Acessibilidade / Reportar erro

Encarceramento provisório na pandemia do coronavírus (Sars-CoV-2) na jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça: prisão preventiva como ultima ratio?

Pre-trial incarceration in the coronavirus pandemic (Sars-CoV-2) in the jurisprudence of the Superior Tribunal de Justiça: preventive detention as the ultima ratio?

Resumo

Considerando-se o contexto pandêmico e a necessidade de adoção de políticas de enfrentamento à disseminação do coronavírus no cárcere, o Conselho Nacional de Justiça editou a Recomendação nº 62/2020. Entre as medidas ali descritas, está a recomendação aos/às magistrados/as que observem, com maior rigor, a excepcionalidade da prisão preventiva. Diante de tal quadro, o presente estudo visa analisar a aplicação de tal recomendação pelo Poder Judiciário neste contexto pandêmico. Para tanto, são analisadas decisões proferidas pelo Superior Tribunal de Justiça, no período de 01.01.2021 a 01.07.2021, visando-se responder à seguinte pergunta: nos tempos pandemia, a prisão preventiva tem sido tratada como ultima ratio pelo STJ? Diante dos dados apresentados pela pesquisa empírica aqui trazida, conclui-se que, na realidade, a política carcerária proposta pelo CNJ não tem sido observada, tendo sido verificada sua relativização por tal Tribunal Superior até mesmo nos casos em que, em tese, caberia a aplicação de medidas cautelares menos gravosas.

Palavras-chave
prisão preventiva; pandemia; excepcionalidade

Abstract

Considering the pandemic context and the need to adopt policies to fight the dissemination of the coronavirus in prison, the National Council of Justice issued Recommendation No. 62/2020. Among the measures described there, there is the recommendation to magistrates to observe, with greater rigor, the exceptionality of preventive detention. Given this situation, this study aims to analyze the application of such a recommendation by the Judiciary in this pandemic context. Therefore, decisions issued by the Superior Court of Justice, from 01.01.2021 to 07.01.2021, are analyzed in order to answer the following question: in times of pandemic, has preventive detention been treated as an ultima ratio by the STJ? In view of the data presents by this empirical research, it is concluded that, in reality, the prison policy proposed by the CNJ has not been observed, having been verified its relativization by this Superior Court even in cases where, in theory, it would be enough the application of less burdensome precautionary measures.

Keywords
preventive detention; pandemic; exceptionality

Introdução

Como se sabe, o sistema prisional brasileiro é marcado por uma intensa crise há décadas. Para além do hiperencarceramento, o sistema apresenta péssimas condições físicas e estruturais, as quais são incapazes de garantir o mínimo de dignidade às pessoas privadas de liberdade. A gravidade das questões que circundam o cárcere levou, inclusive, o Supremo Tribunal Federal a declará-lo como “estado de coisas inconstitucional” na ADPF nº 347. Diante de tal quadro, o Conselho Nacional de Justiça, em razão do contexto pandêmico que assola nossa sociedade, reconheceu a precariedade de nosso sistema prisional para seu enfrentamento, editando a Recomendação nº 62/2020.

Pode-se dizer, assim, que a Recomendação nº 62/2020 do CNJ é oriunda de política carcerária com vistas à colaboração do Poder Judiciário no que tange ao enfrentamento da pandemia nos sistemas prisionais. Dentre as medidas ali descritas, foram propostas recomendações aos magistrados da fase de conhecimento para que observassem a excepcionalidade da prisão preventiva, devendo esta ser decretada somente em casos pontuais a fim de evitar o encarceramento em massa no contexto no qual o isolamento social é medida de rigor para evitar a propagação do vírus. O ato normativo em epígrafe, portanto, pretendeu reforçar à excepcionalidade da prisão preventiva, já prevista no art. 5º, inciso LXVI, da Constituição da República, bem como nos artigos 282, §6º (redação dada pela Lei nº 13.964/2019) e 310, inciso II, do Código de Processo Penal (redação conferida pela Lei nº 12.403/2011).

Nessa esteira, considerando a importância do papel do Poder Judiciário no enfrentamento da pandemia no sistema prisional, no que tange à necessidade de redução da propagação do coronavírus, por meio da observância do princípio da excepcionalidade da prisão preventiva, o presente estudo tem como principal objetivo responder à seguinte questão: como a excepcionalidade da prisão preventiva vem sendo tratada pelo Poder Judiciário no período de pandemia? Para tanto, será realizada pesquisa empírica tendo como escopo a análise de decisões proferidas pelo Superior Tribunal de Justiça, tendo em vista sua relevância constitucional no que tange à uniformização da jurisprudência nacional, verificando-se a aplicação (ou não) das medidas previstas na Recomendação nº 62/2020 do Conselho Nacional de Justiça.

O presente artigo, assim, será dividido em quatro partes: (i) no primeiro capítulo, discorrer-se-á sobre dados da crise do sistema prisional brasileiro e a declaração do estado inconstitucional de coisas pelo STF; (ii) no segundo capítulo, serão abordados alguns aspectos dogmáticos sobre a prisão cautelar, em especial, o princípio da excepcionalidade; (iii) no terceiro capítulo, discorrer-se-á sobre os fundamentos e a edição da Recomendação nº 62/2020 do CNJ e (iv) no quarto capítulo, serão apresentados os resultados da pesquisa empírica acerca da jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça.

1. Da declaração do estado inconstitucional de coisas do sistema prisional brasileiro e a necessidade da mudança da política carcerária frente à pandemia do coronavírus

A crise do sistema prisional brasileiro é notória. A superpopulação carcerária somada à precariedade de condições físicas e estruturais para garantia de um mínimo de dignidade à pessoa presa corresponde à problema já amplamente difundido em estudos acadêmicos, na mídia e em pesquisas estatísticas sobre o cárcere no âmbito nacional2 2 Nesse sentido, ver: MALAN, Diogo. Prisão processual: limites no sistema interamericano de direitos humanos. In: FERNANDES, Márcia Adriana; PEDRINHA, Roberta Duboc (Org.). Escritos transdisciplinares de criminologia, direito e processo penal: homenagem aos mestres Vera Malaguti e Nilo Batista. Rio de Janeiro: Revan, 2014; SHIMIZU, Bruno. Sobre o cárcere, o judiciário e irresponsabilidades. Boletim IBCCRIM, São Paulo, v. 23, n. 274, p. 20-21, set. 2015; SANTORO, Antonio Eduardo Ramires; TAVARES, Natália Lucero Frias; GOMES, Jefferson de Carvalho Gomes. A perspectiva dinâmica da população provisoriamente encarcerada no contexto do superencarceramento brasileiro. Boletim IBCCRIM, São Paulo, v. 25, n. 300, p. 8-10, nov. 2017. . Nas últimas décadas, tem-se notado um excessivo crescimento do encarceramento no sistema prisional pátrio. De se ressaltar, assim, que, conforme dados fornecidos pelo relatório do INFOPEN de junho de 2016, no período de 1990 a 2016, houve aumento de 707% na população prisional brasileira. No ano de 2020, o vultuoso número de pessoas presas no nosso sistema penitenciário levou o Brasil a ocupar, por mais uma vez, o terceiro lugar entre os países que mais encarceram. Segundo dados estatísticos do World Prision Population List, publicado em 02 de abril de 2020, no ano de 2019, o Brasil, com a enorme população de 690.000 presos, somente estava atrás da China, com 1,65 milhões de pessoas presas e dos Estados Unidos, com 2,1 milhão de presos3 3 INSTITUTE FOR CRIMINAL POLICY RESEARCH. World Prison Population List. Disponível em: <<www.prisonstudies.org%2Fsites%2Fdefault%2Ffiles%2Fresources%2Fdownloads%2Fwppl_12.pdf&clen=472035&chunk=true>>. Acesso em: 22/03/2021. . Conforme dados do Departamento Penitenciário Nacional, até junho de 2020, havia, no Brasil, 702.069 (setecentos e duas mil e sessenta e nove) pessoas privadas de liberdade4 4 BRASIL, DEPARTAMENTO PENITENCIÁRIO NACIONAL. Presos em unidades prisionais no Brasil. Disponível em: <https://app.powerbi.com/view?r=eyJrIjoiMjU3Y2RjNjctODQzMi00YTE4LWEwMDAtZDIzNWQ5YmIzMzk1IiwidCI6ImViMDkwNDIwLTQ0NGMtNDNmNy05MWYyLTRiOGRhNmJmZThlMSJ9>. Acesso em 22/03/2021. . De se destacar que entre tal montante, 29,81% da população prisional é formada por presos provisórios5 5 BRASIL, DEPARTAMENTO PENITENCIÁRIO NACIONAL. Presos em unidades prisionais no Brasil. Disponível em: << https://app.powerbi.com/view?r=eyJrIjoiMjU3Y2RjNjctODQzMi00YTE4LWEwMDAtZDIzNWQ5YmIzMzk1IiwidCI6ImViMDkwNDIwLTQ0NGMtNDNmNy05MWYyLTRiOGRhNmJmZThlMSJ9>>. Acesso em: 22/03/2021. . Inegável, assim, a significativa contribuição das prisões cautelares para a superlotação do sistema prisional.

Para além da questão do hiperencarceramento no sistema prisional brasileiro, este ainda enfrenta inúmeras mazelas relacionadas à precariedade de condições físicas e estruturais, tais como: condições insalubres das celas, falta de fornecimento de alimentação adequada às pessoas presas, ausência de assistência básica de saúde e precariedade de políticas educacionais e laborativas6 6 SHIMIZU, Bruno. Sobre o cárcere, o judiciário e irresponsabilidades. Boletim IBCCRIM, São Paulo, v. 23, n. 274, p. 20-21, set. 2015; MALAN, Diogo. Prisão processual: limites no sistema interamericano de direitos humanos. In: FERNANDES, Márcia Adriana; PEDRINHA, Roberta Duboc (Org.). Escritos transdisciplinares de criminologia, direito e processo penal: homenagem aos mestres Vera Malaguti e Nilo Batista. Rio de Janeiro: Revan, 2014. . Em estudo publicado pelo Conselho Nacional de Justiça no ano de 2020, 25,7% dos presídios brasileiros apresentavam péssimas condições; 10,2% apresentavam condições ruins; 48,4% apresentavam condições regulares; 14,1% apresentavam condições boas e somente 1,6% apresentavam condições consideradas excelentes7 7 BRASIL. CONSELHO NACIONAL DE JUSTIÇA. Geopresídios. Disponível em: <<https://www.cnj.jus.br/inspecao_penal/mapa.php>>. Acesso em: 15/03/2021. .

A crise do sistema nacional penitenciário gerada, sobretudo, pelo hiperencarceramento, levou o Supremo Tribunal Federal, sob inspiração de precedentes do Tribunal Constitucional Colombiano, a declará-lo como estado inconstitucional de coisas, na ADPF nº 3478 8 BRASIL. Supremo Tribunal Federal. ADPF 347. Rel. Min. Marco Aurélio. Plenário. Julgamento: 9.9.2015. . Nesse sentido, em seu voto, o Ministro Luís Roberto Barroso reconheceu a violação à dignidade da pessoa humana e à integridade física e moral dos presos. Além disso, ressaltou que não há no caso, como de praxe, na ADPF, a indicação de um ato específico do Poder Público, mas um conjunto de ações e de omissões notórias que fazem com que se tenha esse estado de generalizada inconstitucionalidade por falha estrutural do sistema. Dentre as medidas cautelares deferidas pelo Supremo Tribunal Federal na ADPF nº 347, estão algumas propostas de melhoria ao sistema carcerário, tais como a determinação à União que libere o saldo acumulado do Fundo Penitenciário Nacional para utilização com a finalidade para a qual foi criado, abstendo-se de realizar novos contingenciamentos e a determinação para que a União e Estados encaminhem ao Supremo Tribunal Federal informações sobre a situação prisional9 9 Os autos, ainda, conforme consulta no sítio eletrônico do Supremo Tribunal Federal, aguardam o julgamento pelo Pleno. .

Diante dessa quadratura, considerando a crise do sistema prisional brasileiro, reconhecida, inclusive, pelo Supremo Tribunal Federal, o presente estudo visa analisar o tratamento conferido ao encarceramento provisório durante a pandemia do coronavírus (Sars-CoV-2) pelo Poder Judiciário. Isto porque, após a declaração do estado de emergência sanitária pela OMS, países do mundo todo passaram a adotar medidas para contenção da disseminação do novo vírus, adotando, inclusive políticas voltadas aos sistemas prisionais10 10 Nesse sentido, ver: HEARD, Catherine. Towards a health-informed approach to penal reform? Evidence from ten countries. Institute for Criminal Policy Research, London. Disponível em: <www.prisonstudies.org%2Fsites%2Fdefault%2Ffiles%2Fresources%2Fdownloads%2Ficpr_prison_health_report.pdf&clen=2462687&chunk=true>. Acesso em 20/07/2021. . No Brasil, não foi diferente. O Conselho Nacional de Justiça, considerando o reconhecimento do estado de coisas inconstitucional do sistema penitenciário pelo Supremo Tribunal Federal, na ADPF nº 347, e destacando a ausência de condições materiais e estruturais para o combate da disseminação do novo vírus entre as pessoas presas, editou a Recomendação nº 62/2020, como política carcerária para a contenção da pandemia dentro do sistema prisional. Dentre as medidas ali descritas, foram propostas recomendações aos/às magistrados/as de da fase de conhecimento para que observassem a excepcionalidade da prisão preventiva, devendo esta ser decretada somente em casos pontuais.

Assim, o presente estudo tem como principal objetivo responder à seguinte questão: como a excepcionalidade da prisão preventiva vem sendo tratada no contexto pandêmico? Para tanto, analisar-se-ão decisões do Superior Tribunal de Justiça, verificando-se a aplicação (ou não) das medidas previstas na Recomendação nº 62/2020 do Conselho Nacional de Justiça. Muito embora tal recomendação não tenha caráter cogente, correspondendo a um conjunto de orientações aos/às magistrados no contexto inédito de crise sanitária, trata-se de relevante ato normativo que veio a reforçar a observância do princípio da excepcionalidade. Assim, diante da crise já vivenciada pelo sistema prisional pátrio, entende-se inegável a relevância de tal recomendação como conjunto de diretrizes a compor uma política carcerária no contexto pandêmico. Imperiosa, assim, sua observância pelos magistrados/as.

2. Da excepcionalidade para decretação da prisão preventiva

2.1. Algumas notas sobre a coexistência da prisão preventiva e da presunção de inocência

Como se sabe, as medidas cautelares processuais penais visam assegurar que o resultado do processo seja eficiente11 11 TUCCI, Rogério Lauria; DELMANTO JUNIOR, Roberto. Sistematização das medidas cautelares processuais penais. Revista do Advogado, São Paulo, v. 24, n. 78, p. 111-122, set. 2004, p. 115. . Devem, assim, ser utilizadas excepcionalmente, ante a presença de risco à segurança da marcha processual e à aplicação da lei penal12 12 Nesse sentido, é o credenciado magistério de Antonio Magalhães Gomes Filho: “A cautelaridade constitui uma técnica processual destinada a superar os riscos inerentes à própria estrutura do processo; esta, ao estabelecer dilações para a correta averiguação da situação trazida ao conhecimento do órgão judiciário, assegurando especialmente a participação dos interessados na formação do provimento desejado, traz em si o perigo de que, a final, o estado das coisas tenha sofrido alterações substanciais capazes de tornar absolutamente ineficaz a intervenção estatal para solução do conflito.” (GOMES FILHO, Antonio Magalhães. Presunção de inocência e prisão cautelar. São Paulo: Saraiva, 1991, p. 49.) . No que tange à prisão preventiva, medida cautelar que restringe a liberdade de ir e vir, de maneira mais drástica, somente poderá ser decretada quando eminentemente cautelar13 13 Nesse sentido, Junya Rodrigues Barletta lembra que: “as prisões cautelares deverão tutelar situações fáticas que corporifiquem o fumus comissi delicti e o periculum libertatis, de forma que, desaparecendo as razões que a priori justificavam o encarceramento a título cautelar, o imputado deverá ser colocado imediatamente em liberdade, através da revogação da prisão. Devido ao seu caráter provisional, toda medida cautelar poderá ser objeto de revisão a qualquer tempo, podendo ser substituída, e inclusive, cumulada com outra(s) medida(s) cautelar(es), se tiver sido modificada a situação fática que a ensejou. (BARLETTA, Junya Rodrigues. Prisão provisória e Direitos Humanos. Uma análise baseada nos parâmetros do Sistema Interamericano dos Direitos Humanos, São Paulo: D´Plácido, 2019, p. 35). . Sob tal ótica, para Antonio Magalhães Gomes Filho, a prisão preventiva somente poderá ser decretada quando encontrar justificação ante a garantia da presunção de inocência, ou seja, “na excepcionalidade de situações em que a liberdade do acusado possa comprometer o regular desenvolvimento e a eficácia da atividade processual”14 14 GOMES FILHO, Antonio Magalhães. Presunção de inocência e prisão cautelar. São Paulo: Saraiva, 1991, p. 65. .

Com efeito, como regra de tratamento, a garantia da presunção de inocência veda qualquer forma de identificação do acusado como culpado15 15 Nesse sentido, assevera Odone Sanguiné: “Portanto, trata-se de regra destinada a impedir toda forma de equiparação do imputado ao culpado, isto é, veda de maneira absoluta que as medidas cautelares coercitivas possam desempenhar a função de pena imediata, de castigo antecipado, em relação a uma infração juridicamente ainda sequer definida e a uma pessoa ainda não reconhecida culpada. Como a Constituição prevê simultaneamente a presunção de inocência e também a legitimidade da prisão preventiva, aquela é interpretada como ‘regra dirigida a impedir uma antecipação da pena em relação à condenação definitiva’”. (SANGUINÉ, Odone. Prisão cautelar, medidas alternativas e direitos fundamentais. Rio de Janeiro: Forense, 2014, p. 187). . Trata-se, assim, de aspecto que torna o princípio da dignidade humana premissa fundamental do Estado16 16 “Il reconoscimento della presunzione d’innocenza, come regola di tratamento, ha la consequenziliatá di uma dimonstrazione matemática. Se condizione necessaria per l’inflizione della pena è una condanna pronunciata nei modi di legge, è evidente che senza um símile atto – e fino a quel momento – il citadino non può in nessun caso essere considerato colpevole, nè può essere sottoposto a sanzione.” (ILLUMINATI, Giulio. La presunzione d’innocenza dell’imputato. Bologna: Zanichelli, 1979, p. 33) . Assim, qualquer efeito negativo que decorra da imputação anteriormente ao trânsito em julgado da sentença condenatória ou que importe o reconhecimento da culpabilidade do acusado viola a garantia da presunção de inocência17 17 GOMES FILHO, Antonio Magalhães. Presunção de inocência e prisão cautelar. São Paulo: Saraiva, 1991, p. 35. . Nessa esteira, consoante leciona Maurício Zanoide de Moraes, o recolhimento ao cárcere anterior à condenação definitiva somente poderá ocorrer quando detectados, no caso concreto, atos ou comportamentos pelos quais o acusado demonstre efetivamente sua insubordinação por ato praticado no curso da persecução, devendo o juiz demonstrar a existência de elementos mínimos a configurar o periculum libertatis18 18 MORAES, Maurício Zanoide de. Presunção de inocência no processo penal brasileiro: análise de sua estrutura normativa para a elaboração legislativa e para a decisão judicial. São Paulo: Lumen Juris, 2010, p. 460. Nesse sentido, cf. GIACOMOLLI, Nereu José. Prisão, liberdade e as cautelares alternativas ao cárcere. São Paulo: Marcial Pons, 2013, p. 24; CRUZ, Rogério Schietti Machado. Prisão Cautelar: dramas, princípios e alternativas. 2. ed. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2011, p. 69. .

Assim, somente a cautelaridade é capaz de justificar a coexistência da prisão decretada no curso do processo e a garantia da presunção de inocência, prevista no art. 5º, inciso LVII, da Constituição da República e no art. 8.2 da Convenção Americana de Direitos Humanos19 19 SAAD, Marta. Prisão processual para recuperação de ativos: uma prática desfuncionalizada. In: MALAN, Diogo; BADARÓ, Gustavo; ZILLI, Marcos; MOURA, Maria Thereza Rocha de Assis; SAAD, Marta; MORAES, Maurício Zanoide de. Processo Penal Humanista. Escritos em homenagem a Antonio Magalhães Gomes Filho. São Paulo: D’Plácido, 2019, p. 268. . Nessa esteira, Antonio Magalhães Gomes Filho assevera que apenas as formas de prisão anteriores à condenação que atendam a finalidades processuais, de natureza instrumental e final, destinadas a assegurar a própria realização do processo ou dos resultados, não viola, em princípio, a presunção de inocência20 20 GOMES FILHO, Antonio Magalhães. Medidas cautelares e princípios constitucionais. In: FERNANDES, Og (Org.). Medidas cautelares no processo penal: prisões e alternativas. Comentários à Lei 12.403, de 04.05.2011. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2011, p. 24. . A prisão cautelar, portanto, não pode assumir função essencialmente punitiva. Para Giulio Illuminati, não é admissível que a prisão cautelar tenha como escopo prevenir o perigo que representa à sociedade, em razão da gravidade abstrata dos fatos por ele praticados21 21 ILLUMINATI, Giulio. La presunzione d’innocenza dell’imputato. Bologna: Zanichelli, 1979, p. 44 e 46. .

O Código de Processo Penal, no art. 312, apresenta os requisitos de decretação da prisão preventiva, quais sejam: (i) garantia da ordem pública ou da ordem econômica; (ii) conveniência da instrução criminal, (iii) aplicação da lei penal e (iv) perigo gerado pelo estado de liberdade do imputado. Contudo, para Antonio Magalhães Gomes Filho, dentre tais hipóteses, apenas a conveniência da instrução criminal (cautela instrumental) e a necessidade de aplicar a lei penal (cautela final) constituem justificativas idôneas para privação da liberdade do acusado antes do trânsito em julgado da sentença condenatória. Quanto ao requisito da ordem pública, o autor entende que sua função é extraprocessual, superando os limites impostos pelo princípio da legalidade estrita, que se postula fundamental à matéria, para propiciar a atribuição de um amplo poder discricionário ao juiz22 22 GOMES FILHO, Antonio Magalhães. Presunção de inocência e prisão cautelar. São Paulo: Saraiva, 1991, p. 67. Sobre o conceito de ordem pública, Odone Sanguiné explica que: “Todavia, entre todos os critérios que fundam a prisão provisória, a garantia da ordem pública ou da segurança pública, aparece como a mais controvertida e contestada. Com fronteiras nebulosas e incertas, variando ao gosto da subjetividade dos juízes, o motivo da ordem pública se afirma como uma justificativa que se pode manobrar em todos os sentidos. Seu exato significado nunca foi realmente elaborado, mas constitui uma maneira deturpada de reagir à gravidade do crime cometido e à possível reação da sociedade. O motivo está, portanto, estreitamente relacionado à punição do crime e à extensão da desaprovação social de determinado comportamento (...)” (SANGUINÉ, Odone. Prisão cautelar, medidas alternativas e direitos fundamentais. Rio de Janeiro: Forense, 2014, P. 284). . Nesse sentido, Aury Lopes Júnior afirma que “trata-se de conceito vago e indeterminado, sendo recorrente a definição de risco para ordem pública como sinônimo de clamor público, gravidade do delito, credibilidade das instituições, ameaça à integridade física do imputado/acusado, e, ainda, credibilidade da justiça”23 23 LOPES JÚNIOR, Aury. Prisões cautelares: Lei n. 12.403/2011. 4. ed. São Paulo: Saraiva, 2013, p. 92. Sobre a fundamentação da garantia da ordem pública, ver: LEÃO, Bernardo S. C; PRADO, Alessandra R. M. A periculosidade na decretação de prisão preventiva por furto em Salvador: controle racial e de classe. Revista Brasileira de Direito Processual Penal, vol. 7, n. 3, p. 1713-1749, set./dez. 2021. . Por outro lado, Mauricio Zanoide de Moraes reconhece, excepcionalmente, a possibilidade de decretação da prisão preventiva como garantia da ordem pública. Para o autor, trata-se de prisão provisória, por motivos materiais, excepcionalmente condizente ao Estado democrático de direito, desde que presentes três requisitos: (i) a pena deve ter uma certa magnitude; (ii) as circunstâncias e a forma demonstrada de cometimento do suposto crime e (iii) relação temporal entre o conhecimento da autoria e o momento da decretação da prisão preventiva24 24 MORAES, Maurício Zanoide de. Presunção de inocência no processo penal brasileiro: análise de sua estrutura normativa para a elaboração legislativa e para a decisão judicial. São Paulo: Lumen Juris, 2010, p. 390. .

Assim, sob perspectiva da excepcionalidade da prisão preventiva, somente devem ser admitidas prisões que visam acautelar o resultado útil do processo. Por tal razão, as regras que se aplicam à prisão provisória devem ser interpretadas à luz das garantias constitucionais, em especial, da garantia da presunção de inocência. A prisão preventiva, portanto, não poderá ter outra finalidade senão a garantia do próprio processo no qual é decretada25 25 SAAD, Marta. Prisão processual para recuperação de ativos: uma prática desfuncionalizada. In: MALAN, Diogo; BADARÓ, Gustavo; ZILLI, Marcos; MOURA, Maria Thereza Rocha de Assis; SAAD, Marta; MORAES, Maurício Zanoide de. Processo Penal Humanista. Escritos em homenagem a Antonio Magalhães Gomes Filho. São Paulo: D’Plácido, 2019, p. 268. .

2.2. Da excepcionalidade da prisão preventiva: a prisão como medida cautelar ultima ratio

Consoante já asseverado, a prisão preventiva deve ser decretada, de maneira excepcional, somente quando presentes elementos concretos que dizem com a necessidade de se resguardar o resultado útil do processo. Por ser medida que implica severa violação ao direito de liberdade pessoal do acusado, além de submetê-lo a sofrimento psicológico e à estigmatização social, deverá ser decretada como extrema ratio26 26 Cf. PRADO, Geraldo. Excepcionalidade da prisão provisória. In: FERNANDES, Og (org). Medidas cautelares no processo penal, prisões e suas alternativas. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2012, p. 121-123; SANGUINÉ, Odone. Prisão cautelar, medidas alternativas e direitos fundamentais. Rio de Janeiro: Forense, 2014, p. 401-404. . Nesse sentido, aduzem Rogério Lauria Tucci e Roberto Delmanto Junior que “quanto mais grave a restrição a direitos, maior será a excepcionalidade. Assim, a prisão é a última das medidas cautelares, só utilizável quando todas as demais se projetarem inúteis”27 27 TUCCI, Rogério Lauria; DELMANTO JUNIOR, Roberto. Sistematização das medidas cautelares processuais penais. Revista do Advogado, São Paulo, v. 24, n. 78, p. 111-122, set. 2004, p. 118. Nesse sentido, aduz Teresa Armenta Deu que “La excepcionalidad significa que la ley processal opta decididamente por la libertad provisional como la regla general y primera opción que se debe acoger frente la prisión provisional, en tanto concurran, claro está, los pressupuestos legales al efecto”. (ARMENTA DEU, Teresa. Lecciones de Derecho Procesal Penal. 3. ed. Madrid: Marcial Pons, 2007, p. 180). .

Diante das consequências gravosas ao acusado, a excepcionalidade da prisão provisória encontra eco em diversos tratados internacionais de direitos humanos. A título de exemplo, na Convenção Americana de Direitos Humanos, está prevista no art. 7.2, o qual enuncia que: “ninguém pode ser privado de sua liberdade física, salvo pelas causas e nas condições previamente fixadas pelas constituições políticas dos Estados Partes ou pelas leis de acordo com elas promulgadas”. Por sua vez, o Pacto Internacional de Direitos Civis e Políticos prevê no seu art. 9º, inciso 3º: “a prisão preventiva de pessoas que aguardam julgamento não poderá constituir a regra geral”.

A Corte Interamericana de Direitos Humanos, inclusive, em alguns casos têm ressaltado a importância da excepcionalidade da prisão preventiva para assegurar as garantias do devido processo penal. Segundo o entendimento que tem exarado, a principal consequência que deriva da excepcionalidade do encarceramento preventivo consiste na restrição de sua aplicação a casos em que não há possibilidade de se garantir os fins do processo de outra maneira. Nesse sentido, no caso López Álvarez vs. Honduras28 28 CORTE INTERAMERICANA DE DERECHOS HUMANOS. Caso López Alvarez vs. Honduras, §63. Julgado em: 01 de fevereiro de 2006. Disponível em: <http://www.corteidh.or.cr/docs/casos/articulos/seriec_141_esp.pdf>. Acesso em: 24/03/2021. , assim se manifestou a Corte Interamericana de Direitos Humanos:

La prisión preventiva está limitada por los principios de legalidad, presunción de inocencia, necesidad y proporcionalidad, indispensables en una sociedad democrática83. Constituye la medida más severa que se puede imponer al imputado, y por ello debe aplicarse excepcionalmente84. La regla debe ser la libertad del procesado mientras se resuelve acerca de su responsabilidad penal.68. La legitimidad de la prisión preventiva no proviene solamente de que la ley permite aplicarla en ciertas hipótesis generales. La adopción de esa medida cautelar requiere un juicio de proporcionalidad entre aquélla, los elementos de convicción para dictarla y los hechos que se investigan. Si no hay proporcionalidad, la medida será arbitraria.

No caso paradigma Tibi vs. Equador29 29 CORTE INTERAMERICANA DE DERECHOS HUMANOS. Caso Tibi vs. Equador. Julgado em 07 de setembro de 2004. Disponível em http://www.corteidh.or.cr/docs/casos/articulos/seriec_114_esp.pdf. Acesso em: 24/03/2021. , a Corte Interamericana de Direitos Humanos para além da ilegalidade da prisão preventiva decretada contra o senhor Tibi, manifestou-se pela violação à excepcionalidade de tal medida. É o que se vislumbra do trecho ora destacado:

106. La Corte considera indispensable destacar que la prisión preventiva es la medida más severa que se le puede aplicar al imputado de un delito, motivo por el cual su aplicación debe tener un carácter excepcional, en virtud de que se encuentra limitada por los principios de legalidad, presunción de inocencia, necesidad y proporcionalidad, indispensables en una sociedad democrática.

Ainda, no âmbito do sistema interamericano de proteção dos direitos humanos, de se destacar que a Comissão Interamericana de Direitos Humanos, no seu Informe nº 86/2009, ao analisar o caso Peirano vs. Uruguai, manifestou-se pela excepcionalidade da decretação da prisão preventiva, ressaltando que: “o princípio dirigente para estabelecer a legalidade da prisão preventiva é o de ‘excepcionalidade’, em virtude do qual se intenta evitar que a prisão preventiva se converta em regra e, assim, se descaracterize seu fim” (n. 93)30 30 “El principio rector para establecer la legalidad de la prisión preventiva es el de ‘excepcionalidad’, en virtud del cual se intenta evitar que la prisión preventiva se convierta en regla y, así, se desvirtúe su fin”. COMISIÓN INTERAMERICANA DE DERECHOS HUMANOS. Caso Peirano vs. Uruguai, §93. Informe nº 86/09 – 06 de agosto de 2009. Disponível em: <https://www.cidh.oas.org/annualrep/2009sp/Uruguay12553.sp.htm>. Acesso em: 24/03/2021. .

A excepcionalidade da prisão preventiva, no sistema jurídico brasileiro, está prevista no art. 5º, inciso LXVI, da Constituição da República, bem como nos artigos 282, §6º (redação dada pela Lei nº 13.964/2019) e 310, inciso II, do Código de Processo Penal (redação conferida pela Lei nº 12.403/2011). Segundo o artigo 5º, inciso LXVI, da Constituição da República, “ninguém será levado à prisão ou nela mantido, quando a lei admitir a liberdade provisória, com ou sem fiança”. O artigo 282, §6º31 31 Ver GIACOMOLLI, Nereu José. Prisão, liberdade e as cautelares alternativas ao cárcere. São Paulo: Marcial Pons, 2013, p. 41. , do Código de Processo Penal, prevê que a prisão preventiva somente será determinada quando não for cabível a sua substituição por outra medida cautelar32 32 Art. 282, §6º, do Código de Processo Penal: A prisão preventiva somente será determinada quando não for cabível a sua substituição por outra medida cautelar, observado o art. 319 deste Código, e o não cabimento da substituição por outra medida cautelar deverá ser justificado de forma fundamentada nos elementos presentes do caso concreto, de forma individualizada). . Por fim, o inciso II, do artigo 310, do Código de Processo Penal, preconiza que a conversão da prisão em flagrante em prisão preventiva deverá observar a presença dos requisitos constantes do artigo 312, do Código de Processo Penal, bem como a inadequação e a insuficiência das medidas cautelares diversas da prisão. A prisão preventiva, assim, somente será cabível quando presentes, no caso concreto, de forma inequívoca, o fumus comissi delicti e o periculum libertatis, bem como a real ameaça à integridade do conteúdo probatório e à aplicação da lei penal33 33 Nesse sentido, ver: WEDY, Miguel Tedesco. Prisão Cautelar e Principios Constitucionais. Revista Justica do Direito, Passo Fundo, n. 1, p. 77-94, 2004. , não sendo suficientes as demais medidas cautelares pessoais previstas no ordenamento jurídico.

Ao estudar a excepcionalidade da prisão provisória, Geraldo Prado dividiu-a em três vetores: a) vinculação do juízo e do legislador aos pressupostos e requisitos autorizadores da prisão preventiva; b) possibilidade de se alcançar a tutela do processo por meio menos gravoso e c) duração da prisão preventiva34 34 PRADO, Geraldo. Excepcionalidade da prisão provisória. In: FERNANDES, Og (org) Medidas cautelares no processo penal, prisões e suas alternativas. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2011, p. 121-123. . Segundo o primeiro vetor, o legislador e o intérprete deverão atentar-se aos parâmetros legais que disciplinam a prisão cautelar. Dessa forma, deverá, por exemplo, o magistrado observar os pressupostos e requisitos previstos nos artigos 312 e 313, do Código de Processo Penal. Em razão do segundo vetor, caberá ao intérprete verificar se há outra medida cautelar menos invasiva que seja adequada e suficiente para resguardar o fim útil do processo35 35 É o que dispõe o art. 282, §6º, do Código de Processo Penal. Nas palavras de Aury Lopes Jr.: “O dispositivo é importante e consagra a prisão preventiva como último instrumento a ser realizado, enfatizando a necessidade de análise sobre adequação e suficiência das demais medidas cautelares.” (LOPES JÚNIOR, Aury. Prisões cautelares: Lei n. 12.403/2011. 4. ed. São Paulo: Saraiva, 2013, p. 42) . Por derradeiro, diante da excepcionalidade da prisão preventiva, esta deverá durar o lapso temporal necessário a resguardar a finalidade do processo, devendo ser revisada periodicamente, sob pena de violar a garantia prevista no art. 5º, inciso LXXVIII, da Constituição da República36 36 De se ressaltar, assim, que a prisão preventiva, por assegurar uma situação fática, deve ter breve duração, não podendo assumir contornos de pena antecipada, sob pena de violação à garantia da presunção de inocência. De rigor, assim, a observância ao que dispõe o art. 7.5, da Convenção Americana de Direitos Humanos: “Toda pessoa detida ou retida deve ser conduzida, sem demora, à presença de um juiz ou outra autoridade autorizada pela lei a exercer funções judiciais e tem direito a ser julgada dentro de um prazo razoável ou a ser posta em liberdade, sem prejuízo de que prossiga o processo. Sua liberdade pode ser condicionada a garantias que assegurem o seu comparecimento em juízo.” Sobre o tema, ver: RYU, Daiana. Prisão cautelar e direito ao julgamento no prazo razoável. Belo Horizonte/São Paulo: D’Plácido, 2021. .

Diante de tal quadro, verifica-se que prisão preventiva somente poderá ser decretada ou mantida quando “estritamente necessária” ao alcance das finalidades do processo penal e quando presentes os requisitos impostos pela legislação37 37 SANGUINÉ, Odone. Prisão cautelar, medidas alternativas e direitos fundamentais. Rio de Janeiro: Forense, 2014, p. 401. . Assim, caberá ao/à magistrada, no exame do caso concreto, verificar, de maneira percuciente, a adequação e suficiência das medidas cautelares pessoais previstas no art. 319, do Código de Processo Penal para assegurar as finalidades do processo, devendo lançar mão da prisão preventiva somente em ultima ratio38 38 LOPES JÚNIOR, Aury. Prisões cautelares: Lei n. 12.403/2011. 4. ed. São Paulo: Saraiva, 2013, p. 41. Nesse sentido, é a lição de Banacloche Palao: “la prisión provisional, em cuanto limitativa del derecho fundamental de la libertad personal, tiene que aplicarse excepcionalmente, debiendo optarse en caso de duda por decretar la libertdad del imputado”. (BANACLOCHE PALAO, Julio. La libertad prisional y sus limitaciones. Madri: Macgraw, 1996, p. 381) .

3. Do reforço à excepcionalidade da prisão preventiva na Recomendação nº 62/2020 do Conselho Nacional de Justiça durante a pandemia do SARS-CoV-2

Como é sabido, aos 30 de janeiro de 2020, a Organização Mundial da Saúde reconheceu, formalmente, a propagação do coronavírus (SARS-CoV-2)39 39 WORLDO HEALTH ORGANIZATION. Public Health Emergency of International Concern declared. Disponível em: <https://www.who.int/emergencies/diseases/novel-coronavirus-2019/events-as-they-happen>. Acesso em 15/03/2021. como estado de emergência sanitária, resultando, assim, na tomada de inúmeras medidas pelos países do mundo inteiro para a prevenção e combate da doença por ele provocada. No Brasil, não foi diferente. Aos 06 de fevereiro de 2020, foi promulgada a Lei nº 13.979/2020, com o intuito de determinar diversas medidas voltadas ao combate do novo vírus que já estava a se espalhar ao longo de todo território nacional. Assim, em observância às diretrizes da OMS, na busca da concretização do direito à saúde, referido diploma normativo dispôs acerca de várias providências para o enfrentamento da emergência de saúde pública, tais como o isolamento social, a quarentena, a determinação compulsória de exames médicos e vacinação e o uso obrigatório de máscaras de proteção individual.

Diante de tal quadro, foram, ainda, envidados esforços pelos três Poderes com a implantação de medidas de prevenção e de proteção da contaminação pelo novo coronavírus. O Poder Judiciário, por meio do Conselho Nacional de Justiça, por sua vez, dentre os vários atos normativos que editou durante a pandemia, publicou a Resolução nº 62/2020, no dia 17 de março de 202040 40 Alterada pelas Recomendações nº 68/2020, de 17/06/2020, nº 78, de 15/09/2020 e 91, de 15/03/2021. , considerando o alto índice de transmissibilidade do novo coronavírus e o agravamento significativo do risco de contágio em estabelecimentos prisionais e socioeducativos, tendo em conta a notória precariedade do sistema prisional, reconhecida, inclusive, pelo Supremo Tribunal Federal, na Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental nº 347. Dessa forma, referido ato normativo dispôs acerca de várias recomendações aos/às magistrados/as com vistas a evitar a disseminação da Covid-19 no sistema prisional brasileiro, buscando-se, assim, sobretudo, garantir o direito à saúde das pessoas presas.

Dentre o rol de providências emanadas pelo Conselho Nacional de Justiça, foram editadas algumas medidas a serem observadas pelo/a magistrado/a, na fase de conhecimento, a fim de diminuir o encarceramento provisório, evitando-se, assim, os riscos da propagação do novo coronavírus nos estabelecimentos prisionais. Nesse sentido, dispõe o art. 4º, da Recomendação nº 62/2020, sobre a necessidade de reavaliação periódica das prisões provisórias, nos termos do art. 316, do Código de Processo Penal, devendo os/as magistrados/as priorizar as mulheres gestantes, lactantes, mães ou pessoas responsáveis por criança de até doze anos ou pessoa com deficiência, assim como idosos, indígenas, pessoas com deficiência ou que se enquadrem no grupo de risco. Dispõe, ainda, sobre a priorização da reavaliação das prisões preventivas que tenham excedido o prazo de 90 (noventa dias), observando-se, assim, a provisoriedade da prisão cautelar, esta concretizada no art. 316, parágrafo único, do Código de Processo Penal, introduzido pela Lei nº 13.964/2019, bem como a necessidade de priorizar-se a reavaliação das prisões preventivas relacionadas a crimes praticados sem violência ou grave ameaça à pessoa. Por derradeiro, o inciso III, do art. 4º, da Recomendação nº 62/2020, do Conselho Nacional de Justiça, dispõe sobre “a máxima excepcionalidade de novas ordens de prisão preventiva, observado o protocolo das autoridades sanitárias”. Trata-se, assim, de um reforço ao que dispõe o art. 282, §6º, do Código de Processo Penal.

De mais a mais, em relação ao controle da prisão em flagrante, o art. 8º, da referida recomendação, além de suspender a audiência de custódia, em razão do período de restrição sanitária, dispôs sobre a excepcionalidade da conversão da prisão em flagrante em preventiva, ao dispor que ao analisar o auto de prisão em flagrante, o magistrado proferirá decisão para:

a) relaxar a prisão ilegal;

b) conceder liberdade provisória, com ou sem fiança, considerando como fundamento extrínseco, inclusive, a necessidade de controle dos fatores de propagação da pandemia e proteção à saúde de pessoas que integrem o grupo de risco;

ou c) excepcionalmente, converter a prisão em flagrante em preventiva, em se tratando de crime cometido com o emprego de violência ou grave ameaça contra a pessoa, desde que presentes, no caso concreto, os requisitos constantes do art. 312 do Código de Processo Penal e que as circunstâncias do fato indiquem a inadequação ou insuficiência das medidas cautelares diversas da prisão, observado o protocolo das autoridades sanitárias.

A intensa preocupação dos diferentes poderes quanto ao enfrentamento da pandemia provocada pelo novo coronavírus provocou, portanto, o estabelecimento de medidas para a contenção do alastramento do novo vírus entre a população. No que tange à população prisional presa, verifica-se que o Conselho Nacional de Justiça, ciente da precariedade do sistema prisional pátrio, em razão da já reconhecida superpopulação, das condições insalubres e da escassez de prestação de assistência médica adequada, determinou várias recomendações aos/às magistrados/as da fase de reconhecimento a fim de evitar a contaminação das pessoas encarceradas pelo coronavírus. Dessa forma, determinou aos atores do Poder Judiciário que observem, mais do que nunca, os caracteres da proporcionalidade e da excepcionalidade da prisão cautelar41 41 Sobre a necessidade de observância à proporcionalidade e à excepcionalidade da prisão preventiva, ver: FEDATO, Matheus Arcangelo; KAZMIERCZAK, Luiz Fernando. Prisão cautelar, argumentação e proporcionalidade: uma proposta para a fundamentação das decisões judiciais. Revista Brasileira de Direito Processual Penal, Porto Alegre, vol. 6, n. 1, p. 483-514, jan./abr. 2020. . Diante de tal quadro, segundo se depreende do quanto previsto na Recomendação nº 62/2020 do CNJ, a imposição da medida cautelar extrema deve ser deixada aos crimes de maior gravidade, ou seja, aqueles cometidos mediante violência ou grave ameaça, desde que comprovada a presença dos requisitos e pressupostos da prisão cautelar, conforme dispõe o art. 8º, §1º, alínea “c”. Além disso, dispôs sobre novo fator a permitir a concessão da liberdade provisória durante a vigência do estado de emergência sanitária, qual seja “a necessidade de controle dos fatores de propagação da pandemia e proteção à saúde de pessoas que integrem o grupo de risco”. Dessa forma, os casos que envolvem delitos cometidos sem violência ou grave ameaça devem ser analisados com maior cuidado pelo Poder Judiciário, eis que, segundo as diretrizes do Conselho Nacional de Justiça, a regra em casos tais é a concessão da liberdade provisória.

Para além da preocupação na contenção do alastramento do novo coranavírus no ambiente prisional, visando-se resguardar o direito à saúde da pessoa presa, as medidas acima delineadas objetivam, portanto, resguardar o valor supremo da liberdade, através da observância dos caracteres da proporcionalidade e da excepcionalidade da prisão preventiva. Assim, o/a magistrado/a, ao analisar o caso concreto, além de verificar a suficiência de elementos a indicar a necessidade de imposição da medida extrema, deve se atentar, à análise da proporcionalidade e da excepcionalidade da imposição da prisão preventiva, à luz do contexto dos protocolos sanitários.

Diante dessa quadratura, há, é certo, a efetivação do papel do Poder Judiciário como protagonista quanto à adoção de medidas para o enfrentamento do encarceramento em massa no sistema prisional brasileiro, em especial, neste contexto pandêmico.

4. Da aplicação da Recomendação nº 62 do Conselho Nacional de Justiça na jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça

Diante da reconhecida crise que assola o sistema penitenciário pátrio, sobretudo, em razão da superlotação, das condições insalubres e da falta de assistência médica e hospitalar, bem como do fato de que tais condições precárias são propícias a propagar a disseminação de doenças infectocontagiosas no ambiente prisional42 42 SHIMIZU, Bruno. Sobre o cárcere, o judiciário e irresponsabilidades. Boletim IBCCRIM, São Paulo, v. 23, n. 274, p. 20-21, set. 2015. , o Conselho Nacional de Justiça editou vários atos normativos com recomendações aos/às magistrados/as a fim de evitar o aumento do encarceramento. Conforme já exposto, a prisão preventiva, então, deve ser, mais do que nunca, considerada como medida de ultima ratio. Nos termos do art. 4º, inciso III, da referida recomendação, os magistrados devem observar “a máxima excepcionalidade de novas ordens de prisão preventiva, observado o protocolo das autoridades sanitárias”.

Dessa forma, considerando o importante papel do Poder Judiciário na política carcerária durante a pandemia do coronavírus, esta pesquisa tem como objeto analisar se, de fato, no contexto de tal crise sanitária, a prisão cautelar tem sido tratada como medida excepcional, tal como já dispõe o art. 282, §6º, do Código de Processo Penal. Para tanto, tendo em conta a relevância do Superior Tribunal de Justiça na uniformização da interpretação da lei federal, analisar-se-ão julgados de tal Tribunal Superior. Visa-se, assim, verificar se o Superior Tribunal de Justiça, neste contexto pandêmico, para além das medidas de desencarceramento previstas na Recomendação nº 62/2020 do CNJ, tem observado às diretrizes já previstas no ordenamento jurídico pátrio quanto à excepcionalidade da prisão preventiva. Em outras palavras, almeja-se responder à seguinte pergunta: neste contexto de pandemia, a prisão preventiva tem sido tratada como ultima ratio pelo STJ?

4.1. Da pesquisa empírica: delimitação da metodologia e do espaço amostral

Para atingir o objetivo acima exposto qual seja o de verificar a aplicação do princípio da excepcionalidade da prisão preventiva pelo Superior Tribunal de Justiça, no contexto pandêmico, será necessária a realização de pesquisa empírica, tendo como objeto as decisões proferidas pelo Tribunal Superior. Com vistas a verificar estatisticamente o perfil das decisões (resultado do julgamento da liminar, parecer do Ministério Público, resultado do julgamento final), bem como os tipos de argumento utilizados pelo órgão julgador e eventual aplicação ou não das medidas de desencarceramento recomendadas pelo Conselho Nacional de Justiça, será realizada análise quantitativa43 43 PIRES, Álvaro. Amostragem e pesquisa qualitativa: ensaios teóricos e metodológicos. POUPART, Jean; DESLAURIERS, Jean-Pierre; GROULX, Lionel-H; LAPERRIERE, Anne; MAYER, Robert; PIRES, Alvaro (Org.). A pesquisa qualitativa: enfoques epistemológicos e metodológicos. Tradução Ana Cristina Nasser. Petrópolis: Vozes, 2008, p. 157. . De outro lado, objetivando-se verificar a motivação das decisões e destrinchar seus argumentos com maior acuidade será realizada análise qualitativa44 44 PIRES, Álvaro. Amostragem e pesquisa qualitativa: ensaios teóricos e metodológicos. POUPART, Jean; DESLAURIERS, Jean-Pierre; GROULX, Lionel-H; LAPERRIERE, Anne; MAYER, Robert; PIRES, Alvaro (Org.). A pesquisa qualitativa: enfoques epistemológicos e metodológicos. Tradução Ana Cristina Nasser. Petrópolis: Vozes, 2008, p. 157. .

Para a realização desta pesquisa empírica, tendo em vista ser inviável analisar todas as decisões do Superior Tribunal de Justiça acerca do tema aqui proposto, mister é a formação de uma amostra. Nesse sentido, cabe mencionar que para conferir um maior direcionamento à pesquisa de jurisprudência deve-se lançar mão dos “recortes jurisprudenciais”45 45 PALMA, J. B. D.; FEFERBAUM, M.; PINHEIRO, V. M. Meu trabalho precisa de jurisprudência? Como posso utilizá-la? QUEIROZ, R. M. R. FEFERBAUM, M. (Coord.). Metodologia jurídica: um roteiro prático para trabalhos de conclusão de curso. São Paulo: Saraiva, 2012, p. 144. . Estes correspondem a todas as estratégias para delimitação do tema, sendo que os mais recorrentes são os institucionais, temáticos, processuais e os temporais46 46 PALMA, J. B. D.; FEFERBAUM, M.; PINHEIRO, V. M. Meu trabalho precisa de jurisprudência? Como posso utilizá-la? QUEIROZ, R. M. R. FEFERBAUM, M. (Coord.). Metodologia jurídica: um roteiro prático para trabalhos de conclusão de curso. São Paulo: Saraiva, 2012, p. 144. , os quais serão utilizados na tarefa de melhor restringir a amostra do presente estudo.

Em relação ao recorte institucional, justifica-se a escolha das decisões do Superior Tribunal de Justiça, eis que se trata do órgão que tem como atribuição principal “o controle da inteireza positiva, da autoridade e da uniformidade de interpretação da lei federal”47 47 Ibidem, p. 573. , nos termos do artigo 105, inciso III, alíneas “a”, “b” e “c”, da Constituição da República. Considerando que o recorte temático corresponde à própria delimitação do tema48 48 PALMA, J. B. D.; FEFERBAUM, M.; PINHEIRO, V. M. Meu trabalho precisa de jurisprudência? Como posso utilizá-la? QUEIROZ, R. M. R. FEFERBAUM, M. (Coord.). Metodologia jurídica: um roteiro prático para trabalhos de conclusão de curso. São Paulo: Saraiva, 2012, p. 145. , conforme já explicitado, o foco será a pesquisa das decisões proferidas pelo Superior Tribunal de Justiça quanto à aplicação do princípio da excepcionalidade da prisão preventiva, quando invocada as diretrizes previstas na Recomendação nº 62/2020 do CNJ.

No que tange ao recorte temporal, considerando-se a impossibilidade material de analisar todos os acórdãos proferidos desde o início da vigência da Recomendação nº 62/2020 e o escopo de apresentar decisões recentes sobre o tema estudado, delimitou-se o lapso temporal da pesquisa empírica no período de 01.01.2021 a 01.07.2021. Quanto ao recorte processual, por meio do qual se elege um instrumento processual específico para ser trabalhado na pesquisa49 49 PALMA, J. B. D.; FEFERBAUM, M.; PINHEIRO, V. M. Meu trabalho precisa de jurisprudência? Como posso utilizá-la? QUEIROZ, R. M. R. FEFERBAUM, M. (Coord.). Metodologia jurídica: um roteiro prático para trabalhos de conclusão de curso. São Paulo: Saraiva, 2012, p. 146. , optou-se, neste artigo, utilizar as decisões proferidas em sede de habeas corpus, eis que corresponde ao instrumento utilizado, por excelência, para tratar da violação da liberdade de locomoção.

Delimitados os recortes jurisprudenciais, faz-se necessário explicitar as palavras-chave que nortearam a pesquisa dos acórdãos. Assim, no campo Pesquisa livre do sítio eletrônico do Superior Tribunal de Justiça foi inserida a expressão recomendação e CNJ e prisão preventiva e Covid 19 e excepcional, limitando-se o período em 01.01.2021 a 01.07.2021 e inserindo-se na classe processual o tema do habeas corpus.

Ao final desse procedimento de busca, obteve-se 60 (sessenta) acórdãos prolatados pelo Superior Tribunal de Justiça. No entanto, considerando-se que a escolha dos julgados não deve se esgotar com os resultados fornecidos pela pesquisa online de um tribunal, conforme aduz Rafael Mafei Rabelo Queiroz, é preciso examinar a pertinência dos resultados gerados pelo sistema50 50 QUEIROZ, Rafael Mafei Rabelo. Monografia jurídica: passo a passo. São Paulo: Método, 2015, p. 102. . Assim, do número total de acórdãos encontrados foi necessário o descarte de alguns julgados que não interessavam aos fins deste trabalho, quais sejam: (i) aqueles cujo objeto não versava sobre prisão provisória e (ii) aqueles em que não havia a discussão sobre a Recomendação nº 62/2020 do CNJ.

Do número total de acórdãos selecionados, foram excluídos 10 (dez), sendo que: (i) em 02, o objeto não versava sobre constrangimento ilegal de paciente preso cautelarmente, mas tratava de assunto relativo à execução penal51 51 AgRg no HC 657458 / SP, 5ª Turma, Rel. Min. Joel Ilan Paciornik, J: 22/06/2021 e AgRg no HC 603081/SP, 6ª Turma, Rel. Min. Sebastião Reis Júnior, J: 02/02/2021. ; (ii) em 8 (oito), não houve discussão sobre a aplicação da Recomendação nº 62/2020 em relação aos pacientes presos provisoriamente. Assim, consolidou-se o número de 50 (cinquenta) acórdãos para análise52 52 De se ressaltar que a pesquisa, por meio dos critérios utilizados para busca no sítio eletrônico do STJ, apenas resultou em acórdãos que versavam sobre a impetração de ordem de habeas corpus individual. Não houve o encontro de HC coletivo. Tabela de dados depositada em acesso aberto pela autora em: https://doi.org/10.6084/m9.figshare.19566091.v1 .

Feita a explanação acerca da metodologia empregada para coleta e seleção dos julgados, passa-se à exposição dos resultados.

4.2. Dos resultados da análise quantitativa

4.2.1. Liminares

Considerando o espaço amostral de 50 (cinquenta) acórdãos selecionados para a presente pesquisa, verificou-se que em 32 (trinta e dois) houve o pedido de liminar53 53 Esclarece-se que 18 dos acórdãos decorreram do julgamento de Agravo Regimental em Habeas Corpus, recurso em que não há pedido liminar. , sendo que: (i) foi deferida uma liminar e (ii) foram indeferidas 31 (trinta e uma) liminares, o que corresponde a 58% do espaço amostral, consoante se vislumbra do gráfico abaixo:

Gráfico 1
Liminares

4.2.2. Pareceres do Ministério Público

Dos 50 (cinquenta) acórdãos analisados, em 34 (trinta e quatro), o Ministério Público se manifestou. Desse rol, somente 02 (dois) pareceres foram pela concessão da ordem de habeas corpus; 14 (quatro) pelo não conhecimento; 03 (três) pelo não conhecimento da ordem ou denegação e 15 (quinze) foram pela denegação da ordem, o que corresponde a 44% dos casos analisados. No gráfico abaixo, é notória a discrepância entre o número de denegações e o número de concessões da ordem de habeas corpus:

Gráfico 2
Pareceres do Ministério Público

4.2.3. Resultado do julgamento

No que tange ao resultado do julgamento dos habeas corpus analisados, nota-se que há maior número de não conhecimento (13) ou denegações da ordem (28) do que de concessões da ordem (5). No gráfico abaixo, possível notar a maior porcentagem de casos em que o Superior Tribunal de Justiça denegou ou não conheceu a ordem de habeas corpus, mantendo-se a prisão cautelar do paciente.

Gráfico 3
Resultado do julgamento

4.2.4. Pedidos da defesa

Do rol de julgados selecionados, foi possível identificar 02 (dois) tipos de pedido da defesa, sendo eles classificados em: (i) revogação da custódia cautelar em razão da ausência dos requisitos para sua decretação e presença dos requisitos previstos na Recomendação nº 62/2020 do CNJ (41); (ii) colocação em prisão albergue domiciliar em razão da pandemia/filhos menores (3) e (iii) excesso de prazo da prisão cautelar (3)54 54 Esclarece-se que em três acórdãos, proferidos em sede de agravo regimental em habeas corpus, foram abordados pedidos do Ministério Público. . No gráfico abaixo, comparam-se os diversos tipos de pedido formulados pela defesa acerca do constrangimento ilegal consistente na permanência do preso cautelar durante o contexto pandêmico:

Gráfico 4
Pedidos da defesa

4.2.4. Aplicação da Recomendação nº 62/2020 do Conselho Nacional de Justiça pelo Superior Tribunal de Justiça

4.2.4.1. Dados sobre aplicação/afastamento da Recomendação nº 62/2020 do CNJ

Em todos os casos selecionados para compor o espaço amostral da presente pesquisa empírica, o Superior Tribunal de Justiça foi provocado a se manifestar sobre a aplicação do teor da Recomendação nº 62/2020 do CNJ no que tange à possibilidade de reconhecimento da excepcionalidade da prisão preventiva com a consequente soltura do paciente. Dentre os acórdãos que denegaram ou não conheceram a ordem de habeas corpus, em 44 (quarenta e quatro), as diretrizes estabelecidas pela Recomendação em epígrafe foram expressamente afastadas pelo Tribunal. De outro lado, verificou-se que nas decisões em que houve a concessão da ordem, em 06 (seis) houve a aplicação da Recomendação nº 62/2020 do Conselho Nacional de Justiça.

Tabela 1
Aplicação da Recomendação nº 62/2020 do CNJ

4.2.4.2. Argumentos utilizados para denegação/não conhecimento ou concessão da ordem de habeas corpus

Na análise dos acórdãos que denegaram ou não conheceram a ordem de habeas corpus, foi possível identificar seis tipos de discurso: (i) o Tribunal não poderia se pronunciar sobre a incidência ou não da Recomendação nº 62/2020, do CNJ, sob pena de supressão de instância (4); (ii) o paciente não se encontrava inserido no grupo de risco de contaminação do coronavírus (27); (iii) o paciente pertencia a um grupo de risco, mas com quadro de saúde estável (1); (iv) o paciente não preenchia os requisitos para concessão da liberdade provisória segundo a Recomendação nº 62/2020, do CNJ (3); (v) no caso concreto, não estavam preenchidos os requisitos formulados pela jurisprudência para aplicação da Recomendação nº 62/2020 do CNJ (3); (vi) ausência de comprovação quanto à precariedade do estabelecimento prisional para o enfrentamento da pandemia ou outra situação excepcional (6).

Por outro lado, ao reconhecer a existência de constrangimento ilegal em razão da aplicação da Recomendação nº 62, do CNJ ao caso concreto, o Superior Tribunal de Justiça nos seis acórdãos em que concedeu a liberdade provisória ao paciente, fundamentou sua decisão no reconhecimento da gravidade da pandemia e na necessidade de contenção da propagação do coronavírus no ambiente prisional.

No gráfico abaixo, verifica-se a distribuição dos argumentos utilizados pelo Superior Tribunal de Justiça para denegar/não conhecer ou conceder os writs:

Gráfico 5
Argumentos utilizados para denegação ou não conhecimento da ordem de habeas corpus no contexto pandêmico

4.3. Análise qualitativa

4.3.1. Argumentos para denegação ou não conhecimento da ordem de habeas corpus

A) “O paciente não faz parte do grupo de risco” ou “não comprovou a gravidade do estado de sua saúde”

Conforme exposto no item acerca da análise quantitativa, verificou-se que em algumas decisões que denegaram ou não conheceram a ordem de habeas corpus, o Superior Tribunal de Justiça, muito embora a Recomendação nº 62/2020 não exija, necessariamente, que o preso provisório seja do grupo de risco de contaminação do coronavírus para concessão da liberdade provisória, tem mantido as custódias cautelares sob o argumento de que o paciente não se enquadra na parcela da população reconhecida como mais vulnerável pelos órgãos de saúde. O argumento é utilizado, inclusive, em casos em que se verifica o preenchimento dos requisitos para concessão da liberdade provisória, ou seja, casos que não envolvem o cometimento de delitos mediante violência ou grave ameaça, cujo prognóstico da pena permitiria a fixação de regime diverso do fechado.

No HC nº 632922/SP, de relatoria do Min. Joel Ilan Paciornik, julgado em 02/03/2021 pela Quinta Turma, a ordem foi denegada sob o fundamento de que não se vislumbrava no caso concreto constrangimento ilegal em razão da manutenção da custódia do paciente. Muito embora o caso não envolvesse crime praticado mediante violência ou grave ameaça, eis que ao paciente era imputado o delito de tráfico e associação para o tráfico de drogas, a prisão cautelar foi mantida. O caso ainda não apresentava gravidade exacerbada que permitisse a aplicação da medida extrema. Isto porque o paciente foi surpreendido na posse de 340,04g de maconha, 20,06g de cocaína e 26,34g de crack, quantidade que não é considerada exagerada pela jurisprudência. Contudo, segundo o relator, o paciente não comprovara ser do grupo de risco, fator preponderante na concessão da liberdade provisória para a aplicação da Recomendação nº 62/2020 do CNJ. Nas palavras do relator:

Nesse sentido, cumpre salientar que o risco trazido pela propagação da doença não é fundamento hábil a autorizar a revogação automática de toda custódia cautelar, sendo imprescindível, para tanto, que haja comprovação de que o réu encontra-se inserido na parcela mais suscetível à infecção, bem como, que haja possibilidade da substituição da prisão preventiva imposta. Na hipótese dos autos, ficou demonstrada, de forma concreta, a necessidade da manutenção da prisão preventiva do ora paciente, para garantia da ordem pública, nos termos já elencados em linhas pretéritas. – grifos nossos.

Em semelhança ao quanto sustentado no acórdão acima, no AgRg no RHC 130100/RS, de relatoria do Min. Sebastião Reis Júnior, julgado em 22/06/2021, a Sexta Turma negou provimento ao agravo regimental, mantendo a custódia cautelar do paciente, sob o fundamento da gravidade concreta dos fatos e do fato de não haver comprovação nos autos de que pertencesse ao grupo de risco. Assim, muito embora tenha sido a ele imputado os delitos de associação criminosa, receptação, porte e disparo de arma de fogo, crimes cometidos sem violência ou grave ameaça, sua custódia foi mantida.

Entretanto, tais atitudes devem ser tomadas em conformidade com a recente Recomendação n. 62/2020 do Conselho Nacional de Justiça, que orienta aos magistrados com competência para a fase de conhecimento que, com vistas à redução dos riscos epidemiológicos e em observância ao contexto local de disseminação do vírus, reavaliem as prisões provisórias. No caso, verifica-se que o Tribunal estadual afirmou que, até o momento, não há provas de que o ora agravante faça parte do grupo de risco, ressaltando que (fls. 412/413 - grifo nosso): [...] Na hipótese dos autos, não há notícia de que o paciente esteja no grupo de risco. Na mesma banda, não há informações, até o presente momento, advinda dos órgãos oficiais, sobre a detecção de algum caso suspeito no sistema carcerário. Pelo contrário, no âmbito estatual, a Secretaria da Administração Penitenciária já adotou, por meio da Nota Técnica 01/2020, medidas de prevenção e controle do COVID-19 nos estabelecimentos penais, com base no disposto nas Notas Técnicas 04/2020 da Agência Nacional de Vigilância Sanitária, Nota Técnica do DEPEN das Medidas de Controle e Prevenção do Novo Coronavírus no SPF e Decreto n° 55.115/2020. Inexiste, portanto, motivação razoável para deferir a liberdade ao paciente com base no risco epidemiológico, que, por sinal, pode ser igual ou até maior fora do cárcere. [...] – grifos nossos.

Já no AgRg no HC 605343/RS, de relatoria do Min. João Otavio de Noronha, julgado em 08/06/2021, a Quinta Turma denegou o writ, sob a justificativa de que o paciente embora apresentasse comorbidade consistente na hipertensão arterial, os exames por ele apresentados não indicavam quadro grave de saúde que o tornasse suscetível ao contágio por Covid-19. A Corte, assim, ratificou os fundamentos da autoridade judiciária apontada como coatora a qual havia se manifestado no sentido de que seria “despropositada a soltura de presos por integrarem o referido grupo de risco da Covid-19”. O Ministro Relator, então, assim se pronunciou:

De fato, não se extrai dos referidos documentos que o recorrente padece de enfermidades cardíacas. Ao contrário, o laudo médico emitido pela unidade prisional limita-se a informar que o paciente apresenta quadro de hipertensão arterial, de arritmia cardíaca e de furunculose, tendo sido receitados anti-hipertensivos e solicitados exames gerais. Adicionalmente, os exames clínico-laboratoriais demonstram índices dentro dos valores de referência, o que afasta a tese defensiva de baixa imunidade ou de quadro grave de enfermidade que agrave o risco de contágio por covid-19. Também não consta dos referidos documentos que o paciente padece de quadro de hipertensão que não possa ser controlado com o uso das medicações prescritas pela unidade de saúde do presídio, que, ressalte-se, vem disponibilizando tratamento clínico suficiente.

Diante de tal quadro, verifica-se que a mitigação do escopo da Recomendação nº 62/2020 do CNJ. Nos acórdãos acima analisados, muito embora versem sobre casos que se enquadrariam nos requisitos previstos no art. 4º de tal ato normativo para concessão da liberdade provisória no período de pandemia, houve a denegação da ordem de habeas corpus sob fundamento extra, qual seja a necessidade de comprovação pelo paciente de que pertenceria ao grupo de risco. Para além da mitigação da política carcerária almejada pela recomendação em questão, há clara violação ao princípio da excepcionalidade da prisão provisória em tais casos.

B) “O paciente não preenche os requisitos previstos na Recomendação nº 62/2020”

Em outros acórdãos que denegaram a ordem de habeas corpus, o Superior Tribunal de Justiça tem exarado o entendimento de que, embora reconheça a gravidade do contexto emergencial sanitário pelo qual passamos, a Recomendação nº 62/2020 não implica a liberação automática das pessoas presas preventivamente, devendo os requerentes apresentarem elementos concretos que dizem com o preenchimento dos requisitos previstos na Recomendação nº 62/2020 do CNJ.

O Superior Tribunal de Justiça, assim, ao interpretar os requisitos previstos na Recomendação nº 62/2020 do CNJ, criou um rol de critérios que o paciente deve preencher a fim de ser beneficiado com a concessão da liberdade provisória ou com a substituição da prisão cautelar pela prisão domiciliar. São eles: “a) sua inequívoca adequação no chamado grupo de vulneráveis da COVID-19; b) a impossibilidade de receber tratamento no estabelecimento prisional em que se encontra; e c) risco real de que o estabelecimento em que se encontra, e que o segrega do convívio social, cause mais risco do que o ambiente em que a sociedade está inserida, inocorrente na espécie.”

Verificou-se que pelo menos seis julgados aqui analisados, o Superior Tribunal de Justiça afastou a aplicação dos termos da Recomendação nº 62/2020 do CNJ utilizando o rol de tais critérios. De se ressaltar que os dois últimos critérios, que dizem respeito à comprovação do estado do estabelecimento prisional onde se encontra, são de dificílima comprovação, uma verdadeira probatio diabolica. A escassez de publicação de dados sobre o verdadeiro estado dos estabelecimentos prisionais somada à dificuldade de obtenção dos dados existentes tornam praticamente impossível a comprovação pela pessoa presa quanto “ao risco real” de que o estabelecimento prisional seja mais perigoso à sua saúde no contexto pandêmico do que o convívio social. De mais a mais, tal critério parece ignorar a crise do sistema penitenciário nacional, reconhecido, inclusive pelo Supremo Tribunal Federal na ADPF nº 347, em razão da situação precária e insalubre dos estabelecimentos prisionais nacionais. Em pesquisa realizada pelo Institute for Criminal Policy Research no ano de 2019, concluiu-se que as pessoas privadas de liberdade apresentam maior risco a desenvolver problemas de saúde do que o restante da população, em razão do reduzido acesso à luz natural, ao ar fresco, acesso precário à assistência médica e condições precárias de alimentação55 55 Heard, Catherine (2019) Towards a health-informed approach to penal reform? Evidence from ten countries. Institute for Criminal Policy Research, London. Disponível em: <<chrome-extension://efaidnbmnnnibpcajpcglclefindmkaj/viewer.html?pdfurl=https%3A%2F%2Fwww.prisonstudies.org%2Fsites%2Fdefault%2Ffiles%2Fresources%2Fdownloads%2Ficpr_prison_health_report.pdf&clen=2462687&chunk=true>>. Acesso em 20/07/2021. .

Entre os julgados encontrados nesse sentido, no HC 638738/SP, de relatoria do Min. Reynaldo Soares da Fonseca, julgado em 23/02/2021, a Quinta Turma, muito embora o paciente tenha sido preso cautelarmente pela suposta prática do delito de furto, o qual em tese enquadra-se nas hipóteses de concessão de liberdade provisória previstas na Recomendação nº 62/2020 do CNJ, negou seu pedido de revogação da custódia cautelar, afastando a incidência de tal diploma normativo. Ressaltou, assim, a ausência de preenchimento dos requisitos previstos em tal ato normativo do CNJ:

A recomendação contida na Resolução n. 62, de 18 de março de 2020, do CNJ não implica automática substituição da prisão cautelar pela domiciliar. É necessário que o eventual beneficiário do instituto demonstre: a) sua inequívoca adequação no chamado grupo de vulneráveis da COVID-19; b) a impossibilidade de receber tratamento no estabelecimento prisional em que se encontra; e c) risco real de que o estabelecimento em que se encontra, e que o segrega do convívio social, cause mais risco do que o ambiente em que a sociedade está inserida, inocorrente na espécie.

De igual modo, no AgRg no RHC 136960/RJ, de relatoria do Min. João Otavio de Noronha, julgado em 16/03/2021, acerca de caso envolvendo o delito de tráfico de drogas, o Superior Tribunal de Justiça rechaçou o pedido de liberdade provisória do paciente sob o argumento de que os requisitos previstos na Recomendação nº 62/2020 do CNJ não estavam preenchidos. Ressaltou, assim, que a aplicação de tal diploma normativo não assegura a flexibilização da medida extrema de forma automática. Nas palavras do relator:

No que diz respeito à aplicação da Recomendação CNJ n. 62/2020, o STJ firmou o entendimento de que a flexibilização da medida extrema não ocorre de forma automática (AgRg no HC n. 574.236/SP, relator Ministro Reynaldo Soares da Fonseca, DJe de 11/5/2020; e HC n. 575.241/SP, relatora Ministra Laurita Vaz, DJe de 3/6/2020). Para tanto, é necessária a demonstração de que o preso preenche os seguintes requisitos: a) inequívoco enquadramento grupo de vulneráveis à covid-19; b) impossibilidade de receber tratamento no estabelecimento prisional em que se encontra; e c) exposição a mais risco de contaminação no estabelecimento onde está segregado do que no ambiente social (AgRg no HC n. 561.993/PE, relator Ministro Reynaldo Soares da Fonseca, Quinta Turma, DJe de 4/5/2020).

Nessa linha, observo que, em alguns julgados, o Superior Tribunal de Justiça exigiu de maneira assertiva que o paciente tivesse comprovado a condição estrutural precária do estabelecimento prisional onde se encontrava, ressaltando ser tal condição essencial para que a liberdade provisória fosse concedida. No HC nº 655215/SP, de relatoria do Ministro Joel Ilan Paciornik, julgado em 18/05/2021, por exemplo, em caso envolvendo tráfico de drogas, assim o Superior Tribunal de Justiça se pronunciou:

Nesse sentido, cumpre salientar que o risco trazido pela propagação da doença não é fundamento hábil a autorizar a revogação automática de toda custódia cautelar, sendo imprescindível, para tanto, que haja comprovação de que o réu encontra-se inserido na parcela mais suscetível à infecção, bem como, que haja possibilidade da substituição da prisão preventiva imposta. Na hipótese dos autos, não há falar em revogação da custódia ou na sua substituição por prisão domiciliar em razão da pandemia da COVID-19, especialmente porque o paciente não comprovou a deficiência estrutural do presídio em que se encontra, sendo certo que as autoridades sanitárias e de segurança pública têm agido para minimizar os riscos. – grifos nossos.

Nesse sentido, também decidiu a Sexta Turma, nos autos do AgRg no HC 657942/SP, de relatoria do Min. Rogério Schietti Cruz, julgado em 04/05/2021. Para o ministro relator, a comprovação da condição precária do estabelecimento prisional corresponde a requisito fundamental para a concessão da liberdade provisória:

A Recomendação n. 62/2020 do Conselho Nacional de Justiça estipula medidas preventivas à propagação da infecção pelo novo Coronavírus no âmbito dos sistemas de justiça penal e recomenda a reavaliação das prisões provisórias. No entanto, essa recomendação não reflete uma diretriz obrigatória de se ter de soltar, irrestritamente, todos aqueles que se encontram presos provisoriamente, mas sim um elemento interpretativo a ser levado em consideração em cada caso concreto, tendo-se em conta o trazido pela parte interessada. Na hipótese, seria necessária a demonstração nos autos da incapacidade do estabelecimento prisional de gerir a crise da Covid-19, bem como da análise feita especificamente sobre a questão da saúde do paciente pela direção do presídio e pela autoridade judiciária competente, o que não ocorreu. – grifos nossos

Por fim, cabe consignar que, consoante se vislumbra do teor da Recomendação nº 62/2020, esta não exige que o paciente comprove o estado do estabelecimento prisional no qual se encontra preso. Trata-se, assim, a nosso ver, de obrigação do próprio poder estatal, por meio de seus dados, ter ciência quanto a situação presídio ou centro de detenção provisória onde o paciente se encontra preso, especialmente, em razão da dificuldade de a pessoa presa cautelarmente obter tais dados.

4.3.2. Concessão da ordem: gravidade da pandemia e necessidade de redução da propagação do coronavírus

Em outras decisões, o Superior Tribunal de Justiça reconheceu, contudo, a gravidade do contexto pandêmico e seus impactos no sistema prisional, ao conceder a ordem de habeas corpus aos pacientes. Em suma, exarou o entendimento de que a prisão preventiva trata-se de medida excepcional a qual somente deve ser imposta quando presentes elementos concretos que dizem com sua necessidade. Assim, em alguns casos em que não havia o envolvimento de crime cometido com violência ou grave ameaça, o Superior Tribunal de Justiça, observando as diretrizes da Recomendação nº 62/2020, do CNJ e o princípio da excepcionalidade, concedeu a ordem para colocar o paciente em liberdade provisória ou substituir a medida extrema por medidas cautelares pessoais alternativas.

Dessa forma, no RHC 143523/RJ, de relatoria do Ministro Joel Ilan Paciornik, julgado em 04/05/2021, a Quinta Turma, em caso de tráfico de drogas, envolvendo paciente que havia sido surpreendido na posse de 27 g de cocaína, concedeu-lhe liberdade provisória mediante a imposição de medidas cautelares pessoais. Ressaltou que a prisão preventiva se trata de medida excepcional e que no caso concreto as medidas cautelares alternativas seriam suficientes para assegurar o processo. Ademais, chamou atenção à gravidade da pandemia e a necessidade de se conter a propagação do vírus no cárcere:

Além disso, não se pode ignorar a gravidade vivenciada diante da Pandemia do vírus Covid-19, sendo necessário prevenir e reduzir os fatores de propagação do vírus e as aglomerações no âmbito dos sistemas de justiça penal e socioeducativos, nos termos estabelecidos pela Recomendação n. 62/2020 do Conselho Nacional de Justiça. Nesse diapasão, consoante bem ponderado pelo ilustre Ministro Rogério Schietti Cruz, “À luz do princípio da proporcionalidade do necessário enfrentamento da emergência atual de saúde pública, das novas alternativas fornecidas pela Lei n. 12403/2011 e das alterações ao Código de Processo Penal determinadas pela intitulada “Lei Anticrime” (Lei n. 13.964/2019), há razoabilidade na opção, pela autoridade judiciária, por uma ou mais das providências indicadas no art. 319 do CPP como meio bastante e cabível para obter o mesmo resultado - a proteção do bem jurídico sob ameaça - de forma menos gravosa” (HC 597.650/SP, SEXTA TURMA, DJe 24/11/2020).

No HC 612243/MS, de relatoria do Ministro Sebastião Reis Júnior, julgado em 27/04/2021, a Sexta Turma do Superior Tribunal de Justiça, muito embora o acusado tenha se envolvido em delito de tráfico de drogas no qual foram apreendidos 354kg de maconha, entendeu ser possível a concessão da ordem. Entendeu que o paciente não tivera participação significativa no delito, eis que exercia a função de “batedor”, ou seja, de escolta do veículo que carregava o entorpecente. Ressaltou que o paciente possuía condições subjetivas favoráveis e que a prisão preventiva, como medida excepcional, não deveria ser aplicada no caso concreto, eis que suficientes as medidas cautelares alternativas. Destacou, ademais, a importância de se evitar a propagação do coronavírus no cárcere:

De acordo com reiteradas decisões desta Corte Superior, as prisões cautelares são medidas de índole excepcional, somente podendo ser decretadas ou mantidas caso demonstrada, com base em elementos concretos dos autos, a efetiva imprescindibilidade de restrição ao direito constitucional à liberdade de locomoção.

(...)

Além disso, a situação do paciente amolda-se às hipóteses indicadas na Resolução n. 62/2020 do Conselho Nacional de Justiça, notadamente quanto à recomendação aos Tribunais e aos magistrados quanto à adoção de medidas preventivas à propagação da infecção pelo novo coronavírus - Covid-19 no âmbito dos sistemas de justiça penal e socioeducativo.

No HC 658149/RJ, de relatoria do Min. Joel Ilan Paciornik, julgado pela Quinta Turma em 11/05/2021, muito embora o habeas corpus não tenha sido conhecido, a ordem foi concedida de ofício, em razão da desproporcionalidade da medida extrema em relação ao caso concreto. No caso em apreço, o paciente era primário e foi apreendido na posse de 26,5g de cocaína. Além disso, a Quinta Turma entendeu o fato de não ser possível ignorar a pandemia da Covid-19, sendo medida de rigor a prevenção de fatores de propagação do vírus e aglomerações nos sistemas prisionais. Nesse sentido:

Além disso, não se pode ignorar a gravidade vivenciada diante da Pandemia do vírus Covid-19, sendo necessário prevenir e reduzir os fatores de propagação do vírus e as aglomerações no âmbito dos sistemas de justiça penal e socioeducativos, nos termos estabelecidos pela Recomendação n. 62/2020 do Conselho Nacional de Justiça. Nesse diapasão, consoante bem ponderado pelo ilustre Ministro Rogério Schietti Cruz, “À luz do princípio da proporcionalidade do necessário enfrentamento da emergência atual de saúde pública, das novas alternativas fornecidas pela Lei n. 12 403/2011 e das alterações ao Código de Processo Penal determinadas pela intitulada “Lei Anticrime” (Lei n. 13.964/2019), há razoabilidade na opção, pela autoridade judiciária, por uma ou mais das providências indicadas no art. 319 do CPP como meio bastante e cabível para obter o mesmo resultado - a proteção do bem jurídico sob ameaça - de forma menos gravosa” (HC 597.650/SP, SEXTA TURMA, DJe 24/11/2020).

De se destacar que, assim agindo, o Tribunal Superior além de observar o ato normativo aqui estudado, alinha-se à praxe adotada em diversos países na atual realidade em que vivemos. De acordo com pesquisa publicada pelo Institute for Criminal Policy Research, com a pandemia do coronavírus, vários países passaram a adotar políticas carcerárias com vistas à redução propagação do vírus na sociedade e nos estabelecimentos prisionais, tais como a redução do número de prisões e o privilégio de medidas alternativas ao cárcere56 56 Heard, Catherine. (2021) Locked in and locked down – prison life in a pandemic: Evidence from ten countries London: ICPR. Disponível em: <<chrome-extension://efaidnbmnnnibpcajpcglclefindmkaj/viewer.html?pdfurl=https%3A%2F%2Fwww.prisonstudies.org%2Fsites%2Fdefault%2Ffiles%2Fresources%2Fdownloads%2Flocked_in_and_locked_down.pdf&clen=532108&chunk=true>>. Acesso em: 20/07/2021. . É a concretização do princípio da excepcionalidade.

Considerações finais

Como se sabe, um dos princípios que norteiam a prisão cautelar é a excepcionalidade. A medida cautelar extrema deve, assim, ser aplicada somente quando presentes elementos concretos que dizem com a necessidade de se resguardar o resultado útil do processo. Dessa forma, por se tratar de medida que implica severa violação ao direito de liberdade pessoal do acusado, além de submetê-lo a sofrimento psicológico e à estigmatização social, deverá ser decretada como extrema ratio

Considerando o contexto pandêmico e a crise institucionalizada vivenciada pelo sistema prisional brasileiro há décadas, o Conselho Nacional de Justiça editou a Recomendação nº 62/2020, com medidas voltadas ao desencarceramento a fim de conter a propagação do coronavírus no ambiente prisional. Dessa forma, o artigo 4º, inciso III, prevê que os/as magistrados/as devem observar “a máxima excepcionalidade de novas ordens de prisão preventiva, observado o protocolo das autoridades sanitárias”. O ato normativo, assim, tem como escopo o reforço ao princípio da excepcionalidade da medida extrema, devendo ser esta aplicada somente em casos de maior gravidade. Tanto é assim que o artigo 8º da recomendação dispõe que somente “excepcionalmente o magistrado deve converter a prisão em flagrante em preventiva, nos casos de crime cometido com emprego de violência ou grave ameaça contra a pessoa, desde que presentes, no caso concreto, os requisitos os requisitos constantes do art. 312 do Código de Processo Penal e que as circunstâncias do fato indiquem a inadequação ou insuficiência das medidas cautelares diversas da prisão, observado o protocolo das autoridades sanitárias”.

No entanto, a pesquisa empírica apresentada no presente estudo revelou que o Poder Judiciário, aqui representado pelo Superior Tribunal de Justiça, em que pese a gravidade do contexto emergencial e sanitário que assola nossa sociedade, tem relativizado o princípio da excepcionalidade da prisão preventiva, bem como a aplicação da Recomendação nº 62/2020 do CNJ, inclusive, em casos em que, em tese, estariam preenchidos seus requisitos. Verificou-se, assim, que, dentre o espaço amostral analisado no presente estudo, em 56% dos casos, houve a denegação da ordem de habeas corpus e somente em 6% dos casos houve a concessão da ordem, mediante a observância das diretrizes previstas na recomendação em epígrafe. Nesse sentido, de se ressaltar que o Tribunal Superior, ao negar o pedido defensivo para concessão da liberdade provisória e aplicação da Recomendação nº 62/2020 do CNJ, tem utilizado fundamentos inidôneos, tais como a necessidade de comprovação de que o paciente está inserido em grupo de risco e a comprovação de que o estabelecimento prisional traz “real risco” de contaminação pelo vírus. Verificou-se, assim, na pesquisa empírica realizada, a mitigação do escopo do ato normativo em questão, em clara violação ao princípio da excepcionalidade da prisão cautelar. Em diversos casos que comportariam a concessão da liberdade provisória, em observância ao quanto dispõe o art. 4º, da Recomendação nº 62/2020, a prisão preventiva dos pacientes foi mantida sob o fundamento da necessidade de comprovação da inclusão do paciente no grupo de risco ou na necessidade de se comprovar a precariedade do estabelecimento prisional para o enfrentamento da circulação do coronavírus.

Os números da pesquisa empírica ora analisados e o teor dos acórdãos desvelam, portanto, que mesmo no atual contexto de emergência sanitária e a tentativa de adoção de medidas voltadas ao desencarceramento, a prisão preventiva não tem sido tratada como ultima ratio. Pela análise dos acórdãos, muito embora em alguns casos houve a concessão da ordem de habeas corpus a fim de se observar o quanto previsto na Recomendação nº 62/2020 do CNJ, verificou-se, na maior parte dos acórdãos analisados, certa resistência do Superior Tribunal de Justiça em reconhecer o preenchimento dos requisitos previstos no art. 4º do referido ato normativo, mitigando-se, assim, a observância ao princípio da excepcionalidade.

  • 1
    Doutoranda e mestre em Direito Processual Penal pela Universidade de São Paulo (2018). Pós-graduada em Direito Penal Econômico pelo Instituto de Direito Penal Econômico Europeu da Faculdade de Direito da Universidade de Coimbra (2017). Possui graduação em Direito pela Universidade de São Paulo (2013). Membro do Instituto Brasileiro de Ciências Criminais - IBCCRIM. Professora.
  • 2
    Nesse sentido, ver: MALAN, Diogo. Prisão processual: limites no sistema interamericano de direitos humanos. In: FERNANDES, Márcia Adriana; PEDRINHA, Roberta Duboc (Org.). Escritos transdisciplinares de criminologia, direito e processo penal: homenagem aos mestres Vera Malaguti e Nilo Batista. Rio de Janeiro: Revan, 2014MALAN, Diogo. Prisão processual: limites no sistema interamericano de direitos humanos. In: FERNANDES, Márcia Adriana; PEDRINHA, Roberta Duboc (Org.). Escritos transdisciplinares de criminologia, direito e processo penal: homenagem aos mestres Vera Malaguti e Nilo Batista. Rio de Janeiro: Revan, 2014.; SHIMIZU, Bruno. Sobre o cárcere, o judiciário e irresponsabilidades. Boletim IBCCRIM, São Paulo, v. 23, n. 274, p. 20-21, set. 2015SHIMIZU, Bruno. Sobre o cárcere, o judiciário e irresponsabilidades. Boletim IBCCRIM, São Paulo, v. 23, n. 274, p. 20-21, set. 2015.; SANTORO, Antonio Eduardo Ramires; TAVARES, Natália Lucero Frias; GOMES, Jefferson de Carvalho Gomes. A perspectiva dinâmica da população provisoriamente encarcerada no contexto do superencarceramento brasileiro. Boletim IBCCRIM, São Paulo, v. 25, n. 300, p. 8-10, nov. 2017SANTORO, Antonio Eduardo Ramires; TAVARES, Natália Lucero Frias; GOMES, Jefferson de Carvalho Gomes. A perspectiva dinâmica da população provisoriamente encarcerada no contexto do superencarceramento brasileiro. Boletim IBCCRIM, São Paulo, v. 25, n. 300, p. 8-10, nov. 2017..
  • 3
    INSTITUTE FOR CRIMINAL POLICY RESEARCH. World Prison Population List. Disponível em: <<www.prisonstudies.org%2Fsites%2Fdefault%2Ffiles%2Fresources%2Fdownloads%2Fwppl_12.pdf&clen=472035&chunk=true>>. Acesso em: 22/03/2021.
  • 4
    BRASIL, DEPARTAMENTO PENITENCIÁRIO NACIONAL. Presos em unidades prisionais no Brasil. Disponível em: <https://app.powerbi.com/view?r=eyJrIjoiMjU3Y2RjNjctODQzMi00YTE4LWEwMDAtZDIzNWQ5YmIzMzk1IiwidCI6ImViMDkwNDIwLTQ0NGMtNDNmNy05MWYyLTRiOGRhNmJmZThlMSJ9>. Acesso em 22/03/2021.
  • 5
    BRASIL, DEPARTAMENTO PENITENCIÁRIO NACIONAL. Presos em unidades prisionais no Brasil. Disponível em: << https://app.powerbi.com/view?r=eyJrIjoiMjU3Y2RjNjctODQzMi00YTE4LWEwMDAtZDIzNWQ5YmIzMzk1IiwidCI6ImViMDkwNDIwLTQ0NGMtNDNmNy05MWYyLTRiOGRhNmJmZThlMSJ9>>. Acesso em: 22/03/2021.
  • 6
    SHIMIZU, Bruno. Sobre o cárcere, o judiciário e irresponsabilidades. Boletim IBCCRIM, São Paulo, v. 23, n. 274, p. 20-21, set. 2015SHIMIZU, Bruno. Sobre o cárcere, o judiciário e irresponsabilidades. Boletim IBCCRIM, São Paulo, v. 23, n. 274, p. 20-21, set. 2015.; MALAN, Diogo. Prisão processual: limites no sistema interamericano de direitos humanos. In: FERNANDES, Márcia Adriana; PEDRINHA, Roberta Duboc (Org.). Escritos transdisciplinares de criminologia, direito e processo penal: homenagem aos mestres Vera Malaguti e Nilo Batista. Rio de Janeiro: Revan, 2014MALAN, Diogo. Prisão processual: limites no sistema interamericano de direitos humanos. In: FERNANDES, Márcia Adriana; PEDRINHA, Roberta Duboc (Org.). Escritos transdisciplinares de criminologia, direito e processo penal: homenagem aos mestres Vera Malaguti e Nilo Batista. Rio de Janeiro: Revan, 2014..
  • 7
    BRASIL. CONSELHO NACIONAL DE JUSTIÇA. Geopresídios. Disponível em: <<https://www.cnj.jus.br/inspecao_penal/mapa.php>>. Acesso em: 15/03/2021.
  • 8
    BRASIL. Supremo Tribunal Federal. ADPF 347. Rel. Min. Marco Aurélio. Plenário. Julgamento: 9.9.2015.
  • 9
    Os autos, ainda, conforme consulta no sítio eletrônico do Supremo Tribunal Federal, aguardam o julgamento pelo Pleno.
  • 10
    Nesse sentido, ver: HEARD, Catherine. Towards a health-informed approach to penal reform? Evidence from ten countries. Institute for Criminal Policy Research, London. Disponível em: <www.prisonstudies.org%2Fsites%2Fdefault%2Ffiles%2Fresources%2Fdownloads%2Ficpr_prison_health_report.pdf&clen=2462687&chunk=true>. Acesso em 20/07/2021.
  • 11
    TUCCI, Rogério Lauria; DELMANTO JUNIOR, Roberto. Sistematização das medidas cautelares processuais penais. Revista do Advogado, São Paulo, v. 24, n. 78, p. 111-122, set. 2004, p. 115TUCCI, Rogério Lauria; DELMANTO JUNIOR, Roberto. Sistematização das medidas cautelares processuais penais. Revista do Advogado, São Paulo, v. 24, n. 78, p. 111-122, set. 2004..
  • 12
    Nesse sentido, é o credenciado magistério de Antonio Magalhães Gomes Filho: “A cautelaridade constitui uma técnica processual destinada a superar os riscos inerentes à própria estrutura do processo; esta, ao estabelecer dilações para a correta averiguação da situação trazida ao conhecimento do órgão judiciário, assegurando especialmente a participação dos interessados na formação do provimento desejado, traz em si o perigo de que, a final, o estado das coisas tenha sofrido alterações substanciais capazes de tornar absolutamente ineficaz a intervenção estatal para solução do conflito.” (GOMES FILHO, Antonio Magalhães. Presunção de inocência e prisão cautelar. São Paulo: Saraiva, 1991, p. 49GOMES FILHO, Antonio Magalhães. Presunção de inocência e prisão cautelar. São Paulo: Saraiva, 1991..)
  • 13
    Nesse sentido, Junya Rodrigues Barletta lembra que: “as prisões cautelares deverão tutelar situações fáticas que corporifiquem o fumus comissi delicti e o periculum libertatis, de forma que, desaparecendo as razões que a priori justificavam o encarceramento a título cautelar, o imputado deverá ser colocado imediatamente em liberdade, através da revogação da prisão. Devido ao seu caráter provisional, toda medida cautelar poderá ser objeto de revisão a qualquer tempo, podendo ser substituída, e inclusive, cumulada com outra(s) medida(s) cautelar(es), se tiver sido modificada a situação fática que a ensejou. (BARLETTA, Junya Rodrigues. Prisão provisória e Direitos Humanos. Uma análise baseada nos parâmetros do Sistema Interamericano dos Direitos Humanos, São Paulo: D´Plácido, 2019, p. 35BARLETTA, Junya Rodrigues. Prisão provisória e Direitos Humanos. Uma análise baseada nos parâmetros do Sistema Interamericano dos Direitos Humanos. Belo Horizonte: D´Plácido, 2019.).
  • 14
    GOMES FILHO, Antonio Magalhães. Presunção de inocência e prisão cautelar. São Paulo: Saraiva, 1991, p. 65GOMES FILHO, Antonio Magalhães. Presunção de inocência e prisão cautelar. São Paulo: Saraiva, 1991..
  • 15
    Nesse sentido, assevera Odone Sanguiné: “Portanto, trata-se de regra destinada a impedir toda forma de equiparação do imputado ao culpado, isto é, veda de maneira absoluta que as medidas cautelares coercitivas possam desempenhar a função de pena imediata, de castigo antecipado, em relação a uma infração juridicamente ainda sequer definida e a uma pessoa ainda não reconhecida culpada. Como a Constituição prevê simultaneamente a presunção de inocência e também a legitimidade da prisão preventiva, aquela é interpretada como ‘regra dirigida a impedir uma antecipação da pena em relação à condenação definitiva’”. (SANGUINÉ, Odone. Prisão cautelar, medidas alternativas e direitos fundamentais. Rio de Janeiro: Forense, 2014, p. 187SANGUINÉ, Odone. Prisão cautelar, medidas alternativas e direitos fundamentais. Rio de Janeiro: Forense, 2014.).
  • 16
    “Il reconoscimento della presunzione d’innocenza, come regola di tratamento, ha la consequenziliatá di uma dimonstrazione matemática. Se condizione necessaria per l’inflizione della pena è una condanna pronunciata nei modi di legge, è evidente che senza um símile atto – e fino a quel momento – il citadino non può in nessun caso essere considerato colpevole, nè può essere sottoposto a sanzione.” (ILLUMINATI, Giulio. La presunzione d’innocenza dell’imputato. Bologna: Zanichelli, 1979, p. 33ILLUMINATI, Giulio. La presunzione d’innocenza dell’imputato. Bologna: Zanichelli, 1979.)
  • 17
    GOMES FILHO, Antonio Magalhães. Presunção de inocência e prisão cautelar. São Paulo: Saraiva, 1991, p. 35GOMES FILHO, Antonio Magalhães. Presunção de inocência e prisão cautelar. São Paulo: Saraiva, 1991..
  • 18
    MORAES, Maurício Zanoide de. Presunção de inocência no processo penal brasileiro: análise de sua estrutura normativa para a elaboração legislativa e para a decisão judicial. São Paulo: Lumen Juris, 2010, p. 460MORAES, Maurício Zanoide de. Presunção de inocência no processo penal brasileiro: análise de sua estrutura normativa para a elaboração legislativa e para a decisão judicial. São Paulo: Lumen Juris, 2010.. Nesse sentido, cf. GIACOMOLLI, Nereu José. Prisão, liberdade e as cautelares alternativas ao cárcere. São Paulo: Marcial Pons, 2013, p. 24GIACOMOLLI, Nereu José. Prisão, liberdade e as cautelares alternativas ao cárcere. São Paulo: Marcial Pons, 2013.; CRUZ, Rogério Schietti Machado. Prisão Cautelar: dramas, princípios e alternativas. 2. ed. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2011, p. 69.
  • 19
    SAAD, Marta. Prisão processual para recuperação de ativos: uma prática desfuncionalizada. In: MALAN, Diogo; BADARÓ, Gustavo; ZILLI, Marcos; MOURA, Maria Thereza Rocha de Assis; SAAD, Marta; MORAES, Maurício Zanoide de. Processo Penal Humanista. Escritos em homenagem a Antonio Magalhães Gomes Filho. São Paulo: D’Plácido, 2019, p. 268MALAN, Diogo; BADARÓ, Gustavo; ZILLI, Marcos; MOURA, Maria Thereza Rocha de Assis; SAAD, Marta; MORAES, Maurício Zanoide de (Org.). Processo Penal Humanista. Escritos em homenagem a Antonio Magalhães Gomes Filho. São Paulo: D’Plácido, 2019..
  • 20
    GOMES FILHO, Antonio Magalhães. Medidas cautelares e princípios constitucionais. In: FERNANDES, Og (Org.). Medidas cautelares no processo penal: prisões e alternativas. Comentários à Lei 12.403, de 04.05.2011. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2011, p. 24FERNANDES, Og (org). Medidas cautelares no processo penal, prisões e suas alternativas. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2012..
  • 21
    ILLUMINATI, Giulio. La presunzione d’innocenza dell’imputato. Bologna: Zanichelli, 1979, p. 44 e 46ILLUMINATI, Giulio. La presunzione d’innocenza dell’imputato. Bologna: Zanichelli, 1979..
  • 22
    GOMES FILHO, Antonio Magalhães. Presunção de inocência e prisão cautelar. São Paulo: Saraiva, 1991, p. 67GOMES FILHO, Antonio Magalhães. Presunção de inocência e prisão cautelar. São Paulo: Saraiva, 1991.. Sobre o conceito de ordem pública, Odone Sanguiné explica que: “Todavia, entre todos os critérios que fundam a prisão provisória, a garantia da ordem pública ou da segurança pública, aparece como a mais controvertida e contestada. Com fronteiras nebulosas e incertas, variando ao gosto da subjetividade dos juízes, o motivo da ordem pública se afirma como uma justificativa que se pode manobrar em todos os sentidos. Seu exato significado nunca foi realmente elaborado, mas constitui uma maneira deturpada de reagir à gravidade do crime cometido e à possível reação da sociedade. O motivo está, portanto, estreitamente relacionado à punição do crime e à extensão da desaprovação social de determinado comportamento (...)” (SANGUINÉ, Odone. Prisão cautelar, medidas alternativas e direitos fundamentais. Rio de Janeiro: Forense, 2014, P. 284SANGUINÉ, Odone. Prisão cautelar, medidas alternativas e direitos fundamentais. Rio de Janeiro: Forense, 2014.).
  • 23
    LOPES JÚNIOR, Aury. Prisões cautelares: Lei n. 12.403/2011. 4. ed. São Paulo: Saraiva, 2013, p. 92LOPES JÚNIOR, Aury. Prisões cautelares: Lei n. 12.403/2011. 4. ed. São Paulo: Saraiva, 2013.. Sobre a fundamentação da garantia da ordem pública, ver: LEÃO, Bernardo S. C; PRADO, Alessandra R. M. A periculosidade na decretação de prisão preventiva por furto em Salvador: controle racial e de classe. Revista Brasileira de Direito Processual Penal, vol. 7, n. 3, p. 1713-1749, set./dez. 2021LEÃO, Bernardo S. C; PRADO, Alessandra R. M. A periculosidade na decretação de prisão preventiva por furto em Salvador: controle racial e de classe. Revista Brasileira de Direito Processual Penal, vol. 7, n. 3, p. 1713-1749, set./dez. 2021. https://doi.org/10.22197/rbdpp.v7i3.627
    https://doi.org/10.22197/rbdpp.v7i3.627...
    .
  • 24
    MORAES, Maurício Zanoide de. Presunção de inocência no processo penal brasileiro: análise de sua estrutura normativa para a elaboração legislativa e para a decisão judicial. São Paulo: Lumen Juris, 2010, p. 390MORAES, Maurício Zanoide de. Presunção de inocência no processo penal brasileiro: análise de sua estrutura normativa para a elaboração legislativa e para a decisão judicial. São Paulo: Lumen Juris, 2010..
  • 25
    SAAD, Marta. Prisão processual para recuperação de ativos: uma prática desfuncionalizada. In: MALAN, Diogo; BADARÓ, Gustavo; ZILLI, Marcos; MOURA, Maria Thereza Rocha de Assis; SAAD, Marta; MORAES, Maurício Zanoide de. Processo Penal Humanista. Escritos em homenagem a Antonio Magalhães Gomes Filho. São Paulo: D’Plácido, 2019, p. 268MALAN, Diogo; BADARÓ, Gustavo; ZILLI, Marcos; MOURA, Maria Thereza Rocha de Assis; SAAD, Marta; MORAES, Maurício Zanoide de (Org.). Processo Penal Humanista. Escritos em homenagem a Antonio Magalhães Gomes Filho. São Paulo: D’Plácido, 2019..
  • 26
    Cf. PRADO, Geraldo. Excepcionalidade da prisão provisória. In: FERNANDES, Og (org). Medidas cautelares no processo penal, prisões e suas alternativas. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2012, p. 121-123FERNANDES, Og (org). Medidas cautelares no processo penal, prisões e suas alternativas. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2012.; SANGUINÉ, Odone. Prisão cautelar, medidas alternativas e direitos fundamentais. Rio de Janeiro: Forense, 2014, p. 401-404SANGUINÉ, Odone. Prisão cautelar, medidas alternativas e direitos fundamentais. Rio de Janeiro: Forense, 2014..
  • 27
    TUCCI, Rogério Lauria; DELMANTO JUNIOR, Roberto. Sistematização das medidas cautelares processuais penais. Revista do Advogado, São Paulo, v. 24, n. 78, p. 111-122, set. 2004, p. 118TUCCI, Rogério Lauria; DELMANTO JUNIOR, Roberto. Sistematização das medidas cautelares processuais penais. Revista do Advogado, São Paulo, v. 24, n. 78, p. 111-122, set. 2004.. Nesse sentido, aduz Teresa Armenta Deu que “La excepcionalidad significa que la ley processal opta decididamente por la libertad provisional como la regla general y primera opción que se debe acoger frente la prisión provisional, en tanto concurran, claro está, los pressupuestos legales al efecto”. (ARMENTA DEU, Teresa. Lecciones de Derecho Procesal Penal. 3. ed. Madrid: Marcial Pons, 2007, p. 180).
  • 28
    CORTE INTERAMERICANA DE DERECHOS HUMANOS. Caso López Alvarez vs. Honduras, §63. Julgado em: 01 de fevereiro de 2006. Disponível em: <http://www.corteidh.or.cr/docs/casos/articulos/seriec_141_esp.pdf>. Acesso em: 24/03/2021.
  • 29
    CORTE INTERAMERICANA DE DERECHOS HUMANOS. Caso Tibi vs. Equador. Julgado em 07 de setembro de 2004. Disponível em http://www.corteidh.or.cr/docs/casos/articulos/seriec_114_esp.pdf. Acesso em: 24/03/2021.
  • 30
    “El principio rector para establecer la legalidad de la prisión preventiva es el de ‘excepcionalidad’, en virtud del cual se intenta evitar que la prisión preventiva se convierta en regla y, así, se desvirtúe su fin”. COMISIÓN INTERAMERICANA DE DERECHOS HUMANOS. Caso Peirano vs. Uruguai, §93. Informe nº 86/09 – 06 de agosto de 2009. Disponível em: <https://www.cidh.oas.org/annualrep/2009sp/Uruguay12553.sp.htm>. Acesso em: 24/03/2021.
  • 31
    Ver GIACOMOLLI, Nereu José. Prisão, liberdade e as cautelares alternativas ao cárcere. São Paulo: Marcial Pons, 2013, p. 41GIACOMOLLI, Nereu José. Prisão, liberdade e as cautelares alternativas ao cárcere. São Paulo: Marcial Pons, 2013..
  • 32
    Art. 282, §6º, do Código de Processo Penal: A prisão preventiva somente será determinada quando não for cabível a sua substituição por outra medida cautelar, observado o art. 319 deste Código, e o não cabimento da substituição por outra medida cautelar deverá ser justificado de forma fundamentada nos elementos presentes do caso concreto, de forma individualizada).
  • 33
    Nesse sentido, ver: WEDY, Miguel Tedesco. Prisão Cautelar e Principios Constitucionais. Revista Justica do Direito, Passo Fundo, n. 1, p. 77-94, 2004WEDY, Miguel Tedesco. Prisão Cautelar e Princípios Constitucionais. Revista Justiça do Direito, Passo Fundo, n. 1, p. 77-94, 2004..
  • 34
    PRADO, Geraldo. Excepcionalidade da prisão provisória. In: FERNANDES, Og (org) Medidas cautelares no processo penal, prisões e suas alternativas. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2011, p. 121-123FERNANDES, Og (org). Medidas cautelares no processo penal, prisões e suas alternativas. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2012..
  • 35
    É o que dispõe o art. 282, §6º, do Código de Processo Penal. Nas palavras de Aury Lopes Jr.: “O dispositivo é importante e consagra a prisão preventiva como último instrumento a ser realizado, enfatizando a necessidade de análise sobre adequação e suficiência das demais medidas cautelares.” (LOPES JÚNIOR, Aury. Prisões cautelares: Lei n. 12.403/2011. 4. ed. São Paulo: Saraiva, 2013, p. 42LOPES JÚNIOR, Aury. Prisões cautelares: Lei n. 12.403/2011. 4. ed. São Paulo: Saraiva, 2013.)
  • 36
    De se ressaltar, assim, que a prisão preventiva, por assegurar uma situação fática, deve ter breve duração, não podendo assumir contornos de pena antecipada, sob pena de violação à garantia da presunção de inocência. De rigor, assim, a observância ao que dispõe o art. 7.5, da Convenção Americana de Direitos Humanos: “Toda pessoa detida ou retida deve ser conduzida, sem demora, à presença de um juiz ou outra autoridade autorizada pela lei a exercer funções judiciais e tem direito a ser julgada dentro de um prazo razoável ou a ser posta em liberdade, sem prejuízo de que prossiga o processo. Sua liberdade pode ser condicionada a garantias que assegurem o seu comparecimento em juízo.” Sobre o tema, ver: RYU, Daiana. Prisão cautelar e direito ao julgamento no prazo razoável. Belo Horizonte/São Paulo: D’Plácido, 2021RYU, Daiana. Prisão cautelar e direito ao julgamento no prazo razoável. Belo Horizonte: D’Plácido, 2021..
  • 37
    SANGUINÉ, Odone. Prisão cautelar, medidas alternativas e direitos fundamentais. Rio de Janeiro: Forense, 2014, p. 401SANGUINÉ, Odone. Prisão cautelar, medidas alternativas e direitos fundamentais. Rio de Janeiro: Forense, 2014..
  • 38
    LOPES JÚNIOR, Aury. Prisões cautelares: Lei n. 12.403/2011. 4. ed. São Paulo: Saraiva, 2013, p. 41LOPES JÚNIOR, Aury. Prisões cautelares: Lei n. 12.403/2011. 4. ed. São Paulo: Saraiva, 2013.. Nesse sentido, é a lição de Banacloche Palao: “la prisión provisional, em cuanto limitativa del derecho fundamental de la libertad personal, tiene que aplicarse excepcionalmente, debiendo optarse en caso de duda por decretar la libertdad del imputado”. (BANACLOCHE PALAO, Julio. La libertad prisional y sus limitaciones. Madri: Macgraw, 1996, p. 381)
  • 39
    WORLDO HEALTH ORGANIZATION. Public Health Emergency of International Concern declared. Disponível em: <https://www.who.int/emergencies/diseases/novel-coronavirus-2019/events-as-they-happen>. Acesso em 15/03/2021.
  • 40
    Alterada pelas Recomendações nº 68/2020, de 17/06/2020, nº 78, de 15/09/2020 e 91, de 15/03/2021.
  • 41
    Sobre a necessidade de observância à proporcionalidade e à excepcionalidade da prisão preventiva, ver: FEDATO, Matheus Arcangelo; KAZMIERCZAK, Luiz Fernando. Prisão cautelar, argumentação e proporcionalidade: uma proposta para a fundamentação das decisões judiciais. Revista Brasileira de Direito Processual Penal, Porto Alegre, vol. 6, n. 1, p. 483-514, jan./abr. 2020FEDATO, Matheus Arcangelo; KAZMIERCZAK, Luiz Fernando. Prisão cautelar, argumentação e proporcionalidade: uma proposta para a fundamentação das decisões judiciais. Revista Brasileira de Direito Processual Penal, Porto Alegre, vol. 6, n. 1, p. 483-514, jan./abr. 2020. https://doi.org/10.22197/rbdpp.v6i1.268
    https://doi.org/10.22197/rbdpp.v6i1.268...
    .
  • 42
    SHIMIZU, Bruno. Sobre o cárcere, o judiciário e irresponsabilidades. Boletim IBCCRIM, São Paulo, v. 23, n. 274, p. 20-21, set. 2015SHIMIZU, Bruno. Sobre o cárcere, o judiciário e irresponsabilidades. Boletim IBCCRIM, São Paulo, v. 23, n. 274, p. 20-21, set. 2015..
  • 43
    PIRES, Álvaro. Amostragem e pesquisa qualitativa: ensaios teóricos e metodológicos. POUPART, Jean; DESLAURIERS, Jean-Pierre; GROULX, Lionel-H; LAPERRIERE, Anne; MAYER, Robert; PIRES, Alvaro (Org.). A pesquisa qualitativa: enfoques epistemológicos e metodológicos. Tradução Ana Cristina Nasser. Petrópolis: Vozes, 2008, p. 157.
  • 44
    PIRES, Álvaro. Amostragem e pesquisa qualitativa: ensaios teóricos e metodológicos. POUPART, Jean; DESLAURIERS, Jean-Pierre; GROULX, Lionel-H; LAPERRIERE, Anne; MAYER, Robert; PIRES, Alvaro (Org.). A pesquisa qualitativa: enfoques epistemológicos e metodológicos. Tradução Ana Cristina Nasser. Petrópolis: Vozes, 2008, p. 157.
  • 45
    PALMA, J. B. D.; FEFERBAUM, M.; PINHEIRO, V. M. Meu trabalho precisa de jurisprudência? Como posso utilizá-la? QUEIROZ, R. M. R. FEFERBAUM, M. (Coord.). Metodologia jurídica: um roteiro prático para trabalhos de conclusão de curso. São Paulo: Saraiva, 2012, p. 144QUEIROZ, R. M. R. FEFERBAUM, M. (Coord.). Metodologia jurídica: um roteiro prático para trabalhos de conclusão de curso. São Paulo: Saraiva, 2012..
  • 46
    PALMA, J. B. D.; FEFERBAUM, M.; PINHEIRO, V. M. Meu trabalho precisa de jurisprudência? Como posso utilizá-la? QUEIROZ, R. M. R. FEFERBAUM, M. (Coord.). Metodologia jurídica: um roteiro prático para trabalhos de conclusão de curso. São Paulo: Saraiva, 2012, p. 144QUEIROZ, R. M. R. FEFERBAUM, M. (Coord.). Metodologia jurídica: um roteiro prático para trabalhos de conclusão de curso. São Paulo: Saraiva, 2012..
  • 47
    Ibidem, p. 573.
  • 48
    PALMA, J. B. D.; FEFERBAUM, M.; PINHEIRO, V. M. Meu trabalho precisa de jurisprudência? Como posso utilizá-la? QUEIROZ, R. M. R. FEFERBAUM, M. (Coord.). Metodologia jurídica: um roteiro prático para trabalhos de conclusão de curso. São Paulo: Saraiva, 2012, p. 145QUEIROZ, R. M. R. FEFERBAUM, M. (Coord.). Metodologia jurídica: um roteiro prático para trabalhos de conclusão de curso. São Paulo: Saraiva, 2012..
  • 49
    PALMA, J. B. D.; FEFERBAUM, M.; PINHEIRO, V. M. Meu trabalho precisa de jurisprudência? Como posso utilizá-la? QUEIROZ, R. M. R. FEFERBAUM, M. (Coord.). Metodologia jurídica: um roteiro prático para trabalhos de conclusão de curso. São Paulo: Saraiva, 2012, p. 146QUEIROZ, R. M. R. FEFERBAUM, M. (Coord.). Metodologia jurídica: um roteiro prático para trabalhos de conclusão de curso. São Paulo: Saraiva, 2012..
  • 50
    QUEIROZ, Rafael Mafei Rabelo. Monografia jurídica: passo a passo. São Paulo: Método, 2015, p. 102QUEIROZ, Rafael Mafei Rabelo. Monografia jurídica: passo a passo. São Paulo: Método, 2015.
  • 51
    AgRg no HC 657458 / SP, 5ª Turma, Rel. Min. Joel Ilan Paciornik, J: 22/06/2021 e AgRg no HC 603081/SP, 6ª Turma, Rel. Min. Sebastião Reis Júnior, J: 02/02/2021.
  • 52
    De se ressaltar que a pesquisa, por meio dos critérios utilizados para busca no sítio eletrônico do STJ, apenas resultou em acórdãos que versavam sobre a impetração de ordem de habeas corpus individual. Não houve o encontro de HC coletivo.
    Tabela de dados depositada em acesso aberto pela autora em: https://doi.org/10.6084/m9.figshare.19566091.v1
  • 53
    Esclarece-se que 18 dos acórdãos decorreram do julgamento de Agravo Regimental em Habeas Corpus, recurso em que não há pedido liminar.
  • 54
    Esclarece-se que em três acórdãos, proferidos em sede de agravo regimental em habeas corpus, foram abordados pedidos do Ministério Público.
  • 55
    Heard, Catherine (2019)HEARD, Catherine. Towards a health-informed approach to penal reform? Evidence from ten countries. Institute for Criminal Policy Research, London. Disponível em: <www.prisonstudies.org%2Fsites%2Fdefault%2Ffiles%2Fresources%2Fdownloads%2Ficpr_prison_health_report.pdf&clen=2462687&chunk=true>. Acesso em 20/07/2021.
    www.prisonstudies.org%2Fsites%2Fdefault%...
    Towards a health-informed approach to penal reform? Evidence from ten countries. Institute for Criminal Policy Research, London. Disponível em: <<chrome-extension://efaidnbmnnnibpcajpcglclefindmkaj/viewer.html?pdfurl=https%3A%2F%2Fwww.prisonstudies.org%2Fsites%2Fdefault%2Ffiles%2Fresources%2Fdownloads%2Ficpr_prison_health_report.pdf&clen=2462687&chunk=true>>. Acesso em 20/07/2021.
  • 56
    Heard, Catherine. (2021)HEARD, Catherine. Locked in and locked down – prison life in a pandemic: Evidence from ten countries London: ICPR. Disponível em: <https://www.prisonstudies.org/sites/default/files/resources/downloads/locked_in_and_locked_down.pdf>. Acesso em: 20/07/2021.
    https://www.prisonstudies.org/sites/defa...
    Locked in and locked down – prison life in a pandemic: Evidence from ten countries London: ICPR. Disponível em: <<chrome-extension://efaidnbmnnnibpcajpcglclefindmkaj/viewer.html?pdfurl=https%3A%2F%2Fwww.prisonstudies.org%2Fsites%2Fdefault%2Ffiles%2Fresources%2Fdownloads%2Flocked_in_and_locked_down.pdf&clen=532108&chunk=true>>. Acesso em: 20/07/2021.
  • Declaration of originality: the author assures that the text here published has not been previously published in any other resource and that future republication will only take place with the express indication of the reference of this original publication; she also attests that there is no third party plagiarism or self-plagiarism.

HOW TO CITE (ABNT BRAZIL):

  • RYU, Daiana S. Encarceramento provisório na pandemia do coronavírus (Sars-CoV-2) na jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça: prisão preventiva como ultima ratio? Revista Brasileira de Direito Processual Penal, vol. 8, n. 1, p. 443-486, jan./abr. 2022. https://doi.org/10.22197/rbdpp.v8i1.628

Referências Bibliográficas

  • BARLETTA, Junya Rodrigues. Prisão provisória e Direitos Humanos Uma análise baseada nos parâmetros do Sistema Interamericano dos Direitos Humanos. Belo Horizonte: D´Plácido, 2019.
  • CONTI, José Mauricio (Org.). Poder Judiciário: políticas públicas. Vol. II. São Paulo: Almedina, 2018, p. 568.
  • FEDATO, Matheus Arcangelo; KAZMIERCZAK, Luiz Fernando. Prisão cautelar, argumentação e proporcionalidade: uma proposta para a fundamentação das decisões judiciais. Revista Brasileira de Direito Processual Penal, Porto Alegre, vol. 6, n. 1, p. 483-514, jan./abr. 2020. https://doi.org/10.22197/rbdpp.v6i1.268
    » https://doi.org/10.22197/rbdpp.v6i1.268
  • FERNANDES, Og (org). Medidas cautelares no processo penal, prisões e suas alternativas São Paulo: Revista dos Tribunais, 2012.
  • GIACOMOLLI, Nereu José. Prisão, liberdade e as cautelares alternativas ao cárcere São Paulo: Marcial Pons, 2013.
  • GOMES FILHO, Antonio Magalhães. Presunção de inocência e prisão cautelar São Paulo: Saraiva, 1991.
  • HEARD, Catherine. Towards a health-informed approach to penal reform? Evidence from ten countries. Institute for Criminal Policy Research, London Disponível em: <www.prisonstudies.org%2Fsites%2Fdefault%2Ffiles%2Fresources%2Fdownloads%2Ficpr_prison_health_report.pdf&clen=2462687&chunk=true>. Acesso em 20/07/2021.
    » www.prisonstudies.org%2Fsites%2Fdefault%2Ffiles%2Fresources%2Fdownloads%2Ficpr_prison_health_report.pdf&clen=2462687&chunk=true
  • HEARD, Catherine. Locked in and locked down – prison life in a pandemic: Evidence from ten countries London: ICPR. Disponível em: <https://www.prisonstudies.org/sites/default/files/resources/downloads/locked_in_and_locked_down.pdf>. Acesso em: 20/07/2021.
    » https://www.prisonstudies.org/sites/default/files/resources/downloads/locked_in_and_locked_down.pdf
  • ILLUMINATI, Giulio. La presunzione d’innocenza dell’imputato Bologna: Zanichelli, 1979.
  • LEÃO, Bernardo S. C; PRADO, Alessandra R. M. A periculosidade na decretação de prisão preventiva por furto em Salvador: controle racial e de classe. Revista Brasileira de Direito Processual Penal, vol. 7, n. 3, p. 1713-1749, set./dez. 2021. https://doi.org/10.22197/rbdpp.v7i3.627
    » https://doi.org/10.22197/rbdpp.v7i3.627
  • LOPES JÚNIOR, Aury. Prisões cautelares: Lei n. 12.403/2011. 4. ed. São Paulo: Saraiva, 2013.
  • MALAN, Diogo. Prisão processual: limites no sistema interamericano de direitos humanos. In: FERNANDES, Márcia Adriana; PEDRINHA, Roberta Duboc (Org.). Escritos transdisciplinares de criminologia, direito e processo penal: homenagem aos mestres Vera Malaguti e Nilo Batista. Rio de Janeiro: Revan, 2014.
  • MALAN, Diogo; BADARÓ, Gustavo; ZILLI, Marcos; MOURA, Maria Thereza Rocha de Assis; SAAD, Marta; MORAES, Maurício Zanoide de (Org.). Processo Penal Humanista Escritos em homenagem a Antonio Magalhães Gomes Filho. São Paulo: D’Plácido, 2019.
  • MORAES, Maurício Zanoide de. Presunção de inocência no processo penal brasileiro: análise de sua estrutura normativa para a elaboração legislativa e para a decisão judicial. São Paulo: Lumen Juris, 2010.
  • RYU, Daiana. Prisão cautelar e direito ao julgamento no prazo razoável Belo Horizonte: D’Plácido, 2021.
  • SANGUINÉ, Odone. Prisão cautelar, medidas alternativas e direitos fundamentais Rio de Janeiro: Forense, 2014.
  • SANTORO, Antonio Eduardo Ramires; TAVARES, Natália Lucero Frias; GOMES, Jefferson de Carvalho Gomes. A perspectiva dinâmica da população provisoriamente encarcerada no contexto do superencarceramento brasileiro. Boletim IBCCRIM, São Paulo, v. 25, n. 300, p. 8-10, nov. 2017.
  • SHIMIZU, Bruno. Sobre o cárcere, o judiciário e irresponsabilidades. Boletim IBCCRIM, São Paulo, v. 23, n. 274, p. 20-21, set. 2015.
  • TUCCI, Rogério Lauria; DELMANTO JUNIOR, Roberto. Sistematização das medidas cautelares processuais penais. Revista do Advogado, São Paulo, v. 24, n. 78, p. 111-122, set. 2004.
  • QUEIROZ, Rafael Mafei Rabelo. Monografia jurídica: passo a passo São Paulo: Método, 2015
  • QUEIROZ, R. M. R. FEFERBAUM, M. (Coord.). Metodologia jurídica: um roteiro prático para trabalhos de conclusão de curso São Paulo: Saraiva, 2012.
  • WEDY, Miguel Tedesco. Prisão Cautelar e Princípios Constitucionais. Revista Justiça do Direito, Passo Fundo, n. 1, p. 77-94, 2004.

Editado por

Editorial team
  • Editor-in-chief: 1 (VGV)

  • Reviewers: 3

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    29 Jul 2022
  • Data do Fascículo
    Jan-Apr 2022

Histórico

  • Recebido
    31 Jul 2021
  • Revisado
    02 Ago 2021
  • Revisado
    08 Ago 2021
  • Revisado
    18 Ago 2021
  • Revisado
    21 Ago 2021
  • Revisado
    08 Set 2021
  • Revisado
    01 Dez 2021
  • Aceito
    09 Jan 2022
Instituto Brasileiro de Direito Processual Penal Av. Praia de Belas, 1212 - conj 1022 - Praia de Belas, Porto Alegre - RS / Brasil. CEP 90110-000., +55 (51) 3406-1478 - Porto Alegre - RS - Brazil
E-mail: revista@ibraspp.com.br