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O problema do cociente partidário na teoria e na prática brasileiras do mandato representativo

The party quota problem in Brazilian theory and practice concerning the representative mandate

La question du quotient des partis dans la théorie et la pratique brésiliennes du mandat représentatif

Resumos

The electoral system affects in advance and decisively the nature of representative mandates and the legitimacy of legislative decisions. Majoritarian systems decrease the density of the representative mandate and, when districts are numerically small in terms of both representatives and constituency, such systems tend to curtail the independence of elected officeholders, whose actions can be monitored by the dominant local groups. On the other hand, proportional systems that operate with numerically large districts maximize the density of representative mandates and, at the same time, ensure the elected officeholder the independent responsibility that characterizes the modern representative mandate. There are, however, three varieties of proportional systems (flexible list, open list, and no list) where the vote cast for candidates from different parties or inter-party electoral coalitions eliminate the party quota and jeopardize party identity both inside and outside the legislative realm. In the Brazilian case, this mechanism follows and reinforces the individualistic and atomistic tradition of the political elites

territorial constituency; voluntary constituency; representative mandate; party quota


Le système électoral influe au préalable et de façon décisive sur la nature du mandat représentatif et la légitimité des décisions législatives. Les systèmes majoritaires diminuent la densité du mandat représentatif et, à l’oeuvre dans des districts peu importants en nombre de représentants et d’électeurs, amènent une réduction de l’indépendance des élus, permettant qu’ils se trouvent sous la coupe de groupes dominants locaux. Les systèmes proportionnels appliqués dans des districts plus importants, par leur nombre de représentants et d’électeurs, élèvent beaucoup la densité du mandat représentatif tout en assurant au représentant une responsabilité indépendante, marque du mandat représentatif moderne. Il y a cependant trois sortes de systèmes proportionnels avec liste des partis souple, ouverte ou sans liste, dans lesquels les voix données à des candidats de partis différents ou la coalition électorale entre partis font disparaître le quotient des partis et portent atteinte à leur identité sur la scène législative et en dehors d’elle: dans le cas brésilien, ce mécanisme obéit à la tradition individualiste et atomiste des élites politiques, tout en la renforçant.

circonscription territoriale; circonscription volontaire; mandat représentatif; quotient du parti


territorial constituency; voluntary constituency; representative mandate; party quota

circonscription territoriale; circonscription volontaire; mandat représentatif; quotient du parti

O problema do cociente partidário na teoria e na prática brasileiras do mandato representativo* * Este estudo, versão final da lecture realizada em setembro de 1998 no Helen Kellogg Institute for International Studies, University of Notre Dame, beneficiou-se particularmente dos comentários generosos e estimulantes de Carlos H. Waisman, Guillermo O’Donnell e Scott Mainwaring à primeira versão. Entretanto, nenhum destes estudiosos tem qualquer responsabilidade sobre as concepções que assumo em questões abertas à controvérsia. Durante nossa estada na University of Notre Dame, minha esposa e eu tivemos o privilégio de contar com bons amigos, cuja cálida acolhida agradecemos: Albert H. Le May, Carlos H. Waisman, Christopher Welna e esposa, Denis e Ana Maria Goulet, Gabor Toka, Gabriela Mossi, Guillermo O’Donnell, Julian Casanova, Mark P. Jones, Michael Coopedge, Roberto e Celeste DaMatta e Scott Mainwaring. Guardamos, de Notre Dame, a recordação vívida do espírito vigoroso, da bondade humana e do carisma de Timothy Scully. O texto ora publicado ganhou muito em inteligibilidade, precisão e elegância, graças à competência e à bondade de Tema Pechman, revisora de DADOS. Qualquer dureza ou imperfeição remanescente deve-se à teimosia do autor.

José Antônio Giusti Tavares

Para Olavo Brasil de Lima Junior, mestre e amigo insubstituível, ao qual tanto deve o estudo das instituições eleitorais e representativas brasileiras, o testemunho da profunda saudade e do vazio irreparável que deixa o seu desaparecimento em mais de uma geração de cientistas polític

os.

INTRODUÇÃO

Preocupados em reter o consenso básico a respeito da democracia representativa e constitucional, os cientistas políticos têm encarado as controvérsias acerca do sistema de governo e dos sistemas eleitoral e partidário como questões de método, supondo certa indiferença entre o modo pelo qual operam as instituições políticas e o desempenho da democracia sobre elas edificada.

Há mesmo certo consenso quanto à idéia de que, empregada coerente e consistentemente, qualquer das três grandes regras de decisão eleitoral consagradas pela experiência do Ocidente ¾ a pluralidade uninominal anglo-saxônica, a maioria e pluralidade em dois turnos da tradição européia continental e a representação proporcional ¾ assegura a efetividade, a validade e a legitimidade dos resultados de eleições legislativas.

Entretanto, essa perspectiva, da qual tenho compartilhado, é apenas parcialmente correta: o que significa que é pelo menos parcialmente equivocada, pois nas democracias efetivamente representativas e constitucionais cabe aos métodos eleitorais não só assegurar a idoneidade dos resultados do escrutínio mas prover a legitimidade do mandato representativo e das decisões do corpo de representantes.

Os diferentes sistemas eleitorais são concebidos não apenas segundo propósitos estratégicos mas como artefatos institucionais capazes de realizar uma concepção particular, embora nem sempre teoricamente explicitada, acerca da natureza, das funções e das finalidades da representação política e do mandato representativo: o que supõe, por sua vez, uma concepção acerca da ordem pública e da própria natureza humana.

Como enfatizou Hanna Pitkin (1967, cap. 7), o que se predica e espera da representação política depende de uma concepção metapolítica, isto é, de uma concepção a respeito não só da sociedade e da política mas da natureza dos indivíduos e dos grupos.

Nos sistemas proporcionais edificados sobre distritos de magnitude elevada quanto ao número de representantes que elegem, ao volume do eleitorado e à extensão territorial, os cocientes eleitoral e partidário convertem-se em colégios eleitorais voluntários e unânimes, impessoais e anônimos, que elevam ao máximo a densidade do mandato representativo e asseguram ao representante a responsabilidade independente que caracteriza a representação política moderna.

Ao contrário, os sistemas majoritários, especialmente aqueles que adotam a fórmula anglo-saxônica da pluralidade uninominal, diminuem consideravelmente a densidade do mandato representativo e, neles, distritos pequenos quanto ao número de representantes, ao eleitorado e ao território, tendem a reduzir a independência dos eleitos, vinculando-os a grupos dominantes locais por diretrizes de um verdadeiro mandato imperativo.

Assim, avaliados os sistemas eleitorais do ponto de vista de sua capacidade de prover por antecipação, na democracia constitucional, a efetividade e a legitimidade do mandato representativo e das decisões legislativas, não há como não reconhecer a superioridade, em princípio, da representação proporcional sobre a regra anglo-saxônica da pluralidade uninominal e sobre a regra da maioria e pluralidade em dois turnos.

A primeira parte deste artigo demonstra que só a lógica articulada dos cocientes eleitoral e partidário é capaz de restaurar, na representação política, o requisito da unanimidade consensual predicado pela idéia reguladora do contrato constitucional originário e permanente.

Este importantíssimo aspecto das relações entre a regra eleitoral e as decisões do corpo legislativo eleito permanece inadvertido na literatura da ciência política porque, de modo geral, até agora, a teoria da representação política e a teoria contratualista da constituição da obrigação política, do Estado e da ordem pública constitucional têm sido desenvolvidas paralela mas não integradamente.

Contudo, sistemas proporcionais sem listas, com listas partidárias flexíveis ou com listas abertas, nos quais se praticam o voto em candidatos de partidos diferentes (panachage) ou coligações interpartidárias sem a previsão de um mecanismo que distribua entre os partidos, e proporcionalmente à contribuição relativa de cada um em votos, as cadeiras conquistadas pela coligação, eliminam o cociente partidário ou comprometem-lhe a identidade. A segunda parte deste artigo identifica três variedades desses sistemas com base no estudo comparativo de doze casos de representação proporcional. A terceira seção examina a inconsistência fundamental das coligações eleitorais interpartidárias com os propósitos da representação proporcional, fazendo referência especial ao caso brasileiro.

A quarta parte trata de surpreender o significado sociopolítico da estranha prática do voto uninominal em eleições proporcionais no Brasil. Congênita à instituição da representação proporcional no país, essa combinação patológica ocupa um papel importante na cultura política brasileira, dominada pela convivência entre a idealização comunalista da política pública, com a percepção dos interesses sociais particulares e dos partidos como corruptores, e o individualismo atomista e inarticulado das elites e de suas clientelas.

Finalmente, a última parte identifica muito sumariamente, na obra de Joaquim Francisco de Assis Brasil, autor do Código Eleitoral Brasileiro de 1932, o rationale do voto uninominal na representação proporcional brasileira.

Quando se sustenta a superioridade da representação proporcional e ao mesmo tempo se faz a crítica de suas distorções no Brasil, é impossível evitar duas objeções.

Argumenta-se trivialmente, com aparente realismo, que instituições políticas rigorosas, dotadas de coerência e consistência internas, não são adequadas a países com a cultura política e o nível de desenvolvimento político que possui o Brasil.

Impõe-se inverter o argumento. Regras eleitorais e sistemas de governo, consistentes ou não, são menos decisivos, do ponto de vista da estabilidade política e governamental, bem como do bom funcionamento do governo e do sistema constitucional, em países civilizados do que em países com baixo grau de consenso político e de consciência pública.

Nos países dotados de alto grau de consciência pública e de consenso acerca de valores constitucionais básicos, os efeitos do sistema eleitoral e do sistema de governo sobre o funcionamento da democracia representativa e do governo são marginais e tendem à irrelevância.

Uma sociedade civilizada pode funcionar com um sistema eleitoral e com um sistema de governo tradicionais ou mesmo arcaicos, como os Estados Unidos, ou com um sistema de governo que, atravessado pela ambigüidade institucional e pela superposição de competências entre o presidente e o chefe do Conselho de Ministros, contém a virtualidade do conflito intragovernamental, sem possuir regras ou autoridade superior para solvê-lo, como ocorre com o semipresidencialismo da Quinta República francesa que as elites políticas brasileiras querem instituir no país, dissimulando-o sob o nome de parlamentarismo.

A grave tensão entre o constitucionalismo dos Founding Fathers e a regra da pluralidade uninominal atravessou a democracia constitucional norte-americana ao longo de dois séculos sem ter-lhe aparentemente perturbado a estabilidade e a continuidade.

Entretanto, em países com baixo nível de consenso e de consciência pública, o funcionamento do sistema político depende, em quase todos os seus aspectos, e em grande medida, da nitidez, da coerência e da adequação com que se definem constitucionalmente as regras eleitorais e os mecanismos do sistema de governo.

A segunda objeção é relevante: trata-se do argumento, desenvolvido por Lijphart (1989; 1992), Linz (1994), Jones (1996), Mainwaring (1993; 1997) e Mainwaring e Shugart (1997), de que existem tensões e disnomias irreconciliáveis na combinação institucional entre presidencialismo, proporcionalismo e pluripartidarismo congressual.

O argumento, dominante na literatura norte-americana atual sobre o tema mas, provavelmente, minoritário na atual comunidade brasileira de ciência política, foi pioneiramente elaborado no Brasil, durante a década de 50, por Raul Pilla e Miguel Reale, que mostraram como aquela combinação institucional é adicionalmente complicada e perturbada no Brasil pelo federalismo e pelo regionalismo político (Melo Franco e Pilla, 1958; Pilla, 1980; Reale, 1959). Por outro lado, contrastando com os receios hoje difundidos entre as elites brasileiras, aqueles dois autores já apontavam para a excelência da combinação institucional entre parlamentarismo, proporcionalismo e pluripartidarismo parlamentar.

Tenho explorado e desenvolvido os dois argumentos há quase uma década (Tavares, 1992; 1994; 1998a). No Brasil, não há a esse respeito senão três alternativas.

A primeira, ideal, embora improvável enquanto opção política, consistiria na instituição, associada ao proporcionalismo e ao pluripartidarismo parlamentar moderado, do parlamentarismo: não do semipresidencialismo francês que, proposto por Duverger (1986; 1993) e por Sartori (1996), se encontra na agenda do conservantismo liberal brasileiro sob a denominação de parlamentarismo.

A segunda ¾ a pior das três alternativas mas, felizmente, também pouco provável quanto à sua adoção ¾ sacrificaria o proporcionalismo e o pluripartidarismo a um presidencialismo cesarista plebiscitário cuja estabilidade política seria igualmente duvidosa.

A terceira ¾ a mais provável, por força da inércia, mas certamente desapontadora ¾ reteria a continuidade da combinação difícil entre presidencialismo, proporcionalismo, pluripartidarismo congressual, federalismo e regionalismo político.

Nas alternativas que preservam a representação proporcional, é importante refletir sobre três graves distorções que a têm comprometido na tradição brasileira: o voto uninominal, as coligações eleitorais interpartidárias e a carência de cociente partidário.

O COCIENTE ELEITORAL E A LEGITIMIDADE DAS DECISÕES LEGISLATIVAS

Na prática institucional da representação proporcional, os conceitos de cociente eleitoral e cociente partidário possuem significados técnicos imediatos e intuitivos: o primeiro é simplesmente o custo em votos, em determinado colégio eleitoral, do mandato representativo; o segundo, o número de mandatos representativos que cada partido obtém dividindo-se pelo cociente eleitoral a soma dos votos atribuídos a ele e a seus candidatos naquele colégio.

Entretanto, como toda regra ou mecanismo institucional, o cociente eleitoral foi concebido para cumprir uma racionalidade teleológica que não só não é intuitiva, mas permanece, ao contrário, com muita freqüência, inadvertida, sobretudo para aqueles que se dedicam ao estudo estritamente técnico das instituições políticas.

Há um rationale que, subjacente à noção e à prática dos cocientes eleitoral e partidário, compreende uma teoria não apenas das funções e da legitimidade do processo eleitoral, mas da natureza, do significado e dos propósitos da representação política, do mandato representativo e das decisões legislativas.

Ao conceber e avaliar as regras e os mecanismos eleitorais, entre eles incluído o cociente, é necessário considerar, portanto, que deles dependem a efetividade, a validade e a legitimidade não apenas dos resultados das eleições mas do mandato representativo e, em última instância, o que é mais importante, das decisões legislativas.

Como adiante se pretende demonstrar, eleições majoritárias regulares e idôneas asseguram a legitimidade dos resultados eleitorais, mas não provêem as condições que legitimam a representação legislativa e cada um de seus atos.

Aparentemente, nos sistemas de representação proporcional, o cociente ¾ ou o seu equivalente funcional, a série de divisores ¾ é apenas a fórmula eleitoral, que converte, em cada colégio eleitoral, votos partidários em cadeiras legislativas partidárias.

Entretanto, nos sistemas proporcionais edificados sobre circunscrições de magnitude suficientemente elevada, do ponto de vista do número de representantes que elegem, do volume do eleitorado e da extensão territorial, cada cociente constitui também, na realidade, uma circunscrição eleitoral de natureza diferente daquela de base estritamente territorial: uma circunscrição ao mesmo tempo voluntária, unânime, anônima e impessoal.

Voluntária e unânime porque o representante e a representação partidária são eleitos não por uma unidade territorial habitada por um eleitorado heterogêneo e dividido, do qual a rigor representam apenas um fragmento ¾ que pode ser um terço ¾ , mas por um imenso conjunto de eleitores que, nos limites de uma circunscrição territorial extensa e densamente povoada, associam-se voluntariamente pelo apoio comum e unânime a um projeto político, a um partido e a um candidato.

Anônima e impessoal porque, em princípio, se trata de um colégio eleitoral no qual os eleitores associam-se entre si e com os seus candidatos, embora voluntária e unanimemente, não pelos laços e interesses pessoais, particularistas e adscritivos, não raro de tutela e dependência, próprios dos distritos, uninominais ou plurinominais, de magnitude populacional e territorial restrita, mas ¾ dada a elevada densidade do eleitorado e a conseqüente secundarização dos contatos sociais nos grandes distritos plurinominais ¾ anonimamente, pelos vínculos abstratos, impessoais e universalistas de uma concepção compartilhada da política e do interesse público.

O fato de que cada cociente eleitoral e partidário constitui um colégio eleitoral voluntário e unânime, provendo, ao fim e ao cabo, um corpo de representantes no qual cada representante e cada representação partidária em particular são investidos enquanto tais pela decisão voluntária de um eleitorado unânime, responde a exigências inelidíveis que a instituição da ordem pública democrática e constitucional faz acerca da representação política.

O fundamento filosófico último da existência de uma ordem pública constitucional e democrática consiste na hipótese racional de que a única alternativa capaz de instituir e assegurar o convívio coletivo pacífico, sólido e estável, é o concerto, entre a multidão heterogênea de indivíduos, de um contrato constitucional originário e permanente, por intermédio do qual cada um e todos chegam à unanimidade consensual não acerca de fins mas de regras processuais básicas, entre as quais, fundamentalmente, aquela que consiste em que cada um e todos reconheçam, por antecipação, como efetivamente suas, obrigando-se a elas, todas as decisões que por maioria tomarem os representantes que venham a eleger e autorizar.

Portanto, instituída pela autorização inerente ao contrato constitucional, é a representação política que funda imediatamente a ordem pública, a sua identidade, unidade e coesão. Hobbes (1974) e Kant (1853;1980) ressaltam a idéia de que é a unidade do representante que produz a dos representados, a unidade da representação política que produz a da comunidade política.

Em consistência com o princípio regulador da unanimidade consensual, jamais explicitado em sua obra, Victor Considérant (1846) concluiu que, a fim de que seja assegurada uma base prévia e sólida de consenso e legitimidade ao vote délibératif ¾ isto é, às decisões por intermédio das quais o corpo de representantes produz a legislação, a política pública e, no regime parlamentar, constitui e responsabiliza permanentemente o governo ¾ , o vote répresentatif ¾ isto é, a decisão mediante a qual os eleitores constituem seus representantes ¾ deve ser realizado segundo o princípio da proporcionalidade, de tal modo que nenhum voto deixe de ser considerado e que, portanto, a composição do corpo de representantes que dele resultar possa ser percebida como expressão de uma decisão unânime do corpo eleitoral.

Na verdade, só a representação proporcional repõe, no corpo de representantes, a unanimidade consensual suposta, como princípio regulador, pela idéia do contrato constitucional originário.

Quanto à decisão do corpo de representantes, isto é, ao vote délibératif, não há outra alternativa senão tomá-la por maioria ¾ segundo o preceito lockiano (Locke, 1998) ¾ e, quando estão em causa direitos individuais ou matéria de natureza constitucional, por um número maior que qualifique a decisão, tal como dois terços, ou três quintos, aproximando-a, como propõem James M. Buchanan e Gordon Tullock (1967), da quase unanimidade.

Entretanto, é importante considerar que, na democracia representativa, a regra ou o princípio da maioria nas decisões coletivas deriva a sua legitimidade, a sua validade e, em última instância, a sua exigibilidade moral, do princípio da unanimidade contratual ou constitucional; e este princípio, por sua vez, só é assegurado se, na decisão eleitoral, todos os votos escrutinados forem considerados, e não apenas os da maioria ou da pluralidade, desprezados os votos das diferentes minorias.

É verdade que no contrato constitucional hobbesiano os indivíduos obrigam-se, por unanimidade consensual, a reconhecer como efetivamente suas não apenas as decisões que o corpo constituinte ou legislativo vier a tomar por maioria, mas a decisão por meio da qual a maioria, dentre aqueles indivíduos, eleger os representantes que o integrarão. Trata-se de uma clara limitação histórica da concepção, pelo contratualismo clássico, da unanimidade consensual, que se deve ao fato de não haver, no horizonte dos séculos XVII e XVIII, outro método eleitoral senão o majoritário.

Toda decisão política deve supor um quadro mediato, sedimentado, de consenso básico subjacente, pelo menos acerca de regras, procedimentos e instituições que configurem o método, reconhecido como legítimo por todos, de tomar decisões públicas.

A eleição proporcional do corpo de representantes ¾ de modo que nele estejam presentes todos os projetos políticos minimamente relevantes, cada um na medida da magnitude relativa de sua expressão em sufrágios ¾ produz por antecipação o consenso básico que deverá subjazer às decisões majoritárias do parlamento, pois assegura que a decisão parlamentar, embora obtida pelo método majoritário, reflita, em seu conjunto, em sua complexidade e em sua forma final, a composição de forças e de tendências aninhadas na representação parlamentar, cada uma com um peso específico relativo que reproduz, no corpo de representantes, o peso relativo que ocupa no conjunto do corpo eleitoral.

Ao contrário, a eleição majoritária dos representantes exclui por antecipação o consenso básico que asseguraria, em última instância, às decisões legislativas o caráter de auto-obrigação universal de cada um e de todos os sujeitos que integram a comunidade política.

Atos específicos de governo ou do Poder Executivo ¾ cujas conseqüências, circunscritas e limitadas, se esgotam em regra hic et nunc ¾ podem ser reconhecidos como válidos, ainda que na ausência de consentimento prévio, desde que não violem a Constituição ou as leis, justificando-se em virtude da urgência das demandas a que respondem. Mas leis que obrigam universalmente e em comum a todos, para além do presente imediato, só são capazes de vincular com legitimidade se fundadas em alguma forma de consentimento de cada um e de todos os membros da comunidade política sobre os quais produzirão os seus efeitos.

Compreende-se, portanto, que não basta, para criar uma base sólida de obrigação política dos representados perante as decisões normativas do corpo de representantes, que este, eleito por sufrágio tão universal quanto possível, as tenha adotado por maioria ou mesmo por algum número mais exigente de votos.

É necessário que a composição do corpo de representantes seja o resultado de uma decisão eleitoral na qual (1) nenhum voto tenha sido desprezado e, como propunha John Stuart Mill, (2) cada representante tenha sido eleito por, e represente, um eleitorado aglutinado em uma constituency voluntária e unânime, dentre um conjunto de constituencies da mesma natureza e com número tendencialmente igual de eleitores, de modo que, (3) em princípio, nenhum eleitor seja representado por alguém que, como observou Bagehot (1949), não só não deseja ter mas deseja não ter como representante e, como conseqüência, (4) o corpo de representantes termine sendo definido pela decisão unânime e, portanto, consensual do eleitorado.

Não é difícil verificar que só o sistema proporcional assegura essas quatro condições porque somente ele substitui a circunscrição localizada de caráter territorial pela circunscrição voluntária, edificada sobre o cociente eleitoral ou sobre alguma dentre as séries de divisores ¾ que dele constituem sucedâneos matemáticos mais precisos ¾ , permitindo a aglutinação, sobre uma base territorial ampla, de eleitorados unânimes, cada um deles voluntariamente associado a um projeto político comum, a um partido, lista ou candidato, de modo que nenhum voto é desprezado e cada mandatário representa uma circunscrição unânime, materializada no cociente.

Nas circunscrições de magnitude elevada, cada cociente eleitoral e partidário constitui uma circunscrição voluntária ¾ a voluntary constituency ¾ na qual, por oposição à circunscrição territorial delimitada e de pequena magnitude, os eleitores estão associados pelo apoio comum e unânime a um único candidato e partido, os quais, eleitos por esse meio, desfrutam do máximo consenso possível.

Ao materializar uma circunscrição voluntária e unânime, o cociente repõe permanentemente, no coração do sistema representativo, a unanimidade do contrato constitucional originário, predicada pela teoria política clássica, de Hobbes a Kant.

A transformação sociológica e politicamente mais importante produzida pela representação proporcional consiste em que, nela, circunscrições territoriais extensas e com eleitorados de elevada densidade, elegendo grande número de representantes, viabilizam a substituição da base territorial localizada pela base voluntária da representação política ¾ isto é, das "territorial and compulsory constituencies" pelas "voluntary constituencies" ¾ , o que permite, como resultado da possibilidade do concerto da ação coletiva em grande escala, idealmente em escala nacional, que cidadãos que compartilhem uma concepção e um projeto particulares acerca do interesse público possam, somando seus esforços e votos, lograr o cociente eleitoral e partidário, conquistando uma representação no parlamento e, portanto, uma participação na legislação e nas decisões públicas, proporcionais à sua expressão no conjunto da opinião nacional, que jamais teriam sob as condições da competição majoritário-distrital.

Esse é o significado sociológico-político do cociente eleitoral, ou de seu equivalente funcional, a série de divisores: retendo a base territorial indispensável do voto, substitui a circunscrição de caráter territorial e restrito pela circunscrição voluntária, na qual os eleitores encontram-se unanimemente associados por um projeto público comum.

Na perspectiva do sistema de circunscrições voluntárias, sustentado por Stuart Mill,

"[...] qualquer conjunto de eleitores, [...] desde que constituam um número suficientemente grande para terem direito a um representante, de acordo com princípios de igual justiça [...], qualquer que seja o local do país em que residam, terão o poder de combinar-se para elegerem um representante. [...] nenhum eleitor seria, como se dá na atualidade, representado nominalmente por alguém que não tenha escolhido. Cada membro da Câmara dos Comuns seria o representante de um eleitorado unânime [...], o vínculo entre o eleitor e o representante adquiriria força e valor de que não temos, atualmente, qualquer experiência" (Mill, 1951:351 e 354).

Sob tais condições, o eleitor confiaria ao representante, "com a maior convicção, a faculdade de deliberar por ele" (idem:354).

Nos distritos de magnitude elevada, a unanimidade materializada no cociente eleva ao máximo a densidade do mandato representativo. Inversamente, nos distritos de pequena magnitude e, sobretudo, nos sistemas de pluralidade uninominal, a densidade do mandato representativo é problemática e só existe, a rigor, na fantasia dos distritalistas. Há um encadeamento causal perverso entre a eleição majoritária e a decisão parlamentar, necessariamente majoritária, que esvazia esta última não só de legitimidade, mas de sentido. Esse encadeamento foi anatematizado por Joaquim Francisco de Assis Brasil em seu notável sorites:

"[...] metade mais um do eleitorado fazem a unanimidade da legislatura; metade mais um desta fazem casa e deliberam (segundo os regimentos mais usados); metade mais um dos representantes presentes fazem a lei; logo, tão certo como que metade de metade de metade é igual a um oitavo, a lei, que tem de reger todo o povo, pode haver saído dos representantes de uma oitava parte dele." (Assis Brasil, 1931:116)

Do requisito da unanimidade consensual subjacente ao contrato constitucional originário e permanente ¾ quer na forma em que se encontra exposto por Hobbes (1974), Locke (1998) e Kant (1853;1980), quer na forma contemporânea de Rawls (1979), Buchanan e Tullock (1967) ¾ não decorre, entretanto, que o corpo de representantes deva reproduzir mecânica e exatamente, no seu interior, os interesses e as tendências políticas na forma bruta em que se encontram presentes entre os representados, no conjunto da sociedade.

Pois se a representação política fosse um processo pelo qual os diferentes interesses em que se decompõe a sociedade simplesmente se internalizassem e aninhassem no parlamento, de modo que este reproduzisse, no seu interior, como um microcosmo, mecânica e literalmente, em proporção ao peso específico de cada uma, as diferentes forças em conflito na sociedade, o resultado consistiria em reverter esta última ao estado de natureza e beligerância do qual precisamente se pretende fazê-la emergir ao instituir a representação política.

A excelência da representação proporcional não consiste, como freqüentemente supõe a sua idealização liberal, em que reproduz, no corpo de representantes, as forças, os interesses, as tendências e os projetos políticos na forma imediata e bruta em que se encontram na sociedade, provendo o espelho, o mapa ou a miniatura da sociedade e dos elementos em que ela se decompõe, mas, precisamente ao contrário, em que, elegendo mandatários em circunscrições de magnitude suficientemente elevada e mediante o cociente, liberta o representante das pressões imediatas dos distritos uninominais, assegurando-lhe o juízo e a responsabilidade independentes, exigidos pelo mandato representativo moderno, para definir, aqui e agora, o interesse público. Nesse caso, os cocientes eleitoral e partidário constituem, na realidade, circunscrições ao mesmo tempo voluntárias e anônimas, integradas por eleitores associados pelo apoio comum e unânime a um único candidato, no primeiro caso, e a um único partido, no segundo.

Segundo a teoria do contrato constitucional originário e permanente, edificada sobre o princípio da unanimidade consensual e, pela primeira vez, no Leviatã, associada, coerentemente, por Hobbes (1974), à teoria da representação política como autorização ¾ e não por ela substituída, como pretendem alguns comentaristas ¾ , cada indivíduo, renunciando à liberdade e ao direito ilimitados a todas as coisas e procedendo enquanto autor, sob a condição de que os demais também o façam, autoriza o ator, representante, a definir o interesse público e a decidir e agir, em todos os casos, com o propósito de sua consecução.

Ao constituir cada representante, os representados assumem por antecipação todas as conseqüências normativas que, na esfera pública, decorrem das decisões públicas do corpo de representantes, obrigando-se, cada um e todos os representados, a acolhê-las e observá-las como se eles próprios as tivessem adotado.

Desse modo, cada representado é, ao mesmo tempo, autor da representação política e por ela responsável. Mas, inversamente, pertence à lógica dessa relação que o ator ¾ isto é, o representante ¾ seja, de um lado, independente diante de seus constituintes e, de outro, que as decisões do corpo de representantes, tomadas por maioria ou por algum requisito mais constringente, possuam o poder de obrigar em comum e universalmente a todos os sujeitos que integram a comunidade política. De outro modo, se os representantes fossem mandatários ou embaixadores dos interesses privados, a representação política, atomizada e desintegrada, reproduziria a anomia, a anarquia e o caos próprios da formação social societária desestatizada e a situação reverteria ao momento pré-contratual do estado de natureza.

A representação política é o ato pelo qual o eleitorado autoriza ¾ na acepção hobbesiana ¾ o corpo de representantes a definir o interesse público, investindo-o da responsabilidade independente de fazê-lo e obrigando-se, por antecipação, a assumir como efetivamente suas todas as decisões que aquele corpo vier a tomar. Por sua vez, cada representante, em particular, e a assembléia representativa em conjunto estão obrigados apenas à Constituição, à lei e ao interesse público que lhes incumbe definir, e não à vontade dos eleitores.

Na medula da teoria da representação proporcional, integram-se com coerência duas proposições aparentemente contraditórias entre si: (1) todos os projetos políticos minimamente relevantes devem estar representados no parlamento, segundo a magnitude social relativa de cada um medida pelas preferências do eleitorado; (2) mas no interior do parlamento cada representante deve ser livre para definir, em cada caso, a sua concepção do interesse público, e a deliberação deve resultar da maioria, a menos que um requisito mais estrito e exigente tenha sido constitucionalmente prescrito em virtude da natureza da matéria.

Os representantes não podem ser responsabilizados pelos eleitores simplesmente em virtude das decisões e opiniões que assumirem ao longo da atividade parlamentar, pois são, a esse respeito, como quaisquer outros cidadãos, responsáveis apenas diante do que a lei prescreve ou proíbe. Ao contrário, ao eleger o representante, cada eleitor se compromete, por antecipação, a assumir como efetivamente suas não somente as decisões do representante que elegeu mas as decisões que, com a participação dele, vierem a tomar os representantes, por maioria, no processo legislativo.

Este não é senão um caso particular da noção kantiana da liberdade constitucional como autonomia, que consiste na sujeição voluntária, por parte de cada um e de todos os sujeitos que integram a comunidade política, às leis que cada um e todos se auto-impõem e às quais se auto-obrigam ao produzirem, pela via do contrato constitucional originário e permanente, a ordem pública, nela autorizando representantes com a faculdade e o poder de estatuí-las.

Há, em suma, duas concepções, que se excluem mutuamente, acerca das relações entre representantes e representados e da natureza do mandato representativo: ou o representante é simplesmente o portador de uma delegação, segundo a concepção arcaica e privatista desse instituto e, portanto, submetido ao controle e à responsabilização permanentes pelo distrito que o elegeu e, por este meio, vulnerável e corruptível, ou pelos poderosos locais ou pelos tentaculares interesses econômicos que facilmente dominam os distritos; ou é investido de responsabilidade independente, essencial ao mandato representativo moderno, de acordo com o qual, ainda que eleito por uma circunscrição, ele representa o universo do corpo político e, enquanto tal, seus critérios e decisões não são suscetíveis de serem controlados por, ou subordinados a, qualquer parcela do eleitorado.

Lamentavelmente a concepção privatista da representação política domina a recente onda mundial de reforma dos sistemas eleitorais.

O espírito dessa nova onda ¾ que fez da Itália, de Israel, do Japão e dos regimes políticos que emergiram da desintegração da União Soviética e do bloco comunista, o seu laboratório de experiência ¾ se encontra ilustrado pelos artigos reunidos em The Politics of Electoral Reform, número temático da International Political Science Review, em um dos quais o critério de excelência do método eleitoral consiste em sua capacidade de assegurar aos eleitores a "monitoração" dos representantes (Dunleavy e Margetts, 1995:14 e 25).

Mas se o propósito do instituidor for produzir e preservar a ordem pública constitucional e democrática em uma sociedade minimamente complexa, colocado diante dessas duas concepções, não lhe resta outra decisão senão rejeitar a noção medieva e privatista, que define o representante político como portador de uma delegação vicarial e de um mandato imperativo, e assumir o conceito moderno, consagrado por Burke (1942), do mandato virtual e livre: virtual porque obriga o representante a um interesse que não foi intelectualmente concebido antes dele, o interesse público, que não coincide estritamente com qualquer interesse privado e compreende não só o presente, mas o futuro; livre porque investe o representante da responsabilidade independente de definir esse interesse em cada caso particular, no presente e no futuro, segundo o seu próprio julgamento.

Sartori surpreendeu com acuidade o âmago delicado e contraditório do mandato livre, virtual ou representativo, ao observar que nas democracias modernas os representantes não só são "agentes livres aos quais não podem ser dadas instruções, mas são designados para representar uma vontade que não existia antes de sua própria vontade." (Sartori, 1968:466)

Em seu sentido moderno, o corpo de representantes é autorizado a definir o interesse público, produzindo a vontade pública e sancionando-a universalmente pela elaboração da lei. Por outro lado, a representação política não é constituída por um mandato privado, do direito civil, suscetível de ser revogado a qualquer momento, imotivadamente, pelo outorgante, mas trata-se de uma instituição de direito político, na qual não estão em questão os interesses das partes mas o interesse público, definido segundo critérios públicos.

Nesse quadro, a única solução democrático-consensual possível consiste em que os eleitores elejam representantes escolhendo entre programas genéricos de partido e de governo e confiem as decisões específicas finais nos terrenos da legislação e do governo a representantes eleitos aos quais devem obrigar-se, afinal, em virtude de uma relação fiduciária que, com precisão teórica universal e extrema atualidade, Hobbes (1974) denominou autorização, por oposição à delegação vicarial do medievo.

Efetivamente, não há na democracia representativa outro recurso capaz de assegurar a transitividade e a responsabilidade recíprocas entre os eleitores e os representantes além da instituição do partido político, da transitoriedade do mandato representativo e da regularidade e periodicidade de eleições pluralistas e competitivas para conquistá-lo. A decisão em favor dos colégios eleitorais de magnitude elevada e contra os distritos localizados, em particular os uninominais, constitui o corolário de uma decisão hierarquicamente superior que, no domínio da teoria da representação política, rejeita o arcaísmo oligárquico e privatista do mandato imperativo, optando pela responsabilidade pública independente do representante.

Sob a representação proporcional, distritos de magnitude elevada convertem os cocientes eleitoral e partidário em circunscrições eleitorais que ¾ voluntárias e unânimes, mas ao mesmo tempo anônimas e impessoais ¾ libertam o representante das pressões e dos interesses que, nem sempre locais quanto à sua origem e envergadura, partem, em sua forma imediata e bruta, dos distritos localizados, ampliando-lhe a visão e orientando-o no sentido do interesse público nacional, ao mesmo tempo que lhe asseguram responsabilidade independente, o requisito essencial do mandato representativo moderno.

A responsabilidade independente do representante é a única resposta correta a dois sólidos argumentos.

Em primeiro lugar, o âmbito no qual se trava a competição pela representação política, essencialmente protagonizada pelos partidos, é a esfera pública e, portanto, a matéria disputada pelos partidos não são os interesses particulares, ainda que coletivos, em que se divide a sociedade, mas concepções diferentes e alternativas, consubstanciadas em programas concretos de governo, acerca do interesse público e, em especial, de quais os bens que devem ser providos pelo método público.

A política não é o terreno do confronto ou da negociação entre interesses privados ou mesmo entre interesses sociais particulares divergentes, mas o quadro de normas e de instituições no qual competem versões alternativas acerca do interesse público. A representação política é um processo que se realiza inteiramente na esfera pública, e esta não é uma reprodução da esfera privada.

Ao contrário do que supunha o primitivo liberalismo privatista, de origem lockiana, não há qualquer afinidade ou analogia entre o voto do eleitor na comunidade política e o voto do acionista na sociedade por ações. Por intermédio dos seus votos, cujo número é proporcional à magnitude relativa de sua participação no capital da empresa, o acionista articula e sustenta os seus interesses privados. Por intermédio do voto, único e de igual valor para todos os cidadãos, cada eleitor decide não pelo seu interesse pessoal, privado, ou mesmo pelos interesses particulares que compartilha com algum segmento da sociedade, mas por uma interpretação particular, que compartilha com um grupo ou com um partido, acerca do interesse público.

Daí que a legitimidade e a igualdade do valor do voto entre os eleitores não decorrem da igual legitimidade dos diferentes interesses privados ou, ainda que coletivos, parciais, mas da igual legitimidade de diferentes interpretações acerca do interesse público. O representante não representa o interesse privado dos eleitores nem mesmo os interesses coletivos particulares, parciais, de seu eleitorado, mas o interesse público na concepção particular em que o percebem compartilhadamente o próprio representante e seu partido.

É irrepreensível o conceito burkiano de que o partido político é uma organização de pessoas associadas entre si não por interesses particulares comuns, mas por uma concepção particular, que possuem em comum, acerca do interesse público, para cuja realização buscam ocupar o governo.

A rigor, a instituição e o desenvolvimento dos partidos modernos gerou e consolidou, nas sociedades políticas do Ocidente, um território intermediário, difícil de definir porque suas fronteiras não são nítidas, entre as esferas privada e pública.

Operando nesse território cinzento, enquanto organizações complexas e auto-sustentáveis, os partidos separam, do universo dos representados, a representação política, distanciam-na da esfera privada e, instalando-a no coração da esfera pública, realizam a mediação responsável entre ambas. Na democracia representativa moderna cabe ao partido político e não ao distrito eleitoral prover a mediação institucional entre representantes e representados e a responsabilidade dos primeiros diante dos últimos.

Em segundo lugar, se o representante é investido não de delegação mas de responsabilidade independente é porque os eleitores não o elegem para representar interesses particulares ou gerar bens privados, mas para prover ¾ por meio da legislação, do controle e da sustentação do governo ¾ o interesse público e bens públicos de cujo desfrute nenhum indivíduo, quer tenha ou não contribuído para o seu provimento, pode ser excluído.

O interesse público não é a soma ou a superposição de interesses privados ou, embora coletivos, segmentares; mas o conjunto daqueles interesses comuns e compartilhados, no presente ou entre gerações, dos quais os indivíduos, seus sujeitos, tendem a desinteressar-se ou mesmo a esquecer-se, como observaram Hume (1959-60), Rousseau (1962) e Olson Jr. (1968).

Importa examinar um pouco mais detidamente a questão do interesse. As motivações últimas e primordiais da conduta humana são forças extra-racionais, alógicas na linguagem de Pareto (1968) ou, na de Hobbes (1974), Spinoza (1987) e Locke (1954; 1975), necessidades, instintos, pulsões, paixões e desejos que, sendo carências, movem-se de dentro para fora do psiquismo humano, em direção a um objeto. Orientadas para o objeto e minimamente intelectualizadas, convertem-se em interesses. Por sua vez, a diversidade de interesses e sua competição, mediatizadas pela razão, assumem a forma de pluralismo de fins competitivos.

Certamente, portanto, não há interesses objetivos, fora dos sujeitos interessados. Mas existem interesses cruciais do indivíduo que tendem, entretanto, por força quer da habitualização, quer da complexidade obscura das mediações que o percurso de sua satisfação envolve, a desvanecer-se na consciência e na teleologia individual.

A máxima utilitarista segundo a qual o indivíduo é o único juiz de seu próprio interesse é um libelo correto contra qualquer pretensão autoritária e arrogante de invocar o interesse presumido contra o interesse real de outrem. Mas não é inteiramente válida para os interesses denominados mediatos, quer porque sua satisfação constitui o resultado final de sucessivas e complexas mediações, com freqüência inadvertidas pela consciência do indivíduo, quer porque compartilhados, quer porque futuros ou remotos. Quanto a esses interesses, dentre os quais se encontra o interesse público, o melhor juiz não é o cidadão comum mas, suposta a confiança, o seu representante, que em regra dispõe de um volume de informação ao mesmo tempo genérica e hiperanalítica, científica, técnica, institucional, contextual e factual, ao qual aquele não tem normalmente acesso a baixo custo.

Por outro lado, a representação política constitui um caso particular de solução para o problema do provimento de bens públicos, de cujo desfrute nenhum indivíduo, desde que pertença ao mesmo universo de consumidores potenciais, pode ser excluído, quer tenha ou não contribuído para provê-los, e para cuja consecução, portanto, embora constitua o seu mais elevado interesse, não contribuirá, a não ser que para tanto seja constrangido pela autoridade exteriorizada e impessoal da lei e do governo.

Assim, é racional supor ¾ como fizeram Rousseau (1962), Hume (1959-60) e Kant (1853; 1980) ¾ que os indivíduos consintam em submeter-se livremente à coerção impessoal da lei e da autoridade pública que a sanciona, desde que este seja o único meio capaz de obrigá-los a assumir os encargos que lhes cabem no provimento dos bens públicos fundamentais, os quais constituem o interesse superior, embora mediato e a longo prazo, de cada um, mas de cuja realização voluntária o seu interesse imediato o pressiona a abster-se.

Kant (1853; 1980) argüiu que, dada a sociabilidade insociável que caracteriza a natureza humana, não há outro remédio capaz de assegurar o convívio coletivo senão que os indivíduos constituam representantes que ¾ com poderes para legislar, constituir e responsabilizar o governo ¾ sejam ao mesmo tempo os seus senhores.

Há um sólido consenso na teoria política ocidental, com base sobretudo na antropologia de Hobbes (1974), Hume (1959-60) e Kant (1853; 1980), de que ¾ tangidos pela sociabilidade insociável, divididos, cada um consigo mesmo e todos entre si, por paixões e interesses contraditórios e, enfim, universalmente refratários ao cumprimento da obrigação de cooperar para prover os seus próprios interesses sempre que estes sejam compartilhados ou futuros ¾ os indivíduos são incapazes de autogovernar-se diretamente e não possuem outra alternativa, com o propósito de instituir o convívio coletivo pacífico, senão autorizar representantes que, agindo como seus senhores, elaborem as leis e constituam o governo que cada um e todos assumem, por antecipação, como se fossem efetivamente atos seus.

As causas mais importantes da inversão, pela realidade, do núcleo ativo e dinâmico nas relações aparentes e idealizadas entre povo, especialmente o eleitorado, e elites, especialmente os partidos e os representantes, na democracia constitucional e representativa, bem como da incapacidade da massa dos indivíduos para o autogoverno, não são a complexidade e a tecnicidade crescentes que caracterizam o governo contemporâneo ou o custo elevado e o caráter obviamente problemático do acesso generalizado à competência técnico-científica e mesmo à informação contextual e factual qualificada necessária para a decisão política. A passividade política e a incapacidade do homem comum para o autogoverno, identificadas por Joseph Schumpeter (1942), não são fenômenos recentes, mas imemoriais, e suas causas, permanentes e profundas, são a sociabilidade insociável e a coerção estrutural para descumprir a obrigação de cooperar no provimento do interesse e do bem públicos, inerentes à condição do indivíduo humano.

Contudo, a circunscrição ao mesmo tempo voluntária, unânime, anônima e impessoal ¾ corporificada no cociente ¾ , a autorização do representante pelo eleitorado e, enfim, a responsabilidade independente de que o último investe o primeiro, são os três elementos fundamentais que, distinguindo-a da representação sociológica ¾ isto é, da reprodução microcósmica, no legislativo, do universo societário ¾ , capacitam a representação política não só a governar, ou a contrastar o governo, mas a cumprir o requisito de repor, a cada momento, na operação cotidiana e permanente da ordem pública, a unanimidade consensual do contrato constitucional originário.

LISTAS PARTIDÁRIAS, VOTO PREFERENCIAL, COLIGAÇÕES ELEITORAIS E COCIENTE PARTIDÁRIO: UMA PERSPECTIVA COMPARADA

Na democracia representativa proporcionalista, o partido político é a única instituição capaz de tornar efetiva, entre duas eleições consecutivas, a responsabilização do representante quanto à concepção do interesse público à qual se obrigou com a constituency que, corporificada nos cocientes eleitoral e partidário, o elegeu.

Por esse motivo, na ausência de partido e de cociente partidário, o mandato livre desresponsabiliza o representante; fratura a transitividade, essencial à democracia, entre a classe política e os cidadãos; e atomiza, mergulhando-o no caos, o sistema representativo.

Por outro lado, o propósito dos sistemas de representação proporcional é assegurar a proporcionalidade tendencialmente rigorosa entre distribuição de votos e distribuição de cadeiras legislativas para cada um dos diferentes partidos. Portanto, se desaparece o cociente partidário, entre que conjunto de votos e que conjunto de cadeiras legislativas se trata de estabelecer proporcionalidade? A proporcionalidade perde sentido simplesmente porque perde o conteúdo de referência. Além disso, desaparece a própria mediação partidária entre a decisão legislativa e a comunidade política.

O vigor ou o desvanecimento da identidade partidária da representação política dependem também, estrategicamente, da concepção do boletim de voto. É por meio da definição institucional da estrutura do boletim de voto que cada um dos diferentes sistemas eleitorais decide primariamente acerca da distribuição, entre o partido e seus eleitores, do poder de hierarquizar, por antecipação, as probabilidades de eleição dos candidatos do mesmo partido.

Na eleição por listas partidárias hierarquizadas, fechadas e bloqueadas, pertence inteira e exclusivamente ao partido o poder de ordenar, por antecipação, as probabilidades de eleição de seus próprios candidatos.

Os sistemas proporcionais que adotam listas partidárias fechadas e cociente eleitoral ou algum método de divisores, provêem cocientes partidários e, por este meio, viabilizam e consolidam identidades partidárias, ainda que neles se admita coligação eleitoral interpartidária, mas, neste caso, sob a condição de que as cadeiras obtidas no primeiro procedimento distributivo pela coligação sejam repartidas, em um segundo procedimento, por via do cociente partidário ou de seu equivalente, entre os partidos que a compõem e de acordo com a participação relativa dos votos de cada um na totalidade dos sufrágios da coligação. Exemplo conspícuo é a longa e recentemente interrompida experiência de democracia proporcionalista em Israel, na qual, ademais, o apparentement era limitado a dois partidos e condicionado ao cumprimento, por parte de cada um deles, separadamente, do requisito de uma cláusula mínima de exclusão, 1% dos votos válidos nacionais.

A eleição por listas partidárias flexíveis permite ao eleitor redefinir a ordem de preferência estabelecida pelo partido, atribuir votos preferenciais e votar em um número menor de candidatos ou em um único candidato, dentre os da mesma lista partidária. Nela os eleitores podem compartilhar secundariamente do poder de hierarquizar as probabilidades de eleição dos candidatos, o qual, entretanto, continua a pertencer, no fundamental, ao partido. Nesse caso, ainda que o recurso ao voto preferencial seja efetivo, se não houver coligação eleitoral interpartidária a identidade do cociente partidário permanece preservada.

A Itália, que conta com uma tradição social e culturalmente sólida de identificação partidária, é um exemplo adequado de combinação de lista flexível com voto preferencial dotado de probabilidade efetiva de alterar a hierarquia dos candidatos estabelecida pelo partido. A prática italiana de eleições proporcionais foi notável não só pela sua consistência interna e pela sua duração ao longo do tempo, mas pela sua singularidade. O eleitor fazia uma primeira escolha, independente e categórica, pelo partido, da qual resultava estritamente o cociente partidário. Por meio de uma segunda escolha, os eleitores podiam ordenar, na lista partidária, as prioridades dos diferentes candidatos ¾ dessa segunda escolha do eleitor, intrapartidária, dependia inteiramente a hierarquia de probabilidades de eleição dos diferentes candidatos. Ao contrário da maioria dos sistemas de listas flexíveis com voto preferencial, nos quais o voto na lista partidária conta como voto a favor da hierarquização dos candidatos pelo partido, no caso italiano a hierarquização partidária só era consultada nas situações extremas de empate.

Apenas em 1953 adotou-se nas eleições italianas para a câmara baixa o apparentamento. As listas partidárias podiam coligar-se e se uma lista ou coligação de listas obtivesse a maioria absoluta nacional dos sufrágios receberia 64,5% das cadeiras legislativas, distribuindo-se proporcionalmente, nessa alternativa, entre os demais partidos, as cadeiras restantes: o que, na realidade, converteria o sistema proporcional em um sistema misto, com forte potencial majoritário. Entretanto, nenhum partido ou apparentamento logrou maioria na eleição aprazada e aquela aventura institucional foi logo formalmente derrogada.

A longa experiência italiana de listas flexíveis com voto preferencial teve certamente a propriedade de introduzir grave competição interna, entre candidatos, em cada partido, que lhe fraturava a unidade precisamente nos momentos de mobilização eleitoral, mas não prejudicou gravemente a identidade e a integridade dos cocientes partidários e dos partidos porque afastou a possibilidade quer do panachage quer de coligações interpartidárias eleitorais.

Também os sistemas com listas flexíveis nos quais o voto preferencial, legalmente previsto, não é decisivo ou sequer efetivo, preservam a identidade dos partidos e dos cocientes partidários, mesmo que se pratiquem coligações, desde que retenham o cociente partidário, distribuindo as cadeiras conquistadas pela coalizão entre os partidos que a integram, proporcionalmente ao volume relativo do voto de cada um no conjunto dos votos da coalizão.

Há cinco casos notáveis nesse grupo: Bélgica, Holanda, Noruega, Suécia e Quarta República francesa.

As eleições belgas realizam-se em dois níveis. A Bélgica é dividida em trinta pequenos distritos, os arrondissements, nos quais competem listas partidárias flexíveis, facultando-se ao eleitor votar ou na lista ou em um dos candidatos daquela, por meio do voto preferencial: o que, se houver um concerto coletivo suficiente de votos em favor de um candidato, poderá elevá-lo da parte inferior ao topo da lista. Entretanto, do ponto de vista da distribuição interpartidária, em qualquer das duas alternativas o voto é contabilizado para o partido. Os candidatos cujos votos pessoais igualam ou excedem o cociente são automaticamente eleitos, mas os votos pessoais inaproveitados e os estritamente partidários são sucessivamente contabilizados para os candidatos na ordem da lista partidária respectiva, até que cada um obtenha o cociente. A hierarquia da lista só deixa de prevalecer naqueles casos em que um candidato aquém da prioridade partidária receber um número de votos pessoais pelo menos igual à metade do cociente.

Uma segunda distribuição é feita em cada uma das nove províncias, na qual só competem listas partidárias que constituam, cada uma, o apparentement das listas do partido nos arrondissements que compõem a província, e sob a condição de que o partido tenha logrado pelo menos 66%, dois terços, do cociente em pelo menos um arrondissement. Feita essa segunda distribuição pelo método d’Hondt, subtraem-se de cada partido as cadeiras já obtidas nos arrondissements; as demais são distribuídas, entre os arrondissements, para cada partido, segundo a ordem de sua cifra eleitoral no arrondissement. A distribuição das cadeiras de cada partido entre os seus candidatos faz-se no arrondissement segundo a cifra de elegibilidade, isto é, o resultado da divisão dos votos do partido pelo número, acrescido de uma unidade, de cadeiras por ele obtidas. Muito dificilmente os candidatos atingem essa cifra apenas com os seus votos preferenciais. Desse modo, o procedimento distributivo normal consiste em que os votos de lista, somados aos votos pessoais não aproveitados, distribuem-se entre os candidatos de acordo com a ordem da lista, até que cada candidato complete a sua cifra e que todas as cadeiras sejam ocupadas.

O sistema de listas neerlandês é muito semelhante ao belga, com três diferenças: trata-se de um sistema de circunscrição eleitoral nacional única na qual as listas de um mesmo partido de dezoito regiões eleitorais diferentes convertem-se em uma única lista partidária nacional, segundo o modelo da República Federal da Alemanha; o voto de lista é atribuído ao primeiro candidato na preferência partidária, transferindo-se sucessivamente na ordem de prioridade da lista; e, por fim, na distribuição das cadeiras do partido entre os seus candidatos o denominador no cálculo do cociente da lista não é acrescido de uma unidade.

Na Holanda, os candidatos situados em posições inferiores da lista partidária só podem ser eleitos se, além de terem votação pessoal superior a dos candidatos em prioridade na lista, obtiverem metade ou mais do que o custo em votos da cadeira, isto é, do que o cociente eleitoral da lista, que resulta da divisão do número de votos da lista pelo número de cadeiras que ela ganhou.

Desde 1977 realizam-se nas eleições proporcionais neerlandesas alianças de listas de partidos diferentes, distribuindo-se, em uma segunda operação, as cadeiras obtidas pela coligação, entre os partidos que a integram, segundo a fórmula das mais fortes médias. Entretanto, a prática das coligações eleitorais interpartidárias está severamente limitada: só pode participar de coligações o partido que tiver concorrido nas dezoito regiões eleitorais do país e a lista coligada só é admitida se pelo menos dois dos partidos que a integram tiverem cumprido o requisito de uma cláusula mínima de exclusão.

Na Noruega e na Suécia os eleitores não podem votar em candidatos individuais, mas podem votar na lista partidária ou reordená-la inteiramente, sem panachage. Na Noruega o candidato com o maior número de primeiros votos é eleito em primeiro lugar; em seguida é eleito aquele com o maior número de primeiros e segundos votos, e, assim, sucessivamente. Na Suécia, se um candidato é escolhido em primeiro lugar por metade ou mais dos votos é eleito; são eleitos também dois candidatos que recebam em conjunto os votos para o primeiro e o segundo lugares de dois terços dos eleitores; os três candidatos que recebam os votos para os três primeiros lugares por parte de dois terços dos eleitores; e, assim, sucessivamente. O que significa que, nesses dois sistemas de listas, se essas condições, pouco prováveis, não se cumprirem, prevalece a lista partidária com sua ordenação.

Nas eleições proporcionais suecas havia, entre 1921 e 1952, alianças interpartidárias, embora apenas na esfera local, mas em 1952 a adoção da série Sainte Lagüe modificada de divisores substituiu as coligações interpartidárias como alternativa para salvaguardar os pequenos partidos, ao mesmo tempo favorecendo os partidos maiores e inviabilizando os muito pequenos pelo aumento para 1,4 do primeiro divisor.

Nas eleições proporcionais norueguesas houve, nas décadas de 30 e 40, e há, a partir de 1985, alianças interpartidárias, mas o eleitor conta com a possibilidade de votar apenas na lista de seu partido, riscando na lista conjunta o subtítulo que indica a aliança. Ou seja: como naturalmente ocorre na Irlanda com o single transferable vote, o eleitor pode também na Noruega rejeitar a coligação sem retirar o seu apoio ao partido. Nos dois casos, portanto, é o eleitor que decide se efetivamente haverá ou não coligação.

Na Noruega e na Suécia, ainda que sob o regime de apparentement, o suplente que substitui o parlamentar é o candidato imediatamente mais votado de seu próprio partido.

Na Quarta República francesa houve apenas uma eleição sob regra proporcional, em 1946, no umbral da libertação do país e da restauração democrática. Nela combinaram-se listas partidárias flexíveis e voto preferencial, mas de tal modo que só o concerto de pelo menos metade dos votos partidários ¾ condição altamente improvável ¾ poderia efetivamente alterar a ordem de prioridade da lista partidária. Com o objetivo de coartar a expansão dos dois grandes partidos que ameaçavam polarizar a política, o comunista e o gaullista, fortalecendo os pequenos partidos do centro, instituiu-se e funcionou na França, entre 1951 e 1957, o apparentement ¾ um sistema misto, alternativamente majoritário ou proporcional ¾ que não só permitia a coligação de listas partidárias diferentes nas eleições proporcionais nas circunscrições no interior do país, mas assegurava em cada uma delas a totalidade das cadeiras à lista ou associação de listas que obtivesse a maioria absoluta dos votos. Se nenhum partido ou coligação lograsse maioria absoluta, todas as cadeiras seriam distribuídas pelo método proporcional. Pelos mesmos motivos, o novo sistema não foi previsto para os dois departamentos de Paris, nos quais dominavam os comunistas e os gaullistas, continuando neles a viger o método proporcional.

Percebe-se, intuitivamente, que os sistemas proporcionais acima descritos, nominalmente de listas flexíveis, convertem-se, na realidade, em sistemas de listas hierarquizadas, fechadas e bloqueadas.

Na eleição por listas abertas, os eleitores participam mais decisivamente, e em prejuízo do partido, do poder de determinar por antecipação a distribuição final das cadeiras legislativas entre os candidatos, podendo não só reordenar a lista partidária e votar em um número menor de candidatos ou em um único, concentrar mais de um voto em um mesmo candidato (o voto cumulativo) ou simplesmente dar votos preferenciais, mas nela introduzir candidatos novos ou candidatos de outro partido (o panachage). Neste caso, a prática do panachage fratura a identidade do cociente partidário.

Entretanto, de modo geral, nos países que adotam a lista flexível ou a lista aberta tem sido muito pouco relevante ou quase irrelevante a freqüência com que os eleitores empregam o espaço de poder que lhes é facultado.

Mas há três variedades de sistemas proporcionais nos quais o cociente partidário ou simplesmente desaparece ou se converte no agregado sincrético de diferentes preferências partidárias, comprometendo a identidade e a diferenciação dos partidos: (1) sistemas de lista partidária aberta na qual o eleitor utiliza efetivamente o panachage, isto é, a possibilidade de votar em candidatos de partidos diferentes; (2) sistemas com listas partidárias flexíveis nos quais coligações eleitorais entre partidos eliminam o cociente partidário, substituindo-o pelo da coligação, como na Finlândia e no Chile anterior ao golpe militar de 1973; e, por fim, (3) os sistemas proporcionais sem listas em que o eleitor pode votar em candidatos de partidos diferentes, como o single transferable vote irlandês, e aqueles em que, e este é o caso brasileiro, o eleitor vota em um único candidato e coligações eleitorais interpartidárias eliminam o cociente do partido, substituindo-o pelo cociente da coligação. Nos sistemas do primeiro grupo, a coligação eleitoral interpartidária, embora não promovida pelos partidos, pode resultar do comportamento dos eleitores, dela derivando-se o sincretismo partidário. Nesse grupo encontram-se Suíça e Luxemburgo, países cujos partidos apresentam listas abertas mas, a rigor, os eleitores votam em candidaturas individuais, em mesmo número do que as contidas na lista partidária, podendo ratificar aquela lista, suprimir ou acrescentar nomes, atribuir mais de um voto a um mesmo candidato, da lista partidária ou de sua lista pessoal, o voto cumulativo, e mesmo nela incluir candidatos de outro partido, o panachage. Por esse motivo, como observou um politicólogo suíço, nas eleições proporcionais de seu país "efetivamente, os verdadeiros rivais de um candidato não são os candidatos das outras listas, mas aqueles que figuram na sua, e que devem ser ultrapassados na preferência do público: o adversário está no interior do partido." (Aubert, 1983:77)

Na Suíça o partido pode fazer constar mais de uma vez em sua lista o nome de alguns candidatos, o que equivale a atribuir-lhe o poder de um extraordinário voto preferencial. Ademais, nas eleições proporcionais suíças pratica-se a aliança de listas.

Quanto ao segundo grupo, o sistema eleitoral da Finlândia e o adotado pelo Chile até 1973 têm em comum com o single transferable vote irlandês a peculiaridade de que neles é obrigatória a escolha intrapartidária de candidatos pelo eleitor ou, mais precisamente, é impossível ao eleitor votar sem manifestar a sua preferência por algum ou alguns candidatos do partido.

Na Finlândia, o eleitor vota em um único candidato da lista partidária e esse voto, computado para o partido do ponto de vista da escolha interpartidária, é contabilizado, do ponto de vista da decisão intrapartidária, que o sistema confere ao eleitor, apenas para o candidato. Os votos do partido são, portanto, o agregado dos votos em seus candidatos e a distribuição final das cadeiras do partido entre esses candidatos faz-se conforme a ordem decrescente dos votos de cada um.

Nas eleições proporcionais finlandesas não concorrem propriamente partidos, mas indivíduos que constituem alianças eleitorais: grupos eleitorais simples que podem, por sua vez, coligar-se em uniões de grupos eleitorais (Katz, 1986:88; Schepis, 1955:92* e 93*). São admitidas coligações interpartidárias apenas nos distritos, mas os "partidos que compõem uma aliança não retêm a sua identidade separada no interior da aliança, que é realmente uma lista única de candidatos". Nela, "se um partido inclui muitos candidatos corre o risco de dispersar bastante o suporte eleitoral entre eles, os quais, desse modo, podem não conseguir posição suficientemente elevada na ordem de prioridade para conquistar uma das cadeiras obtidas pela aliança" (Carstairs, 1980:118).

Na verdade, a coligação substitui os partidos que a constituíram e a lista coligada converte-se em uma lista partidária única cujas cadeiras legislativas obtidas distribuem-se não entre os partidos originários mas, diretamente, entre os candidatos mais votados, na ordem decrescente de sua votação pessoal e com abstração do partido. Conseqüentemente, na Finlândia, o suplente de um parlamentar eleito por uma união de grupos eleitorais não é necessariamente o candidato mais votado de seu partido, ou grupo eleitoral simples, mas o candidato mais votado da união.

Do mesmo modo funcionou o sistema proporcional de listas chileno até 1961, ano em que foram proibidas coligações interpartidárias em eleições proporcionais, preservando-se, entretanto, as listas abertas com o voto preferencial em candidato único até o golpe militar de 1973.

Finalmente, o single transferable vote irlandês e o sistema brasileiro de eleições proporcionais pelo voto uninominal devem ser rigorosamente identificados como sistemas de eleição proporcional sem listas. No single transferable vote, concebido por Andrae e Hare e consensualmente praticado na República da Irlanda ao longo deste século, o eleitor decide e fabrica pessoalmente o próprio voto, atribuindo-o a um único candidato, mas indicando na cédula, logo abaixo, em ordem de preferência e independentemente de partido, candidatos aos quais deve aproveitar o voto se o candidato preferido tiver excedido o cociente ou permanecido aquém dele.

Simples quanto ao voto do eleitor, mas complicadíssimo do ponto de vista das sucessivas contabilizações de votos que requer, o single transferable vote aproveita virtualmente todos os votos do eleitor. Em uma primeira série de escrutínios, elegem-se os candidatos que lograram o cociente e transferem-se os votos excedentes daqueles que o ultrapassaram aos candidatos não eleitos mais votados, até o último a atingir o cociente; e, em uma segunda série de escrutínios, somam-se sucessivamente os votos dos candidatos que ainda não lograram o cociente de modo que sejam aproveitados por aqueles mais votados.

A fórmula do voto transferível único aproxima-se sensivelmente do propósito substantivo da representação proporcional. Acolhe, no interior da representação legislativa, os diferentes segmentos e tendências da sociedade na medida em que se organizam em partidos, permitindo-lhes, tanto quanto possível, participarem da condução do governo ou pelo menos do controle sobre suas responsabilidades. Mas, no conjunto dos sufrágios depositados em uma eleição tão competitiva quanto o permitem os diferentes constrangimentos societários e institucionais, distribui as cadeiras legislativas segundo o peso específico relativo dos votos de cada candidato e não de cada partido.

Ao pretender realizar tão plenamente quanto possível a representação, proporcional ao peso específico relativo de cada um, dos diferentes segmentos, interesses, valores e projetos em que se decompõe o conjunto da sociedade, e viabilizar a auto-identidade e a auto-expressão política das minorias, o voto único transferível personifica, entretanto, a representação desses elementos em candidatos individuais, tornando supérfluos e dispensáveis os partidos no próprio processo eleitoral e colocando-se, desse modo, aquém das exigências da democracia representativa moderna, que constitui, essencialmente, um sistema de partidos competitivos e um governo responsável de partido ou coalizão de partidos.

O sistema do voto único transferível não favorece o desenvolvimento ou a consolidação dos laços de identificação partidária. Tende, ao contrário, a inibi-la ou desvanecê-la, pois nesse sistema eleitoral a interação básica não é de eleitores e partidos, através da mediação dos candidatos, mas simplesmente de eleitores e candidatos. Nele, as preferências eleitorais definem-se em torno de candidatos, prescindindo-se dos partidos.

Se, na Irlanda, com a representação proporcional eleita segundo a fórmula do voto único transferível, os laços partidários são densos e vigorosos, é porque as identidades partidárias deitam raízes na tradição histórica e na simbolização nacional.

No estranho sistema de eleições proporcionais pelo voto uninominal, introduzido pelo Código Eleitoral de 1935 na experiência republicana brasileira, o partido é inteiramente privado do poder de hierarquizar as probabilidades de eleição de seus próprios candidatos, as quais passam a depender diretamente das relações entre estes e os seus eleitores. Em eleições proporcionais, o voto em candidato individual que, contabilizado para a legenda, transfere-se aleatoriamente a outros candidatos da mesma legenda e, admitida a coligação interpartidária, a candidatos de outras legendas, equivale ao voto em uma lista partidária virtual que constitui, entretanto, com sua ordenação, o resultado aleatório das escolhas de todos os eleitores do partido ou da coligação. Assim, ao fim e ao cabo, nem o eleitor nem o partido têm qualquer controle sobre o destino do voto e sobre a ordem de precedência dos candidatos nessa lista virtual, porque constituem efeitos compósitos e aleatórios.

Atuando separadamente, cada um dos dois mecanismos ¾ o voto uninominal e a coligação interpartidária sem a previsão de um mecanismo que distribua entre os partidos, proporcionalmente à contribuição em votos de cada um, as cadeiras obtidas pela coligação ¾ descaracteriza o partido político. Associados, como ocorre no Brasil, esses mecanismos produzem carência de identidade e de mediação partidárias no comportamento legislativo, introduzem o sincretismo partidário parlamentar e desfiguram não só a proporcionalidade da representação de cada partido, mas a identidade e o alinhamento dos partidos no parlamento e, logo, fora dele.

O problema que têm em comum a representação proporcional brasileira com voto uninominal e o single transferable vote é a carência de cociente partidário e a irrelevância a que reduzem os partidos na competição eleitoral. Como o princípio da representação proporcional só se realiza quando o seu cálculo se faz por referência à distribuição dos votos entre os partidos enquanto unidades coletivas básicas em que se decompõe a preferência da sociedade, salta aos olhos o não-senso desses dois sistemas. Eleitos os representantes parlamentares enquanto candidatos individuais e não havendo cociente partidário, atomiza-se a representação política e é difícil imaginar os parâmetros segundo os quais se torna possível avaliar a proporcionalidade daquela.

Adotada em países que carecem de estrutura partidária previamente consolidada, qualquer das três variedades de sistema proporcional ora descritas esvazia a identidade partidária e reduz à irrelevância a função e o papel dos partidos políticos nos processos eleitoral, legislativo e governamental.

COLIGAÇÕES ELEITORAIS INTERPARTIDÁRIAS E REPRESENTAÇÃO PROPORCIONAL NO BRASIL

A rigor, alianças eleitorais entre partidos são inconsistentes com a natureza, com os propósitos e com o método da representação proporcional porque esta última busca a integração e o consenso políticos precisamente por meio da diferenciação, da especificidade e da nitidez na expressão parlamentar de cada um dos partidos, e não de seu sincretismo, de sua confusão, ambigüidade e equivocidade.

Sistemas de representação proporcional são sistemas inclusivos e envolventes que, por outro lado, tornam possível a competição eleitoral não apenas pluripartidária mas multipolar, o que modera o conflito político, provendo o meio pacífico e descontraído capaz de convertê-lo em insumo de integração e consenso públicos.

Operando sobre circunscrições de magnitude elevada, os sistemas proporcionais viabilizam a representação política, segundo a magnitude relativa dos sufrágios de cada um, para todos os partidos minimamente relevantes, assim definidos aqueles que tenham logrado pelo menos o cociente eleitoral, que funciona, na tradição brasileira, desde o Código Eleitoral de 1932, como requisito de ingresso ¾ ou cláusula de exclusão ¾ do partido na Câmara dos Deputados e nas assembléias legislativas estaduais brasileiras.

Efetivamente, a representação proporcional não é apenas uma fórmula eleitoral. Ao assegurar a cada partido, no corpo de representantes, uma presença nítida e proporcional à magnitude de sua preferência no eleitorado, converte-se, também, essencialmente, em um método de estruturar e solver o conflito e o dissenso societários, provendo-lhes a negociação e a arbitragem e produzindo a integração política e o consenso público por meio da diferenciação e da especificidade partidárias. Por esse motivo, eleições legislativas proporcionais empenham-se em assegurar a diferenciação, a especificidade, a identidade, a individualidade e a independência de cada partido no corpo de representantes.

Esses efeitos da representação proporcional sobre os partidos, sobre a representação política e sobre o governo derivam, como propriedades, do cociente eleitoral e, logo, do cociente partidário ¾ ou do equivalente funcional de ambos, uma série de divisores ¾ , que materializam a decisão de um colégio eleitoral não territorial, essencialmente voluntário e unânime, constituído por eleitores cujos votos, somados, associam-se sem qualquer equívoco ou ambigüidade a um único partido.

A prática de alianças eleitorais interpartidárias em eleições legislativas proporcionais compromete a identidade e a integridade do cociente e, por via de conseqüência, compromete igualmente a correspondência, para cada um dos diferentes partidos, entre a densidade relativa de votos e a densidade relativa de cadeiras legislativas, que constitui o objetivo essencial da representação proporcional. Obscurece e, no limite, faz desaparecer a identidade e o alinhamento dos partidos no parlamento.

Coligações partidárias em eleições proporcionais produzem o sincretismo, a ambigüidade, a equivocidade, a volatilidade e a confusão não só no comportamento dos partidos, mas na própria composição partidária do parlamento.

A magnitude e a gravidade com que esse fenômeno ocorre na prática legal brasileira das eleições legislativas resultam de que, nelas, a coligação partidária substitui literalmente o partido e o cociente da coligação simplesmente elimina e substitui o cociente partidário, de modo que as cadeiras que aquela obtém não são distribuídas, em um procedimento ulterior, entre os partidos que a constituem e segundo a magnitude relativa da contribuição dos votos de cada um à votação daquela, isto é, segundo o cociente de cada partido no interior da coligação ¾ como se faz na maioria dos regimes proporcionalistas que admitem alianças partidárias eleitorais ¾ , mas simplesmente entre os diferentes candidatos que a compõem, na ordem decrescente da votação pessoal de cada um e fazendo-se completa abstração dos partidos.

A importância das coligações na definição da representação da Câmara dos Deputados foi crescente no regime de 46: nas eleições de 1950, 18% de suas cadeiras foram ocupadas por coligação; em 1954, 1958 e 1962, esse percentual passou, respectivamente, para 34%, 41% e 47%. Nas eleições de 1962, 80% das bancadas dos pequenos partidos e 50% das bancadas dos três grandes partidos, no Congresso, foram ocupadas por coligações (Santos, 1987, cap.VI). Nas eleições de 1986, 40% dos votos para a Câmara dos Deputados foram dados para coligações (Lima Junior, 1993:75).

Por outro lado, ainda segundo o critério legal brasileiro, tendo havido coligação partidário-eleitoral, o suplente que ocupará a cadeira vacante durante a legislatura não será o candidato imediatamente mais votado do partido do representante ausente, mas, simplesmente, o candidato mais votado da coligação, qualquer que seja o seu partido. Esse absurdo não teria sido consagrado pela norma legal se os legisladores tivessem observado o argumento enunciado por Assis Brasil, de que "o suplente não o é da pessoa do representante [...] mas sim da opinião que este representava no corpo legislativo" (Assis Brasil, 1931:288).

Sob a lógica perversa que disciplina as eleições legislativas proporcionais com coligações interpartidárias no Brasil, cada partido, objetivando maximizar o ganho eleitoral, encontra-se diante da necessidade de recomendar ao eleitor não o voto na legenda, que, integrando um fundo comum de votos, pode aproveitar a outro partido, mas o voto em candidato pessoal do partido, cuja probabilidade de ser transferido para candidato de partido coligado é menor.

Portanto, a rigor, o elemento disnômico no sistema eleitoral brasileiro não é tanto a coligação em eleições proporcionais, que ocorre em algumas democracias proporcionalistas sem prejuízos notáveis, mas a sua associação com o voto uninominal e sem a instituição de um mecanismo que redistribua proporcionalmente, entre os partidos, em um segundo momento, as cadeiras obtidas proporcionalmente, no primeiro momento do escrutínio, pela coligação.

Sem a previsão desse mecanismo, coligações interpartidárias em eleições proporcionais por voto uninominal terminam gerando aleatoriamente inúmeras distorções, dentre as quais a super-representação de partidos minúsculos, ao prover-lhes mesmo um único assento parlamentar, em prejuízo do partido maior na coligação. É o que se tem verificado nas coligações entre o PT e micropartidos de esquerda, como o PC do B e o Partido Verde, nas quais o primeiro tem funcionado como hospedeiro e os últimos como parasitas.

Mas coligações partidárias não são apenas inconsistentes com eleições proporcionais; são, também, nelas, desnecessárias. O método proporcional não só desestimula e em alguns casos inibe a formação de alianças eleitorais entre partidos, mas torna-as desnecessárias porque maximiza a probabilidade de que cada partido, incluídos os pequenos, conquiste sozinho e independentemente a representação parlamentar.

É verdade que alguns sistemas proporcionais estabelecem que o partido deve cumprir um requisito de ingresso no corpo de representantes, que consiste em uma cláusula de exclusão, definida por uma participação relativa mínima na totalidade dos votos válidos na eleição em pauta; em uma cláusula de desempenho, concernente à eleição precedente; ou na combinação de ambas. Na tradição do sistema eleitoral brasileiro há uma cláusula de exclusão implícita que consiste, em cada colégio eleitoral estadual, no cociente eleitoral, à qual o recente Código dos Partidos Políticos (Lei 9.096, de 1995, artigo 11) acrescentou a cláusula de exclusão explícita de 5% dos votos válidos para a Câmara dos Deputados, distribuídos em, pelo menos, um terço dos estados, com um mínimo de 2% do total de cada um deles, para que o partido possa ter representação em qualquer Casa Legislativa.

Sabe-se a esse respeito que em vários países, e no Brasil em particular, a permissão de coligações é um mecanismo que tangencia a cláusula de exclusão com o propósito de preservar partidos pequenos ou mesmo minúsculos. Importa assinalar que, se o objetivo é resguardar a existência de partidos menores, é preferível, em princípio, do ponto de vista da natureza, dos objetivos e do adequado funcionamento da representação proporcional, reduzir ou mesmo eliminar a cláusula de exclusão, ou ainda adotar uma fórmula menos concentradora de conversão de votos em cadeiras legislativas para os diferentes partidos, do que introduzir coligações eleitorais interpartidárias. Foi esse o significado da decisão da Suécia, que em 1952 substituiu funcionalmente a possibilidade de alianças eleitorais interpartidárias pela adoção da fórmula Sainte Lagüe modificada.

VOTO UNINOMINAL, COLIGAÇÕES ELEITORAIS INTERPARTIDÁRIAS E A TEORIA DO MANDATO REPRESENTATIVO NO BRASIL

Nas eleições proporcionais brasileiras, o voto uninominal faz resultar da soma dos votos em candidaturas individuais o cociente partidário e a hierarquia dos candidatos partidários eleitos, produzindo migrações aleatórias de votos entre candidatos e ¾ admitidas coligações interpartidárias ¾ entre partidos, que afetam a sua contabilização e a verdade do escrutínio.

Por outro lado, a combinação entre o voto uninominal e a prática das coligações partidárias gera migrações de votos ainda mais aleatórias e irracionais, como resultado das quais os votos para candidato de um partido terminam sendo contabilizados para candidato de outro partido.

Com o voto uninominal, a probabilidade de eleger-se e, por via de conseqüência, a base da força parlamentar, pertencem ao candidato e dependem diretamente de suas relações com os eleitores e não da hierarquização definida por lista partidária. A primeira conseqüência consiste na competição sem tréguas entre os candidatos do mesmo partido, o que compromete irremediavelmente a coesão, a solidariedade, a disciplina, a unidade e a identidade internas do partido precisamente nos momentos de mobilização eleitoral.

É importante assinalar que, entre 1945 e 1964, na ausência da cédula oficial, não era em regra sequer permitido aos eleitores votar na legenda. A referência à legenda não constava na cédula eleitoral que, elaborada pelos candidatos, consagrava, não raro, dois nomes de partidos diferentes concorrendo, "em dobradinha", um para deputado federal e o outro para deputado estadual.

Em 1986 e em 1990 a cédula continha, além do espaço reservado para registrar o nome ou o código do candidato, uma lista de siglas partidárias, de modo que o eleitor podia votar ou no candidato ou na legenda. Entretanto, nas eleições de 1994, embora o eleitor retivesse a faculdade de votar no candidato ou no partido, a cédula não continha as siglas partidárias para assinalar.

A comparação dos resultados evidencia bem como o formato do boletim de voto induz a decisão da grande massa do eleitorado: de 1986 a 1990 a magnitude relativa do voto de legenda chegou a crescer de 14,3% para 18,9%, mas com a cédula de 1994 ¾ que não continha referência à sigla ¾ decresceu radicalmente para 8,3%.

Nos países que adotaram alguma forma de votação que amplia o escopo da decisão individual dos eleitores, em detrimento dos partidos, na determinação final dos candidatos eleitos — como a Irlanda com o voto único transferível, a Finlândia com o voto preferencial e a Austrália com o voto alternativo —, a existência de partidos sólidos e coesos, com identidade enraizada histórica e culturalmente, precedeu a instituição desse mecanismo eleitoral. No Brasil, ao contrário, a adoção do voto uninominal, nos anos 30, precedeu em pouco mais de uma década a emergência, problemática, de partido organizado e moderno de massas.

Oswaldo Trigueiro (1953; 1959) e, mais recentemente, Renato Lessa (1992), Walter C. Porto (1989; 1992) e Wanderley Guilherme dos Santos (1986; 1987) apontaram para as deformações resultantes do voto uninominal contabilizado na legenda e de sua combinação com alianças eleitorais na prática brasileira da representação proporcional.

O fundamental, entretanto, consiste em que na cultura política brasileira há um rationale e um conteúdo normativo subjacentes à instituição e à prática do voto uninominal na representação proporcional: a noção de que, adquirido pela via de uma obrigação pública mas, por esse motivo, direta, atomizada e não sancionável, entre o eleito e a multidão de eleitores, o mandato representativo pertence privada, exclusiva e discricionariamente ao representante.

Nas democracias ocidentais há uma profunda ambigüidade acerca da titularidade e da responsabilidade sobre o mandato representativo, articulada pelas noções de que a democracia representativa moderna é essencialmente mediatizada pela competição entre os partidos e de que, portanto, a responsabilidade e o poder sobre o mandato, embora pertençam imediatamente ao representante, incumbem mediatamente ao partido, que detém a titularidade eminente da representação. No Brasil essa ambigüidade se desfez em benefício do individualismo selvagem dos políticos e em prejuízo dos partidos. A noção de que o representante é o proprietário de seu mandato justifica culturalmente, e o voto uninominal em eleições proporcionais viabiliza tecnicamente, deformações profundas na democracia representativa brasileira.

É essa combinação que habitualiza e legitima o livre fluxo das migrações partidárias dos representantes legislativos e que, com ele, alimenta a existência e o funcionamento de um mercado paralelo de mandatos que, com muita propriedade, Edson Nunes, André Nogueira e Paulo Tafner identificaram como "o mercado secundário dos votos" adquiridos pelo representante no mercado "primário" das eleições (Nunes, Nogueira e Tafner, 1995).

Mas já no mercado primário das eleições, o voto uninominal ¾ que implica a ausência de lista partidária ¾ viabiliza o financiamento seletivo e corruptor, pelo capital organizado e pelas corporações de todo tipo, inclusive sindical, dos candidatos de diferentes partidos, e com a abstração destes últimos: mecanismo mais atrativo porque ao mesmo tempo mais eficiente e mais discreto. A adoção da lista partidária fechada ou mesmo flexível minimizaria o problema, pois reduziria severamente o estímulo à compra de votos e ao financiamento clandestino de candidatos específicos.

É também o voto uninominal que viabiliza a introdução nas eleições dos mecanismos de patronagem e clientela e da corrupção patrimonialista, com os recursos do Estado, por parte das elites políticas, que decidem pela indicação de candidato que, favorecido na competição intrapartidária, será ainda mais facilmente favorecido no processo eleitoral, em prejuízo dos demais candidatos.

O preceito que, recorrente no Brasil desde 1982, define o representante legislativo (senador, deputado federal ou estadual e vereador) como candidato nato à reeleição para o mesmo cargo, pelo partido a que estiver filiado no momento da convenção que escolhe as candidaturas, constitui outra perversidade institucional que, associada à concepção individualista e privatista do voto e da representação política peculiar às elites brasileiras, simplesmente destrói os partidos políticos.

A Lei 8.713/93, que regulou as eleições de 1994, assegurava aos "detentores de mandato de deputado federal, estadual ou distrital [...] o registro de candidatura para o mesmo cargo pelo partido a que estejam filiados na data da convenção, independentemente de sua escolha nesta", com a reserva, "salvo deliberação em contrário do órgão nacional do partido". Contudo, a nova lei eleitoral simplesmente restabelece na sua plenitude, sem aquela restrição, o privilégio da candidatura nata dos representantes legislativos, dele excluindo apenas os senadores e ¾ ao contrário ¾ ampliando-o "aos que tenham exercido esses cargos em qualquer período da legislatura que estiver em curso" (Lei 9.504/97, art. 8o,§1o). Ao fazê-lo, cristaliza e perpetua a propriedade do mandato pelo representante, violando simplesmente o poder dos partidos de decidirem acerca de suas próprias candidaturas.

Por outro lado, na prática do sistema eleitoral brasileiro, o voto uninominal, isto é, a ausência de lista, não só converte o cociente partidário no agregado bizarro das preferências dos eleitores por candidatos individuais ¾ o que ocorre mesmo nos casos em que não há coligação partidária ¾ , mas, quando combinado com coligações interpartidárias, faz literalmente desaparecer, nas eleições proporcionais, a própria noção de cociente partidário, substituindo-a pela de cociente da coligação. As cadeiras legislativas obtidas pela coligação e não ocupadas pelos candidatos que lograram individualmente o cociente eleitoral não são distribuídas entre os partidos que a compõem segundo a magnitude relativa dos votos de cada um no conjunto dos votos da coligação para, apenas em um segundo momento, distribuírem-se as cadeiras que couberem a cada partido entre os seus candidatos mais votados. Essas cadeiras nem sequer, rigorosamente, pertencem aos partidos, mas aos candidatos da coalizão, segundo a ordem decrescente da votação pessoal de cada um, e com total abstração dos partidos, podendo eleger-se o candidato de um partido com os votos de candidatos de outro.

Adicionalmente, esse mecanismo tem a propriedade perversa de estimular, senão constranger, os eleitores a votarem ¾ persuadidos com freqüência pelos seus próprios partidos, e por considerações de cálculo estratégico ¾ não na legenda, mas apenas no nome de seus candidatos e, mais especificamente, concentrarem os votos nos candidatos ou, quando se trata de partido pequeno, no candidato com maior probabilidade eleitoral.

Uma manifestação corrente do problema da combinação brasileira, nas eleições proporcionais, entre voto uninominal e coligações interpartidárias, consiste em que, instalada a legislatura, há a possibilidade de que o mandato tornado vago seja ocupado por suplente que pertence a partido diferente daquele do titular: esse fenômeno altera arbitrariamente a composição partidária do legislativo, incrementando-lhe se não a fragmentação pelo menos a volatilidade, mas, sobretudo, fazendo-a deixar de corresponder à decisão periódica do eleitorado.

Em suma, a combinação entre voto uninominal e coligação partidária em eleições proporcionais altera a natureza do mandato representativo que, em uma democracia moderna e complexa de massas, pertencendo embora imediatamente ao parlamentar eleito, deve pertencer eminentemente ao partido.

VOTO UNINOMINAL E CARÊNCIA DE COCIENTE PARTIDÁRIO NO BRASIL: O RATIONALE

A justificação da carência de cociente partidário e do voto uninominal, que peculiarizam a representação proporcional no Brasil, encontra-se na 4ª edição, de 1931, anotada pelo autor, da obra clássica de Joaquim Francisco de Assis Brasil, Democracia Representativa ¾ Do Voto e do Modo de Votar, editada pela primeira vez em 1893.

Assis Brasil foi o principal arquiteto do primeiro Código Eleitoral do país, o de 1932. Entretanto, o livro de 1893, além de ter provido o rationale daquelas duas debilidades, endêmicas na tradição do sistema representativo brasileiro, continha extraordinários avanços ¾ que, desafortunadamente inadvertidos, tratei de recuperar em estudo recente ¾ em relação ao argumento dominante na teoria do proporcionalismo liberal europeu do século XIX (Tavares, 1998b; 1998c).

Em suas três versões ¾ a de 1893, a de 1927 e a de 1931 ¾ , o projeto de código eleitoral proposto por Assis Brasil instituía não um sistema estritamente proporcional, mas um singular sistema misto que combinava ¾ em distritos de magnitude elevada, assim definidos os estados da federação, e em dois turnos simultâneos ¾ eleição proporcional, pelo voto uninominal e por cociente, e eleição majoritária, por lista.

No primeiro turno, o eleitor votava em um único candidato, cujo nome se encontrava acima da lista e dela separado, sendo eleitos, independentemente dos partidos, todos os candidatos que obtivessem o cociente, que constituía assim o requisito de ingresso na Câmara.

No segundo turno, o eleitor votava em uma lista que, registrada logo abaixo do candidato proporcional, podia conter tantos candidatos quantos quisesse, até o número de cadeiras que coubesse ao distrito, sendo eleitos, segundo o método majoritário, e na ordem de votação pessoal de cada um, tantos candidatos quantas fossem as cadeiras da Câmara que, cabendo ao distrito, não tivessem sido ocupadas pelo cociente, isto é, pelo processo proporcional (Assis Brasil, 1931, Livro IV, caps. II e IX).

Entretanto, o projeto de 1927 introduziu, como acentuou o próprio Assis Brasil, "um aperfeiçoamento indispensável": enquanto no primeiro projeto eram eleitos pelo método proporcional e no primeiro turno apenas os candidatos que obtivessem o cociente, desprezando-se quer os votos excedentes quer os votos insuficientes de cada candidato em relação ao cociente, no primeiro turno do novo projeto os votos excedentes dos candidatos que ultrapassassem o cociente passariam a ser aproveitados pelos candidatos mais votados da legenda que não o houvessem atingido, na ordem decrescente da votação de cada um, elegendo-se aqueles que, com tal adição, obtivessem o cociente.

O projeto de 1931 manteve o mesmo critério: contabilizava apenas os votos excedentes dos candidatos que houvessem logrado o cociente, adicionando-os aos votos de cada um dos candidatos imediatamente mais votados do partido até o último que, ao adicioná-los, obtivesse o cociente, "cessando a transferência" e o aproveitamento dos votos pelos candidatos subseqüentes "quando, somadas as sobras à votação do candidato seguinte, não se completar um cociente" (idem:269 e 270, art. 9o, §1o). Ou seja, a partir do primeiro candidato que, com a adição dos votos excedentes de candidatos eleitos, não lograsse o cociente, os votos dos candidatos partidários não mais se contabilizariam em proveito de outros candidatos do mesmo partido.

Essa é uma importante diferença entre a arquitetura do sistema eleitoral concebida por Assis Brasil e o single transferable vote construído por Andrae e Hare e até agora empregado na República da Irlanda, embora ambos careçam simplesmente do conceito de cociente partidário.

Em Assis Brasil é estranha essa carência porque, nas notas finais ao capítulo I do Livro IV da 4ª edição da Democracia Representativa, enuncia com clareza e precisão o significado do cociente partidário na lógica da representação proporcional:

"O critério do cociente, isto é, o reconhecimento do direito de cada associação partidária a um número de representantes igual ao resultado da divisão do eleitorado concorrente pelo número de elegendos, e tantas vezes quantas demonstrar essa quantidade, tornou-se o fundamento primário de todo sistema que se prezar de racional" (

idem

:174).

E, nas notas ao capítulo VII do Livro III, Assis Brasil parece sugerir que o seu último projeto contabilizava para os candidatos do mesmo partido quer os votos excedentes quer os votos insuficientes de cada candidato em relação ao cociente:

"[...] pelo texto antigo, os votos dispersos das minorias que não chegassem a fazer o cociente no primeiro turno, ou sobrassem dele, ficavam desde logo perdidos para elas; ao passo que, pela variante atual, esses votos dispersos poderão ainda ser por elas aproveitados, se, somados, perfizerem um cociente ou mais de um." (

idem

:152)

É provável que a hesitação e a recusa, por parte de Assis Brasil, de introduzir aquele conceito no sistema eleitoral tenha resultado da avaliação realista, mas resignada, da ausência de partidos nacionais na Primeira República. De qualquer modo, o Código de 1932 introduziu, operacionalizando-o, o conceito de cociente partidário: são eleitos no primeiro turno, por representação proporcional, não apenas os candidatos que pessoalmente lograram o cociente eleitoral mas, em cada legenda, e na ordem decrescente da votação pessoal de cada um, tantos candidatos quantos determina o cociente partidário (art. 58, 5o, 6o e 7o).

Contudo, ainda no derradeiro projeto de Assis Brasil, a ausência de cociente partidário no primeiro turno ¾ com a conseqüente inutilização de parte dos votos proporcionais e, a ela associada, a distribuição das cadeiras remanescentes, por maioria simples, entre os candidatos de lista no segundo turno ¾ obedeceu certamente a um propósito positivo: converter uma maioria relativa de sufrágios em uma maioria congressual absoluta de sustentação ao governo.

Efetivamente, no sistema misto de Assis Brasil, as duas eleições, a majoritária e a proporcional, realizam-se em, e por referência a, distritos de magnitude relativamente elevada e a eleição proporcional, escrutinada pelo cociente de Hare, faz-se, contudo, pelo voto uninominal, nela elegendo-se apenas os candidatos cujos votos ¾ estritamente pessoais ou acrescidos dos votos excedentes dos candidatos da mesma legenda que ultrapassaram o cociente ¾ lograram o cociente eleitoral: as cadeiras não ocupadas pelo turno proporcional são preenchidas por pluralidade, ou maioria simples, e na ordem de votação pessoal de cada um, pelos candidatos que integram a lista.

Por outro lado, enquanto nos sistemas proporcionais consolidados a competição entre listas partidárias, idealmente hierarquizadas, fechadas e bloqueadas, induz e assegura a identidade e a coesão interna de cada partido, no projeto de Assis Brasil a eleição proporcional ¾ que se faz pelo cociente eleitoral, mas por voto uninominal, e na ausência do cociente partidário ¾ simplesmente dissolve a identidade e a unidade partidárias. Para o pensador político gaúcho, o cociente não é um instrumento para fortalecer os partidos; ao contrário, é um "remédio" contra o personalismo dos chefes partidários, contra a oligarquização interna dos partidos e contra a oligopolização do mercado eleitoral.

Segundo a intenção de Assis Brasil é ao segundo turno, majoritário, que cabe reunir, ao redor da unidade da lista partidária, os eleitores do mesmo partido que o primeiro turno havia separado (idem, Livro IV, cap. IV). Mas, ainda assim, a lista do segundo turno é a mais aberta possível, nela podendo o eleitor acrescentar outros candidatos, de tal modo que o poder de decidir sobre a probabilidade de eleição dos diferentes candidatos do mesmo partido encontra-se, em cada um dos dois turnos, no eleitor e não no partido. Há, portanto, a esse respeito, estreita identidade entre a totalidade da arquitetura híbrida de Assis Brasil ¾ e não apenas o seu componente proporcional ¾ e o single transferable vote, que tem sido consensualmente praticado na República da Irlanda ao longo deste século. O problema que possuem em comum o modelo de Assis Brasil e o single transferable vote é a carência de cociente partidário e a irrelevância a que reduzem os partidos na competição eleitoral.

Significativamente, quando argumenta que atribuir, no primeiro turno, os votos do candidato não eleito à "parcialidade política a que ele pertencer", conferindo-os, nela, "aos mais votados dos que não foram eleitos, é romper com o princípio de que devem ser garantidos à opinião que sufragaram" (idem:171), Assis Brasil faz inteira abstração do partido enquanto unidade comum e fundamental de mediação entre eleitores e representantes na democracia representativa moderna.

O princípio do partido político, aparentemente tão importante na teoria de Assis Brasil, desfaz-se na arquitetura do sistema eleitoral que o político riograndense propôs ¾ e precisamente no primeiro turno que, proporcional, deveria retê-lo.

Mas essa lacuna é certamente um tributo do autor à política brasileira de sua época, da qual a política brasileira contemporânea talvez não seja tão diferente.

(Recebido para publicação em janeiro de 1999)

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ABSTRACT

The party quota problem in Brazilian theory and practice concerning the representative mandate

The electoral system affects in advance and decisively the nature of representative mandates and the legitimacy of legislative decisions. Majoritarian systems decrease the density of the representative mandate and, when districts are numerically small in terms of both representatives and constituency, such systems tend to curtail the independence of elected officeholders, whose actions can be monitored by the dominant local groups. On the other hand, proportional systems that operate with numerically large districts maximize the density of representative mandates and, at the same time, ensure the elected officeholder the independent responsibility that characterizes the modern representative mandate. There are, however, three varieties of proportional systems (flexible list, open list, and no list) where the vote cast for candidates from different parties or inter-party electoral coalitions eliminate the party quota and jeopardize party identity both inside and outside the legislative realm. In the Brazilian case, this mechanism follows and reinforces the individualistic and atomistic tradition of the political elites.

Keywords: territorial constituency; voluntary constituency; representative mandate; party quota

RÉSUMÉ

La question du quotient des partis dans la théorie et la pratique brésiliennes du mandat représentatif

Le système électoral influe au préalable et de façon décisive sur la nature du mandat représentatif et la légitimité des décisions législatives. Les systèmes majoritaires diminuent la densité du mandat représentatif et, à l’oeuvre dans des districts peu importants en nombre de représentants et d’électeurs, amènent une réduction de l’indépendance des élus, permettant qu’ils se trouvent sous la coupe de groupes dominants locaux. Les systèmes proportionnels appliqués dans des districts plus importants, par leur nombre de représentants et d’électeurs, élèvent beaucoup la densité du mandat représentatif tout en assurant au représentant une responsabilité indépendante, marque du mandat représentatif moderne. Il y a cependant trois sortes de systèmes proportionnels avec liste des partis souple, ouverte ou sans liste, dans lesquels les voix données à des candidats de partis différents ou la coalition électorale entre partis font disparaître le quotient des partis et portent atteinte à leur identité sur la scène législative et en dehors d’elle: dans le cas brésilien, ce mécanisme obéit à la tradition individualiste et atomiste des élites politiques, tout en la renforçant.

Mots-clés: circonscription territoriale; circonscription volontaire; mandat représentatif; quotient du parti

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  • *
    Este estudo, versão final da
    lecture realizada em setembro de 1998 no Helen Kellogg Institute for International Studies, University of Notre Dame, beneficiou-se particularmente dos comentários generosos e estimulantes de Carlos H. Waisman, Guillermo O’Donnell e Scott Mainwaring à primeira versão. Entretanto, nenhum destes estudiosos tem qualquer responsabilidade sobre as concepções que assumo em questões abertas à controvérsia. Durante nossa estada na University of Notre Dame, minha esposa e eu tivemos o privilégio de contar com bons amigos, cuja cálida acolhida agradecemos: Albert H. Le May, Carlos H. Waisman, Christopher Welna e esposa, Denis e Ana Maria Goulet, Gabor Toka, Gabriela Mossi, Guillermo O’Donnell, Julian Casanova, Mark P. Jones, Michael Coopedge, Roberto e Celeste DaMatta e Scott Mainwaring. Guardamos, de Notre Dame, a recordação vívida do espírito vigoroso, da bondade humana e do carisma de Timothy Scully. O texto ora publicado ganhou muito em inteligibilidade, precisão e elegância, graças à competência e à bondade de Tema Pechman, revisora de
    DADOS. Qualquer dureza ou imperfeição remanescente deve-se à teimosia do autor.
  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      18 Out 1999
    • Data do Fascículo
      1999

    Histórico

    • Recebido
      Jan 1999
    Instituto de Estudos Sociais e Políticos (IESP) da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (UERJ) R. da Matriz, 82, Botafogo, 22260-100 Rio de Janeiro RJ Brazil, Tel. (55 21) 2266-8300, Fax: (55 21) 2266-8345 - Rio de Janeiro - RJ - Brazil
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