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Dos requisitos jurídicos para a instauração do processo de impeachment do Presidente da República

Legal requirements for the establishment of the process of impeachment of the President of the Republic

Resumo

O artigo tem por objetivo realizar reflexões a respeito dos fundamentos teóricos que embasam o regime de sancionamento por crimes de responsabilidade cometidos pelo Presidente da República, levando em consideração as peculiaridades procedimentais que deverão ser observados no momento do julgamento político, bem como as garantias processuais que deverão ser asseguradas aos acusados.

Palavras-chave:
impeachment; julgamento político; princípio republicano; controle judicial; devido processo legal

Abstract

The article aims to present some reflections on the theoretical foundations that support the sanctioning regime for acts punishable by impeachment committed by the President of the Republic, taking into account the procedural peculiarities which should be observed at the time of political judgment as well as the procedural guarantees which should be provided to the accused.

Keywords:
impeachment; political judgment; republican principle; judicial review; due process of law

1. INTRODUÇÃO

Recentemente, conhecidos doutrinadores externaram suas convicções no tema da responsabilização político-administrativa do Presidente da República. Dentre eles, nos chamaram atenção os pareceres de Ives Gandra da Silva Martins e Adilson Abreu Dallari. Ambos versam sobre a viabilidade jurídica da abertura de processo visando à cassação do mandato do Presidente da República em exercício.

No presente artigo procuramos elucidar os requisitos jurídicos para a instauração do processo de impeachment do Presidente da República, o que demanda, no nosso entender, a observância de um regime constitucional de tipologia estrita.

O regime jurídico deste excepcional mecanismo de controle deve ser construído considerando-se, ainda, a elaboração teórica das funções do Estado e o conceito de função política assimilada por esta mesma construção informadora de toda a estrutura do Estado, dada pela Constituição.

Assim é que os requisitos jurídicos para a instauração do processo de impeachment do Presidente da República, e respectivo processo, ainda que vise cominar infração político-administrativa, devem ser extraídos do quanto disposto no nosso Direito positivo, especialmente considerando o arcabouço constitucional, o que não se reduz à intelecção literal e isolada dos artigos 85 e 86 da Constituição.

Para a análise desse tema, necessário se faz lançar mão de uma interpretação sistemática dos princípios republicano e democrático, bem como dos fundamentos (art. 1º) e objetivos (art. 3º) da República Federativa do Brasil, como se passa a expor.

2. A ELABORAÇÃO TEÓRICA DAS FUNÇÕES DO ESTADO E O CONCEITO DE FUNÇÃO POLÍTICA

Na elaboração das funções do Estado, afastamo-nos da modelagem da clássica teoria da “separação dos poderes” de modo a evitar a construção de uma concepção de soberania divisível, fracionada. Assim, “só por antonomásia é que se poderia denominar de separação de poderes a doutrina que pretende explicar e justificar a estruturação do ‘poder’ do Estado”1 1 TAVARES, André Ramos. Repartição de funções estatais: fundamento, estrutura e finalidade. Revista do Advogado, São Paulo, vol. 23, n. 73, p. 21-26, nov/2003. p. 24. .

O poder do Estado é indivisível e personifica o poder político do povo. Fundar uma análise da realidade, portanto, em separação de poder é um contrassenso: o que, por natureza, é uno, não se sujeita a divisibilidade. Nos termos propostos por Karl Loewenstein, a chamada separação é, na verdade, distribuição de determinadas funções a diferentes órgãos do Estado, razão pela qual o vocábulo deve ser entendido de maneira meramente figurativa2 2 Loewenstein, Karl. Teoría de la constitución. Barcelona: Ariel, 1986. p. 55. , ou então organizacional.

Por conseguinte, a ideia de “separação dos poderes do Estado”, como técnica de limitação do poder político deve dar lugar a uma abordagem feita a partir das funções do Estado. Apenas as funções do Estado - atividades específicas, coordenadas e teleológicas - é que se sujeitam a parcelamentos, conforme Georges Burdeau3 3 Burdeau, Georges. Remarques sur la classification des fonctions étatiques. Revue du droit public. Paris, n. 60, p. 202-228, 1945. .

Tratando-se de expressão com conteúdo polissêmico, há de se fazer um apanhado da construção semântica das funções do Estado ou ainda de sua confirmação. Assim conduz-se um esforço de composição de um conteúdo de significado comum, com alguma objetividade, ao qual se possa referir para a análise a que nós propomos.

Aristóteles apontou, no século IV a.C., dentro do contexto de funções do Estado, a existência das funções deliberativa, executiva e judicial4 4 Aristóteles. A política. Brasília: UNB, 1997. . Políbio, no século II a.C, propôs o chamado governo misto, o qual considerava ideal pela combinação entre as formas de governo clássicas5 5 Políbio. História. Brasília: UNB, 1985. . Posteriormente, Cícero defendeu que a melhor alternativa às formas de governo monarquia, aristocracia e democracia seria aquela que resultasse da combinação das três. Isso garantiria a igualdade e a liberdade6 6 CÍCERO, Marco Tulio. Da república. São Paulo: Atena, 1956. .

Com efeito, Aristóteles foi o primeiro a apontar de tal modo organizado a existência das funções do Estado. Não se pode falar que haja nele, porém, alguma sugestão de que estas funções seriam mais bem desempenhadas quando atribuídas a órgãos diferentes. Em Políbio e Cícero, do mesmo modo, não se pode falar que às diferentes funções corresponderiam diferentes órgãos.

Apenas mais tarde, com John Locke, é que se pode falar na necessidade de entrega de diferentes funções a distintos órgãos do Estado. Sua obra Two treatises on government contém o elemento fundamental para o reconhecimento das diferentes funções estatais e sua atribuição a diferentes órgãos do Estado7 7 Locke, John. Segundo tratado sobre o governo civil e outros escritos. Petrópolis: Edusf, 2006. .

Coube a Montesquieu, lastreado no chamado pessimismo antropológico, a formulação da doutrina da separação dos poderes com a nomenclatura, bicameralismo legislativo e independência judicial usualmente conhecidos. O cerne da sua doutrina consiste na entrega de díspares funções a órgãos distintos e especializados, o que serviria de mecanismo de contenção do poder.

A separação orgânico-funcional estabelecida por Montesquieu parte de uma concepção iluminista de lei e de uma ideia mecanicista da função judicial8 8 PIÇARRA, Nuno. A separação dos poderes como doutrina e princípio constitucional: um contributo para o estudo das suas origens e evolução. Coimbra: Coimbra, 1989. p. 122-123. . Se tradicionalmente a separação das funções do Estado envolvia apenas a legislativa e executiva, Montesquieu acrescentou a judicial. A relevância da elaboração teórica das funções do Estado levada a efeito está, ainda, na completude científica e na atribuição do caráter jurídico a tais funções.

Para Georg Jellinek9 9 JELLINEK, Georg. L’etat moderne et son droit. Paris: Pantheon-Assas, 2005. o Estado detém dois fins: um jurídico e outro cultural. Pelo primeiro aspecto, estabelece e tutela o direito; pelo segundo, o Estado afirma a força e incrementa a cultura. Para a satisfação destes fins, o Estado se vale do estabelecimento de regras abstratas e atua concretamente para o alcance de objetivos individualizados. De acordo com o autor, nas funções do Estado, podem-se distinguir atividades livres - marcante na função legislativa - e vinculadas, ampla na jurisdicional.

A despeito do reconhecimento do fim cultural do Estado, há em Georg Jellinek apenas funções jurídicas, razão pela qual pondera Marcello Caetano que este “estava dominado pela ideia kantiana de que a razão de ser do Estado é a realização da Ordem jurídica, donde resultava o seu preconceito de só definir funções jurídicas”10 10 CAETANO, Marcello. Manual de ciência política e direito constitucional. t. I. Coimbra: Almedina, 2009. p. 154. .

Léon Duguit, na determinação das funções do Estado, vale-se da noção de ato jurídico, qual seja, a manifestação de vontade tendente à produção de modificações na ordem jurídica, seja atual, seja futura próxima11 11 DUGUIT, Léon. Traité de droit constitucionnel. Vol. I, p. 219. apud Caetano, Marcello. Manual de ciência política e direito constitucional. t. I. Coimbra: Almedina, 2009. p.151. . O ato jurídico, neste contexto, pode assumir a feição de ato-regra, ato-condição e ato subjetivo. O ato-regra é produzido com intento modificativo de regras abstratas constitutivas de direito objetivo. O ato-condição torna aplicável, a um indivíduo, regras abstratas determinadas que lhe eram inaplicáveis antes da prática do ato. O ato subjetivo gera obrigação especial, concreta, individual e momentânea, não imposta por nenhuma regra abstrata12 12 DUGUIT, L. Manuel de droit constitutionnel. Paris: Pantheon-Assas, 2007. p. 26. .

Em Hans Kelsen, o Estado identifica-se com a ordem jurídica, razão pela qual as funções do Estado são tipicamente jurídicas. As funções do Estado correspondem a graus ou modos de realização da ordem jurídica. A aplicação do direito é, concomitantemente, sua produção. Todo ato jurídico é, simultaneamente, aplicação de uma norma superior, e produção, regulada por esta norma, de uma outra que lhe seja inferior13 13 KELSEN, Hans. General theory of Law and State. Cambridge: Harvard University, 1999. p. 269. .

A premissa fundamental para a compreensão da divisão de funções proposta por Hans Kelsen é, por conseguinte, a concepção da sua Teoria pura do direito. O estudo de validade e criação da ordem jurídica, correspondendo à estática e à dinâmica da ordem estatal, pressupõe Estado enquanto ordem normativa. Partindo da premissa de que as funções executiva e judicial são, em essência, a mesma coisa, qual seja, aplicação do direito, Hans Kelsen vislumbra apenas essas duas funções do Estado14 14 KELSEN, Hans. General theory of Law and State. Cambridge: Harvard University, 1999. .

Georges Burdeau, atento aos atos do Estado, admite serem duas as suas funções fundamentais. Uma governamental, caracterizada por ser incondicionada, criadora e autônoma, subdividindo-se em legislativa e governamental stricto sensu. Outra, administrativa, marcada por ser derivada, secundária e subordinada, a qual se divide em jurisdicional, regulamentar e administrativa stricto sensu15 15 Burdeau, Georges. Remarques sur la classification des fonctions étatiques. Revue du droit public, Paris, n. 60, p. 202-228, 1945. .

Para Karl Loewenstein existem três funções do Estado. Policy determination, relacionada à deliberação das decisões políticas fundamentais conformadoras da sociedade no presente e no futuro; policy execution, voltada à adoção de medidas necessárias à implementação das decisões fundamentais; e, por fim, policy control, vinculada ao controle político dos órgãos estatais16 16 Loewenstein, Karl. Teoría de la constitución. Barcelona: Ariel, 1986. p. 312. .

Traçando um quadro abrangente das diversas modalidades das atividades desenvolvidas pelo Estado, Marcello Caetano, não crendo poderem estas reduzir-se à criação e aplicação do direito, ressalta a preocupação com atividades do Estado cujo conteúdo escapa dos atos de criação e aplicação do direito. Estas outras atividades, para o autor nem sempre em si mesmas jurídicas, e quando muito exteriormente reguladas pela lei, correspondem à função política e à técnica, as quais estão em relação de complementaridade e interdependência com as funções jurídicas do Estado legislativa e executiva.

A por ele chamada de Teoria integral das funções do Estado, assim, implica em dizer que “se todas as funções do Estado podem considerar-se jurídicas no sentido de que podem constituir objeto do Direito, há atividades com conteúdo jurídico e outras sem conteúdo jurídico”17 17 CAETANO, Marcello. Manual de ciência política e direito constitucional. t. I. Coimbra: Almedina, 2009. p. 158. .

A função política liga-se à atividade dos órgãos do Estado cujo objeto direto e imediato é a conservação da sociedade política e a definição e prossecução do interesse geral mediante a livre escolha dos rumos ou das soluções consideradas preferíveis18 18 CAETANO, Marcello. Manual de ciência política e direito constitucional. t. I. Coimbra: Almedina, 2009. p. 172. .

A função técnica relaciona-se à atividade dos agentes do Estado cujo objeto direto e imediato consiste na produção de bens ou na prestação de serviços destinados à satisfação de necessidades coletivas de caráter material ou cultural, de harmonia com preceitos práticos tendentes a obter a máxima eficiência dos meios empregados.

A função legislativa define-se como a atividade dos órgãos do Estado que encerra o estabelecimento, direto e imediato, de normas de caráter geral e impessoal inovadoras da ordem jurídica19 19 CAETANO, Marcello. Manual de ciência política e direito constitucional. t. I. Coimbra: Almedina, 2009. p. 166. .

A função executiva consiste na atividade dos órgãos que tenham por objeto, direto e imediato, a promoção e garantia do cumprimento das leis e aplicação de sanções20 20 CAETANO, Marcello. Manual de ciência política e direito constitucional. t. I. Coimbra: Almedina, 2009. p. 168. . Esta função engloba as modalidades jurisdicional, caracterizada pela imparcialidade e passividade, e administrativa, marcada, ao contrário, pela parcialidade e iniciativa.

Marcello Caetano, como se vê, baseia sua Teoria integral das funções do Estado no aspecto material das funções. O conteúdo dos atos estatais e os resultados almejados são, assim, o alicerce da referida teoria, a qual aparta, em duas funções estatais diferentes, a definição de rumos do Estado e a positivação de regras.

Jorge Miranda apresenta uma divisão tricotômica das funções do Estado considerando, para tanto, a conjugação de critérios materiais, formais e orgânicos21 21 MIRANDA, J. Op. cit. p. 22. . A inovação desta teoria, além da conjugação de critérios, está na detecção de zonas de fronteira e de funções complementares, acessórias ou atípicas.

Funções política, administrativa e jurisdicional decorrem, portanto, dos fins ou do objeto dos atos em razão dos quais se desenvolvem (critério material), em razão dos modos e formas de sua manifestação (critério formal) e das instituições através dos quais são praticados estes atos (critério orgânico).

A função política, pelo critério material, compreende a definição primária e global do interesse público, a interpretação dos fins do Estado e escolha dos meios adequados para atingi-los, além da sua direção. Pelo critério formal, abrange a liberdade ou discricionariedade máxima com subordinação às regras jurídicas, liberdade de escolha e ausência de sanções jurídicas específicas. Pelo critério orgânico, engloba os órgãos políticos e governativos em conexão direta com a forma e o sistema de governo.

A função política compreende a função legislativa, ou legislatio, e governativa, ou política stricto sensu, ou ainda gobernatio, consoante se traduza em atos normativos, direta ou indiretamente, explícita ou implicitamente, e em atos de conteúdo não normativo.

A função administrativa, pelo critério material, realiza-se pela satisfação constante e cotidiana das necessidades coletivas, além da prestação de bens e serviços. Pelo critério formal, a iniciativa e, em regra, a parcialidade na prossecução do interesse público. Pelo critério orgânico, marca-se pela dependência funcional, com sujeição, no interior de cada sistema ou aparelho de órgãos e serviços, às ordens e instruções e ao recurso hierárquico.

A função jurisdicional, pelo critério material, abarca a declaração do direito em concreto e em abstrato. Pelo critério formal, marca-se pela passividade e imparcialidade. Pelo critério orgânico, pela independência e atribuição a órgãos específicos, os tribunais.

Conceituadas as funções, pontifica Jorge Miranda que “os atos próprios de cada função devem provir, em princípio, de órgãos correspondentes a essa função. Todavia encontram-se [...] algumas interpenetrações e inevitáveis zonas cinzentas”22 22 MIRANDA, J. Op. cit. p. 34. . Todavia, tendo em vista o direito positivo português, o autor elenca hipóteses nas quais não se pode falar em exatidão desta correspondência. Cita, dentre outras, as chamadas decisões aditivas do Tribunal Constitucional português e a verificação de fatos e atos do Presidente da República23 23 Ibid. p. 35. .

Esses atos assimétricos, ainda que significativos, não afetam, segundo o autor, o núcleo especificador dos órgãos a que são cometidos24 24 Ibid. p. 36. . De fato, não são eles que individualizam as funções do Estado na sua generalidade, porém, ainda que não afetem, de forma absoluta, a tripartição de funções estatais, não se pode negar perturbações de ordens variadas.

Apresentada uma breve panorâmica da elaboração teórica das funções do Estado, estamos aptos a fixar o conceito de funções do Estado.

A função do Estado reflete, para Jorge Miranda, fim, tarefa ou incumbência, correspondente a certa necessidade coletiva ou a certa zona da vida social. Expressa, ainda, atividade com características próprias, modelo de comportamento25 25 Ibid. p. 8. .

No primeiro sentido, a função traduz o enlace entre a sociedade e o Estado e uma tentativa ou princípio de legitimação do exercício do poder. A função vincula-se, assim, ao Estado enquanto poder e como comunidade26 26 Ibid. p. 8-9. .

No segundo, expressa atos e atividades que o Estado, constantemente, desenvolve em harmonia com as regras que o condicionam e conformam. A função, assim, é uma manifestação específica do poder político, um modo tipicizado de exercício do poder27 27 Ibid. p. 8-9. .

Em ambas as acepções, “exibe-se um elemento finalístico: directamente, na função como tarefa; indirectamente, na função como actividade”28 28 Ibid. p. 9. . Com efeito, a tarefa é o fim historicizado que implica na adstrição de um comportamento que inexiste por si mesmo; a atividade, um meio para a consecução de fins qualificados.

A função no sentido de atividade relaciona-se a um complexo ordenado de atos, interdependentes, ou apenas aparentemente, uns em relação aos outros, destinados à persecução de um fim ou de vários fins conexos. É a atividade, desenvolvida pelo Estado, por meio de seus órgãos e agentes, na realização das incumbências que lhe são atinentes constitucional e legalmente. Não há, nessa perspectiva, atividade do Estado senão nos limites do direito. A atividade é específica ou diferenciada, duradoura e globalizada29 29 MIRANDA, J. Op. cit. p. 11. .Para o mesmo autor, “são os fins do Estado, permanentes ou conjunturais, que determinam o tipo e a feição das actividades dos seus órgãos e agentes, e são as normas jurídico-públicas que as qualificam como actividades do Estado”30 30 Ibid. p. 11. .

Marcello Caetano, do mesmo modo, adota o elemento finalístico para a qualificação da noção de funções do Estado. Para ele a função é uma “actividade específica, complementar de outras actividades também específicas cujo exercício coordenado é indispensável à produção de certo resultado”31 31 CAETANO, Marcello. Manual de ciência política e direito constitucional. t. I. Coimbra: Almedina, 2009. p. 148. .

As funções do Estado, assim, relacionam-se à compreensão da sua ação haja vista os fins de segurança, justiça e bem-estar32 32 CAETANO, Marcello. Manual de ciência política e direito constitucional. t. I. Coimbra: Almedina, 2009. p. 149. . Funções do Estado são, assim, atividades específicas, coordenadas e teleológicas. Tais funções sempre estão condicionadas pelo direito.

3. A FUNÇÃO POLÍTICA DO ESTADO

Para levar a cabo a análise proposta, é necessário debruçarmos-nos dentre as várias funções estatais, na sua função política.

Marcello Caetano sustenta que a função política é atividade não jurídica do Estado. Não conteria, em si mesma, criação e execução do direito, ainda que possa adotar, em determinadas hipóteses, formas jurídicas ou sujeitar-se ao direito33 33 CAETANO, Marcello. Manual de ciência política e direito constitucional. t. I. Coimbra: Almedina, 2009. p. 171. .

Entretanto, dentro da apresentada elaboração teórica das funções do Estado, só se pode adotar um conceito de função política nos quadrantes do direito posto.

A função política é atividade fundamental dos órgãos superiores do Estado com vistas a assegurar, verbi gratia, a unidade e coesão nacionais, definir ideais coletivos, escolher objetivos concretos a realizar e os meios a serem empregados, além de manter o equilíbrio constitucional34 34 CAETANO, Marcello. Manual de ciência política e direito constitucional. t. I. Coimbra: Almedina, 2009. p. 172. .

Há que se destacar que esta opção em temas fundamentais para a preservação do Estado e promoção do bem comum, por órgãos instituídos pela Constituição, ocorre dentro de uma margem de interpretação das disposições constitucionais.

Jorge Miranda destaca que o específico da função política está na incindibilidade total da forma e do sistema de governo. Ou seja, é a Constituição que, sintonizada com a forma e o sistema de governo por ela consagrado, cria e regula os órgãos incumbidos do exercício da função política35 35 MIRANDA, J. Op. cit. p. 28. .

A função política, destarte, é a atividade de definição primária e global do interesse público, a atividade de interpretação dos fins do Estado e escolha dos meios adequados para atingi-los. Inerente ao conceito está, ainda, o exercício por órgãos em conexão direta com a forma e o sistema de governo.

Assim é que Cristina M. M. Queiroz assinala ser a função política “muito mais do que a simples afirmação de uma actividade governamental tout court36 36 QUEIROZ, Cristina Maria Machado. Os actos políticos no Estado de Direito. Coimbra: Almedina, 1990. p. 112. . Não se apresenta, do mesmo modo, como momento destacado na atividade do governo, mas “diz respeito a todos os órgãos constitucionais chamados à concretização da vontade política constitucionalizada”37 37 QUEIROZ, Cristina Maria Machado. Os actos políticos no Estado de Direito. Coimbra: Almedina, 1990. p. 112. .

Quanto ao exercício por opções em temas fundamentais, recorde-se Jorge Miranda, para o qual a função política possui por característica “a interpretação dos fins do Estado e escolha dos meios adequados para os atingir em cada conjuntura”38 38 MIRANDA, J. Funções do Estado. Revista de Direito Administrativo. Rio de Janeiro, vol. 189, p. 85-99, 1992.

Intrínseco ao exercício da função política está a liberdade de escolha, dentro do campo de interpretação da Constituição, relacionada aos rumos e condução dos meios para a manutenção ou transformação das estruturas de uma sociedade global ou das relações fundamentais entre sociedades, como afeiçoa Michel Debrun39 39 DEBRUN, Michel. O fato político. Rio de Janeiro: FGV, 1962. p. 37. .

Conclui-se, assim, que a função política do Estado relaciona-se, basicamente, ao exercício do poder de decisão política por órgãos em conexão direta com a forma e o sistema de governo, os quais são responsáveis pela concretização da vontade política constitucionalizada, concretização esta que ocorre dentro dos quadrantes do direito posto.

4. A RELAÇÃO ENTRE O DIREITO E A POLÍTICA

No contexto da distinção clássica entre o direito e a política, salienta Larry D. Kramer40 40 “We in the twenty-first century tend to divide the world into two distinct domains: a domain of politics and a domain of law. In politics, the people rule. But not in law. Law is set aside for a trained elite of judges and lawyers whose professional task is to implement the formal decisions produced in and by politics” (Kramer, Larry D. The people themselves: popular constitutionalism and judicial review. New York: Oxford University, 2004, p. 7). que à política, a soberania popular, o princípio majoritário e o domínio da vontade; ao direito, o primado da lei (the rule of the law), o domínio da razão. Nesse contexto, Georg Jellinek vincula a Constituição aos princípios jurídicos que definem os órgãos supremos do Estado, sua criação, suas relações mútuas, determinam o âmbito de sua atuação e a situação de cada um deles em relação ao poder do Estado41 41 JELLINEK, Georg. Allgemeine Staatslehre. Darmstadt: Wissenschaftliche Buchgesellschaft, 1960. p. 505. .

Para o referido autor, a política está fora da Constituição42 42 ELLINEK, Georg. Allgemeine Staatslehre. Darmstadt: Wissenschaftliche Buchgesellschaft, 1960. p. 361-363. . Além do mais, deveria haver uma separação entre o direito e a política no estudo do Estado, inclusive na análise da Constituição43 43 JELLINEK, G. Verfassungsanderung und Verfassungswandlung: Eine staatsrechtlichepolitische Abhandlung. Goldbach: Keip Verlag, 1996. p. 5-6. .

A teoria jurídica do Estado de Georg Jellinek, segundo Pedro de Veja García, está ligada a três pressupostos: a positividade do direito, o monopólio estatal da produção jurídica e a personalidade jurídica do Estado44 44 GARCÍA, Pedro de Vega. El tránsito del positivismo jurídico al positivismo jurisprudencial en la doctrina constitucional. apud: Bercovici, Gilberto. Constituição e política: uma relação difícil. Lua Nova, n. 61. 2004, p. 5-24, p. 6. .

Sustentam-se na distinção clássica entre o direito e a política as crenças da neutralidade científica, da completude do direito e a da interpretação judicial como um processo puramente mecânico de concretização das regras jurídicas, em valorações estritamente técnicas.

A relação entre o direito e a política encontra-se cunhada pela positivação do direito, assim entendida como passagem da validade tradicional ou transcendente para validade decisionista, como afeiçoa Dieter Grimm45 45 Grimm, Dieter. Constituição e política. Belo Horizonte: Del Rey, 2006. p. 3. . Ainda que o que valha juridicamente seja decidido politicamente, a política, segundo o referido autor, subordina-se ao direito.

Não há conteúdo politicamente independente do direito. Porém, já que o direito não pode operar determinadas modificações a partir de si mesmo, faz-se necessário a existência de uma instância com legitimidade de decisão que se encarregue de restabelecer o nexo perdido entre exigências sociais e soluções jurídicas46 46 Grimm, Dieter. Constituição e política. Belo Horizonte: Del Rey, 2006. p. 6. .

Pondera Luís Roberto Barroso que o “direito é, certamente, diferente da política. Mas não é possível ignorar que a linha divisória entre ambos, que existe inquestionavelmente, nem sempre é nítida, e certamente não é fixa”47 47 BARROSO, Luís Roberto. O controle de constitucionalidade no direito brasileiro. São Paulo: Saraiva, 2010. . Portanto, direito e política, ainda que pretensamente diversificados e separados por linhas de demarcação analítica, normativa ou funcional, estão osmoticamente atrelados48 48 BARACHO, José Alfredo de Oliveira. O ambiente sistêmico da função judicial e o espaço político da magistratura. Revista de Processo, vol. 98, p. 43, abr.-jun, 2000. .

Os laços entre o direito e a política são, com efeito, inevitáveis. Destaca o citado autor que o por ele chamado de “encontro não marcado entre o direito e a política” ocorre em razão da linguagem aberta dos textos jurídicos, das inevitáveis colisões de normas constitucionais e dos desacordos morais razoáveis (moral reasonable disagreement), relacionados à ausência de conciliação possível sobre determinadas matérias em sociedades pluralistas.

Rudolf Smend tinha por Constituição a ordenação jurídica do Estado, a dinâmica vital na qual se desenvolve a vida estatal, isto é, de seu processo de integração com vistas à permanente reestruturação da realidade total do Estado. A Constituição seria o modelo legal ou normativo de determinados aspectos deste processo49 49 SMEND, Rudolf. Verfassung und Verfassungsrecht in Staatsrechtliche Abhandlungen und andere Aufsätze. Berlin: Duncker & Humblot, 1994, p. 274. Apud: Bercovici, Gilberto. Constituição e política: uma relação difícil. Lua Nova, n. 61. 2004, p. 8. .

Coloca-se nesse sentido aproposta de “Constituição dirigente”, de José Joaquim Gomes Canotilho50 50 CANOTILHO, José Joaquim Gomes. Constituição Dirigente e Vinculação do Legislador: Contributo para a Compreensão das Normas Constitucionais Programáticas. Coimbra: Coimbra, 2001. , que pela teoria material da Constituição, pondera que, como todas as Constituições conformam o político, racionalizando-o, há o estabelecimentode uma vinculação jurídica para os atos políticos.

Não se pode negar, por conseguinte, que a Constituição seja uma interface entre os universos jurídico e político. Em sendo o direito constitucional um direito político, devemos retomar a proposta de Karl Loewenstein, que entendia a teoria da Constituição como uma explicação realista do papel que a Constituição detém na dinâmica política51 51 LOEWENSTEIN, Karl. Teoría de la constitución. Barcelona: Ariel, 1986. p. 217-222. .

Entretanto, não se está a patrocinar uma invasão indevida da política no direito e, em especial, na Constituição. Esta politização corresponde às respostas que o direito deve oferecer às demandas do sistema político a partir de sua própria recursividade52 52 Como bem sintetiza Celso Fernandes Campilongo: “as grandes categorias do constitucionalismo moderno constroem as bases estruturais para a autonomia funcional do direito (...). Mas as Constituições, se de um lado fornecem as ferramentas para o fechamento operativo do direito, de outro também são o mecanismo da abertura cognitiva do direito para a política. No Estado de Direito, o sistema jurídico fornece respostas legais aos problemas da política. Isso não representa ignorância ou insensibilidade para a política. Ocorre que os problemas da política são traduzidos, deslocados e selecionados pelo sistema jurídico com critérios particulares e internos a esse sistema. Enquanto a política opera num quadro de complexidade elevada e indeterminada, o direito atua num contexto de complexidade já reduzida e determinada por limites estruturais mais rigorosos.” (Campilongo, Celso Fernandes. Política, sistema jurídico e decisão judicial. São Paulo: Max Limonad, 2002. p. 24). . O intuito é, ainda, frisar que não há função política do Estado senão nos quadrantes do direito posto.

5. O CRIME DE RESPONSABILIDADE: NATUREZA JURÍDICA

O exercício do munus público sujeita os agentes políticos à responsabilidade, eis que o princípio republicano informa toda a nossa estrutura do Estado53 53 SERRANO, Pedro Estevam Alves Pinto. Princípio republicano e provimento dos cargos públicos. Revista da Faculdade de Direito das Faculdades Metropolitanas Unidas, São Paulo, n. 10, ano 14, p. 67-99, 1996. , o qual impõe que os agentes públicos sejam responsáveis (accountable) pelos comportamentos que adotem no exercício da sua função pública.

A forma republicana de governo é, para José Joaquim Gomes Canotilho, “constitutiva de uma inarredável identidade constitucional”54 54 Canotilho, José Joaquim Gomes. Direito constitucional e teoria da Constituição. Coimbra: Almedina, 2003. p. 228. . Assim é que uma das principais características da forma republicana está na “ideia de ‘antiprivilégio’ no que respeita à definição dos princípios e critérios ordenadores do acesso à função pública e aos cargos públicos”. Na expressão do autor, a forma republicana de governo relaciona-se aos critérios de “electividade, colegialidade, temporariedade e pluralidade, aos critérios de designação, hierarquia e vitaliciedade”55 55 Canotilho, José Joaquim Gomes. Direito constitucional e teoria da Constituição. Coimbra: Almedina, 2003. .

Para José Afonso da Silva, a eleição periódica, por si só, não esgota a realidade democrática. Por essa razão é que, ao longo do exercício do mandato popular, os representantes devem responder pelos atos praticados no decorrer deste mesmo mandato56 56 SILVA, José Afonso da. Curso de direito constitucional positivo. São Paulo: Malheiros, 2008. p. 550. .

Com efeito, o crime de responsabilidade é uma infração político-administrativa praticada por determinados agentes políticos, isto é, aqueles “titulares de cargos estruturais à organização política do País, ou seja, ocupantes dos que integram o arcabouço constitucional do Estado, o esquema fundamental do Poder. Daí que se constituem nos formadores da vontade superior do Estado”57 57 MELLO, Celso Antônio Bandeira de. Curso de direito administrativo. São Paulo: Malheiros, 2009. p. 246. .

Em regimes presidencialistas, o chefe de governo e de Estado, reunidos em um só agente58 58 O Presidente da República, como chefe do Executivo, assume as funções de Chefe de Estado e de Governo (SILVA, José Afonso da. Curso de direito constitucional positivo. São Paulo: Malheiros, 2008. p. 542-543). , pode sofrer o impedimento de seu mandato pelo Legislativo, mas isso apenas após a comprovação de condutas caracterizadoras de ilícitos, anteriormente previstas normativamente, e após comprovação consistente por métodos processuais que garantam ampla defesa e contraditório.

Ainda que se possa chamar, na classificação de Karl Loewenstein, de policy control59 59 Loewenstein, Karl. Teoría de la constitución. Barcelona: Ariel, 1986, p. 312. , referida competência assimétrica, pelo Legislativo, compreende o exercício de uma função política, que, como tal, deve abarcar a concretização da vontade política constitucionalizada, concretização esta que ocorre dentro dos quadrantes do Direito posto.

Os artigos 85 e 86 da Constituição tratam da responsabilidade do Presidente da República. O primeiro dispositivo prevê que são crimes os atos que atentem contra a Constituição. É indicado um rol exemplificativo de condutas típicas. Prevê-se, ainda, que tais crimes serão definidos em lei especial, que estabelecerá as normas de processo e julgamento. Referida espécie normativa é a Lei n.º 1.079/1950, que foi recepcionada, parcialmente, pela Constituição60 60 Nesse sentido: STF. MS n.º 21.564/DF, Rel. para o acórdão Min. Carlos Velloso, julgamento em 23.09.1992. .

O termo impeachment é utilizado para identificar o processo mediante o qual se promove a apuração e o julgamento do crime de responsabilidade. O instituto nasceu na Grã-Bretanha e foi adotado pelos Estados Unidos da América a partir de 1787. No Brasil, o mecanismo nasceu na Constituição de 1891. Todas as Constituições seguintes o acolheram. As primeiras leis ordinárias a regulamentar a matéria foram a Lei n.º 27/1892 e a Lei n.º 30/1892, ambas editadas no regime da Constituição de 189161 61 Barroso, Luís Roberto. Crime de responsabilidade e processo de impeachment. Doutrinas Essenciais de Direito Constitucional, vol. 3, maio/2011. p. 615 .

O impeachment é um mecanismo do Legislativo para controlar os membros do Executivo. Talvez por essa razão que a nossa doutrina, por muito tempo, sustentou que o processo por crime de responsabilidade teria natureza essencialmente política.

Paulo Brossard de Souza já alertava que “o impeachment tem feição política, não se origina senão de causas políticas, objetiva resultados políticos, é instaurado sob considerações de ordem política e julgado segundo critérios políticos - julgamento que não exclui, antes supõe, é óbvio, a adoção de critérios jurídicos”62 62 PINTO, Paulo Brossard de Souza. O impeachment: aspectos da responsabilidade política do presidente da república. 1965. p. 71. .

Com efeito, o processamento e julgamento do crime de responsabilidade pelo Legislativo ocorrem dentro do exercício de uma competência atípica, estranha à função primária do Legislativo na divisão de funções estatais na República.

Ainda que atípica, a função exercida pelo Legislativo ocorre nos quadrantes do conceito de função política do Estado. Deve-se afastar, assim, a arbitrariedade e a discricionariedade na concretização dos conceitos indeterminados da definição legal típica dos crimes de responsabilidade.

Rememore-se, aqui, Celso Antônio Bandeira de Melo, para o qual apenas “no interior das fronteiras decorrentes da dicção legal é que pode vicejar a liberdade (...)”63 63 MELLO, Celso Antônio Bandeira de. Curso de direito administrativo. São Paulo: Malheiros, 2009. p. 951. . Há, com efeito, hipóteses em que a Constituição e a lei regulam dada situação em termos tais que não resta para o intérprete margem alguma de liberdade. Isso ocorre quando a regra “prefigura antecipadamente com rigor e objetividade absolutos os pressupostos requeridos [...]”64 64 MELLO, Celso Antônio Bandeira de. Curso de direito administrativo. São Paulo: Malheiros, 2009. p. 951. . Nesse caso, há vinculação. Ao contrário, há discricionariedade quando existe uma campo de “indeterminação normativa” no qual incide uma “certa esfera de liberdade”65 65 MELLO, Celso Antônio Bandeira de. Curso de direito administrativo. São Paulo: Malheiros, 2009. p. 952. .

A interpretação constitucional contém particularidades que a singularizam no universo da interpretação jurídica em geral. As complicações da interpretação constitucional remontam, em suma, às peculiaridades do Direito constitucional, bem como da Constituição.

Neste contexto, a superioridade da Constituição e a natureza da sua linguagem, marcada pela textura aberta, vagueza dos princípios e dos conceitos jurídicos indeterminados, são um contributo decisivo à particularização da interpretação constitucional. Esta problemática não passou despercebida por Eduardo Garcia de Enterria66 66 Enterria, Eduardo Garcia de. La constitucion como norma y el tribunal constitucional. Madrid: Civitas, 1988. p. 231. , o qual, sensível à amplitude das fórmulas adotadas pela Constituição, salienta que a interpretação constitucional será sempre inserta em uma problemática que exclui qualquer parâmetro simplista67 67 Enterria, Eduardo Garcia de. La constitucion como norma y el tribunal constitucional. Madrid: Civitas, 1988. p. 223. .

Sob a ótica analítica da dogmática jurídica, o chamado conceito jurídico indeterminado68 68 ALEXY, Robert. Teoria da argumentação jurídica. São Paulo: Landy, 2001. p. 246. , por exemplo, possui o que Paulo de Barros Carvalho chama de heterogeneidade de conteúdo: “o direito posto, na sua continuidade normativa, oferece flagrante heterogeneidade de conteúdos, vista sua pretensão de regular as condutas intersubjetivas no contexto social”69 69 Carvalho, Paulo de Barros. Direito tributário: linguagem e método. São Paulo: Noeses, 2013. p. 181. .

A importância da diferença entre os conceitos apontados reside na compreensão do papel que podem desempenhar como argumentos dogmáticos no discurso jurídico.

Com efeito, enquanto os “conceitos jurídicos autênticos” estão inseridos “na dogmática ajustada ao tratamento conceitual-sistemático da lei válida”, os “outros conceitos que ocorrem nas normas jurídicas”70 70 Carvalho, Paulo de Barros. Direito tributário: linguagem e método. São Paulo: Noeses, 2013. p. 181. estão incluídos no campo da interpretação pura, despicienda de regulamentação normativa que lhe conceitue. Esses últimos existem independentemente de outras normas que os definam e devem ser interpretados de forma que seu significado coadune-se com o sistema fático-jurídico em que estão inseridos, segundo, portanto, os valores que integram o Direito posto.

Assim é que a competência do Legislativo de interpretar a Constituição não lhe permite interpretar dispositivos de forma extensiva de modo a invadir competência destinada pela Constituição ao Executivo ou Judiciário ou, ainda, a pretexto de dar cumprimento às determinações constitucionais, interromper o livre processo democrático e republicano de cumprimento de uma função pública outorgada pelo povo.

Tal entender atenta contra a ideia de divisão de funções que é, conforme salientamos na parte introdutória, inerente ao Estado Democrático de Direito. Só os impérios absolutistas ou regimes autoritários admitem centralização de funções diversas num mesmo órgão, por conta de sua vontade autônoma e não pela heteronomia expressa da Constituição.

Em outras palavras, em um Estado Democrático de Direito não existem juízos imperiais, que se caracterizam pela formação autônoma da vontade do julgador. Para ser tido como tal, qualquer julgamento, por mais discricionário que seja, é pautado pelo que Kant71 71 KANT, Immanuel. Fundamentação da metafísica dos costumes. São Paulo: Abril Cultural, 1974. p. 239. e a moderna teoria constitucional chamam de juízo heterônomo, qual seja, a vontade constituída a partir dos fins e processos estipulados na ordem jurídica e não no juízo absolutamente subjetivo.

Por essa razão é que quando se usa a expressão processo e julgamento políticos para tal forma de juízo não se quer dizer julgamento segundo a vontade integralmente autônoma e livre, inclusive com eventual dispensa do devido processo legal. Nesse ponto, comungamos com o entendimento do ilustre Adilson Abreu Dallari, para o qual não podem ser desprezadas, na apuração do crime de responsabilidade, as garantias constitucionais do devido processo legal e da ampla defesa, consubstanciadas no art. 5º, incisos LIV e LV, da Constituição.

Além do mais, o Presidente da República - o chefe de governo e de Estado de regime presidencialista - não se confunde com o Primeiro Ministro de um regime parlamentarista. Ele não pode, portanto, ser afastado da função por mero juízo de conveniência e oportunidade do Parlamento72 72 SILVA, José Afonso da. Curso de direito constitucional positivo. São Paulo: Malheiros, 2008. p. 543. , mas apenas pelo cometimento de infrações previstas normativamente e demonstradas com o devido processo legal.

Ou seja, a chamada perda da public trust, a ensejar moção de censura ou desconfiança do parlamentarismo, é inteiramente inaplicável ao nosso sistema presidencialista. No presidencialismo, o Presidente sujeita-se a um específico processo político-administrativo de responsabilização73 73 SILVA, José Afonso da. Curso de direito constitucional positivo. São Paulo: Malheiros, 2008. p. 550. .

Nesses termos é que quando se afirma que o Legislativo, ao promover o processo e julgamento do crime de responsabilidade, constitui-se em “tribunal especial, para o julgamento político”74 74 SILVA, José Afonso da. Curso de direito constitucional positivo. São Paulo: Malheiros, 2008. p. 552. , referido julgamento só pode ser qualificado como político desde que não se afaste dos quadrantes do ordenamento jurídico.

A característica maior do Estado de Direito está na submissão do político ao Direito. Isso significa que não há decisão política no âmbito do Estado de Direito que tenha tom ou caráter absolutista. Toda decisão, por mais discricionária e aparentemente livre e autônoma que seja, quando adotada pelo Estado, será sempre, de alguma forma, heterônoma, isto é, condicionada pela ordem jurídica.

Assim é que o crime de responsabilidade traz em si um regime jurídico, que visa estabelecer certas garantias ao Presidente da República. No regime presidencialista, o mandato não pode ser interrompido por mero voto de desconfiança do Legislativo. O Chefe do Executivo não é o representante do Parlamento, o que ocorre apenas no parlamentarismo. Não pode haver, portanto, a interrupção do mandato do Presidente porque se considera que ele agiu com incompetência ou inadequação no exercício das funções. A interrupção só pode ocorrer se houver crime de responsabilidade.

Ainda que o processo de impeachment ocorra no âmbito político-administrativo75 75 Nesse sentido: STF. IF 590 QO/CEF, Rel. Min. Celso de Mello, julgamento em 17.09.1998. , e não no contexto de um processo criminal76 76 Nesse sentido: STF. Pet 1365 QO/DF, Rel. Min. Néri da Silveira, julgamento em 03.12.1997. , deve-se oferecer as garantias próprias não só dos processos administrativos sancionadores, mas também de determinados elementos do processo judicial. Tanto assim é que a própria Lei n.º 1.079/1950, no seu art. 38, determina que no processo e julgamento do Presidente da República, serão subsidiários à lei, naquilo em que lhes forem aplicáveis, não só os regimentos internos da Câmara dos Deputados e do Senado Federal, como também o Código de Processo Penal.

Não estamos a dizer, com isso, que o crime de responsabilidade confunde-se com o ilícito penal, mas que referido processo sancionador não pode se afastar, em absoluto, das garantias mínimas da chamada teoria geral do processo.

Nesse ponto, discordamos do posicionamento do ilustre Adilson Abreu Dallari, para o qual deve ser excluído do exame do regime jurídico do processo de cassação do mandato qualquer aplicação indevida de preceitos do Código Penal e do Código de Processo Penal.

Discrepamos, ainda, do referido parecerista quando sugere que o processo de impeachment, em se tratando de processo administrativo, é dirigido à busca de verdade material, em especial no sentido de que, assim, determinados vícios do processo possam ser relevados, corrigidos ou convalidados.

Os sistemas de garantias próprio do Direito penal e do processo penal devem, no que couber, ser aplicados ao processo e julgamento do crime de responsabilidade, resguardando-se, inclusive, as garantias do regime republicano-representativo conferidas ao Presidente da República.

Nesses termos, o crime de responsabilidade é uma infração político-administrativa praticada por determinados agentes políticos, cujo processamento e julgamento decorre do exercício de uma função política do Legislativo, o que deve se dar nos quadrantes do Direito posto.

6. O CRIME DE RESPONSABILIDADE: ELEMENTOS CARACTERIZADORES

Os requisitos jurídicos para a instauração do processo de impeachment do Presidente da República, bem como o processo respectivo, ainda que vise a cominar infração político-administrativa, deve ser extraído do quanto disposto no nosso Direito positivo, especialmente considerando o arcabouço constitucional, o que não se reduz à intelecção literal e isolada dos artigos 85 e 86 da Constituição, devendo envolver a compreensão sistemática dos princípios republicano e democrático, bem como os fundamentos (art. 1º) e objetivos (art. 3º) da República Federativa do Brasil.

O crime de responsabilidade submete-se, na expressão de Luís Roberto Barroso, a um “regime de tipologia constitucional estrita”77 77 BARROSO, Luís Roberto. O controle de constitucionalidade no direito brasileiro. São Paulo: Saraiva, 2010. p. 615. , cabendo ao legislador ordinário tão-somente explicitar e minudenciar práticas que se subsumam aos tipos constitucionais.

Como antecipamos, o fato de o julgamento do crime de responsabilidade decorrer do exercício de uma função política do Estado não é alvará para que se atente contra os direitos fundamentais e o Estado de Direito. Por essa razão é que a aplicação de sanções no processo de crime de responsabilidade demanda o atendimento de requisitos para sua incidência válida.

Além disso, voltamos a frisar, os sistemas de garantias próprio do Direito penal e do processo penal devem, no que couber, ser aplicados ao processo e julgamento do crime de responsabilidade, em especial a regra da modalidade dolosa e, excepcionalmente, diante de expressa disposição legal, a culposa; o princípio in dubio pro reo; e, ainda, a interpretação restritiva. Assim é que, por exemplo, qualquer dúvida em faculdade polissêmica deve ser resolvida em favor do acusado.

A modalidade culposa incide apenas quando houver expressa previsão normativa78 78 Essa é, inclusive, a redação do art. 18 do Código Penal. , o que não há na Constituição. Exige-se, assim, que se comprove, para fins de responsabilização, que o agente tenha querido o resultado ou assumido o risco de produzi-lo. Excepcionalmente, se a lei expressamente assim dispuser, será possível a responsabilização baseada apenas na imprudência, negligência ou imperícia.

Não comungamos, portanto, do posicionamento do ilustre Adilson Abreu Dallari para o qual, no processo do crime de responsabilidade político-administrativa, qualquer dúvida interpretativa que remanesça deve ser dirimida no sentido que assegure maior eficácia ao princípio republicano, nos termos colocados.

Efetivamente, é preciso que seja cotejada a salvaguarda da Constituição, a observância do princípio republicano, a probidade na administração e os demais valores em cena. Entretanto, é preciso que se coteje que a Constituição conferiu ao Presidente da República todas as garantias do regime republicano-representativo, sem o qual estaria inviabilizado o exercício da relevante função pública de chefia do Estado e do governo, imunizando-o de oportunismos ilegítimos.

Por essa razão é que quando se fala em crime de responsabilidade deve-se discriminar, com exatidão, quais esferas do exercício dessa competência são vinculadas pela Constituição e quais esferas são compostas por aquilo que José Joaquim Gomes Canotilho chamou de determinantes autônomas.

As disposições constitucionais são “heteronomamente vinculantes das escolhas discricionariamente feitas pelo legislador”79 79 Canotilho, José Joaquim Gomes. Constituição dirigente e vinculação do legislador: contributo para a compreensão das normas constitucionais programáticas. Coimbra: Coimbra, 1994. p. 265. , não cabendo falar no exercício de qualquer função estatal que transborde a chamada moldura kelseniana.

Para Hans Kelsen, em todos os casos de indeterminação, oferecem-se várias possibilidades de aplicação da regra jurídica, de modo que ela pode ser conformada a corresponder a uma das suas várias significações. Assim é que o Direito a aplicar forma uma moldura “dentro da qual existem várias possibilidades de aplicação, pelo que é conforme ao Direito todo ato que se mantenha dentro deste quadro ou moldura, que preencha esta moldura em qualquer sentido possível”80 80 KELSEN, Hans. Teoria pura do direito. São Paulo: Martins Fontes, 2007. p. 390. .

Assim, a interpretação levada a cabo pelo Legislativo deve compreender a fixação, por via cognoscitiva, do sentido do objeto a interpretar, sendo que o resultado deve ser sempre aquele que representa uma das possibilidades que dentro dessa moldura existe.

É preciso distinguir, assim, quais esferas são decorrentes do exercício de competência vinculada e quais são discricionárias, inclusive no que tange à instauração do processo referente ao crime de responsabilidade. A instauração, portanto, não é autônoma e livre. Ela só pode se dar quando presentes certas condições estabelecidas pela Constituição.

Assim, é necessário o preenchimento dos seguintes requisitos para a instauração do processo de impeachment do Presidente da República: (a) prática de conduta típica por parte durante o exercício do mandato e no exercício das funções e (b) culpabilidade estrita.

A conduta típica compreende uma ação ajustada a um modelo legal de conduta proibida capitulada no art. 85 da Constituição, o qual prevê que são crimes de responsabilidade aqueles que atentem contra (a) a existência da União; (b) o livre exercício do Legislativo, do Judiciário, do Ministério Público e dos “poderes” constitucionais das unidades da Federação; (c) o exercício dos direitos políticos, individuais e sociais; (d) a segurança interna do País; (e) a probidade na administração; (f) a lei orçamentária; e, por fim, (g) o cumprimento das leis e das decisões judiciais. A Lei n.º 1.079/1950 deve ser interpetada consideradas as determinações constitucionais, especialmente referido rol de condutas típicas.

Saliente-se, aqui, que discordamos do posicionamento do ilustre Adilson Abreu Dallari para o qual, dado o elevadíssimo grau de discricionariedade das ações e decisões políticas, não seria possível a exigência de um ajustamento milimétrico ao tipo. Bastaria, portanto, uma compatibilidade razoável com o tipo e um conjunto de circunstâncias que indiquem a ocorrência de comportamento delituoso, sem os rigores do Direito penal.

No nosso entender, a prática de conduta típica durante o mandato e no exercício das funções deve ser cabalmente demonstrada, inclusive - e nesse ponto também discordamos do parecerista - mediante a confirmação de um conjunto probatório requerido para as sanções penais.

Assim é que a primeira condição disposta pela Constituição é que haja um ato praticado pelo Presidente da República. Portanto, uma conduta ativa ou ao menos o que se possa chamar de omissão comissiva, uma omissão estimuladora, praticada na qualidade de Presidente da República. Não basta, portanto, a simples omissão. Nessa linha é o entendimento do exímio Lenio Luiz Streck, para o qual é preciso que se demonstre o dolo, a intenção de cometer o crime, não bastando, simplesmente, a omissão81 81 Streck, Lenio Luiz. Não há nenhum elemento objetivo para Impeachment. Disponível em: <http://zh.clicrbs.com.br/rs/noticias/proa/noticia/2015/02/lenio-streck-nao-ha-nenhum-elemento-objetivo-para-impeachment-4708988.html>. Acesso em: 01 jun. 2015. .

Discordamos, portanto, dos ilustres Adilson Abreu Dallari e Ives Gandra da Silva Martins, os quais comungam do entendimento de que o crime de responsabilidade pode assumir as feições comissiva e omissiva.

É preciso frisar que qualquer ato estranho ao exercício das suas funções não é conduta passível da responsabilidade político-administrativa que ora examinamos. Isso não significa irresponsabilidade, mas que o mecanismo de responsabilização do impeachment incide em específicas hipóteses e dentro do âmbito constitucionalmente estabelecido.

Como se sabe, a responsabilidade do Presidente da República pode ocorrer, além do âmbito político-administrativo, na esfera penal e naquela a que se refere o art. 37, § 4º, da Constituição: improbidade administrativa, regulamentada pela Lei n.º 8.429/1992.

O § 4º do art. 86 da Constituição prevê que o Presidente da República, na vigência de seu mandato, não pode ser responsabilizado por atos estranhos ao exercício de suas funções.

Como a sanção é a perda do mandato, a conduta deve ocorrer neste mesmo mandato. O cargo do Presidente é caracterizado pela periodicidade. Assim é que o ato deve ocorrer no mandato, sob pena de se desconhecer o caráter republicano das representações populares.

Discordamos, portanto, do ilustre Adilson Abreu Dallari que entende que a reeleição, ao implicar no exercício da função por oito anos, viabilizaria a responsabilização político-administrativa do Presidente da República por ato pretérito, praticado no primeiro mandato.

A temporariedade é uma das principais dimensões do princípio republicano. Ela traduz-se na realização de eleições periódicas. A Constituição prevê a legitimidade popular nos seus arts. 28, 29, incisos I e II, e 77, a qual conferirá o mandato de quatro anos, a iniciar-se, in verbis, “em primeiro de janeiro do ano seguinte ao da sua eleição”.

Em nada se confunde, portanto, o dogma republicano de periodicidade do mandato - que é de quarto anos - com a possibilidade, em tese, de reeleição para um único período subsequente. Ou seja, a possibilidade de reeleição não significa que ambos os mandatos serão considerados um mesmo período para fins de responsabilização político-administrativa.

Com efeito, o crime regime de responsabilidade deve ser compreendido à luz do princípio republicano, o qual é caracterizado, essencialmente, pela periodicidade. Não se pode interpretar a Constituição pela lei, o que leva a uma inversão da hierarquia normativa, ocorrendo o que podemos chamar de “legalização da Constituição” em detrimento da constitucionalização das leis.

Nesse equívoco metodológico quer nos parecer que Ives Gandra da Silva Martins incorreu ao aferir em condutas da então Presidente da República em período pretérito inclusive ao seu primeiro mandato, à época em que não era sequer Presidente da República.

Como se não bastasse o entender pela possibilidade de identificar suposta responsabilidade político-administrativa à época em que se era Presidente da República, o parecerista identifica uma inadequada continuidade entre mandatos, quando da reeleição, o que é contrário ao princípio republicano, marcado, essencialmente, pela periodicidade.

A supremacia da Constituição condiciona a validade e o sentido de todo o ordenamento jurídico82 82 Barroso, Luis Roberto. Curso de direito constitucional. São Paulo Saraiva, 2010. p. 300. . O legislador interpreta a Constituição na elaboração da lei. Ou essa interpretação está correta e a lei é constitucional - e, portanto, reflete o que a Constituição determina - ou interpreta equivocadamente e a lei é inconstitucional e, consequentemente, nula. A lei, assim, não possui o condão de estabelecer ou fixar o sentido da Constituição. É a Constituição que condiciona o sentido da lei.

A culpabilidade revela-se, no crime de responsabilidade, como a intencional violação do dever. Deve-se aferir, assim, o dolo. A modalidade culposa incide apenas quando houver expressa previsão legal, o que não há na Constituição.

Exige-se, assim, que o Presidente da República tenha querido o resultado ou assumido o risco de produzi-lo. Apenas se a Constituição expressamente dispusesse, seria possível a responsabilização baseada apenas na imprudência, negligência ou imperícia. Assim é que a Lei n.º 1.079/1950 deve ser interpretada considerando a exigência de atuação dolosa, devendo-se declarar não recepcionados pela Constituição os dispositivos que tratam como crime de responsabilidade as condutas culposas.

Discordamos, portanto, dos ilustres Adilson Abreu Dallari e Ives Gandra da Silva Martins, os quais comungam do entendimento de que o crime de responsabilidade pode assumir as feições dolosa e culposa.

O cumprimento dos requisitos para a instauração do processo de impeachment do Presidente da República devem ser detidamente examinados pela Câmara dos Deputados e pelo Senado Federal.

O Judiciário pode, ainda, exercer o controle (judicial review) da tipicidade dos fatos objetos de imputação83 83 Nesse sentido: STF. MS n.º 21.564/DF, Rel. para o acórdão Min. Carlos Velloso, julgamento em 23.09.1992; MS 21.689, Rel. Min. Carlos Velloso, julgamento em 16.12.1993. , desde que se comprove lesão ou ameaça a direito (art. 5º, inciso XXXV, da Constituição). Comungamos, nesse tema, do posicionamento do ilustre Adilson Abreu Dallari, para o qual é assegurado o controle judicial quanto à observância das formalidades legais.

O processamento dos crimes de responsabilidade divide-se em duas partes: juízo de admissibilidade e processo e julgamento. Em ambos os casos, caberá a verificação do atendimento dos requisitos para sua incidência válida.

O art. 86 da Constituição prevê que a acusação será deduzida perante a Câmara dos Deputados, o que demanda a adequada descrição de uma ação ajustada a um modelo legal de conduta proibida, contrária ao direito e culpável.

Ausentes algum desses pressupostos, a Câmara dos Deputados poderá rejeitar liminarmente a denúncia. É realizado, portanto, um juízo de admissibilidade, isso considerando a consistência da acusação, bem como se as alegações e fundamentos são procedentes. Cabe-lhes, inclusive, rejeitá-la, de plano, acaso patentemente inepta ou despida de justa causa84 84 Nesse sentido: STF. MS n.º 30.672 AgR/DF, Rel. Min. Ricardo Lewandowski, julgamento em 15.09.2011. .

O art. 23, § 1º, da Lei n.º 1.079/1950 prevê que, se por meio de votação nominal, decidir-se pela procedência da denúncia, considerar-se-á decretada a acusação, isso por dois terços da Câmara dos Deputados.

Autorizada a instauração do processo, a matéria passará à competência do Senado Federal, quando a acusação será processada e julgada85 85 Nesse sentido: STF. MS n.º 21.564/DF, Rel. para o acórdão Min. Carlos Velloso, julgamento em 23.09.1992. , conforme prevê o art. 52, inciso II, da Constituição. O Senado Federal poderá, igualmente, realizar a verificação do atendimento de requisitos para a sua incidência válida.

O art. 24 prevê que recebido no Senado Federal o decreto de acusação com o processo enviado pela Câmara dos Deputados e apresentado o libelo pela comissão acusadora, será remetida cópia do processo ao acusado, que será notificado para comparecer em dia prefixado perante o Senado Federal.

Oportunizada a ampla defesa ao imputado, o processo será julgado. O julgamento será absolutório ou condenatório86 86 SILVA, José Afonso da. Curso de direito constitucional positivo. São Paulo: Malheiros, 2008. p. 551. , por dois terços dos votos de seus membros, limitando-se à decisão pela perda do cargo, com inabilitação, por oito anos, para o exercício de função pública (art. 52, parágrafo único, da Constituição).

Não cumpridos os requisitos para a incidência válida da infração político-administrativa, a Constituição será desobedecida.

Frise-se, assim, que a conduta tida como delitiva não deve circunscrever-se à mera decisão subjetiva quanto ao cumprimento de certos valores ideológicos. Ao eleitor cabe o juízo ideológico do governo, não ao Legislativo. Há que se oferecer, ainda, prazo razoável de defesa e a devida dilação probatória.

Não é o fato de o ato ser praticado pelo Legislativo que, por si só, confere legitimidade constitucional ao ato, sob pena de a ele se conferir a função de imperador, que nenhuma autoridade do Estado Constitucional de Direito possui.

O devido processo legal não é uma mera pantomima formal. Assim é que os requisitos jurídicos para a instauração do processo de impeachment do Presidente da República, bem como o processo respectivo, ainda que vise cominar infração político-administrativa, deve seguir o rigoroso rito e a tipologia constitucional estrita.

7. CONSIDERAÇÕES FINAIS

A desobediência à Constituição, que interrompe o processo democrático, extraviando-se da dogmática jurídica, caracteriza-se como ilegítimo ato de exceção, ou seja, como golpe de Estado.

Frise-se, aqui, que as normas constitucionais são desobedecidas mesmo quando praticadas pela autoridade que tenha a competência de praticar o ato, mas pratica fora das normas do devido processo legal (due process of law).

O Legislativo, quando realiza impedimento do mandato do chefe de governo e de Estado87 87 SILVA, José Afonso da. Curso de direito constitucional positivo. São Paulo: Malheiros, 2008. p. 98 e 102. sem observância do devido processo legal e dos direitos do acusado, age com inegável abuso de poder, promovendo o que, no âmbito da ciência política, alcunha-se como “golpe de Estado”, ou seja, interrupção autoritária e, ao menos institucionalmente, violenta do ciclo democrático regular.

Em outras palavras, este tipo de situação de sobreposição à ordem constitucional vigente é descrita por vários nomes, quais sejam, “revolução”, fundação de um novo sistema jurídico, poder constituinte originário, dentre outros. Todos usados numa tentativa de descrever o que, a nosso ver e segundo as lições de Genaro Carrió88 88 CARRIÓ, Genaro. R. Notas sobre derecho y lenguaje. Buenos Aires: Abeledo-Perrot, 1990. , não é possível descrever nos limites de significação da linguagem jurídica, essencialmente uma linguagem que descreve relações de imputação, competências, e não relações de fato. Em política, a tarefa descritiva é mais fácil, basta usarmos um conceito: golpe de Estado.

É preciso cuidado para que, no Brasil, não se reproduzam os golpes de Estado e medidas de exceção que ocorreram, por exemplo, em Honduras e no Paraguai. O Brasil possui uma dimensão, complexidade e solidez democrática incompatíveis com medidas dessa natureza, as quais, em última análise, podem ter repercussões catastróficas para a vida do nosso povo.

  • 1
    TAVARES, André Ramos. Repartição de funções estatais: fundamento, estrutura e finalidade. Revista do Advogado, São Paulo, vol. 23, n. 73, p. 21-26, nov/2003. p. 24.
  • 2
    Loewenstein, Karl. Teoría de la constitución. Barcelona: Ariel, 1986. p. 55.
  • 3
    Burdeau, Georges. Remarques sur la classification des fonctions étatiques. Revue du droit public. Paris, n. 60, p. 202-228, 1945.
  • 4
    Aristóteles. A política. Brasília: UNB, 1997.
  • 5
    Políbio. História. Brasília: UNB, 1985.
  • 6
    CÍCERO, Marco Tulio. Da república. São Paulo: Atena, 1956.
  • 7
    Locke, John. Segundo tratado sobre o governo civil e outros escritos. Petrópolis: Edusf, 2006.
  • 8
    PIÇARRA, Nuno. A separação dos poderes como doutrina e princípio constitucional: um contributo para o estudo das suas origens e evolução. Coimbra: Coimbra, 1989. p. 122-123.
  • 9
    JELLINEK, Georg. L’etat moderne et son droit. Paris: Pantheon-Assas, 2005.
  • 10
    CAETANO, Marcello. Manual de ciência política e direito constitucional. t. I. Coimbra: Almedina, 2009. p. 154.
  • 11
    DUGUIT, Léon. Traité de droit constitucionnel. Vol. I, p. 219. apud Caetano, Marcello. Manual de ciência política e direito constitucional. t. I. Coimbra: Almedina, 2009. p.151.
  • 12
    DUGUIT, L. Manuel de droit constitutionnel. Paris: Pantheon-Assas, 2007. p. 26.
  • 13
    KELSEN, Hans. General theory of Law and State. Cambridge: Harvard University, 1999. p. 269.
  • 14
    KELSEN, Hans. General theory of Law and State. Cambridge: Harvard University, 1999.
  • 15
    Burdeau, Georges. Remarques sur la classification des fonctions étatiques. Revue du droit public, Paris, n. 60, p. 202-228, 1945.
  • 16
    Loewenstein, Karl. Teoría de la constitución. Barcelona: Ariel, 1986. p. 312.
  • 17
    CAETANO, Marcello. Manual de ciência política e direito constitucional. t. I. Coimbra: Almedina, 2009. p. 158.
  • 18
    CAETANO, Marcello. Manual de ciência política e direito constitucional. t. I. Coimbra: Almedina, 2009. p. 172.
  • 19
    CAETANO, Marcello. Manual de ciência política e direito constitucional. t. I. Coimbra: Almedina, 2009. p. 166.
  • 20
    CAETANO, Marcello. Manual de ciência política e direito constitucional. t. I. Coimbra: Almedina, 2009. p. 168.
  • 21
    MIRANDA, J. Op. cit. p. 22.
  • 22
    MIRANDA, J. Op. cit. p. 34.
  • 23
    Ibid. p. 35.
  • 24
    Ibid. p. 36.
  • 25
    Ibid. p. 8.
  • 26
    Ibid. p. 8-9.
  • 27
    Ibid. p. 8-9.
  • 28
    Ibid. p. 9.
  • 29
    MIRANDA, J. Op. cit. p. 11.
  • 30
    Ibid. p. 11.
  • 31
    CAETANO, Marcello. Manual de ciência política e direito constitucional. t. I. Coimbra: Almedina, 2009. p. 148.
  • 32
    CAETANO, Marcello. Manual de ciência política e direito constitucional. t. I. Coimbra: Almedina, 2009. p. 149.
  • 33
    CAETANO, Marcello. Manual de ciência política e direito constitucional. t. I. Coimbra: Almedina, 2009. p. 171.
  • 34
    CAETANO, Marcello. Manual de ciência política e direito constitucional. t. I. Coimbra: Almedina, 2009. p. 172.
  • 35
    MIRANDA, J. Op. cit. p. 28.
  • 36
    QUEIROZ, Cristina Maria Machado. Os actos políticos no Estado de Direito. Coimbra: Almedina, 1990. p. 112.
  • 37
    QUEIROZ, Cristina Maria Machado. Os actos políticos no Estado de Direito. Coimbra: Almedina, 1990. p. 112.
  • 38
    MIRANDA, J. Funções do Estado. Revista de Direito Administrativo. Rio de Janeiro, vol. 189, p. 85-99, 1992.
  • 39
    DEBRUN, Michel. O fato político. Rio de Janeiro: FGV, 1962. p. 37.
  • 40
    “We in the twenty-first century tend to divide the world into two distinct domains: a domain of politics and a domain of law. In politics, the people rule. But not in law. Law is set aside for a trained elite of judges and lawyers whose professional task is to implement the formal decisions produced in and by politics” (Kramer, Larry D. The people themselves: popular constitutionalism and judicial review. New York: Oxford University, 2004, p. 7).
  • 41
    JELLINEK, Georg. Allgemeine Staatslehre. Darmstadt: Wissenschaftliche Buchgesellschaft, 1960. p. 505.
  • 42
    ELLINEK, Georg. Allgemeine Staatslehre. Darmstadt: Wissenschaftliche Buchgesellschaft, 1960. p. 361-363.
  • 43
    JELLINEK, G. Verfassungsanderung und Verfassungswandlung: Eine staatsrechtlichepolitische Abhandlung. Goldbach: Keip Verlag, 1996. p. 5-6.
  • 44
    GARCÍA, Pedro de Vega. El tránsito del positivismo jurídico al positivismo jurisprudencial en la doctrina constitucional. apud: Bercovici, Gilberto. Constituição e política: uma relação difícil. Lua Nova, n. 61. 2004, p. 5-24, p. 6.
  • 45
    Grimm, Dieter. Constituição e política. Belo Horizonte: Del Rey, 2006. p. 3.
  • 46
    Grimm, Dieter. Constituição e política. Belo Horizonte: Del Rey, 2006. p. 6.
  • 47
    BARROSO, Luís Roberto. O controle de constitucionalidade no direito brasileiro. São Paulo: Saraiva, 2010.
  • 48
    BARACHO, José Alfredo de Oliveira. O ambiente sistêmico da função judicial e o espaço político da magistratura. Revista de Processo, vol. 98, p. 43, abr.-jun, 2000.
  • 49
    SMEND, Rudolf. Verfassung und Verfassungsrecht in Staatsrechtliche Abhandlungen und andere Aufsätze. Berlin: Duncker & Humblot, 1994, p. 274. Apud: Bercovici, Gilberto. Constituição e política: uma relação difícil. Lua Nova, n. 61. 2004, p. 8.
  • 50
    CANOTILHO, José Joaquim Gomes. Constituição Dirigente e Vinculação do Legislador: Contributo para a Compreensão das Normas Constitucionais Programáticas. Coimbra: Coimbra, 2001.
  • 51
    LOEWENSTEIN, Karl. Teoría de la constitución. Barcelona: Ariel, 1986. p. 217-222.
  • 52
    Como bem sintetiza Celso Fernandes Campilongo: “as grandes categorias do constitucionalismo moderno constroem as bases estruturais para a autonomia funcional do direito (...). Mas as Constituições, se de um lado fornecem as ferramentas para o fechamento operativo do direito, de outro também são o mecanismo da abertura cognitiva do direito para a política. No Estado de Direito, o sistema jurídico fornece respostas legais aos problemas da política. Isso não representa ignorância ou insensibilidade para a política. Ocorre que os problemas da política são traduzidos, deslocados e selecionados pelo sistema jurídico com critérios particulares e internos a esse sistema. Enquanto a política opera num quadro de complexidade elevada e indeterminada, o direito atua num contexto de complexidade já reduzida e determinada por limites estruturais mais rigorosos.” (Campilongo, Celso Fernandes. Política, sistema jurídico e decisão judicial. São Paulo: Max Limonad, 2002. p. 24).
  • 53
    SERRANO, Pedro Estevam Alves Pinto. Princípio republicano e provimento dos cargos públicos. Revista da Faculdade de Direito das Faculdades Metropolitanas Unidas, São Paulo, n. 10, ano 14, p. 67-99, 1996.
  • 54
    Canotilho, José Joaquim Gomes. Direito constitucional e teoria da Constituição. Coimbra: Almedina, 2003. p. 228.
  • 55
    Canotilho, José Joaquim Gomes. Direito constitucional e teoria da Constituição. Coimbra: Almedina, 2003.
  • 56
    SILVA, José Afonso da. Curso de direito constitucional positivo. São Paulo: Malheiros, 2008. p. 550.
  • 57
    MELLO, Celso Antônio Bandeira de. Curso de direito administrativo. São Paulo: Malheiros, 2009. p. 246.
  • 58
    O Presidente da República, como chefe do Executivo, assume as funções de Chefe de Estado e de Governo (SILVA, José Afonso da. Curso de direito constitucional positivo. São Paulo: Malheiros, 2008. p. 542-543).
  • 59
    Loewenstein, Karl. Teoría de la constitución. Barcelona: Ariel, 1986, p. 312.
  • 60
    Nesse sentido: STF. MS n.º 21.564/DF, Rel. para o acórdão Min. Carlos Velloso, julgamento em 23.09.1992.
  • 61
    Barroso, Luís Roberto. Crime de responsabilidade e processo de impeachment. Doutrinas Essenciais de Direito Constitucional, vol. 3, maio/2011. p. 615
  • 62
    PINTO, Paulo Brossard de Souza. O impeachment: aspectos da responsabilidade política do presidente da república. 1965. p. 71.
  • 63
    MELLO, Celso Antônio Bandeira de. Curso de direito administrativo. São Paulo: Malheiros, 2009. p. 951.
  • 64
    MELLO, Celso Antônio Bandeira de. Curso de direito administrativo. São Paulo: Malheiros, 2009. p. 951.
  • 65
    MELLO, Celso Antônio Bandeira de. Curso de direito administrativo. São Paulo: Malheiros, 2009. p. 952.
  • 66
    Enterria, Eduardo Garcia de. La constitucion como norma y el tribunal constitucional. Madrid: Civitas, 1988. p. 231.
  • 67
    Enterria, Eduardo Garcia de. La constitucion como norma y el tribunal constitucional. Madrid: Civitas, 1988. p. 223.
  • 68
    ALEXY, Robert. Teoria da argumentação jurídica. São Paulo: Landy, 2001. p. 246.
  • 69
    Carvalho, Paulo de Barros. Direito tributário: linguagem e método. São Paulo: Noeses, 2013. p. 181.
  • 70
    Carvalho, Paulo de Barros. Direito tributário: linguagem e método. São Paulo: Noeses, 2013. p. 181.
  • 71
    KANT, Immanuel. Fundamentação da metafísica dos costumes. São Paulo: Abril Cultural, 1974. p. 239.
  • 72
    SILVA, José Afonso da. Curso de direito constitucional positivo. São Paulo: Malheiros, 2008. p. 543.
  • 73
    SILVA, José Afonso da. Curso de direito constitucional positivo. São Paulo: Malheiros, 2008. p. 550.
  • 74
    SILVA, José Afonso da. Curso de direito constitucional positivo. São Paulo: Malheiros, 2008. p. 552.
  • 75
    Nesse sentido: STF. IF 590 QO/CEF, Rel. Min. Celso de Mello, julgamento em 17.09.1998.
  • 76
    Nesse sentido: STF. Pet 1365 QO/DF, Rel. Min. Néri da Silveira, julgamento em 03.12.1997.
  • 77
    BARROSO, Luís Roberto. O controle de constitucionalidade no direito brasileiro. São Paulo: Saraiva, 2010. p. 615.
  • 78
    Essa é, inclusive, a redação do art. 18 do Código Penal.
  • 79
    Canotilho, José Joaquim Gomes. Constituição dirigente e vinculação do legislador: contributo para a compreensão das normas constitucionais programáticas. Coimbra: Coimbra, 1994. p. 265.
  • 80
    KELSEN, Hans. Teoria pura do direito. São Paulo: Martins Fontes, 2007. p. 390.
  • 81
    Streck, Lenio Luiz. Não há nenhum elemento objetivo para Impeachment. Disponível em: <http://zh.clicrbs.com.br/rs/noticias/proa/noticia/2015/02/lenio-streck-nao-ha-nenhum-elemento-objetivo-para-impeachment-4708988.html>. Acesso em: 01 jun. 2015.
  • 82
    Barroso, Luis Roberto. Curso de direito constitucional. São Paulo Saraiva, 2010. p. 300.
  • 83
    Nesse sentido: STF. MS n.º 21.564/DF, Rel. para o acórdão Min. Carlos Velloso, julgamento em 23.09.1992; MS 21.689, Rel. Min. Carlos Velloso, julgamento em 16.12.1993.
  • 84
    Nesse sentido: STF. MS n.º 30.672 AgR/DF, Rel. Min. Ricardo Lewandowski, julgamento em 15.09.2011.
  • 85
    Nesse sentido: STF. MS n.º 21.564/DF, Rel. para o acórdão Min. Carlos Velloso, julgamento em 23.09.1992.
  • 86
    SILVA, José Afonso da. Curso de direito constitucional positivo. São Paulo: Malheiros, 2008. p. 551.
  • 87
    SILVA, José Afonso da. Curso de direito constitucional positivo. São Paulo: Malheiros, 2008. p. 98 e 102.
  • 88
    CARRIÓ, Genaro. R. Notas sobre derecho y lenguaje. Buenos Aires: Abeledo-Perrot, 1990.

8. REFERÊNCIAS

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  • Aristóteles. A política Brasília: UNB, 1997.
  • BARACHO, José Alfredo de Oliveira. O ambiente sistêmico da função judicial e o espaço político da magistratura. Revista de Processo, vol. 98, p. 43, abr.-jun, 2000.
  • Barroso, Luís Roberto. Crime de responsabilidade e processo de impeachment. Doutrinas Essenciais de Direito Constitucional, vol. 3, p. 615, maio, 2011.
  • Barroso, Luís Roberto. Curso de direito constitucional São Paulo Saraiva, 2010.
  • BARROSO, Luís Roberto. O controle de constitucionalidade no direito brasileiro São Paulo: Saraiva, 2010.
  • Bercovici, Gilberto. Constituição e política: uma relação difícil. Lua Nova, n. 61, p. 5-24, 2004.
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  • CAETANO, Marcello. Manual de ciência política e direito constitucional t. I. Coimbra: Almedina, 2009.
  • Campilongo, Celso Fernandes. Política, sistema jurídico e decisão judicial São Paulo: Max Limonad, 2002.
  • Canotilho, José Joaquim Gomes. Constituição dirigente e vinculação do legislador: contributo para a compreensão das normas constitucionais programáticas. Coimbra: Coimbra, 1994.
  • CANOTILHO, José Joaquim Gomes. Constituição Dirigente e Vinculação do Legislador: Contributo para a Compreensão das Normas Constitucionais Programáticas. Coimbra: Coimbra, 2001.
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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    15 Abr 2019
  • Data do Fascículo
    May-Aug 2015

Histórico

  • Recebido
    11 Jun 2015
  • Aceito
    30 Jun 2015
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