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Automedicação e adesão ao tratamento medicamentoso: avaliação dos participantes do programa Universidade do Envelhecer

Resumo

Objetivo

: avaliar o uso de medicamentos de forma contínua e por automedicação e a adesão ao tratamento entre os participantes idosos e não idosos da Universidade do Envelhecer (UniSer).

Método

: estudo observacional, quantitativo e transversal, com emprego da técnica de entrevista, realizado na UniSer com 215 sujeitos. Foi utilizado um instrumento estruturado que permitiu a coleta de variáveis sociodemográficas e automedicação. Foram utilizados a Escala de Morisky-Green-Levine (MGL), de 1986, e o Brief Medication Questionnaire (BMQ) domínio regime na análise de adesão. Foram realizadas análises descritivas dos dados, além do teste qui-quadrado e do exato de Fisher para avaliar associação entre as variáveis de interesse.

Resultados

: dos entrevistados, 127 (59,1%) foram idosos (>60 anos), sendo 81,9% mulheres. Em relação à automedicação, 22,9% dos idosos e 21,7% dos não idosos a praticaram nos últimos sete dias (p=0,848), mesmo que considerem perigosa (p=0,472). Entre estes, 45,8% dos idosos e 55,6% dos não idosos realizaram automedicação irracional dentro do período analisado. Tem-se que 76,4% dos idosos e 64,8% dos não idosos utilizavam medicamentos de uso contínuo (p=0,063). Ao analisar a adesão ao tratamento medicamentoso, 78,8% dos idosos e 76,1% dos não idosos não eram aderentes ao tratamento (p=0,719) segundo a escala MGL; já pelo BMQ domínio Regime 36,7% dos idosos e 41,1% dos não idosos não eram aderentes (p=0,595).

Conclusão:

estes achados demonstram que não houve diferenças significativas entre os grupos estudados e as ações de educação em saúde devem ser realizadas com ênfase nas orientações sobre adesão e uso racional de medicamentos.

Palavras-chave:
Envelhecimento; Uso de Medicamentos; Automedicação; Cooperação e Adesão ao Tratamento; Doenças Crônicas

Abstract

Objectives

: to evaluate the use of medication (for continuous use and self-medication) and adherence to treatment among elderly and non-elderly participants of the Universidade do Envelhecer (UniSer).

Method

: an observational, quantitative and cross-sectional study, using the interview technique, was carried out at UniSer with 215 subjects. A structured instrument was used for the collection of sociodemographic variables and self-medication data. The 1986 Morisky-Green-Levine Scale (MGL) and the Brief Medication Questionnaire (BMQ) regimen screening tool were used to assess adherence. Descriptive analyzes of the data were performed, and the chi-squared Test and Fisher’s Exact Test were applied to evaluate the association between variables of interest.

Results

: of the participants, 127 (59.1%) were elderly (< 60 years old), of whom 81.9% were women. Regarding self-medication, 22.9% of elderly and 21.7% of non-elderly persons practiced it in the previous seven days (p=0.848), even if they considered it dangerous (p=0.472). A total of 45.8% of the elderly and 55.6% of the non-elderly irrationally self-medicated within the analyzed period, while 76.4% of the elderly and 64.8% of the non-elderly used medications of continuous use (p=0.063). A total of 78.8% of the elderly and 76.1% of the non-elderly were not adherent to treatment (p=0.719) according to the MGL scale, while the BMQ Regimen Screen found that 36.7% of the elderly and 41.1% of the non-elderly were not adherent (p=0.595).

Conclusion

: these findings demonstrate that there were no significant differences between the groups studied and health education actions should be carried out with an emphasis on guidelines on adherence and the rational use of medicines.

Keywords:
Aging; Drug Utilization; Self Medication; Treatment Adherence and Compliance; Chronic Disease

INTRODUÇÃO

Com o envelhecimento há um aumento da prevalência de doenças crônicas e de utilização de medicamentos, principalmente daqueles de uso contínuo11 Almeida NA, Reiners AAO, Azevedo RCS, Silva AMC, Cardoso JDC, Souza LC. Prevalência e fatores associados à polifarmácia entre os idosos residentes na comunidade. Rev Bras Geriatr Gerontol. 2017;20(1):143-53.

2 Miranda GMD, Mendes ACG, Silva ALA. O envelhecimento populacional brasileiro: desafios e consequências socais atuais e futuras. Rev Bras Geriatr Gerontol. 2016;19(3):507-19.
-33 World Health Organization. World report on ageing and health. Geneva: WHO; 2015.. Além destes medicamentos, adultos e idosos praticam a automedicação como uma forma de autocuidado. A automedicação é definida como a seleção e uso de medicamentos para o tratamento de doenças e sintomas que acometem o usuário, sem prescrição ou acompanhamento de um profissional habilitado (médico ou dentista)44 Fernandes WS, Cembranelli JC. Automedicação e o uso racional de medicamentos: o papel do profissional farmacêutico no combate a essas práticas. Rev Univap. 2015;21(37):5-12.

5 World Health Organization. The role of the pharmacist in self-care and self-medication. Geneva: WHO; 1998.
-66 Domingues PHF, Galvão TF, Andrade KRC, Silva MT, Pereira MG. Prevalência e fatores associados à automedicação em adultos no Distrito Federal: estudo transversal de base populacional. Epidemiol Serv Saúde 2017;26(2):319-30..

Alguns fatores podem influenciar essa prática, desde os diferentes tipos de acesso aos serviços de saúde, bem como o grau de informação sobre os medicamentos, além de amigos, familiares, propagandas de medicamentos e sobras de tratamentos anteriores77 Arrais PSD, Fernandes MEP, Dal Pizzol TS, Ramos LR, Mengue SS, Luiza VL, et al. Prevalência da automedicação no Brasil e fatores associados. Rev Saúde Pública. 2016;50(supl 2):1-11.. Desvantagens devem ser observadas em relação à automedicação em todos os estratos da população, mas em especial quanto aos idosos. Entre elas, podem-se citar os gastos desnecessários, atrasos nos diagnósticos, potenciais riscos de intoxicação e interações medicamentosas, além de resistência bacteriana77 Arrais PSD, Fernandes MEP, Dal Pizzol TS, Ramos LR, Mengue SS, Luiza VL, et al. Prevalência da automedicação no Brasil e fatores associados. Rev Saúde Pública. 2016;50(supl 2):1-11..

Já para os medicamentos de uso contínuo é importante avaliar a adesão ao tratamento medicamentoso, que é considerada um dos principais determinantes para a efetividade da farmacoterapia e é definida como o grau de concordância entre o comportamento do usuário do medicamento em relação às orientações do médico ou outro profissional da saúde88 Tavares NIL, Bertoldi AD, Mengue SS, Arrais PSD, Luiza VL, Oliveira MA, et al. Fatores associados à baixa adesão ao tratamento farmacológico de doenças crônicas no Brasil. Rev Saúde Pública. 2016;50(Supl 2):1-10.,99 Aquino GA, Cruz DT, Silvério MS, Vieira MT, Bastos RR, Leite ICG. Fatores associados à adesão ao tratamento farmacológico em idosos que utilizam medicamento anti-hipertensivo. Rev Bras Geriatr Gerontol. 2017;20(1):116-27..

Muitas vezes a baixa efetividade dos tratamentos pode ser explicada por diversos fatores, como barreiras de acesso ao sistema de saúde, dificuldades financeiras, efeitos adversos e, também, pela não adesão. Essa pode variar dentro de grupos populacionais, além de que, a localização geográfica (distância que os indivíduos têm que percorrer para ter acesso aos serviços de saúde), estilo de vida (como hábitos alimentares e atividade física) e condições de saúde podem interferir diretamente na adesão1010 Remondi FA, Cabrera MAS, Souza RKT. Não adesão ao tratamento medicamentoso contínuo: prevalência e determinantes em adultos de 40 anos e mais. Cad Saúde Pública. 2014;30(1):126-36..

Ações interdisciplinares são importantes e podem contribuir para o uso racional de medicamentos. Neste sentido, estratégias que foquem o cuidado na saúde podem ser benéficas para melhorar a qualidade de vida da população idosa. Entre essas estratégias podem-se citar os projetos vinculados às secretarias de saúde e de assistência social, como é o caso dos grupos de idosos, e aqueles vinculados às Universidades como o caso das Universidades Abertas à Terceira Idade (UnATI) e outros programas de extensão como a Universidade do Envelhecer (UniSer). Sendo assim, conhecer o perfil de saúde e de uso de medicamentos dos participantes de estratégias como essas é importante para a definição de ações educativas que promovam o uso racional de medicamentos.

Neste contexto, o presente estudo buscou avaliar o uso de medicamentos de forma contínua e por automedicação entre os participantes idosos e não idosos da Universidade do Envelhecer (UniSer), além de avaliar a adesão ao tratamento com medicamentos de uso contínuo entre estes dois grupos.

MÉTODO

Estudo observacional de abordagem quantitativa do tipo transversal, com emprego da técnica de entrevista. A pesquisa foi realizada no Distrito Federal (DF), em um programa de extensão da Universidade de Brasília (UnB), denominado Universidade do Envelhecer (UniSer). Esse programa propõe ações que estimulam a cidadania e a promoção da saúde em idosos e adultos com mais de 45 anos. A intenção desse programa é promover uma educação que amplie o sentido de qualidade de vida, agregando conhecimento, experiência e a participação constante do discente na promoção de um envelhecimento saudável1111 Universidade do Envelhecer da Universidade de Brasília. Porque envelhecer é um ato de amor [Internet]. Brasília, DF: UNISER; 2018 [acesso em 20 maio 2018]. Disponível em: https://www.uniserunb.com/nosso-projeto.

Para o cálculo amostral foi utilizado a totalidade de discentes registrados no programa de extensão no ano de 2017 (420 discentes). O cálculo do tamanho da amostra considerou a prevalência de desfecho de 50%, intervalo de confiança de 95%, erro amostral de 5%, chegando-se a uma amostra mínima de 201 sujeitos. A amostra foi selecionada por conveniência, incluindo participantes de todos os polos do programa de extensão até alcançar ao menos o mínimo da amostra estimada. Como critério de inclusão, considerou-se a participação no programa de extensão. Como critérios de exclusão, adotou-se a incapacidade do participante em responder as questões relacionadas ao uso de medicamentos ou a interrupção da entrevista antes da sua finalização. Foram considerados não idosos aqueles participantes com idade entre 45 e 59 anos, e idosos, aqueles com 60 anos ou mais.

A coleta de dados foi realizada no período de abril a dezembro de 2017, nos polos onde ocorriam as aulas do programa de extensão em Brasília (nas Regiões Administrativas de Ceilândia, Taguatinga, Candangolândia, Riacho Fundo I, Estrutural e Plano Piloto). As entrevistas foram conduzidas por grupos de entrevistadores calibrados, que passaram por treinamento por meio de um manual do colaborador e reuniões periódicas para dirimir quaisquer dúvidas durante o procedimento. Todos os roteiros de entrevistas respondidos foram conferidos e posteriormente houve o lançamento em banco de dados. No caso da identificação de alguma inconsistência ou dado incompleto o entrevistado era contatado por telefone.

O roteiro de entrevista desenvolvido permitiu a coleta de diferentes variáveis. Dentre as sociodemográficas obteve-se: sexo, idade, local de procedência, raça/cor (autodeclarada pelos entrevistados), estado civil, escolaridade, profissão, e renda familiar. Já entre as variáveis relacionadas à saúde foram: problemas de saúde relatados, possuir plano de saúde e se algum familiar do participante era profissional da área da saúde. Também foram consideradas as variáveis relacionadas aos medicamentos: uso contínuo, adoção da automedicação, adesão ao tratamento e acesso aos medicamentos (forma de aquisição de medicamentos de uso contínuo).

Para a análise de racionalidade da automedicação, neste caso compreendida como adequação, foram adotados os seguintes critérios: o medicamento utilizado na prática deveria ser isento de prescrição médica (MIP); o problema de saúde ser autolimitado (agudo); e o tempo de persistência dos sintomas menor do que 15 dias. Neste caso, foi considerada racional a prática que atendeu a todos os critérios citados anteriormente.

Quanto ao resultado da automedicação, solicitou-se aos entrevistados que relatassem se o problema de saúde havia sido resolvido após a adoção desta prática. Foi considerado resolvido quando o entrevistado assim o percebeu e relacionou a melhora ao tratamento adotado por automedicação.

Não foram considerados no trabalho os medicamentos caseiros, chás, fitoterápicos e homeopáticos para a análise da automedicação. Durante as entrevistas explicou-se aos participantes o significado de automedicação e suas variações, desde ir a um estabelecimento de saúde e comprar um medicamento sem prescrição médica, como também tomar algum medicamento por recomendação de amigos ou familiares, além de utilizar sobras de tratamentos anteriores. Todos os entrevistados foram esclarecidos sobre tal conceito antes de responder as questões relacionadas a essa prática. Para a análise da automedicação foi utilizado como período recordatório os sete dias anteriores à entrevista como forma de minimizar o viés de memória.

Para análise dos medicamentos de uso contínuo foi definido que os mesmos são aqueles que os participantes utilizavam todos os dias, ou quase todos os dias, sem data de previsão para término do tratamento. No caso de esquecimento dos medicamentos utilizados, sejam eles de uso contínuo ou por automedicação, os participantes eram informados sobre o contato telefônico que seria realizado posteriormente para coleta dessa informação.

Para a obtenção dos dados referentes à adesão ao tratamento foram utilizados dois questionários previamente validados em outros estudos: a Escala de Adesão de Morisky-Green-Levine (MGL), de 19861212 Morisky DE, Green LW, Levine DM. Concurrent and predictive validity of a self-reported measure of medication adherence. Med Care. 1986;24(1):67-74., e o Brief Medication Questionnaire (BMQ) domínio regime1313 Ben AJ, Neumann CR, Mengue SS. Teste de Morisky-Green e Brief Medication Questionnaire para avaliar adesão a medicamentos. Rev Saúde Pública. 2012;46(2):279-89..

A Escala MGL utilizada foi traduzida daquela publicada em 1986, cuja recomendação foi realizada pelo prof. Dr. Donald Morisky. Ela é caracterizada pela simplicidade de aplicação (por ser constituída de apenas quatro perguntas)1010 Remondi FA, Cabrera MAS, Souza RKT. Não adesão ao tratamento medicamentoso contínuo: prevalência e determinantes em adultos de 40 anos e mais. Cad Saúde Pública. 2014;30(1):126-36.. A escala indica que o uso inadequado de medicamentos ocorre por um ou todos os motivos seguintes: descuido, esquecimento e interrupção do tratamento quando se sente melhor ou pior. No trabalho foi considerado pontuações para as respostas, sendo SIM = 1 ponto e NÃO = 0 ponto. Se as respostas para as quatro perguntas forem NÃO, a pontuação será 0 e assim o participante será considerado “aderente ao tratamento medicamentos”. Foram considerados “não aderente ao tratamento” aqueles participantes que tiveram pontuação entre 1 e 41212 Morisky DE, Green LW, Levine DM. Concurrent and predictive validity of a self-reported measure of medication adherence. Med Care. 1986;24(1):67-74..

O BMQ é constituído por três domínios: Regime, Crença e Recordação. Para o presente trabalho foi adotado o domínio Regime como instrumento de avaliação da adesão, pois é o domínio que avalia o comportamento dos participantes em relação ao tratamento1313 Ben AJ, Neumann CR, Mengue SS. Teste de Morisky-Green e Brief Medication Questionnaire para avaliar adesão a medicamentos. Rev Saúde Pública. 2012;46(2):279-89.,1414 Segundo AFSM. Avaliação do grau de aderência medicamentosa em pacientes com epilepsia [Dissertação]. Pernambuco: Universidade de Pernambuco, Centro de Ciências da Saúde, Universidade Federal de Pernambuco; 2015..

Previamente à coleta de dados, o instrumento utilizado na pesquisa foi testado em um estudo piloto com 50 participantes para se verificar a adequação das perguntas e para fazer o treinamento dos entrevistadores. Foram necessários apenas pequenos ajustes na ordem das questões e na forma de abordagem, o que não inviabilizou a inclusão dos dados do piloto no estudo.

O banco de dados foi construído no programa EpiData 3.0 e posteriormente analisado no programa SPSS 23.0 e EpiInfo 7.0. Foram realizadas análises descritivas dos dados, e as prevalências relacionadas ao perfil dos participantes foram estimadas com um intervalo de confiança (IC) de 95%. Também foi realizada análise bivariada utilizando-se teste qui-quadrado para avaliar a associação entre variáveis categóricas e foram apresentadas razões de prevalência. Quando necessário foi utilizado o teste exato de Fisher. Foi considerado um nível de significância de 5% (p<0,05).

Este estudo foi aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa da Faculdade de Ceilândia (FCE/UnB), com parecer número 1.985.490 atendendo as exigências para pesquisas envolvendo seres humanos da Resolução nº 466/2012, do Conselho Nacional de Saúde, e da Declaração de Helsinki. Os participantes da pesquisa assinaram o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido (TCLE).

RESULTADOS

Dos 420 participantes do projeto, 215 foram incluídos neste estudo e não houve exclusões. Observou-se que os mesmos eram majoritariamente do sexo feminino (189; 87,9%), com média de idade de 61,3 anos (+8,6); não brancos (139; 65,6%), com menor escolaridade (<12 anos de estudos) (150; 69,9%) e possuíam renda familiar acima de três salários mínimos (121; 56,3%). A maior parte dos entrevistados era aposentada (121; 56,3%). Da amostra total, 88 (40,9%) eram não idosos, com média de idade de 53,6 anos (+4,95) e 127 (59,1%) eram idosos, com média de idade de 66,7 anos (+6,23). A Tabela 1 apresenta os dados relacionados às variáveis sociodemográficas dos participantes da UniSer.

Tabela 1
Perfil sociodemográfico dos participantes da UniSer. Brasília, DF, 2017.

Foi relatado por 154 (71,6%, IC:65,3%-77,2%) entrevistados a utilização de medicamentos de uso contínuo, sendo que destes 83 (53,9%, IC:46,0%-61,6%) adquirem seus medicamentos com recursos próprios, 52 (33,8%, IC:26,8%-41,5%) em Unidades de Saúde do sistema público do DF e 19 (12,3%, IC:8,0%-18,5%) em Farmácia Popular.

Em relação à automedicação, a prevalência no grupo entrevistado foi de 188 alunos (87,4%, IC:82,3%-91,2%) para aqueles que realizaram a prática alguma vez na vida. Dentre esses, 42 (22,3%, IC:17,0%-28,8%) realizaram automedicação nos sete dias anteriores à entrevista. As variáveis analisadas na comparação entre idosos e não idosos da UniSer para automedicação estão apresentados na Tabela 2.

Tabela 2
Análise da prática de automedicação entre idosos e não idosos participantes da UniSer. Brasília, DF, 2017.

Não foram observadas diferenças significativas entre as idades, verificando-se uma tendência de aumento no uso de medicamentos de uso contínuo e relatos de problemas de saúde entre os idosos, como pode ser observado na Tabela 3.

Tabela 3
Comparação do relato de problemas de saúde e de uso contínuo de medicamentos entre idosos e não idosos participantes da UniSer. Brasília, DF, 2017.

Em relação à adesão, não houve diferença significativa entre os grupos etários. Ou seja, ambos são poucos aderentes aos tratamentos com medicamentos de uso contínuo. Segundo a Escala MGL, 67 idosos (n=85; 78,8%) e 35 não idosos (n=46; 76,1%) foram considerados não aderentes ao tratamento. Pelo BMQ domínio regime, 33 idosos (n=90, 36,7%) e 23 não idosos (n=56; 41,1%) também foram considerados não aderentes ao tratamento (Tabela 3).

DISCUSSÃO

É cada vez mais comum começar os estudos (e o seu retorno) na fase adulta, e são escassas as informações a respeito da saúde nesse público. A Universidade do Envelhecer (UniSer), apesar de não ser de fato uma Universidade e sim um curso de extensão (com carga horária de 720 horas), possui objetivo diferente de outros projetos no país, como é o caso das Universidades Abertas à Terceira Idade (UnATI), pois busca a formação na fase adulta, em especial entre os idosos. Neste contexto, a realização do presente estudo torna-se relevante para conhecer o comportamento relacionado ao uso de medicamentos desse público.

Ao identificar que os frequentadores da UniSer são majoritariamente do sexo feminino, não brancos (englobando pardos, negros, amarelos, indígenas, entre outros), com baixa escolaridade e aposentados, nossos dados são condizentes com alguns estudos nacionais1515 Abi-Ackel MM, Lima-Costa MF, Castro-Costa E, Filho AIL. Uso de psicofármacos entre idosos residentes em comunidade: prevalência e fatores associados. Rev Bras Epidemiol. 2017;20(1):57-69.

16 Sales AS, Sales MGS, Casotti CA. Perfil farmacoterapêutico e fatores associados à polifarmácia entre idosos de Aiquara, Bahia, em 2014. Epidemiol Serv Saúde. 2017;26(1):121-32.

17 Neves SJF, Marques APO, Leal MCC, Diniz AS, Medeiros TS, Arruda IKG. Epidemiologia do uso de medicamentos entre idosos em área urbana do Nordeste do Brasil. Rev Saúde Pública. 2013;47(4):759-68.

18 Barroso R, Telles Filho PCP, Pinheiro MLP, Bodevan EC, Pereira Júnior AC, Cambraia RP. Automedicação em idosos de estratégias de Saúde da Família. Rev Enferm UFPE [Internet]. 2017;11(Supl 2):890-7.
-1919 Ely LS, Engroff P, Guiselli SR, Cardoso GC, Morrone FB, De Carli GA. Uso de anti-inflamatórios e analgésicos por uma população de idosos atendida na estratégia Saúde da Família. Rev Bras Geriatr Gerontol. 2015;18(3):475-85..

No Brasil, 38,3% dos idosos possuem renda familiar entre meio e um salário mínimo2020 Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística. Síntese de indicadores sociais: uma análise das condições de vida da população brasileira. Rio de Janeiro: IBGE; 2016., e o resultado deste trabalho mostrou-se diferente. Uma das possíveis explicações seria que o Distrito Federal apresenta o maior Índice de Desenvolvimento Humano (IDH) entre todas as Unidades da Federação, e a maior diferença entre o IDH do DF e o de outros Estados está no componente Renda2121 Brasília. Secretária de Estado de Saúde do Distrito Federal. Plano distrital de saúde 2016-2019. Brasília, DF: SESDF; 2016..

Além disso, mais da metade dos participantes não possuem companheiro, assim como apontam outros estudos1717 Neves SJF, Marques APO, Leal MCC, Diniz AS, Medeiros TS, Arruda IKG. Epidemiologia do uso de medicamentos entre idosos em área urbana do Nordeste do Brasil. Rev Saúde Pública. 2013;47(4):759-68.,1919 Ely LS, Engroff P, Guiselli SR, Cardoso GC, Morrone FB, De Carli GA. Uso de anti-inflamatórios e analgésicos por uma população de idosos atendida na estratégia Saúde da Família. Rev Bras Geriatr Gerontol. 2015;18(3):475-85.. Ter um companheiro se torna importante no cuidado da saúde, sendo que muitas vezes esse cuidador é o próprio cônjuge e seu envolvimento poderá contribuir, principalmente, por meio do auxílio na administração de medicamentos e também no acompanhamento aos serviços de saúde11 Almeida NA, Reiners AAO, Azevedo RCS, Silva AMC, Cardoso JDC, Souza LC. Prevalência e fatores associados à polifarmácia entre os idosos residentes na comunidade. Rev Bras Geriatr Gerontol. 2017;20(1):143-53.,2222 Santos-Orlandi AA, Brito TRP, Ottaviani AC, Zazzetta MS, Gratão ACM, et al. Perfil de idosos que cuidam de outros idosos em contexto de alta vulnerabilidade social. Esc Anna Nery. 2017;21(1):1-8..

Em relação à aquisição de medicamentos de uso contínuo, observou-se que a maior parte dos entrevistados adquirem os mesmos com recursos próprios. Isto pode ser reflexo da qualidade da atenção primária do DF, uma das mais problemáticas do país considerando apenas as capitais2323 Sousa MF, Hamann EM. Programa Saúde da Família no Brasil: uma agenda incompleta? Ciênc Saúde Coletiva. 2009;14(Supl 1):1325-35., bem como pela necessidade de prescrições médicas atualizadas tanto para aquisição nas unidades públicas, quanto no programa Farmácia Popular. Além disso, cabe salientar que nestes dois últimos locais de acesso o elenco de medicamentos é restrito.

Não foram encontradas diferenças significativas entre o grupo de idosos e não idosos participantes do programa para as variáveis utilizadas na comparação da prática de automedicação, isto é, ambos estão utilizando medicamentos de forma inadequada, o que é um risco para a saúde dos adultos e, principalmente, dos idosos da UniSer. A baixa escolaridade pode ser um dos fatores encontrados que interfere no autocuidado. Idosos mais escolarizados tendem a compreender melhor as informações passadas pelos profissionais da saúde, além da importância relacionada ao uso racional de medicamentos2424 Neves RG, Duro SMS, Flores TR, Nunes BP, Costa CS, Wendt A, et al. Atenção oferecida aos idosos portadores de hipertensão: Pesquisa Nacional de Saúde, 2013. Cad Saúde Pública. 2017;33(7):1-11., mesmo que isto não tenha sido observado no presente estudo.

Dentre os participantes da UniSer, 76,4% dos idosos utilizam medicamentos de uso contínuo. Segundo a Pesquisa Nacional sobre Acesso, Utilização e Promoção do Uso Racional de Medicamentos (PNAUM), esse valor chega a 95,0% na população idosa2525 Ramos LR, Tavares NUL, Bertoldi AD, Farias MR, Oliveira MA, Luiza VL, et al. Polifarmácia e polimorbidades em idosos no Brasil: um desafio em saúde pública. Rev Saúde Pública. 2016;50(Supl 2):1-13.. Outros estudos de caráter local demonstram que esses valores podem variar entre 75,7% até 85,5%1717 Neves SJF, Marques APO, Leal MCC, Diniz AS, Medeiros TS, Arruda IKG. Epidemiologia do uso de medicamentos entre idosos em área urbana do Nordeste do Brasil. Rev Saúde Pública. 2013;47(4):759-68.,2626 Luz EP, Dallepiane LB, Kirchner RM, Silva LAA, Silva FP, Kohler J, et al. Perfil sociodemográfico e hábitos de vida da população idosa de um município da região norte do Rio Grande do Sul, Brasil. Rev Bras Geriatr Gerontol. 2014;17(2):303-14., sendo compatíveis com o resultado obtido pela pesquisa. A vulnerabilidade dos idosos a efeitos adversos é muito alta, principalmente devido à necessidade de utilização de mais de um medicamento para tratamento de seus problemas de saúde, além de alterações farmacocinéticas e farmacodinâmicas que ocorrem com o próprio envelhecimento2626 Luz EP, Dallepiane LB, Kirchner RM, Silva LAA, Silva FP, Kohler J, et al. Perfil sociodemográfico e hábitos de vida da população idosa de um município da região norte do Rio Grande do Sul, Brasil. Rev Bras Geriatr Gerontol. 2014;17(2):303-14.. No caso da UniSer, estima-se que idosos mais saudáveis busquem o programa, o que explicaria a diferenças entre as prevalências de uso de medicamentos. Discussões sobre educação em saúde mostram-se necessárias, principalmente em relação à automedicação, ajudando assim a prevenir ou minimizar os efeitos adversos que o uso inadequado de medicamentos pode causar na população idosa e também o mascaramento de doenças2626 Luz EP, Dallepiane LB, Kirchner RM, Silva LAA, Silva FP, Kohler J, et al. Perfil sociodemográfico e hábitos de vida da população idosa de um município da região norte do Rio Grande do Sul, Brasil. Rev Bras Geriatr Gerontol. 2014;17(2):303-14..

A prevalência de automedicação realizada alguma vez na vida para os participantes da UniSer foi de 87,4%, e quando analisado a prática apenas nos últimos sete dias reduziu para 22,3%. Na literatura são encontrados valores de 14,9% a 35,0%66 Domingues PHF, Galvão TF, Andrade KRC, Silva MT, Pereira MG. Prevalência e fatores associados à automedicação em adultos no Distrito Federal: estudo transversal de base populacional. Epidemiol Serv Saúde 2017;26(2):319-30.,77 Arrais PSD, Fernandes MEP, Dal Pizzol TS, Ramos LR, Mengue SS, Luiza VL, et al. Prevalência da automedicação no Brasil e fatores associados. Rev Saúde Pública. 2016;50(supl 2):1-11.,2727 Domingues PHF, Galvão TF, Andrade KRC, Sá PTT, Silva MT, Pereira MG. Prevalência da automedicação na população adulta do Brasil: revisão sistemática. Rev Saúde Pública. 2015;49:1-9.. A prevalência obtida no presente trabalho encontra-se entre aquelas obtidas em outros estudos brasileiros. Contudo, destaca-se que há algumas diferenças metodológicas como, por exemplo, o período recordatório de sete dias enquanto alguns estudos utilizam 15 dias, como também as características da população investigada (idade e renda). Também cabe salientar que a automedicação pode aumentar com uma maior escolaridade e melhor nível socioeconômico77 Arrais PSD, Fernandes MEP, Dal Pizzol TS, Ramos LR, Mengue SS, Luiza VL, et al. Prevalência da automedicação no Brasil e fatores associados. Rev Saúde Pública. 2016;50(supl 2):1-11.,2828 Schmid B, Bernal R, Silva NN. Automedicação em adultos de baixa renda no município de São Paulo. Rev Saúde Pública. 2010;44(6):1039-45.. Quanto mais o indivíduo adquire conhecimento ao longo da vida e melhora sua situação financeira, mais acesso e confiança para se automedicar ele tem. Entretanto, é importante que este processo ocorra baseado nos critérios do uso racional de medicamentos, não devendo ser adotada, por exemplo, para problemas crônicos ou com medicamentos de venda sob prescrição médica66 Domingues PHF, Galvão TF, Andrade KRC, Silva MT, Pereira MG. Prevalência e fatores associados à automedicação em adultos no Distrito Federal: estudo transversal de base populacional. Epidemiol Serv Saúde 2017;26(2):319-30.,2525 Ramos LR, Tavares NUL, Bertoldi AD, Farias MR, Oliveira MA, Luiza VL, et al. Polifarmácia e polimorbidades em idosos no Brasil: um desafio em saúde pública. Rev Saúde Pública. 2016;50(Supl 2):1-13..

Quando considerada apenas a população idosa, foi encontrada uma prevalência de 22,9% para a automedicação nos últimos sete dias, o que se mostra dentro dos valores apresentados em estudos específicos para idosos, com resultados que podem variar de 8,9% até 70,8%1616 Sales AS, Sales MGS, Casotti CA. Perfil farmacoterapêutico e fatores associados à polifarmácia entre idosos de Aiquara, Bahia, em 2014. Epidemiol Serv Saúde. 2017;26(1):121-32.,2929 Araújo PL, Galato D. Risco de fragilização e uso de medicamentos em idosos residentes em uma localidade do sul de Santa Catarina. Rev Bras Geriatr Gerontol. 2012;15(1):119-26.. Esta variação pode ser explicada também pelas características da população investigada, do conceito de automedicação adotado e do período recordatório.

Em relação à racionalidade da prática de automedicação, 45,8% dos idosos que a realizaram nos últimos sete dias não atenderam aos critérios definidos como racionais pelo estudo, mesmo que 94,5% a considerem perigosa para a sua saúde. A automedicação quando praticada de forma racional pode evitar danos à saúde, bem como gastos desnecessários com doenças autolimitadas. Entretanto, é importante estar atento às desvantagens que possam surgir da automedicação, em especial na população idosa, desde o mascaramento de doenças graves como o surgimento de reações adversas (consequentemente aumentando os gastos com saúde). Além disso, existe o risco de interações medicamentosas e intoxicações44 Fernandes WS, Cembranelli JC. Automedicação e o uso racional de medicamentos: o papel do profissional farmacêutico no combate a essas práticas. Rev Univap. 2015;21(37):5-12.,66 Domingues PHF, Galvão TF, Andrade KRC, Silva MT, Pereira MG. Prevalência e fatores associados à automedicação em adultos no Distrito Federal: estudo transversal de base populacional. Epidemiol Serv Saúde 2017;26(2):319-30.. Sendo assim, a automedicação deve ser realizada de forma racional, sobretudo na população idosa, e precisa ser auxiliada por profissionais da saúde capacitados, pois o risco da prática também está relacionado ao grau de instrução e informação dos usuários sobre medicamentos3030 Prado MAMB, Francisco PMSB, Bastos TF, Barros MBA. Uso de medicamentos prescritos e automedicação em homens. Rev Bras Epidemiol. 2016;19(3):594-608..

No presente estudo, a prevalência de idosos não aderentes ao tratamento com medicamentos de uso contínuo foi alta. Quando utilizado a escala MGL, 78,8% dos entrevistados foram considerados não aderentes, compatível com outros resultados encontrados em estudos anteriores1414 Segundo AFSM. Avaliação do grau de aderência medicamentosa em pacientes com epilepsia [Dissertação]. Pernambuco: Universidade de Pernambuco, Centro de Ciências da Saúde, Universidade Federal de Pernambuco; 2015.,3131 Girotto E, Andrade SM, Cabrera MAS, Matsuo T. Adesão ao tratamento farmacológico e não farmacológico e fatores associados na atenção primária da hipertensão arterial. Ciênc Saúde Coletiva. 2013;18(6):1763-72.,3232 Marchi KC, Chagas MHN, Tumas V, Miasso AI, Crippa JAS, Tirapello CR. Adesão à medicação em pacientes com doença de Parkinson atendidos em ambulatório especializado. Ciênc Saúde Coletiva. 2013;18(3):855-62.. Segundo a Organização Mundial de Saúde (OMS), em países desenvolvidos a adesão ao tratamento com medicamentos de uso contínuo é geralmente por volta de 50,0%. Já em países em desenvolvimento esse valor pode ser muito menor3333 World Health Organization. Adherence to long-term therapies: evidence for action. Geneva: WHO; 2003..

A adesão também foi avaliada por meio do BMQ domínio regime, onde 36,7% dos idosos não foram aderentes ao tratamento. O resultado obtido foi diferente daquele mostrado pela escala MGL. Alguns fatores podem explicar essa variação de taxas de não adesão, como por exemplo, diferenças culturais, estado de saúde, origem da população estudada1010 Remondi FA, Cabrera MAS, Souza RKT. Não adesão ao tratamento medicamentoso contínuo: prevalência e determinantes em adultos de 40 anos e mais. Cad Saúde Pública. 2014;30(1):126-36. e, em especial, o fato de que os instrumentos de coleta de dados possuem diferenças em suas perguntas e contextos como, por exemplo, o tempo de avaliação em relação ao uso de medicamentos. A escala MGL considera um tempo mais longo; já o BMQ considera os dados da última semana, o que restringe o período de tempo investigado, o que poderia minimizar o viés de memória. Além disso, foi utilizada no estudo uma versão do BMQ simplificada no quesito dosagem. Uma pesquisa realizada em Porto Alegre, Rio Grande do Sul, mostrou em seu estudo piloto que os participantes da pesquisa não conseguiam relatar as concentrações dos medicamentos utilizados, sugerindo assim a simplificação do BMQ domínio Regime1313 Ben AJ, Neumann CR, Mengue SS. Teste de Morisky-Green e Brief Medication Questionnaire para avaliar adesão a medicamentos. Rev Saúde Pública. 2012;46(2):279-89.. A falha neste quesito já seria considerada não aderência ao tratamento. Este detalhe pode ter contribuído para a diferença nos resultados entre os instrumentos.

Por outro lado, a utilização de dois questionários permitiu a identificação de diferentes comportamentos relacionados com a não adesão ao tratamento, possibilitando uma melhor compreensão do fenômeno investigado, e desta forma será possível o desenvolvimento de ações de educação em saúde junto a esta população, no sentido de melhorar a utilização de medicamentos de uso contínuo.

Como consequência da não adesão ao tratamento medicamentoso podemos citar a falta de controle das enfermidades, risco aumentado de hospitalizações e aumento na mortalidade88 Tavares NIL, Bertoldi AD, Mengue SS, Arrais PSD, Luiza VL, Oliveira MA, et al. Fatores associados à baixa adesão ao tratamento farmacológico de doenças crônicas no Brasil. Rev Saúde Pública. 2016;50(Supl 2):1-10.,1010 Remondi FA, Cabrera MAS, Souza RKT. Não adesão ao tratamento medicamentoso contínuo: prevalência e determinantes em adultos de 40 anos e mais. Cad Saúde Pública. 2014;30(1):126-36.,1414 Segundo AFSM. Avaliação do grau de aderência medicamentosa em pacientes com epilepsia [Dissertação]. Pernambuco: Universidade de Pernambuco, Centro de Ciências da Saúde, Universidade Federal de Pernambuco; 2015.,3131 Girotto E, Andrade SM, Cabrera MAS, Matsuo T. Adesão ao tratamento farmacológico e não farmacológico e fatores associados na atenção primária da hipertensão arterial. Ciênc Saúde Coletiva. 2013;18(6):1763-72.,3434 Lutz BH, Miranda VIA, Bertoldi AD. Inadequação do uso de medicamentos entre idosos em Pelotas, RS. Rev Saúde Pública. 2017;51:1-12.. Ou seja, essa prática acarreta consequências clínicas, sociais e econômicas, e ainda recebe pouca atenção. Sendo assim, sua avaliação é essencial para que diminua a progressão das doenças e evite o surgimento de efeitos colaterais. Neste contexto, independentemente do questionário aplicado não foi encontrada diferença significativa entre o grupo de idosos e não idosos.

Cabe destacar que a educação em saúde, incluindo tópicos que envolvam o uso de medicamentos e o autocuidado, deveria ser inclusa na formação de adultos, bem como de todas as profissões da saúde independente da sua relação com esta tecnologia.

Quanto à limitação deste estudo cita-se o fato de que a maioria das informações obtidas foram autorreferidas, e assim há possibilidade de viés de memória dos participantes por se tratar de avaliação recordatória. Contudo, cabe destacar que os instrumentos adotados para avaliação da adesão são reconhecidos pela sua validade, bem como, a forma e recordatório adotados para a determinação da automedicação, assim como seu contexto (conceito adotado) estão coerentes com outros trabalhos descritos na literatura para esta faixa etária.

CONCLUSÃO

Não foram identificadas diferenças significativas entre o uso de medicamentos por automedicação ou de forma contínua entre o grupo de idosos e não idosos participantes do programa Universidade do Envelhecer. Da mesma forma, quando avaliada a racionalidade da automedicação ou a adesão ao tratamento não foram encontradas diferenças entre os grupos. Neste contexto, a prática da automedicação realizada nos últimos sete dias foi considerada irracional. Esse dado é importante, considerando-se que mais da metade dos participantes da Universidade do Envelhecer são idosos, e mais suscetíveis aos efeitos negativos que a automedicação pode provocar.

Os dados relacionados à adesão não foram adequados, mesmo utilizando dois questionários diferentes para avaliação. Ambos os grupos apresentaram baixa adesão ao tratamento com medicamentos de uso contínuo, o que consequentemente traz riscos à saúde, devido principalmente à ineficácia da utilização do medicamento prescrito para as doenças relatadas.

Desta forma, os achados do estudo reforçam a necessidade de se educar tanto adultos quanto idosos para o autocuidado, seja por meio de conteúdos relacionados com a prática de automedicação como sobre o uso de medicamentos de forma contínua, com vistas a incentivar a adesão ao tratamento medicamentoso e melhorar o perfil de saúde desse público.

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    Nov-Dec 2018

Histórico

  • Recebido
    06 Jun 2018
  • Revisado
    17 Set 2018
  • Aceito
    26 Set 2018
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