Acessibilidade / Reportar erro

Seleção de solos para a imobilização de arsênio

Resumos

Esse trabalho consistiu da realização de estudos comparativos da capacidade de retenção de arsênio de 3 amostras de solos do Estado de Minas Gerais e de 1 amostra de rejeito de minério aurífero oriundo da mina do Morro do Ouro, da Rio Paracatu Mineração S.A. A capacidade de retenção foi avaliada com base no levantamento de isotermas, através das quais foi calculado o carregamento máximo de arsênio em cada material. Foi realizada, também, a caracterização química e mineralógica desses sólidos de forma a determinar os minerais constituintes das amostras e, conseqüentemente, os principais adsorventes de arsênio. Finalmente, correlacionando a capacidade adsortiva de cada solo com seus constituintes mineralógicos, foi possível fazer a seleção dos solos mais adequados para a imobilização do arsênio.

arsênio; adsorção; solos; meio ambiente


This work aimed at investigating arsenic adsorption capacity of three soil samples from Minas Gerais region and one tailing sample from Morro do Ouro, a gold mine owned by Rio Paracatu Mineração S.A. Maximum adsorption capacities of the samples were determined by a Langmuir type equation. Chemical and mineralogical characterization were carried out in order to determine the main minerals responsible for the adsorption process. The arsenic adsorption capacities were then correlated with the samples constituents. Based on the adsorption data and on the samples constituents, it was possible to select an appropriated soil for arsenic immobilization.

arsenic; adsorption; soils; environment


Mineração

Seleção de solos para a imobilização de arsênio

Ana Cláudia Q. Ladeira

Dr., Pesquisadora, Depart. de Eng. Metalúrgica e de Materiais, UFMG

E-mail: aladeira@demet.ufmg.br

Virgínia Sampaio T. Ciminelli

Ph.D., Professora Titular, Depart. de Eng. Metalúrgica e de Materiais, UFMG

E-mail: ciminelli@demet.ufmg.br

Alessandro L. Nepomuceno

M.Sc., Engenheiro de Minas, Rio Tinto do Brasil Ltda

E-mail: alessandro.nepomuceno@rtb.riotinto.com.br

Resumo

Esse trabalho consistiu da realização de estudos comparativos da capacidade de retenção de arsênio de 3 amostras de solos do Estado de Minas Gerais e de 1 amostra de rejeito de minério aurífero oriundo da mina do Morro do Ouro, da Rio Paracatu Mineração S.A. A capacidade de retenção foi avaliada com base no levantamento de isotermas, através das quais foi calculado o carregamento máximo de arsênio em cada material. Foi realizada, também, a caracterização química e mineralógica desses sólidos de forma a determinar os minerais constituintes das amostras e, conseqüentemente, os principais adsorventes de arsênio. Finalmente, correlacionando a capacidade adsortiva de cada solo com seus constituintes mineralógicos, foi possível fazer a seleção dos solos mais adequados para a imobilização do arsênio.

Palavras-chave: arsênio, adsorção, solos, meio ambiente.

Abstract

This work aimed at investigating arsenic adsorption capacity of three soil samples from Minas Gerais region and one tailing sample from Morro do Ouro, a gold mine owned by Rio Paracatu Mineração S.A. Maximum adsorption capacities of the samples were determined by a Langmuir type equation. Chemical and mineralogical characterization were carried out in order to determine the main minerals responsible for the adsorption process. The arsenic adsorption capacities were then correlated with the samples constituents. Based on the adsorption data and on the samples constituents, it was possible to select an appropriated soil for arsenic immobilization.

Keywords: arsenic,adsorption, soils, environment.

1. Introdução

Elevadas concentrações de poluentes nos solos das regiões urbanas podem trazer sérios impactos ao meio ambiente, principalmente se alguns desses poluentes forem lixiviados atingindo aqüíferos superficiais ou subterrâneos. O processo de sorção de alguns poluentes nos solos ocorre na natureza de forma sistemática e, em geral, lentamente. Inicialmente os poluentes são adsorvidos nos solos através de troca iônica, interações eletrostáticas, forças de van der Waals ou ligações químicas estáveis e, através do envelhecimento do solo, podem vir a fazer parte da estrutura de alguns minerais. Quando não ocorre uma interação estável do poluente com o solo, pode, então, haver a migração do poluente, culminando com a contaminação da água de lençóis ou da superfície.

Os impactos negativos causados pelo arsênio aos solos e águas têm despertado grande interesse do público devido principalmente à contaminação de uma parcela significativa de populações vizinhas às fontes geradoras desse elemento (Rawlins et al., 1997). Uma das principais fontes de contaminação são as atividades de explotação de minérios sulfetados, que produzem resíduos sólidos ricos em arsênio. Esses resíduos são depositados na forma de pilhas de rejeito, pilhas de estéril e pilhas extintas de lixiviação. A dissolução de minerais de arsênio, como a arsenopirita, dispostos nessas pilhas, é uma fonte permanente de contaminação. Outra fonte provável de contaminação está relacionada aos precipitados de arsenatos metálicos utilizados como forma de disposição do arsênio solubilizado em processos hidrometalúrgicos. Também a lixiviação natural de solos típicos de regiões da Índia, Bangladesh e Mongólia, entre outros países, com background elevado em As, tem acarretado a contaminação de grandes volumes de água subterrânea, levando à contaminação de milhões de pessoas.

Em se tratando da solubilização de arsênio presente em rejeitos sólidos, a utilização de substratos inorgânicos que apresentam elevada capacidade de sorção tem sido estudada como uma opção para remoção e imobilização desse elemento. O uso de adsorventes inorgânicos é uma tentativa de se empregarem tecnologias mais eficazes e mais acessíveis economicamente às indústrias de extração mineral. Entre os minerais que apresentam propriedades adsorventes de arsênio encontram-se alguns argilominerais (Griffin et al., 1977, Lo et al., 1997), a alumina (Ghosh & Yuan, 1987, Ladeira et al., 2001), óxidos de ferro (Pierce & Moore, 1982, Fuller et al., 1993, Isaacson et al., 1994, Fendorf et al., 1997), óxidos de manganês (Deschamps et al., 2002) e até mesmo a pirita (Zouboulis & Kydros, 1993). Para um melhor entendimento da imobilização de certos elementos em substratos naturais, alguns trabalhos foram conduzidos com sedimentos de rios e em determinados tipos de solos (Blakey, 1984, Rodie et al., 1995, Ahmann et al., 1997, Manning & Martens, 1997). Grande parte dos minerais citados anteriormente está presente em vários solos do território brasileiro e são substratos disponíveis, o que contribui para a viabilidade de sua utilização como adsorventes inorgânicos.

2. Materiais e métodos

2.1 Amostras

Os materiais denominados solos vermelho, marrom e rejeito foram fornecidos pela Rio Paracatu Mineração S.A. (RPM) e são oriundos da região de Paracatu, Minas Gerais. O material denominado solo amarelo foi fornecido pela Mineração Morro Velho S.A, sendo proveniente da região de Nova Lima, Minas Gerais. As amostras foram inicialmente desaglomeradas e peneiradas em malha de abertura equivalente a 0,59mm. Posteriormente os materiais foram amostrados utilizando-se a técnica de cone-quarteamento, seguida de amostragem no equipamento Sieving Riffler, da marca Quantachrome Corporation, gerando amostras de cerca de 50 gramas que foram estocadas para uso imediato.

2.2 Isotermas de Adsorção

Os experimentos foram realizados em erlenmeyers agitados, vedados, contendo 100mL de solução de arsênio e 10g de material adsorvente. As soluções de arsênio trivalente e pentavalente foram preparadas através da dissolução dos sais meta-arsenito de sódio (AsNaO2 PA; 99,0%; Fluka) e arsenato ácido disódio (Na2HAsO4.7H2O PA; 98,5%, Fluka) em água deionizada. O pH da solução foi ajustado com NaOH ou HCl e a força iônica da solução foi ajustada com NaCl ou Na2SO4 de acordo com as condições de cada ensaio. A concentração inicial do arsênio em solução variou entre 100 e 1000mg/L. Ensaios distintos foram realizados para a obtenção de cada ponto da isoterma. O tempo de cada ensaio foi fixado em 24 horas e a temperatura em 25±0,5°C. O pH durante o ensaio foi sendo corrigido para um valor predeterminado com NaOH ou HCl até a completa estabilização. Ao final de cada experimento, a polpa foi imediatamente filtrada, sendo o filtrado coletado para determinação da concentração final de arsênio total. O arsênio total inicial e final foi analisado diretamente através de espectrometria de absorção atômica e/ou espectrometria de plasma de acoplamento indutivo (ICP- Spectro Modula).

A quantidade máxima de arsênio adsorvida (Qmax) foi calculada a partir do ajuste da equação de Langmuir, descrita a seguir, aos dados experimentais:

(1)

onde:

Q = quantidade de arsênio adsorvida pelo sólido (mg As/g de sólido adsorvente).

Qmax = quantidade máxima de arsênio adsorvido pelo sólido (mg/g de sólido adsorvente).

Cf = concentração de arsênio no equilíbrio (mg/L).

k = constante.

2.3 Caracterização Química e Mineralógica

Devido às variadas condições geológicas de formação dos mesmos, os diversos materiais estudados constituem sistemas complexos, cuja caracterização requer a utilização de várias técnicas analíticas. No presente trabalho, foram utilizadas análises químicas via úmida para a identificação e dosagem dos constituintes; fluorescência de raios X para identificação da composição elementar (equipamento Philips PW 2510), difração de raios X (equipamentos Philips PW 1400 e Philips PW 2400), juntamente com observação em microscópio ótico e microscópio eletrônico de varredura para a determinação da composição mineralógica (modelo Jeol JSM35C); determinação da área superficial específica pelo método BET (Quantachrome modelo Nova 1000); e obtenção da distribuição granulométrica utilizando o equipamento SediGraph 5000.

3. Resultados

3.1 Isotermas de Adsorção

Os dados obtidos através do levantamento de isotermas de adsorção estão apresentados em gráficos relacionando a concentração final de arsênio na fase aquosa (mg/L), considerada como concentração de equilíbrio, e a quantidade de arsênio adsorvido pelo sólido (mg de As/g de adsorvente). Devido à escassez de dados na literatura relativos à adsorção de As(III) e por ser essa espécie significativamente mais tóxica e apresentar maior tendência a remobilização que o As(V), optou-se primeiramente por se trabalhar com a espécie trivalente. A Figura 1 mostra as isotermas para As(III), obtidas em pH 5,5 para todos os substratos empregados. As linhas sólidas na Figura 1 representam o ajuste dos dados experimentais ao modelo teórico de Langmuir (eq. 1). O erro em torno da média foi calculado em no máximo 5%.

Figura 1
- Remoção de As(III) utilizando-se diferentes adsorventes. Condição das isotermas: pH=5,5; I=0,15 M ajustada com NaCl; temperatura de 25±0,5°C.

A equação da isoterma proposta por Langmuir tem sido muito utilizada para descrever o fenômeno de adsorção de íons em adsorventes sólidos (Griffin et al., 1977, Pierce & Moore, 1982, Ghosh & Yuan, 1987, Isaacson et al., 1994), sendo também empregada nesse estudo. O modelo de adsorção proposto por Langmuir assume que todos os sítios estão inicialmente livres, não considera reações reversíveis e supõe que as espécies adsorvidas interagem somente com um sítio ativo formando uma monocamada. Embora as hipóteses do modelo não sejam sempre atendidas, a equação de Langmuir tem se apresentado bastante satisfatória na descrição dos fenômenos de adsorção.

O comportamento das várias amostras, em relação à forma da curva, é bastante similar para todos os casos avaliados, o mesmo sendo observado para outros tipos de solos ou minerais. Utilizando-se da equação de Langmuir (Eq. 1) para o cálculo da capacidade máxima de carregamento (Qmax.), obteveram-se os valores apresentados na Tabela 1. O erro para os valores de Qmax. foi calculado em no mínimo 1% e no máximo 4%. Para os casos em que o patamar não estava nitidamente definido, como, por exemplo, para o solo vermelho (Figura 1), o valor de Qmax. foi obtido por extrapolação dos dados originados pela Equação 1. O coeficiente de correlação mostrado na Tabela 1 foi calculado para a forma linearizada da Equação 1 (Cf vs. Cf/Q). O menor coeficiente de correlação foi obtido para o rejeito. Melhores ajustes foram alcançados para as demais amostras.

Tabela 1
- Valores de Qmax. para As(III) relativo aos diversos substratos.

Observa-se uma diferença significativa em relação à capacidade de carregamento das diferentes amostras. O solo vermelho apresentou o maior carregamento de As(III), com Qmax.=3,6mg/g. Os solos amarelo e marrom tiveram praticamente o mesmo desempenho, com valores de Qmax.=1,0mg/g e Qmax.=0,7mg/g, respectivamente. A extração máxima calculada para o rejeito foi muito inferior às demais (Qmax.=0,1mg/g) e pode ser considerada insignificante para o proposto nesse trabalho. Dados da literatura (Griffin et al., 1977; Pierce & Moore, 1982) mostram extrações máximas que variam de 0,1mg/g para o caulim até 38,5mg/g para um óxido de ferro sintético.

Através do levantamento de isotermas, foram também determinadas as capacidades de carregamento em pH 2,0 e 8,5 de todos os materiais citados anteriormente com relação à espécie trivalente. Para a espécie pentavalente, o carregamento foi avaliado em pH 5,5 e 8,5. A Figura 2 ilustra o desempenho dos materiais, exceto para o solo amarelo, em relação ao As(V) e pH 5,5. Para todas as condições aplicadas, observou-se a superioridade do solo vermelho comparativamente às demais amostras, com um carregamento de até três vezes mais arsênio do que a segunda melhor amostra (amarela). O desempenho diferenciado do solo vermelho a respeito da adsorção de ambas as espécies de arsênio será discutido a seguir com base na constituição mineralógica e propriedades físicas das amostras.

Figura 2
- Remoção de As(V) utilizando-se amostras de solo vermelho, marrom e rejeito. Condição das isotermas: pH=5,5, I=0,15M ajustada com NaCl; T= 25±0,5°C. As linhas sólidas representam o ajuste dos dados experimentais à Equação 1.

3.2 Diâmetro médio e superfície específica

A Tabela 2 indica os valores de d50 (diâmetro médio abaixo do qual se encontram 50% das partículas) e das áreas superficiais específicas das amostras. A amostra de solo vermelho mostrou-se bastante fina, sendo que 50% (em massa) das partículas apresentaram valores de diâmetros inferiores a 0,5 mm. O solo amarelo aparece também com uma granulometria fina apresentando um d50= 1,2mm. A elevada porcentagem de partículas de diâmetro equivalente inferior a 2mm classifica essas amostras como materiais argilosos (Santos, 1975).

Tabela 2
- Diâmetro médio (d50) e Superfície específica.

Os materiais avaliados possuem áreas superficiais específicas significativamente elevadas, que variaram de 35,7 a 5,2m2/g. Os valores obtidos para os solos amarelo e marrom (18,9 e 16,2 m2/g, respectivamente) são similares, o mesmo ocorrendo com a composição química e a composição mineralógica, conforme mostrado na próxima seção. Entretanto o solo amarelo é sensivelmente mais fino. Apesar da granulometria mais fina, essa amostra apresentou o valor de Qmax. próximo ao do solo marrom e quase 4 vezes menor ao apresentado pelo solo vermelho (Tabela 1). Portanto, até onde é possível concluir com base nos experimentos conduzidos, não existe correlação entre a granulometria das amostras e sua capacidade de adsorção de arsênio.

3.3 Caracterização química e mineralógica

3.3.1 Composição química

As análises por fluorescência de raios x indicaram como principais constituintes das amostras os elementos Si, Al, Fe e O. Os elementos potássio e titânio aparecem com teor médio e ainda como traços estão os elementos sódio, magnésio e manganês. As análises químicas via úmida (Tabela 3) mostraram resultados coerentes com a composição química proveniente da fluorescência de raios x. De acordo com a Tabela 3, os materiais são compostos basicamente de óxidos de silício, alumínio e ferro, estes perfazendo cerca de 85% dos constituintes. O solo vermelho distingue-se das demais amostras, em especial, pelo elevado teor de óxidos de ferro (10,6%) e de alumínio (17,3%, provavelmente gibbsita) solúveis.

Tabela 3
- Composição química dos solos obtida por via úmida.

O ferro insolúvel está presente na composição dos silicatos ou nos sulfetos (pirita). Já o silício aparece em destaque devido à presença desse elemento tanto na composição dos argilominerais como na estrutura do quartzo. O silício na forma do mineral quartzo (SiO2(silica)) é inerte à adsorção de arsênio e, portanto, não contribui para a sua remoção. De todos os adsorventes, o solo marrom é o que apresenta o maior teor de (SiO2(silica)). No rejeito, a fração de SiO2 (23%) resultante da diferença entre o SiO2(tot) e o SiO2(silica), e que representa o silício presente nos aluminossilicatos, é a mais elevada. Os baixos índices de alumínio solúvel no rejeito vêm comprovar esse fato, já que os aluminossilicatos são formados basicamente de silício e alumínio e são insolúveis em HCl.

3.3.2 Composição mineralógica

Os materiais adsorventes avaliados são constituídos por rochas provenientes da decomposição de outras rochas ou minerais e, geralmente, apresentam uma grande variedade de minerais. Para a identificação desses materiais, foi empregada a difração de raios X e, especificamente para o solo vermelho, foram realizadas análises petrográficas em microscópio ótico e em microscópio eletrônico de varredura/microssonda. Os resultados das análises por difração de raios X indicam apenas os principais constituintes, uma vez que a técnica apresenta como limitações o problema de superposição de raias e a falta de sensibilidade para constituintes em pequeno teor. O mineral quartzo (SiO2) aparece como abundante (acima de 40%) em todos as amostras, o feldspato (Kx(Si3.xAlx)0 8), a moscovita ((K,H3O)Al2(Si,Al)4 O10(OH)2) e a caulinita (Al2Si2O5(OH) 4) aparecem nas quatro amostras em teores que variam de 10 a <40%. Entretanto o solo vermelho apresenta ainda teor elevado de gibbsita (Al2O3.3H2O), teores entre 10 a <40% e teores significativos de goethita (FeOOH) e hematita (Fe2O3), entre 3 a 10%. Tendo em vista o melhor desempenho do solo vermelho, foi calculada a composição mineralógica aproximada da amostra (Tabela 4), gerada com base nos dados das análises químicas, difração de raios X e fluorescência descritas anteriormente. Deve-se ressaltar a presença elevada dos óxidos de ferro e alumínio, que, juntos, perfazem um total de 37% dos constituintes do solo vermelho.

Tabela 4
- Composição aproximada do solo vermelho.

Estudos anteriores (Griffin et al., 1977; Pierce & Moore, 1982; Fuller et al., 1993; Ladeira et al., 2001) mostraram que amostras de óxidos de ferro, óxidos de alumínio e determinados argilominerais são adsorventes eficientes para o arsênio. Avaliando-se as extrações máximas dos materiais em estudo e respectivas composições químicas e mineralógicas, observou-se que os materiais que apresentaram as mais elevadas extrações foram aqueles que apresentaram, em sua composição, os minerais hematita, goethita e gibbsita. Contrariando alguns dados apresentados na literatura (Griffin et al., 1977), que conferem à caulinita poder adsorvente, o rejeito que é constituído basicamente de quartzo e aluminossilicatos (moscovita e caulinita) foi o pior adsorvente para o arsênio. Entretanto Darland e Inskeep (1997) destacam que o arsenato é preferencialmente adsorvido pelos óxidos de superfície, se comparado aos silicatos constituídos de camadas.

O objetivo da análise petrográfica (Salas, 1996) foi a identificação dos óxidos de ferro e de alumínio e aluminossilicatos, as associações desses minerais e a determinação da distribuição desses componentes de acordo com a faixa granulométrica. Determinar os componentes na fração granulométrica mais fina foi de grande importância, pois, devido à elevada área superficial e à presença de argilominerais, essa é considerada a parte mais ativa dos solos. Além dos constituintes minerais já determinados, os estudos petrográficos apontaram outros minerais, porém na forma de traços, sendo eles: magnetita, martita, pirita, pirrotita, "mineral de titânio" e fragmentos de rocha xistosa muito agregados. Os resultados também mostraram que os aluminossilicatos exibem um avançado processo de oxidação, apresentam-se em finíssimos grãos e na forma de abundantes agregados com tamanhos irregulares e concentrando-se predominantemente na fração menor que 37 mm. Esses agregados englobam pequenas incrustações de óxidos de ferro hidratados/ goethita e se apresentam com coloração cinza-escura resultante da alteração de óxido de ferro ou com coloração avermelhada resultante da alteração de minerais ferromagnesianos silicatados. Os "minerais transparentes" ocorrem predominantemente na fração maior que 37 mm, sendo que alguns grãos contêm óxido de ferro.

A análise em microscópio eletrônico de varredura/microssonda mostrou que os óxidos de alumínio se encontram inclusos nos poros do quartzo (Figura 3a). A análise elementar do ponto 1 mostrou uma região constituída de 99% de quartzo e 0,4% de alumínio, enquanto que no ponto 2 observa-se um enriquecimento de alumínio até um teor de 60%. Os óxidos de alumínio também aparecem como partículas discretas com teor próximo de 82%. A associação entre óxidos de ferro e aluminossilicatos foi comprovada e está mostrada na Figura 3b, na qual o ponto 4 indica uma região predominantemente formada por aluminossilicatos e o ponto 3 de um óxido de ferro.

Figura 3
- (a) Solo vermelho > 37mm. Ponto 1® Si=99,2%; Al=0,4%; Ti=0,4%. Ponto 2® Si=30%; Al=60%, Fe=4%, Cl=6%. (b) Solo vermelho >10mm. Ponto 3® Si=2%; Al=2%, Fe=94%, Cl=1%, K=1%. Ponto 4® Si=31%; Al=20%, Fe=24%, Cl=13%, K=10%, Ti=2%. Imagens obtidas por emissão de elétrons secundários.

4. Considerações finais

Os materiais aqui testados como adsorventes não irão passar por processos de dessorção/regeneração e, sim, servir como uma barreira que irá imobilizar o arsênio, evitando a migração desse para o meio ambiente. Portanto é importante que o material utilizado para tal fim tenha uma elevada capacidade de adsorção e seja quimicamente estável. Através das isotermas pôde-se selecionar os materiais mais adequados em relação à capacidade de adsorção, ou seja, aqueles que apresentaram um elevado carregamento de arsênio. A mobilidade química é avaliada em uma outra publicação (Ladeira et al.,2000). Os dados das isotermas indicam ser o solo vermelho visivelmente superior aos demais materiais em relação à capacidade de remoção de As(III) e As(V). Considerando todas as condições estudadas, o maior valor de Qmax. calculado para esse solo foi 3,6mg/g. O solo marrom e o amarelo apresentaram baixas capacidades de remoção de arsênio (0,7mg/g e 1,0mg/g, respectivamente), se comparadas à apresentada pela amostra vermelha. O rejeito apresentou índices de remoção de arsênio próximos a zero em praticamente todas as condições avaliadas.

Além da avaliação comparativa do valor de Qmax de cada amostra, foi importante fazer a relação entre a capacidade de remoção e os constituintes minerais identificados. As amostras são constituídas basicamente por silicatos: quartzo, moscovita, caulinita e feldspato. A amostra de solo vermelho distingue-se das demais amostras por apresentar ainda elevado teor de óxidos de alumínio (26%) e de óxidos de ferro (11%), goethita e hematita, preferencialmente. Essa amostra caracteriza-se pela menor granulometria (d50= 0,5mm) e maior área superficial específica (35,7 m2/g) entre todos os materiais estudados. Sendo assim, propõe-se que a maior adsorção de arsênio pelo solo vermelho está associada ao maior teor de óxidos de alumínio e de ferro bem como à elevada área superficial específica.

A utilização de solos como adsorventes, oriundos de regiões com potencial para ocorrência de contaminação, foi uma forma de se conhecer o risco imposto ao meio ambiente, caso esse solos fossem contaminados ou utilizados como revestimento em valas de rejeito. Apesar do elevado teor de minerais inertes ao arsênio, o solo vermelho apresentou níveis de carregamento (Qmax.) compatíveis com aqueles determinados para minerais puros (Griffin et al., 1977). Portanto conclui-se que o solo vermelho assim como os demais outros solos com as características anteriormente identificadas apresentam-se com um grande potencial imobilizador do arsênio.

5. Agradecimentos

Os autores agradecem ao CNPq, Pronex e ao Instituto do Milênio.

SALAS, H.T. Caracterização de amostra de material argiloso. 1996, 14p. Relatório.

Artigo recebido em 23/05/2002 e aprovado em 09/08/2002.

  • AHMANN, D. et alii. Microbial mobilization of arsenic from sediments of the Aberjona Westershed. Environ. Sci. Technol., v. 31, n. 10, p. 2923-2930, 1997.
  • BLAKEY, N.C. Behavior of arsenical wastes co-disposed with domestic solid wastes. J. Water Pollution Control Federation, v. 56, n. 1, p. 69-75, 1984.
  • DARLAND, J.E., INSKEEP, W.P. Effects of pore water velocity on the transport of arsenate. Environ. Sci. Technol., n. 31, p. 704-709, 1997.
  • DESCHAMPS, E. et alii. Arsenic sorption onto soils enriched with manganese and iron minerals. Submitted to Clays and Clay Minerals, 2002.
  • FENDORF, S. et alii. Arsenate and chromate retention mechanisms on goethite. 1. Surface structure. Environ. Sci. Technol., v. 31, n. 2, p. 315-320, 1997.
  • FENDORF, S. et alii. Mechanism of chromium (III) sorption on silica. 1. Cr(III) surface structure derived by stended X-ray absorption fine structure spectroscopy. Environ. Sci. Technol., n. 28, p. 284-289, 1994.
  • FULLER, C.C. et alii. Surface chemistry of ferrihydrite: Part 2. Kinetics of arsenate adsorption and coprecipitation. Geo. Cosmo. Acta, n. 57, p. 2271-2282, 1993.
  • GHOSH, M.M., YUAN, J.R. Adsorption of inorganic arsenic and organoarsenicals on hydrous oxides. Environ. Progress, n. 6, p. 150-157, 1987.
  • GRIFFIN, R.A. et alii. Attenuation of pollutants in municipal landfill leachate by clay minerals. Environ. Geology Notes, n. 79, p. 1-47, 1997.
  • ISAACSON, A.E. et alii. Arsenic removal using immobilized ferric oxyhydroxides. In: HARRIS, B., KRAUSE, E. (eds.). Internal. Symp. on Impurity Control and Disposal in Hydrometallurgical Processes Canada, CIM, p. 47-55, 1994.
  • LADEIRA A.C.Q. et alii. The use of Al-based adsorbents for arsenic mitigation. In: 6Th SOUTHERN HEMISPHERE MEETINGS ON MINERAL TECHNOL. Anais Rio de Janeiro, Brazil, p. 549-554, 2001.
  • LADEIRA A. C. Q., CIMINELLI V. S. T. Mobility of As(III) and As(V) on soils. In: C. YOUNG C. (ed.) Minor Elements 2000 SME, USA, p. 191-198, 2000.
  • LO, I.M.C. et alIi. Modified clays for waste containment and pollutant attenuation. J. Environ. Eng., v. 123, n. 1, p. 25-32, 1997.
  • MANNING, B.A., MARTENS, D.A. Speciation of arsenic(III) and arsenic(V) in sediment extracts by high-performance liquid chromatography-hydride generation atomic absorption spectrophotometry. Environ. Sci. Technol., n. 31, p. 171-177, 1997.
  • PIERCE, M.L., MOORE, C.B. Adsorption of arsenite and arsenate on amorphous iron hydroxide. Water Res., n. 16, p. 1247-1253, 1982.
  • RAWLINS, B.G. et alii. Preliminary investigation of mining-related arsenic contamination in the provinces of Mendoza and San Juan (Argentina) and Minas Gerais (Brazil). British Geol. Survey Tech. Report WC/97/60. 1997. 27p. Relatório.
  • RODIE, A. et alii. Biological pathways of arsenic in lakes. Environ. Rev., n. 3, p. 304-307, 1995.
  • SANTOS, P.S. Tecnologia de argilas; São Paulo: Edgard Blücher Ltda. n. 1, p.339.
  • ZOUBOULIS, A.I., KYDROS, K.A. Arsenic(III) and arsenic(V) removal from solutions by pyrite fines. Separation Sci. Technol., n. 28, p. 2449-2463, 1993.

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    07 Dez 2007
  • Data do Fascículo
    Set 2002

Histórico

  • Aceito
    09 Ago 2002
  • Recebido
    23 Maio 2002
Escola de Minas Rua Carlos Walter Marinho Campos, 57 - Vila Itacolomy, 35400-000 Ouro Preto MG - Brazil, Tel: (55 31) 3551-4730/3559-7408 - Ouro Preto - MG - Brazil
E-mail: editor@rem.com.br