Coping religioso/espiritual e nível de esperança em pacientes com câncer em quimioterapia

RESUMO

Objetivo:

demonstrar a relação entre o coping religioso/espiritual e a esperança em pacientes com câncer em tratamento quimioterápico.

Método:

trata-se de um estudo transversal, descritivo, com abordagem quantitativa, realizado em um ambulatório de referência em tratamento quimioterápico de Caruaru-PE, entre agosto e outubro de 2017. Participaram da pesquisa 82 pessoas com câncer em tratamento quimioterápico, utilizando-se a escala de coping religioso/espiritual breve (CRE-Breve) e a escala de esperança de Herth (EEH).

Resultados:

a amostra apresentou escores médios de CRE positivo (3,03 ± 0,41), e o nível de esperança foi considerado alto (42,7 pontos; ± 3,67). Verificou-se que os pacientes que tiveram classificação alta do CRET apresentaram maior média do nível de esperança de Herth (44,12 pontos).

Conclusão:

este estudo torna-se relevante aos profissionais de enfermagem ao encorajar cuidados que contemplem a dimensão espiritual do paciente a fim de estimular os mecanismos positivos do CRE e, consequentemente, elevar os níveis de esperança.

Descritores:
Espiritualidade; Neoplasias; Adaptação Psicológica; Esperança; Enfermagem

ABSTRACT

Aim:

To demonstrate the relationship between religious/spiritual coping and hope in cancer patients undergoing chemotherapy.

Method:

This is a cross-sectional, descriptive study with a quantitative approach performed in a reference outpatient clinic in Caruaru, PE, between August and October 2017. A total of 82 cancer patients undergoing chemotherapy were included in the study, using the brief religious/spiritual coping scale (RCOPE-Brief) and the Herth Hope Scale (HHS).

Results:

The sample presented mean positive RCOPE scores (3.03 ± 0.41) and the level of hope was considered high (42.7 points ± 3.67). Patients who had a high RCOPE score were found to have a higher mean of Herth’s level of hope (44.12 points).

Conclusion:

This study becomes relevant to nursing professionals by encouraging care that takes into account the patient’s spiritual dimension in order to stimulate positive mechanisms of religious coping and, consequently, raise the levels of hope.

Descriptors:
Spirituality; Neoplasms; Psychological adaptation; Hope; Nursing

RESUMEN

Objetivo:

demostrar la relación entre el coping religioso/espiritual y la esperanza en pacientes con cáncer en tratamiento quimioterápico.

Método:

se trata de un estudio transversal, descriptivo, con abordaje cuantitativo, realizado en un ambulatorio de referencia en tratamiento quimioterápico de Caruaru-PE, entre agosto y octubre de 2017. Participaron de la investigación 82 personas con cáncer en tratamiento quimioterápico, escala de coping religioso/espiritual breve (CRE-Breve) y la escala de esperanza de Herth (EEH).

Resultado:

la muestra presentó escores medios de CRE positivo (3,03 ± 0,41) y el nivel de esperanza fue considerado alto (42,7 puntos, ± 3,67). Se verificó que los pacientes que tuvieron clasificación alta del CRET presentaron mayor promedio del nivel de esperanza de Herth (44,12 puntos).

Conclusión:

se vuelve relevante a los profesionales de enfermería para alentar los cuidados que contemplan la dimensión espiritual del paciente a fin de estimular los mecanismos positivos del CRE y, consecuentemente, elevar los niveles de esperanza.

Descriptores:
Espiritualidad; Neoplasias; Adaptación Psicológica; Esperanza; Enfermería

INTRODUÇÃO

No Brasil, o câncer é considerado um problema de saúde pública cuja incidência está em ascensão. Segundo estimativas do Instituto Nacional do Câncer (Inca), foram previstos, para o biênio 2016/2017, cerca de 600 mil novos casos de câncer. Nesta estimativa constatou-se também os tipos de câncer mais incidentes, que são os de próstata e pulmão, no sexo masculino, e de mama, cólon e reto no sexo feminino⁽¹⁾.

Apesar dos avanços tecnológicos nas ciências da saúde, que têm permitido novas formas de tratamento para doenças consideradas verdadeiras fatalidades em tempos passados, o câncer, para a sociedade, continua sendo percebido como uma doença incurável. Em função do “peso” social da enfermidade, associado à incurabilidade e às mudanças no estilo de vida, o diagnóstico de uma doença oncológica desencadeia emoções negativas relacionadas a dor e sofrimento, como também faz emergir do indivíduo a ideia de finitude da vida^(2-3).

Ao suscitar a ideia de proximidade da morte, o câncer atinge o ser humano em sua totalidade biopsicossocial e espiritual, por gerar também indagações de cunho existencial e situações que provocam sentimentos de desesperança. Na busca de um novo significado para essa realidade ameaçadora da vida, a religiosidade e a espiritualidade podem ocasionar efeitos benéficos ao indivíduo, como a redução de experiências perturbadoras devido ao câncer e a melhora de sua qualidade de vida^(2,4).

A espiritualidade tem sido alvo de pesquisas referentes ao seu papel como estratégia de enfrentamento utilizada por pacientes com câncer, tendo em vista sua importância, assim como da religião, ao exercer efeito protetor diante dos impactos negativos advindos da doença oncológica. Nesse aspecto, a espiritualidade é expressa por cada indivíduo de forma peculiar, inerente à sua natureza intrínseca, o que possibilita a renovação da esperança de sobreviver ao câncer, uma vez que as crenças religiosas e espirituais fornecem possibilidades de ressignificar as experiências de vida, principalmente no que concerne ao processo de adoecimento⁽⁵⁾.

Nesse sentido, o coping refere-se a um conjunto de estratégias comportamentais e cognitivas utilizadas para enfrentar situações de estresse. Quando o indivíduo faz uso de sua religião, espiritualidade ou fé como estratégia de enfrentamento para lidar com contextos que podem causar esgotamento físico, mental e espiritual, há o coping religioso/espiritual (CRE)⁽⁵⁾.

No que se refere à esperança, trata-se de um sentimento imprescindível ao enfrentamento do câncer, podendo ser considerada um dos aspectos primordiais para a assistência de enfermagem. Isso porque contribui para a aceitação da nova condição da doença, possibilitando uma maior capacidade de enfrentamento de situações de crise, assim como a manutenção de boas condutas relacionadas a longos períodos de tratamento⁽⁶⁾.

É importante considerar que, durante a quimioterapia, além dos pensamentos que o paciente evoca ao associar o diagnóstico de câncer à impossibilidade de cura, tal forma de tratamento pode agravar ainda mais os sentimentos de medo, ansiedade e desesperança devido a reações medicamentosas que provocam supressão do sistema imunológico. Assim, faz-se necessária a presença de enfermeiros empenhados em identificar esses momentos de fragilidade física, social e espiritual⁽⁷⁾.

Ter conhecimento dos aspectos religiosos e espirituais de um indivíduo significa compreender suas percepções mais profundas, relacionadas ao seu modo de ser e existir no mundo, permitindo ao profissional de saúde um entendimento mais amplo das suas necessidades⁽⁸⁾. É relevante para o enfermeiro compreender os valores das crenças religiosas e espirituais, bem como o nível de esperança de pacientes durante o tratamento do câncer, visando promover uma assistência individualizada ao paciente durante o tratamento quimioterápico.

OBJETIVO

Demonstrar a relação entre o coping religioso/espiritual e a esperança em pacientes com câncer em tratamento quimioterápico.

MÉTODO

Aspectos éticos

Este estudo respeitou os preceitos éticos da Resolução nº 466/2012 do Conselho Nacional de Saúde, sendo a pesquisa aprovada pelo Comitê de Ética em Pesquisa do Centro Universitário Tabosa de Almeida (Asces/Unita).

Desenho, local de estudo e período

Trata-se de estudo transversal, descritivo, com abordagem quantitativa, realizado em um ambulatório de referência em tratamento quimioterápico de Caruaru-PE, entre agosto e outubro de 2017. O ambulatório é referência para pacientes que necessitam de tratamento quimioterápico e recebe pacientes de todo o agreste pernambucano.

População e amostra

O cálculo da amostra mínima necessária para se obter resultados com significância estatística foi feito por meio do programa Sample Size Calculator by Raosoft. Para tal cálculo, foi levada em consideração uma população de 1.200 pacientes cadastrados para tratamento no local do estudo. Considerou-se um erro máximo de 5% e um efeito de delineamento igual a 1. Assim sendo, um número mínimo de 292 pacientes cadastrados fazendo uso da quimioterapia antineoplásica foi estabelecido para que os resultados obtidos tivessem um grau de confiança de 95%.

Critérios de inclusão e exclusão

Participaram do estudo pessoas de ambos os sexos, com idade maior que 18 anos, diagnosticadas com câncer e que estavam em tratamento quimioterápico (curativo e/ou paliativo). Não foram incluídos no estudo pacientes que se encontravam na fase de pós-tratamento, que estavam realizando tratamento radioterápico concomitante à quimioterapia, que apresentavam recidiva do câncer ou aqueles que desconheciam o objetivo do tratamento.

Protocolo do estudo

Os pacientes foram abordados durante as sessões de quimioterapia. Após explanação do objetivo do estudo ao paciente, foi solicitada a assinatura do termo de consentimento livre e esclarecido para participação na pesquisa. Foi necessária a realização de entrevista para que os sujeitos respondessem ao questionário, uma vez que, na maioria das vezes, o membro superior estava puncionado para infusão do medicamento. Durante a entrevista não houve interpretação das questões por parte do entrevistador, nem interferência dos acompanhantes.

Para a coleta de dados, foi utilizada a escala de Coping Religioso/Espiritual Breve (CRE-Breve), a escala de esperança de Herth (EEH) e o questionário adaptado pelo pesquisador^(5,9,10). Tal questionário foi dividido em duas partes: parte A, com o intuito de caracterizar os dados sociodemográficos; e parte B, a fim de assinalar os aspectos clínicos relacionados ao tumor do paciente.

A escala de CRE-Breve, validada por Panzini e Bandeira⁽¹¹⁾, permite avaliar a utilização da espiritualidade/religiosidade pelo indivíduo como mecanismo de enfrentamento quando acometido pela doença. As respostas são dadas em escala tipo Likert de cinco pontos, que variam de 1 (nem um pouco) a 5 (muitíssimo). A escala contém 49 itens, divididos em três dimensões⁽⁵⁾:

• CRE positivo (CREP): corresponde ao nível de coping religioso/espiritual positivo praticado pelo indivíduo, indicado por meio de 34 itens da escala;

• CRE negativo (CREN): corresponde ao nível de coping religioso/espiritual negativo praticado pelo indivíduo, indicado por meio de 15 itens da escala;

• CRE total (CRET): corresponde à quantidade total de CRE praticado pelo indivíduo, indicada por meio da média das respostas do CREP e das médias das respostas invertidas do CREN.

Os parâmetros utilizados para análise dos valores das médias da CRE-Breve foram: nenhuma ou irrisória (1,00 a 1,50); baixa (1,51 a 2,50); média (2,51 a 3,50); alta (3,51 a 4,50); e altíssima (4,51 a 5,00)⁽⁵⁾.

Para a análise do nível de esperança foi utilizada a EEH validada por Sartore e Grossi⁽¹²⁾. Trata-se de uma escala de autorrelato que quantifica a esperança de vida. A escala apresenta 12 itens, escritos de forma afirmativa, em que a graduação dos itens ocorre por escala tipo Likert de 1 a 4 pontos, na qual o ponto 1 indica “discordo completamente” e o 4 indica “concordo completamente”. O escore total varia de 12 a 48, sendo que, quanto maior o escore, mais alto o nível de esperança de vida⁽¹⁰⁾.

Análise dos resultados e estatística

O processamento dos dados foi construído em um banco no programa Epi Info, versão 3.5.4, o qual foi exportado para o software Statistical Package for the Social Sciences (SPSS), versão 18, por meio do qual foi realizada a análise. Para avaliar o perfil pessoal, de moradia, financeiro, religioso e clínico dos pacientes avaliados, foram calculadas as frequências relativas e construídas as respectivas distribuições de frequência. Para comparar os percentuais encontrados nos níveis dos fatores avaliados, foi aplicado o teste qui-quadrado para comparação de proporção. Na avaliação das variáveis quantitativas, foram calculadas as estatísticas: mínimo, máximo, média e desvio-padrão. Para determinar os fatores associados ao coping religioso/espiritual e de esperança dos pacientes avaliados foram aplicados os testes t de Student e o teste da análise de variância (Anova), uma vez que foi indicada a normalidade dos escores de CRE e de EEH pelo teste de Kolmogorov-Smirnov. Todas as conclusões foram tiradas considerando-se o nível de significância de 5%.

RESULTADOS

Dos 292 pacientes selecionados, 210 foram excluídos por não se adequarem aos critérios de inclusão do artigo, dos quais 145 faziam uso de outros fármacos não quimioterápicos, como bisfosfonatos, hormônios e imunoterápicos, e 65 faziam quimioterapia associada à radioterapia. Dessa forma, foram incluídos 82 entrevistados, observando-se que houve predominância de pacientes do sexo feminino, que eram 68 (82,9%). Em relação à cor, 60 (73,3%) eram não brancos, e 37 (45,1%) possuíam idade predominante entre 41 e 59 anos. Sobre a escolaridade, 48 (58,8%) estudaram até o 1º grau. Quanto ao estado civil, 44 (53,7%) possuíam companheiro, 70 (85,4%) possuíam filhos, e 73 (89%) eram procedentes de área urbana. Em relação ao perfil financeiro, 68 (82,9%) possuíam renda de dois salários mínimos ou mais, e 68 (53,8%) eram aposentados, pensionistas ou sem atividade.

Sobre o perfil religioso, 75 (91,5%) possuíam religião e, destes, 56 (68,3%) se declararam católicos. Em relação ao perfil clínico dos pacientes, 50 (61%) tinham câncer de mama, 47 (57,3%) tiveram diagnóstico em até um ano, 69 (86,3%) foram submetidos a quimioterapia adjuvante ou paliativa, e 23 (29%) apresentaram estadiamento IV. Ainda, observou-se que 51 (62,2%) realizaram quimioterapia por até um ano, e 40 (49,4%) realizaram até seis sessões.

Verificou-se que a maioria dos pacientes apresentaram CRET na classificação média (57; 69,5%), seguidos do grupo com classificação alta (25; 30,5%). O teste de comparação de proporção foi significativo (p-valor < 0,001), indicando que o número de pacientes com média classificação do CRE é relevantemente maior (Tabela 1).

Tabela 1
Resultados da distribuição da escala de coping religioso/espiritual breve segundo os domínios e a avaliação total. Caruaru-PE, Brasil, 2017

Classificação do CRE	Domínios do CRE		CRE Total	p-valor1
	Positivo	Negativo
Nenhum ou irrisória	0(0,0%)	24(29,3%)	0(0,0%)	<0,001
Baixa	7(8,5%)	51(62,2%)	0(0,0%)
Média	68(82,9%)	7(8,5%)	57(69,5%)
Alta	7(8,5%)	0(0,0%)	25(30,5%)
Altíssima	0(0,0%)	0(0,0%)	0(0,0%)
Mínimo - máximo	2,06 - 4,12	1,00 - 3,20	2,73 - 4,31	-
Média ± desvio-padrão	3,03 ± 0,41	1,79 ± 0,49	3,39 ± 0,27	-

• Nota: CRE: coping religioso/espiritual;
• ¹
  p-valor do teste qui-quadrado.

Entre os itens avaliados pela EEH, verifica-se, na Tabela 2, que o item de número 2 apresentou a pontuação média mais baixa, de 3,15 (± 0,80), demonstrando que 20,7% da amostra discordava (n = 15) ou discordava completamente (n = 2) da afirmativa “eu tenho planos em curto e longo prazo”. Por outro lado, o item com o escore médio mais alto foi o de número 12, “eu sinto que minha vida tem valor e utilidade”, com a média de 3,88 (± 0,33). Diante disso, 100,0% dos respondentes concordavam (n = 10) ou concordavam completamente (n = 72) com a referida afirmativa. O nível de esperança dos pacientes apresentou escore médio de 42,7 pontos (± 3,67) e mediana de 43 pontos, apresentando pontuações entre 34 e 48 pontos.

Tabela 2
Estatística descritiva da esperança dos pacientes oncológicos em quimioterapia. Caruaru-PE, Brasil, 2017

Variáveis	Média	Desvio- padrão	Mediana	Variação obtida
1. Eu estou otimista quanto à vida.	3,51	0,72	4	1 - 4
2. Eu tenho planos em curto e longo prazos.	3,15	0,80	3	1 - 4
3. Eu me sinto muito sozinho(a).	3,41	0,86	4	1 - 4
4. Eu consigo ver possibilidades em meio às dificuldades.	3,38	0,64	3	1 - 4
5. Eu tenho uma fé que me conforta.	3,82	0,50	4	1 - 4
6. Eu tenho medo do meu futuro.	3,46	0,80	4	1 - 4
7. Eu posso me lembrar de tempos felizes e prazerosos.	3,56	0,63	4	1 - 4
8. Eu me sinto muito forte.	3,70	0,56	4	2 - 4
9. Eu me sinto capaz de dar e receber afeto/amor.	3,70	0,49	4	2 - 4
10. Eu sei aonde eu quero ir.	3,40	0,74	4	2 - 4
11. Eu acredito no valor de cada dia.	3,73	0,47	4	2 - 4
12. Eu sinto que minha vida tem valor e utilidade.	3,88	0,33	4	3 - 4

A Tabela 3 demonstra a relação entre o CRET e o nível de esperança através da EEH. Verifica-se que o grupo com classificação alta do CRET apresentou maior média do EEH (média = 44,12 pontos), seguido do grupo com CRET médio (média = 42,07 pontos). Ainda, observa-se que o teste de comparação de distribuição foi significativo (p-valor = 0,019), indicando que a distribuição do grau do EEH difere entre as classificações do CRET.

Tabela 3
Avaliação da relação entre a escala de coping religioso/espiritual breve e o nível de esperança da escala de Herth. Caruaru-PE, Brasil, 2017

Variáveis	Classificação do CRET		p-valor
	CRET médio	CRET alto
1. Eu estou otimista quanto à vida.	3,46 ± 0,80	3,64 ± 0,49	0,5302
2. Eu tenho planos em curto e longo prazos.	3,04 ± 0,84	3,40 ± 0,64	0,0732
3. Eu me sinto muito sozinho(a).	3,30 ± 0,94	3,68 ± 0,56	0,1272
4. Eu consigo ver possibilidades em meio às dificuldades.	3,26 ± 0,64	3,64 ± 0,57	0,0092
5. Eu tenho uma fé que me conforta.	3,84 ± 0,41	3,76 ± 0,66	0,7862
6. Eu tenho medo do meu futuro.	3,40 ± 0,88	3,60 ± 0,58	0,5372
7. Eu posso me lembrar de tempos felizes e prazerosos.	3,53 ± 0,66	3,64 ± 0,57	0,4742
8. Eu me sinto muito forte.	3,61 ± 0,59	3,88 ± 0,44	0,0212
9. Eu me sinto capaz de dar e receber afeto/amor.	3,67 ± 0,51	3,76 ± 0,44	0,4672
10. Eu sei aonde eu quero ir.	3,35 ± 0,77	3,52 ± 0,65	0,3962
11. Eu acredito no valor de cada dia.	3,75 ± 0,47	3,68 ± 0,48	0,4142
12. Eu sinto que minha vida tem valor e utilidade.	3,86 ± 0,35	3,92 ± 0,28	0,4452
Escore total da escala de Herth	42,07 ± 3,65	44,12 ± 3,37	0,0191

• Nota: CRET: coping religioso/espiritual total;
• ¹
  p-valor do teste t de Student.
• ²
  p-valor do teste Mann-Whitney.

A Tabela 4 apresenta o coeficiente de correlação de Pearson entre os domínios do CRE e o EEH. Verifica-se que o CREP e o CRET possuem correlação diretamente proporcional com o escore de Herth, ou seja, o aumento do CREP e do CRET implicam aumento do EEH. Para o CREN foi verificada uma fraca correlação inversamente proporcional com o escore total de Herth, indicando que o aumento do CREN acarreta uma redução não relevante no nível de esperança do paciente. Mesmo sendo encontradas essas relações, o teste de correlação foi significativo apenas para o escore CRET (p-valor = 0,253), indicando que o CRE altera de forma relevante o nível de esperança.

Tabela 4
Associação entre coping religioso-espiritual e esperança dos pacientes oncológicos em quimioterapia. Caruaru-PE, Brasil, 2017

Domínio avaliado	p-valor1
CRE positivo	0,213
CRE negativo	-0,055
CRE total	0,253

• Nota: CRE: coping religioso/espiritual;
• ¹
  p-valor do teste de correlação de Pearson.

DISCUSSÃO

Por se tratar de uma doença crônica que ameaça a vida, o paciente acometido por câncer muitas vezes se vê diante da “morte”, e isso traz perguntas sobre o significado da vida, angústia, medo e sofrimento, gerando um aumento significativo das necessidades espirituais e podendo resultar em uma crise existencial. Um paciente com câncer experimentará os piores sintomas não apenas por causa dos danos causados pela doença, mas também pela toxicidade dos agentes antineoplásicos, que provocam uma má qualidade de vida, além do sofrimento emocional, social e espiritual^(13-14).

Por isso, prestar cuidado levando em consideração a espiritualidade do indivíduo é uma forma de englobar as necessidades espirituais e promover qualidade de vida. Tais necessidades são a força motriz para a busca de sentido da vida e impulsionam superar o sofrimento e as dificuldades, principalmente para aqueles que têm câncer e estão em tratamento^(15-16).

Um estudo⁽¹⁷⁾ que buscou investigar a relação entre estratégias de coping, qualidade de vida e humor em pacientes com câncer incurável identificou que os pacientes utilizavam, no início do tratamento, diversas estratégias de enfrentamento. Neste estudo, todos os pacientes sob tratamento quimioterápico utilizavam o CRE no intuito de manejar seu estado de saúde.

Observou-se que boa parte dos pacientes do estudo buscam a religião/espiritualidade como forma de enfrentamento da doença neoplásica. No entanto, a forma como o indivíduo faz uso do CRE poderá trazer benefícios, tais como menor incidência de doenças ou complicações durante o tratamento e maior longevidade; ou poderá acarretar maior ansiedade e depressão e menores níveis de esperança e bem-estar espiritual⁽¹⁵⁾. Neste estudo, a predominância de pacientes que apresentaram CREP na classificação média pode indicar que não houve impacto emocional negativo relevante causado pelo câncer graças a comportamentos que definem as estratégias de enfrentamento como positivas, tais como orar pelo bem-estar do próximo e buscar proteção, apoio, amor e orientação em Deus^(18-19).

A forma como o indivíduo emana sua espiritualidade está diretamente relacionada às suas estratégias de enfrentamento, sendo a fé em Deus um sentimento expresso em situações complexas e desfavoráveis. Nesse caso, a religiosidade e a espiritualidade, através da fé, permitem o ajustamento do paciente diante do câncer, podendo ele extrair pensamentos positivos das experiências estressantes, a fim de ocasionar uma mudança de vida⁽²⁰⁾. Aliados às crenças religiosas e espirituais, altos níveis de esperança proporcionam satisfação e bem-estar, elevando a resiliência diante de doenças que ameaçam a vida⁽²¹⁾.

Os resultados obtidos através da EEH (escore total de 42,7 pontos) mostraram-se elevados, assim como num estudo realizado com 96 pacientes em tratamento quimioterápico, que alcançou 40,80 pontos (± 4,45)⁽²²⁾. Num estudo de coorte transversal que buscou identificar o nível de esperança em 60 pacientes oncológicos em início e final de tratamento, foram obtidos 35,8 pontos (± 6,11) no primeiro momento e 36,1 (± 7,12) no segundo momento⁽²³⁾. Outro estudo levantou escore total de 38,06 (± 4,32) em 127 pacientes renais em tratamento hemodialítico⁽¹⁰⁾.

Em relação aos itens da EEH que atingiram excelentes pontuações, a afirmativa “eu tenho uma fé que me conforta” apontou que os pacientes possuem a fé como componente espiritual valioso para manutenção do bem-estar, auxiliando numa perspectiva satisfatória para o enfrentamento e proporcionando satisfação de vida. Ademais, isso indica a possiblidade de se relacionar com Deus e com forças transcendentais por meio de orações para reforçar a perspectiva de melhora de saúde e qualidade de vida no futuro, o que denota, também, tolerar características estressoras vividas no momento presente, ao longo do tratamento⁽²¹⁾.

Os resultados encontrados neste estudo apresentam semelhança com a realidade levantada por outro estudo, no qual o item “eu sinto que minha vida tem valor e utilidade” apresentou maior pontuação⁽²³⁾. Ressalta-se que os pacientes, apesar de possuírem uma doença em que há forte tendência a fragilizar os aspectos físicos, sociais, mentais e espirituais, reconhecem que a vida é um bem maior, superior a qualquer circunstância adversa que tanto o câncer como, possivelmente, o tratamento impõem. Como consequência da consciência desse valor inerente à existência humana, vem o autorreconhecimento expresso através do sentimento de utilidade, permitindo compartilhar seus valores, ações e sentimentos com os outros.

No entanto, tais autores identificaram que o item que apresentou menor pontuação (média de 2,67 e ± 1,05) foi a afirmativa “eu me sinto muito sozinho”, em contrapartida com este estudo, que teve a afirmativa “eu tenho planos em curto e longo prazo” com menor pontuação (média de 3,15 e ± 0,80). Desse modo, é relevante refletir sobre a atuação dos profissionais inseridos no processo de cuidar de pacientes sob tratamento quimioterápico, buscando implementar ações de caráter subjetivo, como a escuta ativa, para colher queixas e compreender os sentimentos que possam comprometer os níveis de esperança⁽²³⁾.

A associação positiva entre o maior escore de esperança e o alto CRET indica que é relevante direcionar cuidados relativos à dimensão espiritual do sujeito, tendo em vista que os resultados de um estudo⁽⁵⁾ apontam que pacientes em tratamento quimioterápico consideram a religião/espiritualidade como ferramenta importante para o enfrentamento da doença, mas poucos foram abordados em relação a tal temática.

Diante disso, realizar intervenções de natureza espiritual levando em consideração o CRE do paciente pode mostrar ao profissional as estratégias de coping utilizadas pelo sujeito e instigá-lo a refletir sobre eventuais perspectivas deletérias que estão repercutindo negativamente em sua saúde, já que, durante a assistência de enfermagem, o ser é percebido em suas dimensões biopsicossocial e espiritual. Consequentemente, buscar aspectos positivos dessas estratégias irá reverberar na elevação e na manutenção da esperança ao longo do tratamento, tendo em vista que a prevalência da desesperança em pacientes com câncer está relacionada ao sofrimento espiritual e a menores níveis de bem-estar espiritual^(13-14).

Limitações do estudo

Este estudo apresentou limitações durante a coleta de dados pois alguns pacientes que residiam em municípios fora do local do estudo demonstraram certo grau de apreensão durante a aplicação dos questionários, com receio de perderem o transporte oferecido pela prefeitura do município para retornarem a suas residências. O espaço no qual eram realizadas as entrevistas era pequeno e não comportava muitos pacientes, o que dificultou entrevistar um maior número de pessoas. Muitos dos pacientes eram analfabetos e, durante a entrevista, foi requerido do entrevistador explicar algumas perguntas para maior entendimento do entrevistado. Como o local de coleta dos dados não apresentava um sistema computacional capaz de identificar a quantidade exata de pacientes em quimioterapia, houve dificuldade em realizar o cálculo de população para o estudo, sendo este efetuado de acordo com número total de pacientes atendidos no ambulatório, o que resultou em uma população de estudo alta, que foi reduzida drasticamente devido aos critérios de exclusão propostos para o estudo.

Contribuições para a área de enfermagem, saúde ou população pública

Levando em consideração o contexto apresentado, este estudo aponta a relevância de enfermeiros, inseridos na assistência ao paciente em tratamento quimioterápico, considerarem a dimensão espiritual como componente fundamental no processo de cuidado. Nesse sentido, o cuidado será um elemento propulsor para potencializar positivamente os mecanismos de enfrentamento religioso/espiritual que esses pacientes manejam antes, durante e após cada sessão de quimioterapia, bem como para desenvolver um olhar direcionado à esperança do paciente e de sua família.

Diante desse cenário, reforça-se a figura do enfermeiro como protagonista do processo de cuidado ao estabelecer, na relação enfermeiro-paciente-família, um vínculo que permeará valores humanísticos e ideais metafísicos, de modo a enaltecer um olhar integral voltado a essa tríade. Por meio da inserção da espiritualidade, o ato de cuidar abarcará a dimensão objetiva e subjetiva do paciente e da família que vive a experiência do tratamento quimioterápico.

CONCLUSÃO

Este estudo evidencia que grande parte dos pacientes apresentaram CREP em classificação média como estratégia de enfrentamento. Além disso, apresentaram altos níveis de esperança durante o tratamento quimioterápico, comparando-se com outros estudos realizados. Em relação às afirmativas contidas na EEH, a maioria dos pacientes se valorizam e se sentem úteis diante da sociedade, mesmo sendo submetidos periodicamente ao tratamento quimioterápico. Ainda assim, foi mostrado que indivíduos que apresentam estratégias de coping positivas apresentam altos níveis de esperança.

Tal estudo se mostra relevante para os profissionais de enfermagem pois, por estarem em contato direto com o paciente e seus familiares ao longo da terapia quimioterápica, eles possuem a oportunidade de estabelecer uma relação em que se torna possível detectar as necessidades religiosas e espirituais do binômio paciente-família. Por conseguinte, o cuidado voltado à espiritualidade será direcionada ao indivíduo, respeitando-se sua concepção de mundo, o que trará benefícios ao utilizar positivamente suas estratégias de enfrentamento, manter e elevar a sua esperança.

Dessa forma, sugere-se que sejam realizados mais estudos que busquem demonstrar a relação entre os níveis de esperança e de coping religioso/espiritual de pacientes com câncer, em diferentes momentos ao longo do tratamento, de modo a identificar os possíveis fatores que influenciem esses níveis e, consequentemente, promover saúde numa perspectiva holística.

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Datas de Publicação

• Publicação nesta coleção
  27 Jun 2019
• Data do Fascículo
  May-Jun 2019

Histórico

• Recebido
  16 Jul 2018
• Aceito
  16 Fev 2019