Liderança transformacional na prática de enfermeiros: desafios e estratégias

RESUMO

Objetivo:

compreender os desafios e quais as estratégias adotadas por enfermeiros para o exercício da Liderança Transformacional em um hospital universitário.

Métodos:

estudo qualitativo e exploratório, do qual participaram 25 enfermeiros atuantes em um hospital universitário no estado da Bahia, Brasil. Os dados foram coletados por meio de entrevistas semiestruturadas e categorizados conforme Análise Temática, com auxílio do software Nvivo.

Resultados:

os desafios prevalentes envolveram: pouco incentivo da instituição para a formação de líderes; inexperiência profissional e jovialidade; resistência à liderança e insubordinação. As estratégias adotadas pelos enfermeiros consistem em atuar como exemplos da equipe e estabelecer relações dialógicas.

Considerações finais:

a prática da Liderança Transformacional demonstrou ser relevante no cotidiano dos enfermeiros e contribui para a qualidade da assistência.

Descritores:
Liderança; Enfermagem; Serviços de Saúde; Recursos Humanos de Enfermagem; Hospitais Universitários

ABSTRACT

Objective:

to understand the challenges and strategies adopted by nurses for the exercise of Transformational Leadership in a university hospital.

Methods:

qualitative and exploratory study, in which 25 nurses working in a university hospital in the state of Bahia, Brazil participated. Data collection took place through semi-structured interviews and categorized according to Thematic Analysis, using Nvivo software.

Results:

The prevalent challenges involved: lack of encouragement from the institution for the training of leaders; professional inexperience and young age; resistance to leadership and insubordination. The strategies adopted by nurses consist of acting as team examples and establishing dialogic relationships.

Final considerations:

The practice of Transformational Leadership has been relevant in the daily lives of nurses and contributes to the quality of care.

Descriptors:
Leadership; Nursing; Health services; Nursing Staff; University, Hospitals

RESUMEN

Objetivo:

comprender los desafíos y estrategias adoptadas por los enfermeros para el ejercicio del Liderazgo Transformacional en un hospital universitario.

Métodos:

estudio cualitativo y exploratorio, en el que participaron 25 enfermeros que trabajan en un hospital universitario en el estado de Bahía, Brasil. Los datos se recopilaron a través de entrevistas semiestructuradas y se clasificaron de acuerdo con el Análisis Temático, con la ayuda del software Nvivo.

Resultados:

los desafíos predominantes involucraron poco incentivo de la institución para la formación de líderes; inexperiencia profesional y jovialidad; resistencia al liderazgo y la insubordinación. Las estrategias adoptadas por los enfermeros consisten en actuar como ejemplos de equipo y establecer relaciones dialógicas.

Consideraciones finales:

se ha demostrado que la práctica del Liderazgo Transformacional es relevante en la vida diaria de los enfermeros y contribuye a la calidad de la atención.

Descriptores:
Liderazgo; Enfermería; Servicios de salud; Recursos Humanos de Enfermería; Hospitales Universitarios

INTRODUÇÃO

A liderança destaca-se como uma das competências gerenciais necessárias à prática de enfermeiros, sobretudo no atual contexto de frequente superlotação e escassez de leitos, déficit de recursos materiais e dimensionamento insuficiente de pessoal. A realidade de alguns serviços públicos de saúde possui fragilidades no atendimento à população e carece de enfermeiros com conhecimentos, habilidades e atitudes para atuar como líderes, capazes de contribuir construtivamente para o alcance dos objetivos e atender às necessidades de saúde dos usuários.

Enquanto competência gerencial, a liderança interfere diretamente na satisfação profissional do enfermeiro e da equipe, no sentido de promover um ambiente de trabalho saudável, que confira visibilidade à profissão e facilite o gerenciamento do cuidado^(1-2). Como a liderança é um aspecto central no processo de gerenciamento do cuidado, são necessários profissionais qualificados para alcançar metas de promoção da assistência com qualidade e priorizar a eficácia no trabalho, no processo de gestão de pessoas, e no provimento de recursos materiais e físicos adequados⁽³⁾.

No cenário internacional, pesquisas^(2,4-5) demonstram a importância da liderança no ambiente hospitalar, e a necessidade de implementar programas que favoreçam o desenvolvimento desta capacidade, especialmente entre enfermeiros.

Neste estudo, optou-se pela vertente teórica da Liderança Transformacional, apesar de existirem outras abordagens, pois quando esta é exercida por enfermeiros no ambiente de trabalho, gera confiança na equipe e, consequentemente, contribui para maior eficácia do líder⁽⁶⁾.

Pesquisadores⁽⁷⁾ definem a Liderança Transformacional como um conjunto de ações transformadoras promovidas pelo líder sobre seus seguidores, no sentido de ampliar a conscientização sobre a importância das atividades realizadas e do trabalho bem feito, atuando em defesa da missão da organização e do alcance de suas metas. Além disso, esse modelo permite enxergar as necessidades pessoais e profissionais do outro⁽⁶⁾.

Os autores⁽⁷⁾ descrevem quatro elementos que fundamentam a Liderança Transformacional, aos quais se referem como os “Quatro Eus”, sendo eles: a) Influência idealizada: os líderes transformacionais são modelos a serem seguidos, admirados e respeitados, por metas idealizadas ou aspectos comportamentais, tidos como confiáveis e descritos em termos de senso de valores, crenças e missão a ser alcançada, com altos padrões éticos e morais; b) Motivação inspirada: relaciona-se à capacidade do líder inspirar confiança, motivação e um senso de propósito em seus seguidores. Exige boa capacidade de comunicação, otimismo em alcançar a meta e entusiasmo; c) Estimulação intelectual: líder que encoraja e valoriza a criatividade, e estimula a participação na tomada de decisão e autonomia; e d) Consideração individualizada: líder que enxerga os indivíduos e suas necessidades, tanto pessoais quanto profissionais, não os vendo apenas como funcionários. Esse modelo de liderança permite criar oportunidades de aprendizagem e demonstra aceitação às diferenças individuais.

A perspectiva teórica da Liderança Transformacional pode ser adotada para diversos objetos de investigação. Estudo⁽⁸⁾buscou sintetizar estratégias pedagógicas para aplicar essa modalidade de liderança no ensino da segurança de medicamentos adotando os quatro elementos supracitados. Foi identificado que essa Liderança se caracteriza pelo foco do enfermeiro enquanto educador e no desenvolvimento das habilidades dos estudantes, pela criação de uma cultura de apoio e incentivo à criatividade, motivação e comportamento ético entre os envolvidos no processo de ensino aprendizagem.

Da mesma forma, estudos em outros países^(9-10) com diretores, gestores, encarregados de enfermagem e profissionais de diferentes cenários hospitalares, demonstraram a relevância da Liderança Transformacional exercida pelo enfermeiro. Ela permite agregar e desenvolver habilidades essenciais ao fortalecimento do profissional e da instituição, com resultados positivos no comprometimento e satisfação da equipe e de seus pacientes.

A Liderança Transformacional desponta como uma vertente teórica que propõe novas possibilidades de se pensar e aplicar essa competência em diversos contextos, sendo pertinente para várias profissões. Estudos acerca da Liderança Transformacional com enfermeiros no ambiente hospitalar são importantes pelo suporte teórico, amplitude e flexibilidade oferecidos por essa perspectiva. Diante do exposto, a condução deste estudo foi norteada pela seguinte questão: “quais os desafios e as estratégias adotadas por enfermeiros para o exercício da Liderança Transformacional em um hospital universitário?”

A pesquisa visa colaborar com o reconhecimento dos desafios que interferem no exercício da liderança e das estratégias adotadas por enfermeiros para fortalecer e conduzir sua prática, além de fornecer subsídios para aprimorar a dinâmica institucional e o relacionamento entre os membros da equipe de enfermagem, o que favorece o gerenciamento do cuidado.

OBJETIVO

Compreender os desafios e quais as estratégias adotadas por enfermeiros para o exercício da liderança transformacional em um hospital universitário.

MÉTODOS

Aspectos éticos

O estudo atendeu às diretrizes e normas regulamentadoras envolvendo pesquisas com seres humanos, de acordo com a Resolução nº 466/12 do Conselho Nacional de Saúde do Ministério da Saúde. Foi aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa da Universidade Federal da Bahia. Foram respeitados os preceitos éticos de confidencialidade e o direito de desistir da pesquisa a qualquer momento sem nenhum prejuízo. Os participantes assinaram o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido em duas vias, ficando uma em posse do participante e outra do pesquisador.

Tipo de estudo

Pesquisa exploratória, qualitativa. O referencial teórico adotado foi a perspectiva de Liderança Transformacional de Bass e Avolio⁽⁷⁾ e metodologia de análise dos dados foi a análise de conteúdo, com recurso aos pressupostos de Minayo⁽¹¹⁾.

Cenário do estudo

Estudo realizado em um hospital universitário na Bahia, que presta atendimento especializado de média e alta complexidade pelo Sistema Único de Saúde, especificamente em um complexo hospitalar e ambulatorial de ensino e pesquisa composto pelas unidades ambulatorial, pediátrica e hospitalar. Desde 2012, a instituição é administrada por uma Empresa Brasileira Pública de Direito Privado (EPDP) vinculada ao Ministério da Educação e tem como finalidade administrar hospitais universitários federais.

Fonte de dados

A população desse estudo foi composta por enfermeiros assistenciais e gerenciais de um universo de 237 profissionais. O quantitativo de participantes foi definido mediante sorteio aleatório simples utilizando o programa Microsoft Excel 2010. Para o sorteio, os nomes dos enfermeiros foram organizados em ordem alfabética e identificados por números. Nesse estudo, foram entrevistados 25 enfermeiros e esse quantitativo foi baseado no critério de saturação das informações, alcançado por análise preliminar, quando os depoimentos dos entrevistados não acrescentaram novas informações relevantes aos resultados. Os critérios de inclusão se restringiram a ser enfermeiro e atuar há no mínimo seis meses no hospital. Profissionais afastados por qualquer motivo durante o período da coleta de dados foram excluídos do sorteio.

Coleta e organização dos dados

Os dados foram coletados entre setembro e novembro de 2017. Entrevistas semiestruturadas foram realizadas pela pesquisadora e dois estudantes de graduação em iniciação científica e duraram 30 minutos em média. Foram utilizados dois gravadores para que nenhum dado fosse perdido em virtude de eventual falha em um dos aparelhos. As entrevistas foram agendadas previamente em dias e horários escolhidos pelos participantes, realizadas na própria instituição, em espaço reservado e de forma individual, para assegurar a privacidade de cada entrevistado. Buscou-se informações sobre a caracterização dos entrevistados quanto a idade, sexo, vínculo empregatício e formação. Como questão norteadora, foram utilizadas duas perguntas: quais estratégias você costuma utilizar para facilitar o exercício da liderança? Quais dificuldades você poderia destacar para o exercício da liderança? Durante as entrevistas, quando emergiam comportamentos relacionados à liderança transformacional, outras perguntas eram feitas a fim de aprofundar o tema e obter maiores esclarecimentos para facilitar o entendimento do pesquisador e revelar as dificuldades e estratégias para o exercício da liderança no ambiente hospitalar.

Análise dos dados

Os dados foram organizados e tratados com auxílio do software Nvivo 11.0 e analisados de acordo com a técnica de Análise de Conteúdo na modalidade de Análise Temática¹¹. Operacionalmente, essa técnica se desdobra em uma pré-análise dos dados mediante leitura flutuante e constituição do corpus, com formulação e reformulação de hipóteses e objetivos, seguida da exploração do material, tratamento dos resultados obtidos e interpretação.

O processo de análise culminou em três categorias temáticas. Para esse manuscrito, a partir dos objetivos, foram utilizados “Desafios para o exercício da Liderança Transformacional” e “Estratégias para o exercício da Liderança Transformacional”.

A fim de preservar o anonimato, foi atribuída a letra “E” a todos os enfermeiros, acompanhada do número recebido conforme a ordem de sorteio, após aceitarem participar da pesquisa (por exemplo: E1, E2 até E25).

RESULTADOS

Os entrevistados tinham entre 28 e 49 anos de idade, 92% (n=23) eram do sexo feminino e 8% (n=2) do masculino. Em relação ao vínculo empregatício, 92% (n=23) eram celetistas e apenas 8% (n=2) estatutários. Quanto à formação, os participantes relataram ter entre cinco e 19 anos desde a conclusão do curso, sendo 88% (n=22) pós-graduados, 8% (n=2) em fase de conclusão de curso e um não quis responder a esta pergunta. Desse total, cinco em níveis stricto sensu (doutorado e mestrado) e 19 lato sensu.

Desafios para o exercício da Liderança Transformacional

Esta categoria evidenciou a presença de três subcategorias, que retratam as dificuldades enfrentadas para o exercício da Liderança Transformacional: pouco incentivo da instituição para formação de líderes; inexperiência profissional e jovialidade; e resistência à liderança e insubordinação.

Pouco incentivo da instituição para a formação de líderes

Esta subcategoria identificou que o reconhecimento da liderança como uma habilidade própria do enfermeiro foi um desafio para a instituição, independentemente do cargo ocupado pelo profissional. Este fato contribuiu para fragilizar esse estilo de liderança, evidenciou o pouco incentivo da instituição para a qualificação dos líderes e a insatisfação dos enfermeiros nesse contexto, como mostram as falas a seguir:

Vejo a implementação da liderança, cada vez mais, sendo podada nesse processo. (E21)

Tem a enfermeira aqui que é referência, que fica mais na parte administrativa. Elas estão tendo capacitação em liderança. Elas têm tido, mas nós somos em cinco, uma está tendo essa formação, sendo que a nossa profissão exige isso, então deveria ter. (E02)

Inexperiência profissional e jovialidade

A inexperiência emergiu de forma significativa nos depoimentos, acompanhada de um prejulgamento relacionado à idade. Os enfermeiros mais jovens enfrentaram dificuldade para serem acolhidos pela equipe como líderes, o que por vezes sugere preconceitos. A jovialidade foi um aspecto questionado pelos demais profissionais acerca da capacidade profissional de alguns participantes do estudo, o que também evidenciou barreiras para que pessoas mais experientes aceitassem ser lideradas por eles. Essa destacou-se como uma das dificuldades para o exercício da liderança transformacional:

No início, era mais por conta da minha idade. Então, no início, tem muito essa questão da pessoa ser mais nova: “ah, ela é mais nova que eu e eu vou receber ordens?” (E23)

Trabalhar com pessoas que acham que, por terem anos de profissão, sabem tudo. (E20)

Resistência à liderança e insubordinação

A resistência dos colaboradores em aceitar a liderança exercida pelo enfermeiro vinculou-se à desconfiança em relação ao reconhecimento acumulado por este profissional.

Houve relatos de conflitos emergentes entre os líderes e os profissionais que atuam como técnicos de enfermagem, mas são graduados em enfermagem. Os técnicos passam a questionar as decisões do enfermeiro, que, por sua vez, reconhece nessa atitude uma postura de insubordinação:

Vejo que, em alguns casos, existe um conflito, talvez de posição. Nós temos hoje técnicos que são enfermeiros, mas na instituição não atuam como, e talvez passem a não se ver como técnicos, e aí pega aquele conhecimento adquirido como enfermeiro e quer entrar em confronto com aquele que está exercendo de fato. Então, essa situação talvez seja o que torne as coisas mais difíceis. (E14)

Outra situação de resistência identificada nos depoimentos dos participantes envolve a atuação de líderes contratados sob diferentes vínculos empregatícios, como ilustra o depoimento:

Dificulta no sentido de que nós temos diversos vínculos empregatícios na instituição, tem o estatutário, o celetista. Então, querendo ou não, há sim, preconceito ainda! [...] Tudo isso você sente a resistência. Como é que eu vou ser liderada por um vínculo que talvez seja mais superficial, inferior ao meu? (E22)

Estratégias para o exercício da Liderança Transformacional

Os relatos dos enfermeiros entrevistados possibilitaram a construção de duas subcategorias que evidenciam as estratégias por eles utilizadas para o exercício da liderança, a saber: Liderança pelo exemplo; e Relações dialógicas.

Liderança pelo exemplo

Os enfermeiros destacaram a necessidade de atuar pelo exemplo para exercer uma liderança positiva, e consideraram ser esta uma estratégia fundamental.

E acho que a gente acaba sendo um bom líder pelo exemplo, pelo agir, acho que a gente ensina muito mais quando a gente faz do que quando a gente manda a pessoa fazer. Se a pessoa vê em mim que eu sou uma pessoa atuante, que eu concluo meu serviço, acho que acabo passando isso para a pessoa, pela forma de agir nos trabalhos. (E09)

Mostrando meu exemplo, com pontualidade, cordialidade... (E15)

Relações dialógicas

Das diversas estratégias utilizadas por enfermeiros para o exercício desse estilo de liderança, o diálogo e a escuta atenta foram expressivamente mencionados. Através desse comportamento, o líder consegue enxergar as necessidades dos seus colaboradores, do setor e da instituição, para assim, promover a liderança.

O diálogo com os profissionais, com toda a equipe. Dialogar e tentar ver o que, de fato, estará de senso comum entre todos. O que todo mundo concorda, o que as pessoas estejam concordando. (E12)

A outra estratégia é uma liderança mais democrática e uma relação mais horizontal, em que a equipe veja que o líder realmente se preocupa com os problemas que acabam acontecendo dentro do próprio setor. Essa forma de escuta e uma relação mais horizontal é o que eu faço para estabelecer minha relação de liderança. (E07)

DISCUSSÃO

O exercício da liderança nem sempre é facilitado e encontra barreiras, o que pode recair diretamente sobre a qualidade da assistência prestada ao usuário e prejudicar o nível de satisfação no trabalho dos colaboradores.

A falta de apoio e garantia das instituições para proporcionar ambientes fomentadores dessa habilidade pode afetar o desenvolvimento da liderança, quando ela é vista como algo inerente ao profissional, que deve realizar um trabalho de excelência, de acordo com as expectativas do chefe, e tendo como principal incentivo a necessidade de assegurar o emprego⁽¹²⁾. Estudos^(6,9) evidenciam a importância do incentivo das instituições de saúde para formar enfermeiros líderes, a fim de melhorar a satisfação no trabalho e a efetividade das ações. Para tanto, esses profissionais devem ser estimulados a adotar um estilo de liderança, e motivados a aprimorar os atributos comportamentais, organizacionais e relacionais considerados essenciais para o enfrentamento de diversas situações.

Implementar a Liderança Transformacional nas instituições favorece as relações com a equipe e, portanto, o alcance de objetivos comuns. A atuação de um líder transformacional é capaz de transformar o ambiente de trabalho em seus diversos cenários e situações. Líderes transformacionais são caracterizados como visionários e estrategistas por sua capacidade de cativar e entusiasmar a equipe, além de organizarem o trabalho⁽¹³⁾.

A Liderança Transformacional favorece o envolvimento dos colaboradores no cumprimento da missão proposta em prol do coletivo, motivados para além de interesses individuais. Nesse sentido, fomenta-se o interesse por mudanças na cultura da organização que objetivem potencializar as ações e conferir maior segurança na tomada de decisões⁽¹⁴⁾.

A pouca idade associada à inexperiência foi um dos obstáculos identificados no estudo, o que evidenciou um prejulgamento quanto à capacidade do profissional. Embora a liderança faça parte do exercício profissional do enfermeiro, nem sempre se constitui uma prática fácil e a falta de posicionamento desse profissional pode colocar a sua credibilidade em risco⁽¹⁵⁾. De fato, a pouca prática, insegurança e formação acadêmica deficiente podem prejudicar o desenvolvimento dessa habilidade⁽¹⁶⁾, e em alguns casos, frustrar e desmotivar o enfermeiro em assumir o posto de líder da equipe. Mas em outras situações, tais características podem ser um estímulo para superar as dificuldades e assim, buscar qualificação para exercer uma Liderança Transformacional⁽¹⁵⁾.

Nessa conjuntura, a falta de incentivos da organização para promover e estimular o desenvolvimento da liderança compromete a eficiência e a qualidade dos serviços prestados⁽¹⁷⁾, o que torna imprescindível o apoio e o acompanhamento desse profissional durante seu processo de adaptação, para enfrentar as dificuldades encontradas^(3,18).

Por sua vez, tais dificuldades podem contribuir para consolidar a resistência da equipe de enfermagem. A posição do enfermeiro diante de um técnico de enfermagem com o mesmo grau de formação é outro ponto que tem gerado resistência à liderança, seja pelo anseio do colaborador em mostrar conhecimento e preparo para estar na mesma posição do enfermeiro, ou pela dificuldade deste último em acolher as sugestões e críticas do outro.

Trata-se de um contexto que torna ainda mais relevante o exercício da liderança no sentido de promover mudanças que favoreçam o respeito e reconhecimento necessários para uma liderança efetiva e adequada. O líder caracteriza-se por seu comportamento moral e ético, acessível, empático, motivador e inspirador, compreensível às necessidades do outro, além de focado na missão da organização⁽⁷⁾.

Talvez, se ao invés de se sentirem ameaçados ou incomodados com as contribuições de outros trabalhadores, esses enfermeiros as utilizassem em prol do crescimento do grupo, esse tipo de situação poderia ser melhor gerenciada e percebida. Quando o líder é favorável ao diálogo e tem uma relação de empatia frente ao posicionamento dos colaboradores, ele consegue motivar e inspirar a equipe, de forma a criar um vínculo de confiança com suas ações e decisões, pois creem numa relação de escuta, ensino e ajuda no que for preciso^(2,19). Ao mesmo tempo, o líder consegue sanar quaisquer dúvidas ou receios da equipe sobre a nova liderança, independente do vínculo empregatício.

O aspecto anterior se confirma ao identificar que os achados referentes à subcategorias Liderança pelo exemplo e Relações dialógicas fomentam o potencial de desenvolvimento de líderes transformacionais. Foi possível observar que o exercício da liderança orientado pelo exemplo representou a forma mais rápida e fácil de ensinar, notando-se reconhecimento, aceitação e cumprimento das ações delegadas, o que oportuniza uma relação horizontalizada. Além disso, o ato do enfermeiro realizar as mesmas atividades dos demais e conseguir finalizá-las é um ótimo motivador e influenciador para que os colaboradores sigam a mesma postura. O líder proativo tende a estimular a sensação de gratidão, companheirismo, respeito e confiança dos colaboradores, preceitos defendidos por Bass⁽²⁰⁾ acerca da Liderança Transformacional.

Investigadores lembram que a atuação participativa do enfermeiro o aproxima da equipe durante a execução dos serviços, tornando-o referência para o grupo e apoiador da assistência de qualidade em benefício dos pacientes⁽²¹⁾. O líder, quando engajado e efetivamente integrado nas atividades da equipe, favorece o sentimento de cooperação e melhora as relações interpessoais, o que consequentemente contribui para reduzir conflitos, aumentar a confiança e criar um ambiente saudável⁽²²⁾. Aproveitar esses momentos para aproximação da equipe pode constituir uma estratégia na construção de uma relação interpessoal pautada na confiança e respeito mediante o exemplo do líder e o diálogo. Essas situações demandam que o líder seja carismático em sua essência, capaz de influenciar e entusiasmar a equipe, um aspecto comum ao estilo de Liderança Transformacional e que tende a conferir admiração e alto grau de confiança⁽¹⁴⁾.

Nessa dinâmica, o diálogo é uma ferramenta indispensável para o exercício da liderança pelo enfermeiro, pois amplia o espaço para a explanação e acolhimento das ideias, momento em que o líder pode se posicionar, encaminhar os problemas, escutar, avaliar e implementar ideias criativas e resolutivas, escutar as dificuldades e facilidades dos colaboradores e auxiliar no enfrentamento e superação dos desafios^(19-23). Esses aspectos são comuns na prática da Liderança Transformacional⁽¹⁴⁾, quando o líder encoraja seus colaboradores a resolver os problemas levantados e os envolve na tomada de decisões.

Apesar desses benefícios, atualmente, algumas críticas são direcionadas ao modelo teórico da Liderança Transformacional. Estudos internacionais reforçam fragilidades da liderança transformacional e questionam a moralidade deste modelo. Alega-se que esse tipo de liderança tem forte potencial para motivar seguidores por meio de fortes emoções, independentemente dos efeitos provocados. Nos casos em que o líder utiliza mecanismos subjacentes para influenciar sua equipe, essa postura é inclusive considerada incompatível com os valores morais. Nesse aspecto, a Liderança carece de freios e contrapesos de interesses compensatórios e para ser autêntica e benéfica, deve valorizar os princípios de honestidade, lealdade, justiça e respeito aos direitos humanos^(24-25). Autores⁽²⁴⁾ refletem que na saúde, o objetivo estaria em liderar uma mudança transformadora ao invés de mudar para ser um líder com características transformadoras.

Ao analisar os resultados do presente estudo acerca do exercício da Liderança Transformacional de um grupo de enfermeiros com o apoio do referencial teórico de Bass⁽¹⁴⁾, foi possível identificar as contribuições desse estilo de liderança para o gerenciamento do cuidado nas mais variadas perspectivas. Apesar dos desafios serem comuns ao cotidiano do líder, eles são melhor superados quando é utilizado um estilo de liderança que permita o desenvolvimento de uma relação interpessoal pautada no respeito e confiança, mais horizontalizada e aberta à escuta e empatia.

Os enfermeiros que exerceram um perfil de Liderança Transformacional mostraram-se mais abertos para sugestões e atentos às necessidades dos usuários e da equipe. Este modelo promove a integração dos seus membros por orientá-los para as tarefas conforme a capacidade técnica de cada um, o que otimiza a força de trabalho.

Limitações do estudo

Embora o objetivo desse estudo tenha sido alcançado, a realização de entrevistas apenas com enfermeiros foi considerada como uma limitação, pois abriu margem para futuros estudos que investiguem se a percepção desses profissionais é compatível com a dos demais membros da equipe de enfermagem.

Contribuições para a enfermagem

O presente estudo contribuiu para reflexões acerca da relevância da Liderança Transformacional exercida por enfermeiros na prática hospitalar e evidenciou os principais desafios enfrentados por esses profissionais nas situações em que atuaram como líderes. Além disso, permitiu identificar as estratégias disponíveis para melhorar a assistência e a vivência no ambiente de trabalho por meio do exercício deste estilo de liderança.

Merece destaque o fato desse estudo ter sido realizado em um hospital de referência, com uma gestão inovadora ,70 anos de serviços à população e uma nova conformação dos profissionais. Nesse contexto, os funcionários, alguns com significativo tempo de atuação e outros recém-chegados, precisam se adaptar a essas mudanças. Por isso, é essencial acompanhar o perfil de liderança presente no hospital.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

O desenvolvimento do presente estudo desvelou desafios e as estratégias adotadas pelos enfermeiros no exercício da Liderança Transformacional, com ênfase em algumas habilidades fundamentais para aqueles que desempenham este papel no contexto hospitalar, sobretudo carisma, diálogo e liderança pelo exemplo. A atuação de um líder com tais habilidades favorece o gerenciamento do cuidado, pois inspira e motiva a equipe de enfermagem e contribui para a qualidade da assistência. Os enfermeiros reconhecem a importância da liderança como algo que favorece a autonomia de todos envolvidos no processo de trabalho de enfermagem, principalmente para gerenciamento de conflitos, tomada de decisões e comunicação com a equipe.

Diante do exposto, a Liderança Transformacional mostrou-se uma forma adequada de liderar, pois possibilita enfrentar alguns desafios que dificultam o reconhecimento da atuação do enfermeiro como líder. O estudo identificou a necessidade de as instituições investirem no impulso da liderança entre os enfermeiros como forma de capacitá-los para o enfretamento e gerenciamento de conflitos e resolução de problemas, independente do cargo hierárquico ocupado (assistencial ou administrativo). Além disso, a inexperiência e o pré-julgamento da equipe em relação à jovialidade de alguns dos enfermeiros recém-contratados também poderiam ser melhor trabalhados se houvesse uma cultura de capacitação de líderes na instituição.

Também foram identificadas estratégias que permitiram o exercício da liderança transformacional, como a liderança pelo exemplo e o diálogo. O enfermeiro proativo mostra de forma prática a importância de um trabalho bem feito e focado em uma assistência de qualidade e contribui para uma melhor relação interpessoal como forma de facilitar o diálogo com os colaboradores. O diálogo foi identificado como uma importante ferramenta para a liderança e permitiu abertura para uma relação horizontalizada e fortalecimento do respeito e confiança. Os enfermeiros que atuam como líderes transformacionais necessitam desempenhar este papel com extrema responsabilidade moral e respeito pela equipe de enfermagem, sempre atentos à satisfação desses profissionais no ambiente de trabalho.

Espera-se que este estudo contribua para desenvolver enfermeiros-líderes em suas práticas de trabalho, despertando um olhar mais crítico, que fortaleça o trabalho em equipe e, ao mesmo tempo, atenda às expectativas das instituições de saúde. Assim, pode ser possível alcançar objetivos comuns, que efetivamente permitam transformações na realidade.

Sugerimos o desenvolvimento de novas pesquisas com enfoque na liderança transformacional, que versem sobre a percepção de outros membros da equipe de enfermagem a respeito dos estilos de liderança.

• FOMENTO
  Esta pesquisa teve auxílio financeiro da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (CAPES) no contexto do Programa de Apoio à Pós-Graduação para mestrado, e da Universidade Federal da Bahia para o financiamento do macroprojeto ao qual este estudo está vinculado, contemplado no Programa de Apoio a Jovens Professores Doutores (PROPESQ), que permitiu a aquisição do software Nvivo 11 para análise dos dados qualitativos.

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Editado por

EDITOR CHEFE: Antonio José de Almeida Filho

EDITOR ASSOCIADO: Alexandre Balsanelli

Datas de Publicação

• Publicação nesta coleção
  10 Ago 2020
• Data do Fascículo
  2020

Histórico

• Recebido
  05 Ago 2019
• Aceito
  14 Dez 2019