee et al.(44)
Rong et al.(39)	Rong(34)	Lee & Bell(49)
Kuruvilla-Dugdale et al.(42)	Searl et al.(45)	Lee et al.(52)
Lee et al.(44)	Bandini et al.(47)	Rong & Green(24)
Stipancic et al.(22)	Allison et al.(50)	Makkonen et al.(26)
Lee & Bell(49)	Kuruvilla-Dugdale & Mefferd(53)	Pawlukowska et al.(28)
Lee et al.(52)	Wang et al.(55)	Lee et al.(31)
Makkonen et al.(26)	Wang et al.(25)	Rong (34)
Pawlukowska et al.(28)	Rong et al.(32)	Lee et al.(37)
Eshghi et al.(40)	Tanchip et al.(41)	Eshghi et al.(40)
Shellikeri et al.(23)	Shellikeri et al.(43)	Shellikeri et al.(23)
Bandini et al.(47)	Lancheros et al.(46)	Searl et al.(45)
Allison et al.(50)	Gutz et al.(51)	Bandini et al.(47)
Kuruvilla-Dugdale & Mefferd(53)	Eshghi et al.(54)	Allison et al.(50)
Wang et al.(55)		Kuruvilla-Dugdale & Mefferd(53)
Wang et al.(25)		Wang et al.(55)
Rong et al.(21)		Wang et al.(25)
Yunusova et al.(29)		Rong et al.(21)
Rong et al.(32)		Rong et al.(32)
Leite & Constantini(35)		Tanchip et al.(41)
Leite et al.(38)		Shellikeri et al.(43)
Tanchip et al.(41)		Lancheros et al.(46)
Shellikeri et al.(43)		Kim et al.(56)
Lancheros et al.(46)
Stipancic et al.(48)
Gutz et al.(51)
Eshghi et al.(54)

Os estudos encontrados nas bases de dados, que utilizaram a análise perceptivo-auditiva, obtiveram seus resultados através das medidas de inteligibilidade de fala, consideradas de particular importância no diagnóstico diferencial e quantificação de disartria(²⁶,⁴²). A análise da inteligibilidade de fala foi relatada com frequência nos artigos, pois é uma medida da percepção da fala pelo ouvinte. É calculada por meio da porcentagem de palavras transcritas corretamente do número total de palavras produzidas(⁴²).

A taxa de fala foi uma das medidas utilizadas para avaliar a inteligibilidade de fala e verifica a quantidade de palavras lidas por minuto. O valor de referência é de 150 palavras por minuto e, quando rebaixado, indica comprometimento bulbar e deterioração da fala(²²,⁵⁰,⁵³,⁵⁵).

A extensão da frase foi outra medida utilizada para avaliar a inteligibilidade de fala(³⁰). É realizada por meio da leitura de frases em ordem crescente de extensão (de 5 a 15 palavras), por meio das quais se calcula o percentual de inteligibilidade de cada frase(³⁰,⁴⁶).

A análise de pausa da fala também foi uma das medidas úteis para descrever o desempenho de fala do indivíduo, a partir da qual podem-se obter informações importantes referentes ao início do comprometimento bulbar e acompanhar o curso da doença(²⁷,²⁹,³⁰,³⁶,⁵⁰).

Um número significativo dos estudos utilizou a análise acústica para avaliação da disartria na ELA(²⁰,²⁵,³⁶,³⁹,⁴¹,⁴³-⁴⁷,⁵⁰,⁵³,⁵⁵). A análise acústica é um método objetivo, que, por meio do processamento de sinais e algoritmos, é capaz de obter o traçado do formato da onda sonora, medidas de perturbação, como jitter e shimmer e relação harmônico-ruído, como também analisar a frequência fundamental, permitindo descrever quase completamente a voz humana, auxiliando na compreensão de vozes normais e patológicas(²¹,³²,³⁹,⁵⁵).

Além dos parâmetros descritos, a análise acústica, na avaliação da disartria na ELA, permitiu descrição do voice onset time e formantes das vogais, frequência fundamental e variabilidade temporal ciclo a ciclo(³¹,³²,⁴⁴,⁵³).

Uma das possibilidades de análise de movimento é por meio da articulografia, na qual os movimentos orofaciais são registrados através de um articulógrafo eletromagnético 3D(²⁴,³³,³⁹,⁴⁴,⁴⁹,⁵²). Os sensores de captação de movimento são fixados em regiões estratégicas, como lábios, língua e mandíbula e, geralmente, um é fixado na testa para criar um sistema de coordenadas e expressar o movimento de cada um dos outros sensores(²⁴,³³,³⁹,⁴⁴,⁴⁹,⁵²).

Para a análise de movimento, uma das medidas utilizadas foi a taxa de movimentos articulatórios da língua, lábio inferior e mandíbula(³³,⁴⁷,⁴⁹,⁵²). A outra medida foi a diadococinesia, que avalia o planejamento motor da fala, detecta déficits oromotores, inclusive leves, que ocorrem devido à disfunção bulbar(³⁴,³⁹,⁴¹,⁴³,⁵⁰). É realizada por meio da emissão das sílabas /pa/, /ta/, /ka/(³⁴,³⁹). A Taxa de Movimentos Alternados (Alternating Motion Rate - AMR) também foi utilizada nos estudos(²¹,³²,⁴⁰). É um procedimento em que o paciente produz uma sílaba o mais rápido possível, numa única respiração(²¹,³²,⁴⁰). A Figura 2 sintetiza as principais medidas utilizadas na avaliação da disartria na ELA, discutidas nos estudos desta revisão.

Figura 2
Esquema demonstrativo das principais medidas utilizadas na avaliação da disartria na esclerose lateral amiotrófica

Além das avaliações supracitadas, as pesquisas utilizaram a Amyotrophic Lateral Sclerosis Functional Rating Scale - Revised (ALSFRS-R), que foi correlacionada com os resultados das análises perceptivo-auditiva, do movimento e acústica(²¹-²³,²⁷,³⁸-⁴⁰,⁴⁷,⁴⁹,⁵⁰,⁵²). A ALSFRS-R é um questionário composto por 12 questões que abrangem o domínio bulbar, a coordenação motora dos músculos menores e maiores e a função respiratória(²¹-²³,²⁷,³⁸-⁴⁰,⁴⁷,⁴⁹,⁵⁰,⁵²).

Os estudos que analisaram a taxa de movimentos articulatórios da língua, lábio inferior e mandíbula concluíram que, nos indivíduos com disartria severa, quando a taxa de movimento articulatório e o espaço articulatório da língua diminuem, o lábio inferior e a mandíbula aumentam seus movimentos, pois a mandíbula tenta compensar a redução do movimento da língua para manter uma fala inteligível(³³,⁴⁷,⁴⁹,⁵²,⁵³).

A diadococinesia mostrou-se um indicador sensível de declínio bulbar inicial e a a taxa de movimentos alternados permite uma avaliação multifacetada da capacidade motora, pois envolve o sistema neuromotor nos domínios espacial e temporal(³⁴,³⁹,⁴¹,⁴³,⁵⁰). Os pacientes tiveram a capacidade reduzida para fazer os ajustes articulatórios, pois apresentaram déficits neurológicos subjacentes(³⁴,³⁹,⁴¹,⁴³,⁵⁰).

Os parâmetros da inteligibilidade e taxa de fala são importantes para determinar o grau de comprometimento da fala. As medidas quantitativas dos subsistemas da fala capturaram que a disfunção articulatória e fonatória foram afetadas antes da presença de déficits de inteligibilidade da fala e da redução substancial da taxa de fala(²⁶,²⁹,³¹,³⁹,⁴²,⁴⁴,⁵⁵). A diminuição da taxa de fala em 120 palavras por minuto marca o início do declínio da inteligibilidade na comunicação oral(⁴⁸).

As deficiências articulatórias, incluindo velocidade reduzida de movimento dos lábios e mandíbula e taxa reduzida de diadococinesia, bem como deficiências fonatórias e a faixa reduzida de frequência fundamental, serviram como indicadores sensíveis do declínio bulbar precoce(²⁴,²⁸,³³,³⁴,³⁷,³⁹,⁴⁰,⁴⁷,⁴⁹,⁵²).

Os estudos mostraram, ainda, que houve interferência da extensão da sentença. A inteligibilidade de fala diminuiu significativamente em sentenças mais longas para os falantes com sintomas de disartria mais graves(²²,³⁰,⁴⁶). Já os falantes com disartria de leve a moderada mostraram declínios significativos na taxa de fala e na pausa durante a fala(²⁷,²⁹,³⁰,³⁶,⁵⁰).

Os estudos que utilizaram a análise obtida por programas automatizados, que estimam algoritmicamente a taxa de fala e a análise de pausas, detectaram que quanto mais avançado o grau da disartria, maiores são as pausas que o locutor faz, interferindo diretamente na inteligibilidade de fala(²⁹,³⁶,⁴¹,⁵⁶).

A avaliação acústica, por sua vez, revelou que diversas alterações nos parâmetros avaliados possibilitaram a identificação e acompanhamento da evolução da disartria na ELA(³⁴,⁴³,⁵³,⁵⁴).

Por fim, quando correlacionadas característica temporais da análise acústica (variabilidade temporal ciclo a ciclo) com análise de movimento (taxa de movimentos alternados e frequência do movimento) surgiram resultados com maior precisão diagnóstica(³⁴,⁵³). Entre todas as medidas de diadococinesia acústica e cinemática, a variabilidade temporal ciclo a ciclo apresentou a maior precisão diagnóstica, com sensibilidade de 80% e especificidade de 94%, para diferenciar indivíduos com ELA de indivíduos-controle saudáveis, sugerindo que os déficits de controle temporal, podem ser sinais bulbares iniciais subclínicos na ELA(³⁴).

DISCUSSÃO

A avaliação no processo de diagnóstico da disartria em decorrência da ELA é um procedimento de extrema relevância, pois, a partir do resultado, dar-se-á início às possíveis intervenções e monitoramento da evolução da doença. Por isso, este estudo buscou identificar, por meio de uma revisão integrativa, os tipos de avaliação e os parâmetros utilizados.

A maior parte dos estudos foi do tipo quantitativo. Nos tipos de avaliação utilizados, prevalecem medidas objetivas, o que está em consonância com a literatura da área, pois a análise quantitativa visa enumerar e medir eventos de forma objetiva e precisa(⁵⁷).

Observou-se que grande parte dos estudos teve um número reduzido de participantes, variando de 10 a 147 pessoas. Tal fato deve-se às características da ELA, pois os pacientes, por apresentarem uma vulnerabilidade significativa, têm dificuldade em participar das pesquisas. Como referido em um estudo(¹⁷), há também um tempo de sobrevida limitado que pode interferir na participação.

A média de idade dos participantes foi de 60 anos, dado confirmado pela literatura, que mostra que a idade do diagnóstico e dos primeiros sintomas é de 58 a 60 anos(⁵⁸,⁵⁹). Quanto ao gênero, o masculino foi mais atingido (56,4%), o que se coaduna com os achados de outros estudos(¹).

A pesquisa identificou que a avaliação perceptivo-auditiva, a avaliação acústica e a avaliação do movimento, todas com o intuito de avaliar o grau de inteligibilidade de fala, foram os principais tipos de avaliação. Elas geram medidas que, quando correlacionadas entre si ou com outros instrumentos, fornecem informações relevantes sobre a existência ou não da disartria na ELA. Tais achados também são relatados na literatura da área. Autores(⁶⁰) afirmam que uma avaliação de fala é composta por avaliação motora da fala, triagem dos subsistemas da fala, avaliação perceptivo-auditiva e avaliação da inteligibilidade; a maioria desses procedimentos se sobrepõe, pois a disartria, na ELA, afeta todos os subsistemas da fala.

Na análise perceptivo-auditiva, foi avaliada a inteligibilidade e a taxa de fala, porque são medidas fundamentais para avaliar a disartria na ELA. A inteligibilidade de fala é uma medida bastante utilizada clinicamente, pois mostra a funcionalidade da fala ou a limitação; também serve para documentar a eficácia de alguma intervenção(⁶¹).

A taxa de fala é uma medida que está diretamente relacionada com a inteligibilidade, pois é afetada antes; ela diminui linearmente com a progressão da doença. Isso ocorre devido a uma compensação motora que o paciente com ELA faz para manter a fala inteligível(⁶²). Como a inteligibilidade e a taxa de fala reduzidas são consequências quase universais da disartria e também na ELA, é imperativo que os fonoaudiólogos tenham as ferramentas disponíveis para avaliar adequadamente essas características(⁶⁰).

A extensão da frase também foi usada como forma de avaliar a inteligibilidade de fala dos pacientes com ELA. Quanto maior a frase, mais ininteligível a fala, pois o paciente necessita realizar mais ajustes motores e compensações para manter a inteligibilidade, acarretando pausas maiores durante a fala, reduzindo a taxa de fala e a precisão da articulação(³⁰).

A análise de pausa da fala mostrou-se uma medida útil para descrever o desempenho da fala do indivíduo. Na ELA, as mudanças desse parâmetro podem oferecer informações importantes para obter um diagnóstico, como o início do comprometimento bulbar, pois, quando a pausa da fala está aumentada significa comprometimento das bases motoras(⁶³). A correlação da pausa da fala com a inteligibilidade e a taxa de fala é considerada útil para detectar alterações associadas à ELA bulbar(⁶⁴).

A análise acústica é outro método que apresenta informações sutis por meio de processamento de sinais e algoritmos e possibilitou a identificação e acompanhamento da evolução da disartria na ELA. Ela auxilia na compreensão de vozes normais e patológicas, fornecendo evidências objetivas para avaliação da voz, assim como acompanhamento da evolução e eficácia do tratamento(⁶⁵,⁶⁶). Esse método também auxilia na quantificação dos dados e nas descrições das correlações dos julgamentos perceptivos da qualidade vocal, tipo de disartria e inteligibilidade de fala(⁶⁷,⁶⁸).

A análise dos estudos também mostrou que a frequência fundamental nos pacientes com ELA pode aumentar ou diminuir; evidência similar foi citada em estudo(⁶⁹).

A análise do movimento foi avaliada por meio da articulografia eletromagnética, ferramenta que mostra o padrão do movimento e velocidade dos articuladores, principalmente o padrão de velocidade do movimento da língua. Autores(¹¹) relatam que o padrão do movimento da língua pode ser um parâmetro relevante para detecção precoce do comprometimento bulbar. Esses padrões exprimem informações sobre a gravidade da disartria, porém, a desvantagem da articulografia está na necessidade de um investimento considerável para adquirir um articulógrafo eletromagnético(⁷⁰).

A avaliação do movimento pela diadococinesia também consegue revelar a integridade neuromuscular. É vantajoso porque não tem custo com aparelhos e não necessita que o paciente tenha uma cognição sem nenhuma alteração(²¹).

Por fim, a Amyotrophic Lateral Sclerosis Functional Rating Scale - Revised (ALSFRS-R) é uma escala largamente utilizada na avaliação de pacientes com ELA para monitorar a evolução dos sintomas e as possíveis limitações na realização de atividades rotineiras(⁷¹). A escala foi utilizada nos estudos desta pesquisa(⁷¹) para estabelecer correlações com as medidas de avaliação da disartria e a correlação foi positiva.

Nesse sentido, a avaliação da disartria na ELA requer a utilização de diferentes tipos de avaliação e precisa ser realizada por meio da obtenção de medidas de vários parâmetros. A participação do fonoaudiólogo para gerenciar a avaliação e os cuidados prestados em relação à fala é imprescindível, já que a disartria na ELA provoca declínios significativos com implicações devastadoras para o paciente. Além disso, a avaliação fonoaudiológica da disartria pode ser um critério para diagnóstico diferencial. Conforme os resultados, observou-se um número limitado de produções nacionais, o que dificulta obter informações sobre como as avaliações estão sendo realizadas no Brasil.

CONCLUSÃO

A avaliação da disartria na ELA é realizada por meio de vários parâmetros e por diferentes procedimentos de avaliação. Essa variabilidade ocorre devido à necessidade de analisar o funcionamento de todas as bases motoras da fala. A análise perceptivo-auditiva é a mais utilizada na avaliação. Ressalta-se a contribuição de medidas objetivas, como análise acústica e análise de movimento, para estabelecer critérios de avaliação e monitoramento da disartria na ELA.

• Trabalho realizado no Departamento de Fonoaudiologia, Universidade Federal do Rio Grande do Norte - UFRN - Natal (RN), Brasil.
• Financiamento: Nada a declarar.

REFERÊNCIAS

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Datas de Publicação

• Publicação nesta coleção
  30 Out 2023
• Data do Fascículo
  2023

Histórico

• Recebido
  06 Abr 2023
• Aceito
  02 Jul 2023