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Mecanismos poupadores de água como suporte ao planejamento urbano

Water saving mechanisms supporting urban planning

RESUMO

Este estudo avalia a aplicação de equipamentos poupadores, em edifícios verticais, visando minimizar o impacto da demanda de água gerada, em um horizonte de cinco anos, no bairro do Catolé, em Campina Grande – PB. Investiga-se a redução do consumo de água a partir da utilização de mecanismos poupadores em edifícios residenciais, com o intuito de estabelecer parâmetros para a construção de novas edificações. Espera-se que estes parâmetros possam servir de suporte ao planejamento urbano, auxiliando no estabelecimento de meios de incentivo para minimizar o consumo de água. Para tanto, são selecionados cinco tipos de mecanismos poupadores e avaliados os custos de implantação e a eficiência dos mesmos. O consumo de água é simulado para edifícios em construção e são gerados cenários, utilizando os mecanismos poupadores, com a finalidade de verificar o quanto a utilização desses equipamentos contribuiria para a redução da demanda de água. Os resultados indicam que a utilização dos equipamentos poupadores reduz em 83,26% o consumo final de água em edifícios verticais. Conclui-se que é possível minimizar o problema da escassez da água, utilizando instrumentos de gerenciamento que contribuam para a racionalização do uso, visto que ações de responsabilização da sociedade pelo consumo consciente dos recursos naturais têm se mostrado eficazes, pois agregam, consequentemente, qualidade às áreas urbanas.

Palavras Chave:
Equipamentos poupadores; Demanda de água; Planejamento urbano

ABSTRACT

This research evaluates the use of water saving equipment in vertical buildings, in order to minimize the impact of water demand increasing over five years. The area studied is a district of Campina Grande city (PB) named Catolé. A survey was developed of some reducing devices that could contribute to the water demand decrease in the studied buildings. Water Demand Management recommends the use of water saving devices in buildings to decrease water consumption. The main goal was to evaluate the reduction of the water use caused by water savers in residential buildings and to try to establish parameters for the new buildings. Those parameters can be used for urban planning guidelines and laws to minimize water consumption. Therefore, four different types of water saving devices were selected and the economic and efficiency aspects of implementation were analyzed. Some scenarios were simulated for unfinished buildings (under construction) to evaluate the future water consumption. The results obtained show that the use of water saving devices can reduce water consumption in vertical buildings by 83.26%. Therefore, it has been concluded that it is possible to minimize the water scarcity problem using management tools that can contribute to rational use and also improve society’s awareness of natural resources in urban areas.

Keywords:
Water saving devices; Water demand; Urban planning

INTRODUÇÃO

Pode-se dizer que, de uma forma geral, os gestores urbanos respondem à escassez de água, frequentemente, com promessas de expansão da oferta. Esta política, por assim dizer, “não sustentável” encontra suporte na falta de regulação e controle das águas que abastecem as cidades. Tal ausência de regulação, em alguns casos, tem gerado problemas de difícil resolução, como o desperdício proveniente de vazamentos na rede de distribuição, as instalações clandestinas e a consequente diminuição do volume de água ofertado. Enquanto maior o desenvolvimento e verticalização das cidades, maiores são as dificuldades para compatibilizara oferta e demanda de água. Os problemas decorrentes dessa incompatibilidade afetam tanto a população das cidades quanto os gestores municipais ou de autarquias, como as companhias de abastecimento de água, por exemplo. Entretanto, a ocorrência desses problemas impulsiona a busca por soluções viáveis e sustentáveis (ARAÚJO; RUFINO, 2011Araújo, E. L.; Rufino, I. A. A. Estimativa do crescimento da demanda de água baseada em dados de uso e ocupação do solo urbano. In: XV SIMPÓSIO BRASILEIRO DE RECURSOS HÍDRICOS, Maceió, AL. 2011. Anais... Maceió: ABRH, 2011.).

Neste contexto, o objetivo principal deste trabalho foi avaliar a redução do consumo de água a partir da utilização de mecanismos poupadores em edifícios residenciais, num bairro em crescente adensamento da cidade de Campina Grande – PB. Além disso, verificar a demanda de água no bairro e sua estimativa para os anos subsequentes e, sugerir parâmetros urbanísticos relativos ao consumo de água, a serem incluídos na legislação municipal. Para tanto, verificou-se a demanda de água estimando o consumo para um horizonte de cinco anos e identificou-se os impactos de mecanismos poupadores na redução do consumo de água em edifícios residenciais.

CRESCIMENTO E ADENSAMENTO

Para se perceber as necessidades e demandas de infraestrutura em uma cidade é de fundamental importância entender as dinâmicas espaciais que ocorrem no espaço urbano, responsáveis pelo adensamento populacional e pelo espraiamento periférico dessas redes. Dessa forma, processos como a centralização, a verticalização e a descentralização ganham relevância neste estudo. (WAGNER; ZALEWSKI, 2009Wagner, I.; Zalewski, M. Ecohydrology as a basis for the sustainable city strategic planning: focus on Lodz, Poland. In: Reviews in Environmental Science and Biotechnology. Springer Netherlands, v.8, n.3 de 2009. Pag. 209 a 217).

A descentralização está associada à expansão da cidade, tanto em termos demográficos como espaciais. Alguns fatores estão ligados ao processo de repulsão da área central, entre eles está o aumento constante do preço da terra, impostos e aluguéis, afetando certas atividades que perdem a capacidade de se manterem localizadas na área central (CORRÊA, 1995Corrêa, R. L. O Espaço Urbano. 3. ed. n.174. Rio de Janeiro: Editora Ática, 1995. p.1-16. (Série Princípios).).

Outro fenômeno diretamente ligado ao crescimento da cidade e que promove o adensamento populacional é a verticalização, que promove a multiplicação efetiva do solo urbano, por meio do uso do elevador (SOMEKH, 1997Somekh, N. A cidade vertical e o urbanismo modernizador: São Paulo, 1920-1939. São Paulo: Edusp/ FAPESP/Studio Nobel, 1997. (Cidade aberta)). A essa ideia associam-se a característica da verticalidade e o aproveitamento intensivo da terra urbana (densidade). O processo de verticalização também ocorre como consequência da valorização do espaço. A proposta básica da verticalização é a compensação do preço da terra. Com os terrenos valorizados, a construção e venda de imóveis, nesses terrenos, só passa a ser economicamente viável quando a área construída pode ser multiplicada, gerando mais imóveis e o retorno financeiro necessário à subsistência do empreendimento (BONATES, 2010Bonates, M. F. Leis que (des)orientam o processo de verticalização. Transformações urbanas em Campina Grande à revelia da legislação urbanística. La planificación territorial y el urbanismo desde el diálogo y la participación. In: XI COLOQUIO INTERNACIONAL DE GEOCRÍTICA, Universidad de Buenos Aires, 2-7 de mayo de 2010. Actas…Buenos Aires: 2010.).

Cidades cujo adensamento acontece bruscamente correm o risco de um colapso dos sistemas de infraestrutura urbana e em particular do sistema de abastecimento de água, por falta de uma rede de abastecimento compatível com a demanda, ou simplesmente por falta de disponibilidade hídrica. Percebe-se a partir desta verificação a importância do conhecimento das demandas de água nos setores da cidade através das taxas de crescimento e adensamento, para tornar possível a previsão de falhas no abastecimento.

PLANEJAMENTO URBANO SENSÍVEL AOS RECURSOS HÍDRICOS

A pressão gerada pelo crescimento populacional e a criação de novas áreas para expansão urbana que comprometem as áreas de mananciais abastecedores das cidades, são dois dos maiores desafios para os governos locais. A crescente demanda por água potável, o aumento do escoamento, os fluxos de pico e descargas de águas residuais, bem como a poluição e a degradação dos recursos hídricos estão intensificados pelas mudanças climáticas e os impactos gerados. Para combater e prevenir esses problemas, urbanistas devem promover melhores estratégias e práticas de conservação da água em ambientes urbanos. Este é o objetivo principal do Planejamento Urbano Sensível aos Recursos Hídricos (em inglês Water Sensitive Urban Design - WSUD) (SANCHES; GARCIAS, 2009Sanches, A. M e GARCIAS, C. M.; SANCHES, A. M. Vulnerabilidades socioambientais e as disponibilidades hídricas urbanas: levantamento teórico-conceitual e análise aplicada à região metropolitana de Curitiba - PR. Risco, Revista de Pesquisa em Arquitetura e Urbanismo. São Carlos, n. 10, 2009. Pag. 96 a 149. Disponível em: file:///C:/Users/Livia/Dropbox/Publicacoes/Publica%C3%A7%C3%B5es%202015/Marcelo%20Barros/44783-53340-1-PB.pdf. Acesso em: 10/06/2012; NUNES et al., 2011Nunes, R. T. S.; Deletic, A.; Wong, T. H. F.; Prodanoff, J. H. A.; e Freitas, M. A. V. Procedures for integrating Water Sensitive Urban Design (WSUD) technologies into the site planning process: Criteria for streetscape scale applied in Melbourne Region – Australia. In: 12ND INTERNATIONAL CONFERENCE ON URBAN DRAINAGE, Porto Alegre/Brazil, 2011. Proceedings… Porto Alegre: 2011.).

Os princípios fundamentais do Planejamento Urbano Sensível aos Recursos Hídricos, segundo Wong (2006)Wong, T. H. F. An Overview of Water Sensitive Urban Design Practices in Australia. Water Practice & Technology. v. 1, n° 1. 2006., são: (i) proteger os sistemas naturais; (ii) integrar o tratamento de águas pluviais à paisagem; (iii) proteger a qualidade da água; (iv) reduzir escoamento e pico de fluxo; e (v) agregar valor, minimizando os custos de desenvolvimento.

Esses princípios, se aplicados corretamente, conseguem minimizar grande parte dos problemas urbanos referentes aos recursos hídricos, como a baixa qualidade das águas servidas e as enchentes. O maior impasse para a execução desse planejamento urbano sensível aos recursos hídricos é que boa parte desses princípios requer intervenções nas estruturas físicas da cidade e representam investimentos significantes para o orçamento municipal. Quando a cidade não é de grande porte, a exemplo de Campina Grande, as dificuldades de aplicação aumentam em decorrência da falta de recursos para investimento em outras estruturas prioritárias como saneamento básico, saúde, educação e transporte.

Entretanto, há medidas não estruturais que podem ser adotadas através de instrumentos legais de regulação do solo urbano. A aplicação das leis pode garantir um controle dos recursos naturais no ambiente urbano e ainda implica no equilíbrio ambiental sem onerar os custos de gestão dos municípios.

INSTRUMENTOS LEGAIS DE PLANEJAMENTO E GESTÃO

Os instrumentos legais de planejamento e gestão das cidades existem para induzir o poder público a agir em prol do interesse coletivo, garantindo que todos os cidadãos tenham acesso aos serviços, aos equipamentos urbanos e a toda e qualquer melhoria realizada. Assim, o Estado pode cumprir o seu papel de provedor do bem-estar social e mediador dos conflitos urbanos.

Dentre os instrumentos Legais que regulam o Planejamento e gestão das cidades se destaca o Estatuto da Cidade (Lei n° 10.257/2001BRASIL. Lei 10257 de 10 de julho de 2001. Regulamenta os arts. 182 e 183 da Constituição Federal, estabelece diretrizes gerais da política urbana e dá outras providências. Brasília: Diário Oficial da União, Seção 1, de 11 de julho de 2001, p. 1.). O Estatuto pode ser um importante instrumento para diminuir as distorções de investimentos públicos em determinadas áreas da cidade, em contraposição a outras que, em geral, já não se realizavam investimentos e coincidem com os setores urbanos ocupados pela população pobre.

O Estatuto da Cidade reúne importantes instrumentos urbanísticos, tributários e jurídicos que podem garantir efetividade de outro instrumento legal, o Plano Diretor, que por sua vez é responsável pelo estabelecimento da política urbana na esfera municipal e pelo pleno desenvolvimento das funções sociais da cidade e da propriedade urbana. Sua função é definir os usos adequados da propriedade urbana, os padrões mínimos e máximos de utilização que caracterizam cada uso, definir os locais e as finalidades para a cessão onerosa do direito de construir, identificar a parcela da área urbana onde os imóveis não edificados, subutilizados ou não utilizados poderão ser objeto de parcelamento e edificação compulsórios, entre outros (OLIVEIRA, 2001Oliveira, I. C. E. Estatuto da cidade; para compreender... Rio de Janeiro: IBAM/DUMA, 2001. 64p.).

As principais leis que interferem diretamente no processo de verticalização, pois regem o uso e ordenamento do solo, estão expressas na forma de Plano Diretor, Leis de Uso e Ocupação do Solo e Códigos de Obras. Estas são compostas, dentre outros princípios, de prescrições urbanísticas como coeficientes de aproveitamento, taxas de ocupação, gabaritos, recuos, etc. E uma das principais prescrições ligadas à verticalização é o coeficiente de aproveitamento, que embasa a tese do “solo criado”, ou seja, a capacidade de construir mais de que a própria área do terreno (BONATES, 2010Bonates, M. F. Leis que (des)orientam o processo de verticalização. Transformações urbanas em Campina Grande à revelia da legislação urbanística. La planificación territorial y el urbanismo desde el diálogo y la participación. In: XI COLOQUIO INTERNACIONAL DE GEOCRÍTICA, Universidad de Buenos Aires, 2-7 de mayo de 2010. Actas…Buenos Aires: 2010.).

Além dos elementos de planejamento e gestão do uso do solo, de infraestrutura viária, água, energia, comunicação e transporte; o mecanismo de gestão socioambiental é de extrema importância para garantir o crescimento sustentável das cidades. E neste âmbito existe, igualmente, legislação que norteia o consumo dos recursos naturais. Algumas diretrizes mais específicas instituídas pelo Governo Federal compõem o Programa Nacional de Combate ao Desperdício de Água (PNCDA), que tem como objetivo geral promover o uso racional da água de abastecimento público nas cidades brasileiras, visando definir e implementar um conjunto de ações e instrumentos tecnológicos, normativos, econômicos e institucionais, para uma efetiva economia dos volumes de água demandados para o consumo nas áreas urbanas (BRASIL, 2004BRASIL. . DTA F1 - Tecnologias Poupadoras de Água nos Sistemas Prediais. Brasília: Presidência da República, Ministério das Cidades, 2004.).

Dentro do Programa foram elaborados Documentos Técnicos de Apoio (DTA’s) na área de conservação, tecnologia de sistemas públicos de abastecimento de água, de sistemas prediais de água e esgoto e campanhas educativas. Os DTA’s que abordam especificamente as tecnologias economizadoras de água em edifícios são o DTA - F1 e o DTA - F2 (BRASIL, 2004BRASIL. . DTA F2 - Produtos Economizadores de Água nos Sistemas Prediais. Brasilia: Presidência da República Ministério das Cidades, 2004.).

O DTA - F1 apresenta um panorama das tecnologias poupadoras de água nos sistemas prediais disponíveis mundialmente. Propõe também linhas de ação alternativas para alcançar a racionalização do uso da água nos edifícios baseadas nas experiências internacionais, científicas e tecnológicas do setor, passíveis de aplicação à realidade nacional (BRASIL, 2004BRASIL. . DTA F1 - Tecnologias Poupadoras de Água nos Sistemas Prediais. Brasília: Presidência da República, Ministério das Cidades, 2004.).

O DTA - F2 descreve os diversos tipos de produtos economizadores de água existentes, fornecendo subsídios para esclarecimento das características de funcionamento e utilização destes equipamentos conforme os tipos de usos e usuários da edificação (BRASIL, 2004BRASIL. . DTA F1 - Tecnologias Poupadoras de Água nos Sistemas Prediais. Brasília: Presidência da República, Ministério das Cidades, 2004.).

A Lei n° 6.938, de 31 de agosto de 1981 (BRASIL, 1981BRASIL. Lei n° 6.938, de 31 de agosto de 1981. Dispõe sobre a Política Nacional do Meio Ambiente, seus fins e mecanismos de formulação e aplicação, e dá outras providências. Brasília: Diário Oficial da República Federativa do Brasil, Brasília, DF, 02. set. 1981.), dispõe sobre a Política Nacional do Meio Ambiente visando à compatibilização do desenvolvimento econômico-social com a preservação da qualidade do meio ambiente e do equilíbrio ecológico.

Entretanto, a norma que efetivamente trata das questões relativas à água no Brasil, é a Política Nacional de Recursos Hídricos (PNRH). Estabelecida pela Lei Federal 9.433/1997. Essa Lei determina um processo participativo e descentralizado para a gestão de recursos hídricos, em nível de bacia, envolvendo a Sociedade Civil, Usuários da Água e o Poder Público (RIBEIRO, 2012Ribeiro, M. A. F. M. Participação Pública em Gestão de Recursos Hídricos: Uma análise do caso paraibano. 2012. Dissertação (Mestrado em Engenharia Civil e Ambiental). Universidade Federal de Campina Grande, Campina Grande, 2012.; BRASIL, 1997BRASIL. Lei 9.433, de 08. jan. 1997. Institui a Política Nacional de Recursos Hídricos e cria o Sistema Nacional de Gerenciamento dos Recursos Hídricos, regulamenta o inciso XIX do artigo 21 da CF, e altera o artigo 1 da Lei 8.001 de 13.03.1990 que modificou a Lei 7.990, de 28.12.1989. Brasília: Diário Oficial da República Federativa do Brasil, Brasília, DF, 09. jan.1997.).

Diante do exposto, os diversos problemas decorrentes da urbanização desordenada e a quantidade de Leis que controlam o uso dos recursos naturais demonstram que para um desenvolvimento equilibrado e sustentável, os elementos de gestão da cidade, precisam ser considerados, especialmente no tocante ao adensamento construtivo. Se o adensamento construtivo não for bem planejado, pode acarretar graves problemas aos serviços de infraestrutura da cidade. Neste sentido, é necessário um planejamento multidisciplinar, pois não se pode estimular o adensamento de uma área que não possui infraestrutura compatível com a quantidade de pessoas que ocuparão a área. Especialmente quando um projeto de expansão previr áreas com potencial para verticalização (ARAÚJO; RUFINO, 2011Araújo, E. L.; Rufino, I. A. A. Estimativa do crescimento da demanda de água baseada em dados de uso e ocupação do solo urbano. In: XV SIMPÓSIO BRASILEIRO DE RECURSOS HÍDRICOS, Maceió, AL. 2011. Anais... Maceió: ABRH, 2011.).

Por conseguinte, Wagner e Zalewski (2009)Wagner, I.; Zalewski, M. Ecohydrology as a basis for the sustainable city strategic planning: focus on Lodz, Poland. In: Reviews in Environmental Science and Biotechnology. Springer Netherlands, v.8, n.3 de 2009. Pag. 209 a 217 dizem que existe a necessidade de um novo paradigma de gestão da cidade, que deve ser considerada como um sistema ecológico, analisando processos fundamentais, como a circulação de água, matéria e fluxo de energia. A compreensão do ciclo desses componentes pode ajudar a regulá-los e melhorar a eficácia da gestão integrada nas cidades. Ocorre que, para regular o uso indiscriminado da água nas áreas urbanas é necessária uma legislação municipal compatível com o aparato legal federal, de forma que os municípios possam participar da gestão dos recursos hídricos acompanhando a evolução das legislações e adaptando as mesmas às suas realidades específicas.

Com relação ao adensamento desordenado e à verticalização acelerada, poucos municípios consideram o aumento da demanda de água como um dos fatores determinantes para estabelecer as diretrizes urbanas. Principalmente porque exige a integração das leis de meio ambiente a as leis urbanas. Sendo assim, as definições e diretrizes nos códigos de obras municipais são fundamentais para induzir o uso racional da água nos objetos edificados, e precisam interagir com as leis ambientais, garantindo que o crescimento urbano ocorra de maneira sustentável.

MATERIAL E MÉTODOS

O trabalho foi organizado em três fases: i) seleção dos mecanismos poupadores; ii) criação dos cenários de adensamento urbano e suas demandas de água, e iii) análise urbanística.

Dentro de cada fase foram realizadas as etapas, descritas a seguir.

Seleção dos Mecanismos Poupadores

Foram utilizados alguns critérios para a identificação e escolha dos mecanismos poupadores. Estes são: (i) que fossem de fácil implantação, considerando a qualificação da mão de obra local; (ii) que tivessem uma boa relação entre o investimento inicial e o retorno financeiro gerado pelos mesmos, comparando os custos representados pela substituição dos equipamentos e a economia alcançada por eles; (iii) que demonstrassem maior adequabilidade à realidade da região em estudo; e (iv) que resultassem em maior redução do consumo de água.

Baseado nesses critérios, os equipamentos escolhidos para esta pesquisa foram: torneira (com arejador); chuveiro; bacia sanitária (de acionamento duplo); reuso de água (cinzas); e medidores individuais. O funcionamento destes mecanismos pode ser entendido de forma resumida através das descrições do Quadro 1.

Quadro 1
–Funcionamento dos mecanismos poupadores (MP) selecionados

Cálculo das economias

Utilizando os dados de distribuição do uso da água em empreendimentos verticais, adotados por Mierzwa et al. (2006)Mierzwa, J. C.; Hespanhol, I.; Codas, B. V. B.; Silva, J. O. P.; Mendes, R. L. Avaliação econômica dos sistemas de reuso de água em empreendimentos imobiliários. In: XXX CONGRESO DE LA ASOCIACION DE INGENIERIA SANITARIA Y AMBIENTAL. Punta Del Este – Uruguay, 2006. Anais... Punta Del Este: 2006., calculou-se a economia de cada equipamento poupador na porcentagem que ele representa para consumo final da unidade habitacional, obtendo-se, assim, a economia destes no edifício.

Com base no valor do aumento da demanda de água resultante da conclusão dos edifícios residenciais, calculado por Araújo (2012)Araújo, E. L. Estimativa e análise do crescimento da demanda de água, a partir de cenários de uso e ocupação do solo. 2012. 92f. Dissertação (Mestrado em Engenharia Civil e Ambiental) – Universidade Federal de Campina Grande. Campina Grande, 2012., aplicou-se a parcela que cada equipamento poupador representaria no consumo.

Relação entre investimento e economia de água

De posse da quantidade de água economizada por cada equipamento poupador, indicada por Mierzwa et al. (2006)Mierzwa, J. C.; Hespanhol, I.; Codas, B. V. B.; Silva, J. O. P.; Mendes, R. L. Avaliação econômica dos sistemas de reuso de água em empreendimentos imobiliários. In: XXX CONGRESO DE LA ASOCIACION DE INGENIERIA SANITARIA Y AMBIENTAL. Punta Del Este – Uruguay, 2006. Anais... Punta Del Este: 2006., foi feito um levantamento de custos necessários para a substituição ou implantação de cada um dos equipamentos nos edifícios verticais.

O percentual de investimento para a substituição dos equipamentos foi adquirido comparando-se o valor do produto convencional com o valor do produto com a tecnologia economizadora.

Criação de Cenários

Cenário 1 – Considerou-se a situação dos imóveis no momento da pesquisa de campo (2012), calculando-se a demanda de água. Os edifícios que estavam em construção não foram considerados no cálculo.

Nessa etapa utilizaram-se os dados de Araújo (2012)Araújo, E. L. Estimativa e análise do crescimento da demanda de água, a partir de cenários de uso e ocupação do solo. 2012. 92f. Dissertação (Mestrado em Engenharia Civil e Ambiental) – Universidade Federal de Campina Grande. Campina Grande, 2012.. Este autor realizou o levantamento dos usos e ocupações dos lotes situados no bairro do Catolé (Campina Grande - PB) e relacionou com o consumo de água de cada lote. Esse consumo foi relacionado à rede de distribuição de água da área, verificando a compatibilidade do uso atual com a disponibilidade da rede.

Cenário 2 – Calculou-se a demanda de água resultante da conclusão dos edifícios que, no momento da pesquisa de campo, estavam em construção.

Nessa etapa considerou-se o cenário que leva em conta a rápida expansão da construção civil gerado por Araújo (2012)Araújo, E. L. Estimativa e análise do crescimento da demanda de água, a partir de cenários de uso e ocupação do solo. 2012. 92f. Dissertação (Mestrado em Engenharia Civil e Ambiental) – Universidade Federal de Campina Grande. Campina Grande, 2012..

Cenário 3 – Avaliou-se o percentual de economia, para um horizonte de 5 (cinco) anos, comparando-se os dados obtidos nos cenários 1 e 2.

Cenário 4 – Partiu-se da estimativa do aumento populacional, segundo o censo do IBGE, calculado para os horizontes de 10 (dez) e 20 (vinte) anos, e, nesse incremento populacional, aplicou-se a mesma percentagem de crescimento da demanda de água obtida por Araújo (2012)Araújo, E. L. Estimativa e análise do crescimento da demanda de água, a partir de cenários de uso e ocupação do solo. 2012. 92f. Dissertação (Mestrado em Engenharia Civil e Ambiental) – Universidade Federal de Campina Grande. Campina Grande, 2012. para cada período de anos.

Cenário 5 - Sobre a demanda de água estimada para os horizontes de 10 e 20 anos, aplicou-se o percentual de economia de cada mecanismo poupador. Com esses dados, foi possível comparar o aumento da demanda com e sem o uso dos mecanismos poupadores, e assim, determinar a economia gerada pela implantação dos mecanismos nas novas edificações, e consequentemente, na área de estudo.

Classificação dos empreendimentos

Foram classificados os tipos de empreendimentos segundo os conjuntos de equipamentos que neles fossem aplicados. A classificação foi feita de acordo com a eficiência de cada conjunto na redução do consumo de água, avaliando-se, também, seus custos de implantação. Estabelecendo, assim, parâmetros aos gestores para a adoção de medidas incentivadoras a quem se enquadrar nos tipos de classificação.

Análise urbanística

Para a definição da taxa de adensamento no bairro foram comparados, a partir dos censos demográficos 2000 e 2010 (IBGE, 2001IBGE. Censo Demográfico 2000. Rio de Janeiro: INSTITUTO BRASILEIRO DE GEOGRAFIA E ESTATÍSTICA, 2001.; 2011IBGE. Censo Demográfico 2010. Rio de Janeiro: INSTITUTO BRASILEIRO DE GEOGRAFIA E ESTATÍSTICA, 2011.) os dados de população e dos tipos de edificações recorrentes na área. Através da taxa média geométrica de crescimento anual da população-incremento médio anual da população. Com isso determinou-se a taxa de adensamento demográfico e adensamento habitacional para o bairro do Catolé. Em seguida fez-se uma projeção da estimativa de consumo de água para os próximos 10 e 20 anos, considerando o incremento da população obtido através da taxa de crescimento da população.

CAMPINA GRANDE E OS INSTRUMENTOS DE PLANEJAMENTO E GESTÃO

Campina Grande é uma cidade localizada no semiárido paraibano, cuja população, de acordo com o censo 2010, é de 385.213 habitantes. Ocupando uma área de 594,182 km2, a cidade possui uma densidade demográfica de 648,31 hab/km2, não representando uma densidade tão alta, pelo fato de considerar a área das regiões urbana e rural (IBGE, 2011IBGE. Censo Demográfico 2010. Rio de Janeiro: INSTITUTO BRASILEIRO DE GEOGRAFIA E ESTATÍSTICA, 2011.). A Figura 1 apresenta a localização da Área de Estudo.

Figura 1
– Localização da Área de Estudo – bairro do catolé, Campina Grande - PB

O serviço de abastecimento de água da cidade é feito pela Companhia de Água e Esgotos da Paraíba (CAGEPA). A rede de distribuição é abastecida por três adutoras (500, 700 e 800 mm), conta com 16 reservatórios em operação, possui uma capacidade total de reservação de 59.270m3 e tem aproximadamente 540km de comprimento (ARAÚJO et al., 2011Araújo, E. L.; Rufino, I. A. A.; Lunguinho, R. L. Análise da expansão urbana versus o comportamento da rede de distribuição de água da cidade de Campina Grande – PB através de imagens de satélite. In: XV SIMPÓSIO BRASILEIRO DE SENSORIAMENTO REMOTO - SBSR, Curitiba, PR, Brasil, Maio 2011, p.783 - 790. Anais... Curitiba: INPE/SELPER, 2011.).

Ao longo da última década, a população teve um incremento de 29.882 pessoas e Campina Grande cresceu a uma taxa de 1,01% a.a. Na zona urbana a população que, em 2000, era de 316.139 habitantes passou a 335.842 habitantes em 2010, o que implica num aumento de 19.703 moradores urbanos (66% do incremento populacional total no município). Esse crescimento populacional refletiu-se no espaço da cidade e a mancha urbana sofreu alterações, aumentando sua área total, sendo que as mudanças mais sensíveis ocorreram na região sudoeste. (IBGE, 2011IBGE. Censo Demográfico 2010. Rio de Janeiro: INSTITUTO BRASILEIRO DE GEOGRAFIA E ESTATÍSTICA, 2011.). Os valores estão sintetizados na Tabela 1.

Tabela 1
- Evolução da população em Campina Grande-PB

De acordo com o Plano Diretor do município, o bairro do Catolé está situado na Zona de Recuperação Urbana, que se caracteriza pelo uso predominantemente residencial, com carência de infraestrutura e equipamentos públicos e incidência de loteamentos irregulares e núcleos habitacionais de baixa renda.

A Figura 2 mostra a localização do bairro, inserido no zoneamento do Plano Diretor.

Figura 2
- Localização do bairro Catolé no Plano Diretor de Campina Grande – PB

Pelo que se percebe, a realidade da área em estudo é bastante diferente da considerada no Plano Diretor. Especialmente no Catolé, onde estão inseridos alguns dos principais equipamentos públicos, espaços verdes e de lazer da cidade, como o Parque da Criança, centros de compras, museus, entre outros. A inserção destes equipamentos provocou, ao longo dos anos, uma valorização imobiliária muito forte na área. Estimulado por uma infraestrutura básica mais consistente, desde o sistema viário aos de saneamento e abastecimento de água, o setor da construção civil concentrou seus investimentos no bairro e impulsionou o surgimento de vários edifícios residenciais de médio e grande porte.

Segundo Bonates (2010)Bonates, M. F. Leis que (des)orientam o processo de verticalização. Transformações urbanas em Campina Grande à revelia da legislação urbanística. La planificación territorial y el urbanismo desde el diálogo y la participación. In: XI COLOQUIO INTERNACIONAL DE GEOCRÍTICA, Universidad de Buenos Aires, 2-7 de mayo de 2010. Actas…Buenos Aires: 2010. nesta Zona de Recuperação Urbana, em especial nos bairros do Catolé e Mirante, encontram-se dois importantes pontos de verticalização na cidade, e uma das principais variáveis que incentivou a intensificação do solo nessa área foi a implantação de grandes objetos imobiliários no bairro nas últimas duas décadas, como os Shopping Centers. Salientam-se outros objetos imobiliários no bairro como o Museu de Arte Assis Chateaubriand, algumas escolas e faculdades privadas. Bonates (2010)Bonates, M. F. Leis que (des)orientam o processo de verticalização. Transformações urbanas em Campina Grande à revelia da legislação urbanística. La planificación territorial y el urbanismo desde el diálogo y la participación. In: XI COLOQUIO INTERNACIONAL DE GEOCRÍTICA, Universidad de Buenos Aires, 2-7 de mayo de 2010. Actas…Buenos Aires: 2010. ainda comenta que o Catolé também é considerado, pelos corretores imobiliários, como um bairro de maior liquidez na venda de imóveis.

RESULTADOS E DISCUSSÃO

As dinâmicas urbanas e consumo de água em Campina Grande - PB

Densidades Populacionais

O processo de verticalização tem sido o principal agente do adensamento na cidade, pois concentra um número maior de unidades habitacionais em uma só área. Essa dinâmica do espaço urbano se deu devido à mudança de uso de vários setores da cidade. Algumas áreas que estavam inutilizadas foram loteadas e nelas construíram-se unidades habitacionais, em outras, houve a substituição de residência por edifícios residenciais com várias unidades. A Figura 3 apresenta a distribuição da população urbana em números de habitantes por quilômetro quadrado (IBGE, 2001IBGE. Censo Demográfico 2000. Rio de Janeiro: INSTITUTO BRASILEIRO DE GEOGRAFIA E ESTATÍSTICA, 2001.; 2011IBGE. Censo Demográfico 2010. Rio de Janeiro: INSTITUTO BRASILEIRO DE GEOGRAFIA E ESTATÍSTICA, 2011.). Comparando as duas imagens, percebe-se que, a população, em 2010, se redistribuiu em alguns pontos periféricos da malha urbana, ocupando espaços antes ociosos. Alguns bairros apresentam maior adensamento e algumas das áreas mais habitadas receberam um incremento ainda maior de habitantes, aumentando, consequentemente, sua densidade populacional.

Figura 3
- Distribuição da população urbana de Campina Grande – PB (Censo 2000 e Censo 2010) Fonte: IBGE (2011)IBGE. Censo Demográfico 2010. Rio de Janeiro: INSTITUTO BRASILEIRO DE GEOGRAFIA E ESTATÍSTICA, 2011.

A Tabela 2 apresenta a população, a área e a densidade populacional de alguns bairros de Campina Grande-PB. A relação entre população e a área do bairro, indicada pela densidade populacional, é importante para avaliação da dinâmica urbana. O comparativo destes valores contribui para a percepção das diferenças de cada bairro.

Tabela 2
- População, área e densidade populacional de bairros de Campinas Grande – PB

Observa-se pela Tabela 2 que o bairro de maior densidade populacional é o Pedregal, com 27.503 hab/km2. A densidade se justifica pelo fato do bairro ter se originado de um assentamento irregular onde muitas vezes, mais de uma família habita uma única residência.

Observa-se também, pela Tabela 2, que o segundo bairro de maior densidade populacional, com características diferentes do Pedregal, é o Catolé, com 10.894 hab/km2. Nele as infraestruturas básicas estão estabelecidas, ou seja, existe um ordenamento do uso e ocupação do solo, o sistema viário é bem distribuído com ruas e avenidas largas e existem equipamentos urbanos de grande porte. Portanto, a alta densidade populacional do Catolé é resultante do adensamento construtivo e da verticalização, fator ainda comprovado pela extensão do bairro, que é uma das maiores da cidade, com 2.897km2. O Catolé tem uma população superior a de outros bairros com áreas maiores, levando a concluir que existe um grande potencial de adensamento desses bairros, que poderá em pouco tempo comprometer as infraestruturas naturais e construídas da cidade.

Densidades Habitacionais

Apesar de existir um grande número de pessoas atuando nas edificações de usos comerciais e de serviços, e reconhecendo que o setor industrial não é relevante no bairro do Catolé, as exigências de infraestrutura para esta população usuária, principalmente nos sistemas de abastecimento de água e esgoto, são relativamente pequenas se comparadas ao uso residencial, por isso, é no uso residencial que se evidencia a necessidade de uma melhor gestão dos recursos hídricos.

A Figura 4 mostra a evolução do número de domicílios e a dinâmica de adensamento na cidade e a Figura 5 indica a evolução dos edifícios residenciais, em números de apartamentos. Os cartogramas de densidade habitacional (Figuras 4 e 5) foram elaborados através de um estimador de densidade de padrões (“Kernel”) e evidenciam as áreas que sofreram maior adensamento na última década.

Figura 4
- Evolução dos domicílios em Campina Grande– PB (Censo 2000 e Censo 2010)
Figura 5
- Evolução dos apartamentos em Campina Grande – PB (Censo 2000 e Censo 2010) Fonte: Barros (2013)Barros, M. B. Avaliação de mecanismos poupadores de água como suporte ao planejamento urbano em Campina Grande – PB. 2013. 98f. Dissertação (Mestrado em Engenharia Civil e Ambiental) – Universidade Federal de Campina Grande. Campina Grande, 2013

Observa-se pela Figuras 5 que o centro da cidade, como comumente ocorre nas cidades brasileiras, recebeu um incremento de apartamentos, se tornando mais denso. Observa-se também que a descentralização do adensamento ocorreu de forma não homogênea e fragmentada. Essa distribuição reforça a análise de que a verticalização ocorreu por valorização subjetiva e demonstra a falta de controle do Plano Diretor sobre o espaço urbano.

Mesmo diante do adensamento fragmentado, algumas áreas se destacaram pelo maior surgimento de edifícios multifamiliares, dentre elas, o bairro do Catolé, situado na região sul da cidade (ARAÚJO; RUFINO, 2011Araújo, E. L.; Rufino, I. A. A. Estimativa do crescimento da demanda de água baseada em dados de uso e ocupação do solo urbano. In: XV SIMPÓSIO BRASILEIRO DE RECURSOS HÍDRICOS, Maceió, AL. 2011. Anais... Maceió: ABRH, 2011.).

O bairro se tornou atrativo para a construção de edifícios residenciais, entre outros aspectos, por suas vantagens locacionais e em virtude da qualidade da infraestrutura viária, de abastecimento de água e energia, esgotamento sanitário e coleta de lixo, e da instalação de empreendimentos geradores de fluxo. Além de já existir o terminal rodoviário, ao longo dos anos foram construídos centros de compras e equipamentos de serviço como escolas, faculdades e restaurantes, que por sua vez geraram focos de comércio e finalmente viabilizaram o mercado de apartamentos.

Em Campina Grande, do ano 2000 a 2010, foram construídos 4.918 apartamentos, e estes representam 23% do número total de domicílios criados. Destes novos apartamentos construídos na cidade, 16,24% foram instalados no Catolé e o crescimento destas unidades, no bairro, foi da ordem de 49,20%, mais que o dobro do crescimento na cidade (IBGE, Censo 2000 e 2010). A Tabela 3 mostra a relação entre domicílios e apartamentos em Campina Grande e no bairro do Catolé.

Tabela 3
- Relação entre domicílios e apartamentos em Campina Grande e no bairro do Catolé

A verticalização oferece algumas vantagens como: concentração de usos e infraestrutura em uma faixa territorial menor; diminuição da distância a ser percorrida entre regiões, facilitando o deslocamento da população, e consequentemente, reduzindo os investimentos em estruturas viárias, de saneamento e abastecimento. Contudo, a ausência de um planejamento adequado para essa verticalização pode possibilitar o surgimento de áreas muito adensadas, em regiões cuja infraestrutura não suporte a nova demanda.

Sendo assim, a sobrecarga dos sistemas de infraestrutura tem sido um dos principais problemas encontrados em áreas adensadas, pois, à medida que aumenta a população em um determinado setor, aumentam-se o fluxo de veículos e os consumos de água e energia; geram-se mais resíduos sólidos e líquidos; entre outros. E para atender a todas essas demandas, são necessários grandes investimentos por parte dos gestores municipais, porém uma legislação eficiente também é capaz de controlar e minimizar os impactos decorrentes de um adensamento.

O Plano Diretor do município de Campina Grande reconhece os problemas oriundos da verticalização, entretanto, as lacunas existentes em seu texto limitam as ações do poder público e dificultam a obtenção do equilíbrio econômico, social e ambiental. No Artigo 24, é determinado que o uso e ocupação do solo urbano ficam condicionados ao controle de densidade demográfica; em função da: saturação da infraestrutura; oferta de transportes; e ameaça ao meio ambiente. Para tanto, o controle de densidade deve ser feito mediante o estabelecimento de limites de construção por Zonas. Todavia, as Zonas do município são classificadas por características que diferem da realidade encontrada, gerando incompatibilidade entre o uso e ocupação, e as ações propostas para o controle urbanístico (CAMPINA GRANDE, 2006CAMPINA GRANDE. Lei complementar Nº 003, de 09 de outubro de 2006. Promove a revisão do Plano Diretor do Município de Campina Grande. Campina Grande: Prefeitura da Cidade de Campina Grande, 2006. (Mímeo)).

O Consumo de Água

A pesquisa de Araújo (2012)Araújo, E. L. Estimativa e análise do crescimento da demanda de água, a partir de cenários de uso e ocupação do solo. 2012. 92f. Dissertação (Mestrado em Engenharia Civil e Ambiental) – Universidade Federal de Campina Grande. Campina Grande, 2012. forneceu os valores que balizaram os cálculos apresentados a seguir. O autor identificou a demanda de água no bairro do Catolé no ano de 2012 e estimou a demanda para um horizonte de cinco anos (2017), prazo estipulado para conclusão dos 23 edifícios diagnosticados (Tabela 4).

Tabela 4
- Estimativa de consumo de água no bairro do Catolé, Campina Grande – PB

Observa-se pela Tabela 4 um crescimento da demanda de água em 14,31%, ou seja, 738.699,77 l/dia, esse é o valor de referência para os cálculos de economia desta pesquisa, por se tratarem especificamente dos edifícios.

É importante salientar que o crescimento da demanda (Tabela 4) considerou apenas as construções dos 23 edifícios multifamiliares e não contempla as mudanças de uso nem as novas construções unifamiliares. Percebe-se que apenas os edifícios, mesmo representando uma pequena parcela das construções do bairro, aumentam sensivelmente a demanda do bairro inteiro, mostrando que é relevante um melhor entendimento da economia obtida com o uso dos mecanismos poupadores.

Mecanismos Poupadores e a Efetiva Redução do Consumo

Ao relacionar os dados de Mierzwa et al. (2006)Mierzwa, J. C.; Hespanhol, I.; Codas, B. V. B.; Silva, J. O. P.; Mendes, R. L. Avaliação econômica dos sistemas de reuso de água em empreendimentos imobiliários. In: XXX CONGRESO DE LA ASOCIACION DE INGENIERIA SANITARIA Y AMBIENTAL. Punta Del Este – Uruguay, 2006. Anais... Punta Del Este: 2006., da economia de água alcançada pela substituição de um equipamento convencional por um equipamento poupador, obteve-se a representatividade da economia de cada equipamento no consumo final do edifício. Os valores do percentual aplicado ao cálculo da economia estão representados na Tabela 5.

Tabela 5
- Percentual aplicado ao cálculo da economia

O investimento necessário para substituir os equipamentos convencionais pelos equipamentos poupadores e a relação entre os custos do investimento e a economia de água alcançada pelos equipamentos poupadores encontram-se na Tabela 6.

Tabela 6
- Relação da economia e investimento dos equipamentos poupadores

Observa-se pela tabela 6 que a relação da economia e investimento dos equipamentos poupadores difere de acordo com o equipamento. Em geral, o investimento é compensado pela economia de água.

A Tabela 7 apresenta o quanto cada equipamento poupador representa no consumo total dos edifícios, a economia alcançada por cada equipamento e a economia final de cada mecanismo poupador nos edifícios. Essa economia foi obtida pela diferença entre a demanda dos edifícios sem e com o uso de mecanismos poupadores.

Tabela 7
- Economia dos mecanismos poupadores nos edifícios do bairro do Catolé, Campina Grande – PB

Pelas Tabelas 5 e 7 observa-se que a economia obtida com o uso dos mecanismos poupadores resultou em 83,26% nos edifícios em construção, ou seja, 615.041,42 l/dia, consequentemente, a nova demanda dos edifícios seria de 123.658,35 l/dia.

De posse dos valores de economia de cada poupador, calculou-se o impacto da utilização dos mecanismos nos edifícios e na demanda para os anos considerados (2012 e 2017) do bairro. A Tabela 8 apresenta a economia resultante do uso de mecanismos poupadores.

Tabela 8
- Economia resultante do uso de mecanismos poupadores (MP)

Pela Tabela 8 observa-se que a demanda de água, no bairro do Catolé, de 14,31% passou para 2,39%, resultando numa economia de 10,42%. Com isso, percebe-se que a implantação de mecanismos poupadores em edifícios residenciais, apesar de ser uma aplicação pontual, pode trazer resultados significativos de economia.

Evolução do Adensamento

O referido estudo contemplou os 23 edifícios em construção, no bairro do Catolé, para um horizonte de cinco anos. Entretanto, conhecendo a taxa geométrica de crescimento populacional do Catolé, que é 1,05% a.a., calculada pelos valores da última década, pôde-se fazer uma estimativa da população para os próximos 10 e 20 anos.

Como os valores de população foram calculados a partir de dados do IBGE, nos censos 2000 e 2010, foram estes os parâmetros para estimar as populações nos anos 2015, 2020 e 2040. As demandas de água se basearam no percentual definido por Araújo (2012)Araújo, E. L. Estimativa e análise do crescimento da demanda de água, a partir de cenários de uso e ocupação do solo. 2012. 92f. Dissertação (Mestrado em Engenharia Civil e Ambiental) – Universidade Federal de Campina Grande. Campina Grande, 2012. para edifícios sem o uso de poupadores e no percentual encontrado nesta pesquisa para edifícios com uso de poupadores. Os valores da demanda de água para os próximos 5 anos, descritos nesta pesquisa e por Araújo (2012)Araújo, E. L. Estimativa e análise do crescimento da demanda de água, a partir de cenários de uso e ocupação do solo. 2012. 92f. Dissertação (Mestrado em Engenharia Civil e Ambiental) – Universidade Federal de Campina Grande. Campina Grande, 2012., diferem principalmente na maneira como consideram o aumento populacional (uma a partir da taxa de crescimento, e outra a partir da pesquisa de campo dos edifícios em construção).

Para melhor compreensão a evolução do adensamento e das demandas de água no Catolé são apresentadas na Tabela 9 e nas Figuras 5 e 6.

Tabela 9
- Evolução do adensamento e das demandas de água no bairro do Catolé, Campina Grande – PB
Figura 6
- Evolução Populacional no bairro do Catolé, Campina Grande – PB

Observa-se pela Tabela 9 e Figuras 6 e 7 que o aumento populacional gera um impacto sensível na demanda de água e que esses problemas poderiam ser minimizados com o uso de mecanismos poupadores, independentemente do tipo de construção.

Figura 7
- Evolução da Demanda de Água no bairro do Catolé, Campina Grande – PB

CONCLUSÕES

As leis municipais demonstraram falta de controle quanto ao uso e ocupação do solo. A incompatibilidade entre as exigências para cada zoneamento e a realidade no local, além das lacunas encontradas no texto do plano diretor, permite que o adensamento e a verticalização ocorram segundo a vontade dos empresários da construção, pois o único limitante da altura dos edifícios são os recuos. A ausência de normas municipais que tratem especificamente do objeto construído, principalmente dos edifícios residenciais, incentivando o uso de mecanismos poupadores de água, que apesar de ser um tema tão recorrente na atualidade, ainda não foi contemplado nas diretrizes de Campina Grande - PB, refletindo a falta de atualização ocorrida nos órgãos gestores municipais.

Neste contexto, analisando o uso de mecanismos poupadores, concluiu-se que são boas ferramentas para economia de água. Para todo o bairro do Catolé a economia foi de 10,42%, utilizando os mecanismos apenas nos edifícios residenciais. Além disso, a substituição representou baixos custos de investimentos em relação ao custo total da obra, e se mostrou vantajosa quando comparada à economia de água de 83,26%, gerada ao longo da vida do edifício. Deve-se considerar principalmente que a sua utilização consiste simplesmente em substituir os equipamentos convencionais pelos poupadores, não exigindo grandes intervenções na construção do edifício e nem mudanças drásticas no comportamento dos usuários. Também não agride o meio ambiente com os impactos causados por grandes obras de transporte de águas.

Portanto é possível minimizar o problema da escassez da água, utilizando instrumentos de gerenciamento que contribuam para a racionalização do uso.

RECOMENDAÇÕES

Considerando apenas as variáveis utilizadas nesse estudo, verificou-se que uma pequena variação populacional na cidade de Campina Grande – PB gerou impactos de proporções consideráveis nas infraestruturas da cidade, acentuando-se a necessidade de implantar leis para estimular o consumo racional dos recursos naturais, principalmente da água.

Portanto, recomenda-se que o crescimento urbano deve ser acompanhado de perto pelos gestores municipais e que este trabalho seja aprofundado em outras variáveis da expansão urbana.

REFERÊNCIAS

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    Mar 2016

Histórico

  • Recebido
    25 Abr 2014
  • Revisado
    05 Jun 2015
  • Aceito
    13 Out 2015
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